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quinta-feira, 15 de julho de 2010

JURID - Sentença condenatória. Ameaça. Maria da penha. [15/07/10] - Jurisprudência


Apelação criminal. Sentença condenatória. Ameaça. Maria da penha. Suspensão condicional do processo

Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul - TJMS

Primeira Turma Criminal

Apelação Criminal - Detenção e Multa - N. 2010.016658-1/0000-00 - Campo Grande.

Relator - Exmo. Sr. Des. Dorival Moreira dos Santos.

Apelante - Ministério Público Estadual.

Prom. Just - Ana Lara Camargo de Castro .

Apelante - Kellen Xavier Fernandes.

Def.Pub.1ª Inst - Maria Gisele Scavone de Mello.

Apelante - Hudson Ortiz de Oliveira.

Def.Pub.1ª Inst - Franklin de Deus Cardoso.

Apelado - Kellen Xavier Fernandes.

Def.Pub.1ª Inst - Maria Gisele Scavone de Mello.

Apelado - Hudson Ortiz de Oliveira.

Def.Pub.1ª Inst - Franklin de Deus Cardoso .

Apelado - Ministério Público Estadual.

Prom. Just - Ana Lara Camargo de Castro.

EMENTA - APELAÇÃO CRIMINAL - SENTENÇA CONDENATÓRIA - AMEAÇA - MARIA DA PENHA - SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO - IMPOSSIBILIDADE - VEDAÇÃO LEGAL - PRECLUSÃO - SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA - POSIBILIDADE.

Impossível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, vez que o delito foi praticado com violência a pessoa e encontra óbice no art. 44, inciso I, do Código Penal. Entretanto, não se obstaculariza a concessão da suspensão condicional da pena, tendo em vista que o réu preenche os requisitos previstos no art. 77, do Código Penal.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Primeira Turma Criminal do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade e com o parecer, dar provimento aos recursos do Ministério Público e da Defensoria Pública da Mulher e negar provimento ao apelo da defesa.

Campo Grande, 6 de julho de 2010.

Des. Dorival Moreira dos Santos - Relator

RELATÓRIO

O Sr. Des. Dorival Moreira dos Santos

O Ministério Público Estadual interpôs recurso de apelação em face da sentença que condenou o réu Hudson Ortiz de Oliveira, por incurso no art. 129, § 9º, do Código Penal em conformidade com a Lei nº 11.340/2006, a pena de 03 (três) meses de detenção, no regime aberto, substituindo-se a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Sustenta ser inaplicável aos delitos praticados com violência ou grave ameaça à pessoa a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.

Alega que o ordenamento jurídico atual veda que as infrações penais havidas no ambiente doméstico e familiar contra a mulher como delitos de menor potencial ofensivo.

Assevera que é possível a concessão do sursis da pena, previsto no art. 77 do Código Penal.

Ao final, prequestiona o art. 44, inciso I, e ao artigo 46, caput, ambos do Código Penal.

A Defensoria Pública de Defesa da Mulher interpôs recurso de apelação alegando, também, que a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos deferida pelo juízo sentenciante, não pode subsistir, pugnando, pela suspensão condicional da pena - sursis pelo prazo de 02 (dois) anos.

Às f. 139-144 foram apresentadas contrarrazões ao recurso, pugnando pelo seu não-provimento.

O réu, por sua vez, interpôs recurso de apelação, alegando que deve ser aplicada ao caso a suspensão do processo e, o mérito, que as provas mostradas durante a instrução, não estão aptas a demonstrar a culpabilidade do recorrente, devendo se aplicar o princípio do in dubio pro reo.

Às f. 174-181 e 183-188 foram apresentadas contrarrazões ao recurso do réu, pugnando pelo seu não-provimento.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo não-provimento do recurso da defesa e pelo provimento do recurso ofertado pelo Ministério Público e da Defensoria Pública da Mulher, afastando-se a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, bem como concedendo ao apelado o benefício da suspensão condicional da pena.

VOTO

O Sr. Des. Dorival Moreira dos Santos (Relator)

Narra a denúncia que o réu ofendeu a integridade corporal da vítima, sua namorada, com socos, chutes e apertões em seu pescoço, causando-lhe as lesões corporais descritas no laudo de exame de corpo de delito (f.13).

A suspensão condicional do processo não é cabível nos casos de violência contra a mulher, nos termos da Lei Maria da Penha, que expressamente afastou a possibilidade de incidência da Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/95). Referida lei, em seu art. 41, assim dispõe:

"Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n.º 9.099, de 26 de setembro de 1995.".

Assim, entendo que o afastamento dos institutos despenalizadores previstos na Lei n. 9.099/95 para os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, inclui os institutos da transação penal (art. 76) e da suspensão condicional do processo (art. 89), ambos da referida lei.

Em relação ao art. 41, da Lei Maria da Penha, ensina Guilherme de Souza Nucci:

"os crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não são de menor potencial ofensivo, pouco importando o quantum da pena, motivo pelo qual não se submetem ao disposto na Lei 9099/95. Embora severa, a disposição do art. 41, é constitucional. Em primeiro plano, porque o art. 98, I, da Constituição Federal, delegou a Lei a conceituação de infração de menor potencial ofensivo e as hipóteses em que se admite a transação. Em segundo lugar, pelo fato de se valer do princípio da isonomia e na da igualdade literal, ou seja, deve-se tratar desigualmente os desiguais. Em terceiro prisma, esse é o resultado, em nosso ponto de vista, da má utilização pelo Judiciário, ao longo do tempo, de benefício criado pelo legislador. Em outros termos, tantas foram as transações feitas, fixando, como obrigação para os maridos ou companheiros agressores de mulheres no lar, a doação de cestas básicas (pena inexistente na legislação brasileira), que a edição da Lei 11340/2006 tentou, por todas as formas, coibir tal abuso de brandura, vedando a 'pena de cesta básica', além de outros benefícios (art. 17 desta Lei), bem como impondo a inaplicabilidade da Lei 9.099/95" (in Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 884).

Nesse vértice, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER (LEI 11.340/06). VIAS DE FATO. JUIZADO ESPECIAL E VARA CRIMINAL. PREVISÃO EXPRESSA DE AFASTAMENTO DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS (LEI 9.099/95). ARTS. 33 E 41 DA LEI 11.340/06. PARECER DO MPF PELA COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE. CONFLITO CONHECIDO, PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DE ITAJUBÁ/MG, O SUSCITANTE.

1. A conduta atribuída ao companheiro da vítima amolda-se, em tese, ao disposto no art. 7o., inciso I da Lei 11.340/06, que visa a coibir a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda a integridade ou a saúde corporal da mulher.

2. Ao cuidar da competência, o art. 41 da Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) estabelece que, aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais Criminais). O art. 33 da citada Lei, por sua vez, dispõe que enquanto não estiverem estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as Varas Criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes de violência doméstica.

3. Afastou-se, assim, em razão da necessidade de uma resposta mais eficaz e eficiente para os delitos dessa natureza, a conceituação de crimes de menor potencial ofensivo, punindo-se mais severamente aquele que agride a mulher no âmbito doméstico ou familiar.

4. A definição ou a conceituação de crimes de menor potencial ofensivo é da competência do legislador ordinário, que, por isso, pode excluir alguns tipos penais que em tese se amoldariam ao procedimento da Lei 9.099/95, em razão do quantum da pena imposta, como é o caso de alguns delitos que se enquadram na Lei 11.340/06, por entender que a real ofensividade e o bem jurídico tutelado reclamam punição mais severa.

5. Parecer do MPF pelo conhecimento e declaração da competência do Juízo suscitante.

6. Conflito conhecido, para declarar a competência do Juízo de Direito da Vara Criminal da Infância e Juventude de Itajubá/MG, o suscitante". (CC 96522/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Órgão Julgador: Terceira Seção. Data da Publicação/Fonte: DJe 19-12-2008)

Este Tribunal vem decidindo reiteradamente pela impossibilidade da suspensão condicional do processo em casos como o presente. Vejamos os mais recentes julgados:

"EMENTA - APELAÇÃO CRIMINAL - LEI MARIA DA PENHA - SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO - INVIABILIDADE.

Diante do reconhecimento da integral constitucionalidade da Lei n. 11.340/06, o que resulta em aplicação total de seus artigos, não é possível o benefício da suspensão condicional do processo, nos termos do art. 41 da referida lei.

Ademais, o exame da possibilidade de aplicação da suspensão condicional do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/95, não é mais possível após a prolação da sentença condenatória." (Apelação Criminal - Detenção e Multa - N. 2009.026834-8/0000-00 - Campo Grande, de minha relatoria, Primeira Turma Criminal. Data do Julgamento: 03.11.2009)

"APELAÇÃO CRIMINAL - AMEAÇA - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - RECURSO DEFENSIVO - PRETENDIDA PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO - LEI MARIA DA PENHA DECLARADA CONSTITUCIONAL PELO PLENO DESTE SODALÍCIO - INAPLICABILIDADE DOS INSTITUTOS DA LEI N. 9.099/95 - PRELIMINAR REJEITADA - MÉRITO - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS - PROVAS SUFICIENTES - RECURSO IMPROVIDO.

Tendo sido reconhecida pelo órgão de cúpula deste Sodalício a integral constitucionalidade da Lei n. 11.340/06, o que resulta em aplicação total de seus artigos, não há falar em aplicação da suspensão condicional do processo prevista no art. 89 da Lei n. 9.099/95. Preliminar rejeitada.

Mantém-se a condenação pelo crime de ameaça (art. 147 do CP), havendo provas suficientes da autoria." (Apelação Criminal - Detenção e Multa - N. 2009.021476-1/0000-00 - Campo Grande. Rel. Des. Romero Osme Dias Lopes. Órgão Julgador: Segunda Turma Criminal. Data do Julgamento: 21.9.2009)

Não obstante a impossibilidade da suspensão condicional do processo, em função da vedação expressa do art. 41 da Lei n. 11.340/06, a argüição de tal medida descriminalizadora encontra-se preclusa, eis que não foi alegada no momento oportuno, advindo sentença condenatória.

Em relação à autoria do delito a prova é suficiente a embasar o decreto condenatório.

O acusado afirma que teve uma discussão com a vítima, tentou tomar a chave dela e acabou puxando seu cabelo, segurando-a com força, e como ela é branca, ficou com sinais(f. 98).

A vítima declarou que o acusado quebrou seu celular e depois passou a agredi-la com apertões no pescoço e socos, e que a agressão aconteceu no posto de gasolina (f. 95).

A testemunha Katiane Xavier Fernandes disse que viu a vítima e que ela estava com marcas no corpo e sei celular estava quebrado.

Ademais, corroborando com a versão apresentada pela vítima, o Laudo de Exame de Corpo de Delito, concluiu: "Do observado e acima exposto concluímos que a examinada apresenta lesão corporal leve, cujas caracteristicas são compatíveis de terem sido produzidas conforme época relatada no histórico, por ação contundente." (f. 13/verso)

Cabe mencionar que nos delitos de violência doméstica, a palavra da vítima é de extrema relevância para a elucidação dos fatos, vez que, na maioria das vezes, neste tipo de delito não existem testemunhas presenciais dos fatos, como in casu.

Nesse sentido colho precedentes do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

"APELAÇÃO CRIMINAL - IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA - RELEVÂNCIA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE. As lesões corporais praticadas no âmbito familiar são, na maioria das vezes, realizadas às escuras, sem a presença de testemunhas. Daí ser relevante, neste tipo de delito, a palavra da vítima, não sendo imprescindível que existam testemunhas presenciais. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO." (TJMG- Ap. Crim. 1.0382.05.051316-9/001, Relatora Desa. Márcia Milanez, p. 04.04.2008)

"APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - PALAVRA DA VÍTIMA - RELEVÂNCIA - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE. A Lei 11.340/06, intitulada ""Lei Maria da Penha"", tem como objetivo coibir a violência doméstica e familiar, que na maioria das vezes ocorre às escuras, dentro do próprio ambiente domiciliar, ausente de testemunhas presenciais. Assim, nos delitos tipificados na nova lei, de suma importância é a palavra da vítima para o melhor elucidar dos fatos. Comprovadas a autoria e a materialidade do delito de violência doméstica, impossível a absolvição. Improvimento do recurso que se impõe. Retificação de ofício." (TJMG - Ap. Crim. 1.0479.06.121463-7/001, Relator Des. Antônio Carlos Cruvinel, p. 06.07.2007)

Do recurso do MP e da Defensoria Pública de Defesa da Mulher:

Trata-se de recursos de apelação criminal do Ministério Público Estadual e da Defensoria Pública de Defesa da Mulher, nos quais se impugna a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e pleiteia a aplicação da suspensão condicional da pena. Tenho que assiste razão aos apelantes.

Embora não se admita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em razão de o delito ter sido praticado com violência a pessoa, não há óbice à concessão da suspensão condicional da pena. Assim, tendo em vista que o réu preenche os requisitos previstos no art. 77, do Código Penal (não reincidente em crime doloso; possui condições subjetivas favoráveis a concessão do benefício e não cabimento da substituição prevista no art. 44 do CP), há de se conceder o sursis.

Nesse sentido:

"APELAÇÃO - AMEAÇA - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - PENAS RESTRITIVAS - ARTIGO 44, I DO CP - MULTA - ARTIGO 17 DA LEI 11.340/06 - REQUISITOS DO ARTIGO 77 DO CP - CABÍVEL SURSIS.

1- A lei Maria da Penha veda a aplicação da Lei 9099/95 aos delitos cometidos em situação de violência doméstica e familiar e as restritivas de direito, ante a limitação do 44. I do CP, mas não a Suspensão da Execução da Pena, mediante condições, se o condenado reunir os requisitos do artigo 77 e incisos para o benefício.

2- A pena inferior a 06 meses comportaria multa, mas como o artigo 17 da 11.340/06 veda expressamente a espécie, sendo as circunstâncias judiciais favoráveis, opta-se pelo Sursis simples, §2º do artigo 78, incorporando-se entre as condições as medida protetivas, determinadas pelo juiz e que não desaparecem com a condenação. PROVIDO EM PARTE." (Apelação Crime Nº 70030060925, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, Julgado em 24/09/2009). (destaquei)

Outrossim, registre-se, que os artigos prequestionados restaram analisados, não se configurando qualquer violação aos mesmos.

Posto isso, com o parecer, nego provimento ao recurso do réu e dou provimento aos recursos do Ministério Público Estadual e da Defensoria Pública de Defesa da Mulher, para reformar a sentença quanto à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, e, conceder a suspensão condicional da pena privativa de liberdade, por 02 (dois) anos, conferindo ao juiz da execução penal a especificação das condições a que o réu ficará sujeito.

DECISÃO

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE E COM O PARECER, DERAM PROVIMENTO AOS RECURSOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA DEFENSORIA PÚBLICA DA MULHER E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DA DEFESA.

Presidência do Exmo. Sr. Des. João Carlos Brandes Garcia.

Relator, o Exmo. Sr. Des. Dorival Moreira dos Santos.

Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Dorival Moreira dos Santos, João Carlos Brandes Garcia e Marilza Lúcia Fortes.

Campo Grande, 6 de julho de 2010




JURID - Sentença condenatória. Ameaça. Maria da penha. [15/07/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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