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quarta-feira, 7 de julho de 2010

JURID - Seguro e processual civil. Ação condenatória. [07/07/10] - Jurisprudência


Apelação cível. Seguro e processual civil. Ação condenatória. Procedência na origem.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2010.018343-9, de Lages

Relator: Juiz Henry Petry Junior

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONDENATÓRIA. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. I - ALEGADA AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DO EVENTO À SEGURADORA. DESNECESSIDADE. LIGAÇÃO TELEFÔNICA EFETIVADA. ADEMAIS, CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PROCEDENTE NO JUÍZO A QUO. ALEGAÇÃO AFASTADA. II - MÉRITO. PLANO CONTRATADO: FAMILIAR. COBERTURA PARA MORTE E INTERNAÇÃO HOSPITALAR. FATO GERADOR DEMONSTRADO. DEVER DE INDENIZAR. - SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

I - Não há falar em descumprimento contratual por parte do segurado por não comunicação de evento à seguradora se este, por meio telefônico, contata a ré solicitando o pagamento de indenização e, diante da inércia da empresa, ajuiza ação cautelar de exibição de documentos preparatória .

II - Urge o pagamento da indenização securitária se o beneficiário prova a ocorrência do fato gerador e a cobertura, notadamente se a seguradora, inerte, nada demonstra acerca de fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do pleito deduzido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.018343-9, da comarca de Lages (3ª Vara Cível), em que é apelante QBE Brasil Seguros S A, e apelado Alcione Pereira:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

RELATÓRIO

1. A ação

Na comarca de Lages, ALCIONE PEREIRA aforou "ação de cobrança de seguro" em face de QBE BRASIL SEGUROS S.A., nos autos qualificados, alegando, em breve resumo, que: [a] aderiu ao contrato de seguro "Renda Garantida Familiar" com a ré, pagando a quantia mensal de R$ 12,90 (doze reais e noventa centavos), sendo essa descontada na fatura telefônica; [b] em 13.11.08 sua esposa adoeceu e foi internada no Hospital Nossa Senhora dos Prazeres, permanecendo no local até o dia 13.12.08, data em que faleceu; [c] entrou em contato com a empresa ré, sendo informada que os documentos para que fosse pleiteada a indenização seriam encaminhados brevemente, além da promessa de ser enviada também a cópia da apólice contratada; [d] contudo, os documentos não chegaram à sua residência como restou combinado, ajuizando ação cautelar para exibição dos documentos; [e] a ação (n. 039.09.002394-1) foi julgada procedente, devendo a ré apresentar a cópia do contrato firmado entre as partes; [f] tem direito a ser indenizado no valor de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), em virtude da morte da sua esposa, mais R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) por dia em que ela permaneceu internada no hospital; e [g] o quantum total da indenização merecida é de R$ 6.000,00 (seis mil reais), sendo R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais) referente a morte e R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais) referente aos 30 dias de internação hospitalar da sua esposa.

Pleiteou, ao final, a condenação da ré ao pagamento de indenização na cifra de R$ 6.000,00 (seis mil reais). Requereu, ainda, a condenação da empresa demandada ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios.

Citada, a ré apresentou resposta em forma de contestação escrita às fls. 23/40, argumentando, em síntese, que o autor não cumpriu suas obrigações contratuais, deixando de comunicar sobre o ocorrido, além de não ter enviado os documentos necessários para que fosse instaurado o processo administrativo.

Impugnação à contestação apresentada às fls. 48/55.

Após, sobreveio decisão judicial.

2. A sentença

No ato compositivo da lide (fls. 56/59), o magistrado Marcelo Pizolati, em 10.11.2009, julgou procedente os pedidos iniciais do autor, condenando a ré ao pagamento do valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), corrigindo monetariamente a quantia desde a data do óbito, incidindo juros de mora a contar da citação.

Condenou a ré, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.

3. O recurso

Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação às fls. 61/74, argumentando, em síntese, que: [a] o autor não cumpriu suas obrigações contratuais, deixando de enviar os documentos necessários à abertura do processo administrativo; e [b] não houve recusa ao pagamento da indenização, visto que não foi oficialmente comunicada do ocorrido conforme exige o contrato.

Após a apresentação de contrarrazões (fls. 78/87), ascenderam os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

1. A admissibilidade do recurso

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

2. Do mérito

2.a. Da alegada ausência de comunicação à seguradora

Sustenta a apelante que, não havendo nos autos prova do aviso do sinistro à seguradora, para comunicação do ocorrido, é impossível que se proceda ao pagamento das indenizações securitárias porque, presente no termo contratual dita obrigação, é ele o meio apto para o início do procedimento administrativo necessário para o pagamento da indenização.

Por primeiro, importante ressaltar que a alegação da apelante, no sentido de que, ausente requerimento administrativo, descumpriu o postulante exigência contratual, discrepa do autuado.

Com efeito, o autor, em sua exordial, afirma que manteve contato telefônico com a seguradora para recebimento dos valores pleiteados, no que não foi atendido, sendo que, passados meses sem qualquer resposta por parte da apelante, ajuizou em face desta cautelar de exibição de documentos.

De fato, tramitou na origem ação cautelar, ajuizada pelo autor em face da ré, que foi julgada procedente, já encontrado-se os autos no arquivo - autos n. 039.09.002394-1.

Consigno, por oportuno, que mesmo que ausente comunicação à seguradora, não há falar sequer em ausência de interesse de agir. Neste sentido, colhe-se da jurisprudência desta Corte:

FALTA DE INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO DO SINISTRO. GARANTIA DE ACESSO AO JUDICIÁRIO. ART. 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DA INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA PARA INGRESSAR EM JUÍZO. PRELIMINAR ARREDADA.

O interesse processual, desdobrado no binômio adequação-necessidade, afigura-se presente quando o meio eleito é apto ao alcance da pretensão exposta e a necessidade do provimento jurisdicional é intuída da ampla resistência apresentada na contestação, dispensando-se a formalização de pedido prévio negado na via administrativa. (TJSC, Apelação Cível n. 2007.028881-8, de Lages. Rel.ª: Des.ª MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA. j. em 13.11.2007).

Assim, realmente despropositada a alegação, não merece agasalho.

3. Do pleito indenizatório

Sustenta a seguradora ré que o autor não cumpriu os trâmites estipulados no contrato do seguro de vida pactuado entre as partes, não tendo sido comunicada da morte da esposa do segurado, assim como não recebeu os documentos necessários para que fosse iniciado o processo administrativo para futuro pagamento da indenização.

Afirma, ainda, que a cláusula de número 15 e seus itens (15.1.1; 15.1.2 e 15.2) - documento trazido aos autos às fls. 44/45 - especifica os documentos que deveriam ter sido enviados a ré com o objetivo de sanar as despesas hospitalares e posteriormente pagar a indenização referente à morte da esposa do autor.

A fim de solucionar a presente lide, importante tecer, inicialmente, algumas considerações acerca da relação jurídica existente entre segurado e seguradora.

De se ressaltar que a relação existente entre o segurado e a seguradora é nitidamente uma relação de consumo, devendo as normas contratuais pactuadas ser interpretadas em conformidade com os princípios norteadores deste estatuto legal. Tal se infere a partir da leitura do art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, que ao definir o que seja serviço, prevê claramente: "é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".

Ademais, o contrato de seguro enquadra-se dentre aqueles definidos como contrato de adesão. Segundo definição do próprio CDC, esse tipo de contrato possui cláusulas aprovadas pela autoridade competente ou, então, estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que possa o consumidor discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo (art. 54).

Sobre esse fato, JOÃO MARCOS BRITO MARTINS, na obra Direito de Seguro - Responsabilidade Civil das Seguradoras, doutrina, legislação, jurisprudência, 2ª ed., Editora Forense Universitária, ano 2004, explica:

Evidentemente que o fato de as normas terem sido aprovadas ou, até mesmo, estipuladas pelas autoridades competentes em hipótese alguma pode indicar que está só particularidade tivesse o condão de revestir de justiça qualquer conduta baseada naquela premissa. A obediência aos preceitos é condição necessária para a manutenção da ordem e segurança jurídica. Mas não suficiente. (p. 173)

Analisando-se novamente os preceitos insertos no CDC, há os §§ 3º e 4º do art. 54, que auxiliam na elucidação, em parte, da lide em análise:

§3º - Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

§4º - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

ADA PELLEGRINI GRINOVER [et al.], na obra Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, 7ª ed., Editora Forense Universitária, ano 2001, ao comentar os parágrafos retro indicados, afirma:

Sobre os destaques, ganha maior importância o dever de o fornecedor informar o consumidor sobre o conteúdo do contrato (art. 46,CDC). Deverá chamar a atenção do consumidor para as estipulações desvantajosas para ele, em nome da boa-fé que deve presidir as relações de consumo.

[...].

O destaque pode ser dado de várias formas: a) em caracteres de cor diferente das demais cláusulas; b) com tarja preta em volta da cláusula; c) com redação em corpo gráfico maior do que o das demais estipulações; d) em tipo de letra diferente das outras cláusulas, como, por exemplo, em itálico, além de muitas outras fórmulas que possam ser utilizadas, ao sabor da criação d estipulante. (p. 569-570).

Afirma, o autor, que a seguradora ré comprometeu-se a enviar os documentos necessários para que fosse iniciado o processo administrativo. Contudo, teve que intentar ação cautelar de exibição de documentos na 3ª Vara Cível de Lages para receber a apólice do contrato e posteriormente garantir o pagamento da indenização.

A cópia da conta telefônica do autor (fl. 15) confirma a informação de que esse entrou em contato com a ré através do número 0800-727-1602, cumprindo sua obrigação contratual para que fosse dado início ao processo de pagamento administrativo.

Foram acostados aos autos, também pelo autor, a certidão de óbito de sua esposa (fl. 10), declaração do Hospital Nossa Senhora dos Prazeres referente ao período de internação da segurada (fl. 09) e cópia do contrato de seguro (fls. 12/14), essa obtida através de ação cautelar de exibição de documentos (n. 039.09.002.394-1).

Restando, portanto, incontroversa a internação hospitalar da segurada pelo período de 30 (trinta) dias, além da certidão que comprovou o óbito, evidenciado ser a razão da morte a "falência de múltiplos órgãos e sistemas" (fl. 10).

Disposto está no certificado de seguro (fl. 12), mais especificamente nas cláusulas 2.2.2.1 e 2.2.2.2, que:

2.2.2.1. - Morte por qualquer causa: Garante ao Segurado Titular o pagamento de uma indenização no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos mil reais), em caso de falecimento, exceto se decorrente de risco excluídos.

2.2.2.2. - Renda diária por Internação Hospitalar: Esta cobertura tem por objetivo garantir o pagamento de até 365 (trezentos e sessenta e cinco) Diárias Pecuniárias ao Segurado, no valor de R$ 150,00 ( cento e cinquenta reais) por diária, sendo limitado ao capital máximo de R$ 54.750,00 ( cinquenta e quatro mil, setecentos e cinquenta reais) por vigência anual da apólice, em caso de internação hospitalar para tratamento clínico ou cirúrgico em consequência de doença ou acidente, exceto se decorrente de riscos excluídos.

Portanto, ante os motivos acima delineados, não há como prevalecer a tese da seguradora, visto que devido o pagamento da indenização no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), conforme previsão do contrato de seguro firmado entre as partes.

Posto isto, voto no sentido de negar provimento ao recurso interposto pela seguradora ré.

DECISÃO

Ante o exposto, por unanimidade, a Câmara decide conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos supra.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto, dele participando o Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato.

Florianópolis, 22 de junho de 2010.

Henry Petry Junior
Relator




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