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quinta-feira, 8 de julho de 2010

JURID - Responsabilidade civil do município. Cemitério. [08/07/10] - Jurisprudência


Administrativo e constitucional. Responsabilidade civil do município. Cemitério. Autorização municipal.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2008.062941-9, de Lages.

Relator: Des. Jaime Ramos

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO - CEMITÉRIO - AUTORIZAÇÃO MUNICIPAL PARA TRANSLADO E EXUMAÇÃO - INDICAÇÃO DO LOCAL DO JAZIGO - DESAPARECIMENTO DOS RESTOS MORTAIS - OFENSA MORAL - MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

"O Município responde objetivamente pela violação de túmulo e transferência dos restos mortais sem autorização ou notificação da respectiva família. Esse proceder causa abalo emocional nos parentes envolvidos e autoriza a indenização por danos morais" (TJSC - AC n. 2001.016185-0, de Rio do Sul, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.062941-9, da Comarca de Lages, em que é apte/apdo Amélia Terezinha Muniz dos Santos, e apdo/apte o Município de Lages:

ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso do Município e dar provimento parcial ao recurso da autora. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Na Comarca de Lages, Amélia Terezinha Muniz dos Santos ajuizou "ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais" contra o Município, alegando que era casada com Aristides Cordova dos Santos; que seu marido faleceu em 18.10.2002, no Hospital Geral e Maternidade Teresa Ramos, em Lages, vítima de Carcinomatose-Neoplasia Gástrica-Caquexia; que o sepultamento ocorreu por conta do Município, no Cemitério Nossa Senhora da Penha, pois a autora não tinha condições financeiras de arcar com o ritual; que a Municipalidade alertou que o jazigo somente poderia ser ocupado pelo prazo de cinco anos; que, findo o prazo, foi requerida autorização para o translado dos restos mortais; que, diante da autorização, fez-se orçamento de compra de um jazigo no Cemitério Parque da Saudade; que no dia e na hora marcada, verificou-se que o corpo sepultado no local Q J F 05 n. 31 era feminino, ou seja, não era o do marido da autora; que não conseguiu localizar os restos mortais do seu marido.

Requereu a condenação do Município ao cumprimento de obrigação de fazer para que seja compelido a encontrar os restos mortais do marido da autora e que seja condenado ao pagamento de indenização por danos morais.

Citado, o Município contestou afirmando que à autora incumbia providenciar a identificação nos túmulos, o que não fez; que o corpo não foi removido do local; que a reparação de dano moral é, portanto, incabível.

A contestação foi impugnada.

O Ministério Público de Primeiro Grau, entendendo não haver interesse público na causa, deixou de intervir.

Sentenciando, o MM. Juiz julgou parcialmente procedente o pedido formulado para condenar o Município "ao pagamento de R$ 1.500,00 [hum mil e quinhentos reais] a título de danos morais, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês contados a partir da presente decisão e, em conseqüência, ressalto ter ocorrido hipótese de julgamento com resolução do mérito, com base no art. 269, I, do CPC. Custas e honorários advocatícios, ante a autora ter decaído de parte considerável do pedido, ficam compensados integralmente nos termos do art. 20, § 4º do CPC c/c o parágrafo único do artigo 21 do CPC, atendidas as alíneas a, b e c do referido artigo. Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição, eis que o valor da condenação não excede a sessenta salários mínimos, consoante determina o § 2º do art. 475 do CPC."

Inconformada, a autora apelou requerendo a majoração da quantia fixada para reparação dos danos morais.

Inconformado, o Município apelou argumentando que o jazigo encontrava-se em completo estado de abandono; que a autora não providenciou identificação do local do sepultamento; que a condenação ao pagamento de indenização por danos morais não merece prosperar, pois não há nexo causal.

Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância.

VOTO

Por abrangerem toda a matéria discutida nos autos, os recursos serão julgados em conjunto.

O recurso do Município é improcedente. Contudo, há que se dar provimento parcial ao recurso de apelação cível interposto por Amélia Terezinha Muniz dos Santos a fim de se modificar o valor da quantia arbitrada a título de danos morais.

1. Da responsabilidade civil do Município

Como se sabe, a responsabilidade civil da Administração Pública, decorrente de danos causados por seus agentes, é objetiva, quer seja com base nos arts. 43 e 932, inciso III, do Código Civil de 2002, ou diante do que prescreve o art. 37, § 6º, da Constituição Federal: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

O art. 43, do Código Civil de 2002 (Lei Federal n. 10.406/02), vigente à época dos fatos, assim dispõe: "As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo".

SÍLVIO RODRIGUES, sobre a responsabilidade objetiva do Estado e das concessionárias de serviço público, leciona:

"Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente.

"A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele" (Direito civil, v. IV, 19. ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 10).

HELY LOPES MEIRELLES, referindo-se à norma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988, leciona:

"Desde que a Administração defere ou possibilita ao seu servidor a realização de certa atividade administrativa, a guarda de um bem ou a condução de uma viatura, assume o risco de sua execução e responde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceiros. Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco da sua ação ou omissão, é que se assenta a teoria da responsabilidade civil objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço, porque esta falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins" (Direito administrativo brasileiro. 33. ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 656).

E, mais adiante, acrescenta que "para obter a indenização, basta que o lesado acione a Fazenda Pública e demonstre o nexo causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano, bem como seu montante. Comprovados esses dois elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar. Para eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda Pública comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade da vítima, subsiste a responsabilidade objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da indenização" (Direito administrativo brasileiro. 33. ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 660).

O Supremo Tribunal Federal, acerca da matéria, tem orientado:

"A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público" (STF - RE n. 109615/RJ, Primeira Turma, Rel. Ministro Celso de Melo, DJU de 02/08/1996).

Portanto, o Município somente se exime do dever de indenizar se comprovar a existência de alguma excludente, como culpa exclusiva da vítima ou de terceiro ou caso fortuito ou força maior. Todavia, como se verá, não é o caso dos autos.

Na espécie, a apelante Amélia Terezinha Muniz dos Santos alega que os restos mortais de seu marido, Aristides Cordova dos Santos, foram retirados do jazigo Q J F 05 n. 31, localizado no Cemitério de Nossa Senhora da Penha, em Lages, onde deveriam estar, à sua revelia e sem qualquer autorização da família.

É bem verdade que, em 18.10.2002, quando o marido da apelante foi sepultado naquele Cemitério, ela recebeu a informação de que aquele local não poderia ser ocupado por período superior a cinco anos e que, após esse interregno, independentemente de autorização da família, outra poderia ser a destinação dada ao lugar do jazigo.

Ciente disso, a autora/apelante requereu autorização para o translado dos restos mortais de seu marido para o Cemitério Parque da Saudade, em Lages, pouco antes do fim do prazo quinquenal.

No dia e na hora marcados para a transferência dos restos mortais do marido da apelante para outro Cemitério, apurou-se que no local indicado pelo Administrador do Cemitório como sendo do jazigo Q J F 05 n. 31 estava um corpo do sexo feminino.

Inconformada, com o ato ilícito praticado, a apelante requereu a condenação do Município para que ele seja compelido a encontrar os restos mortais do marido da autora/apelante e que, ainda, seja condenado ao pagamento de indenização por danos morais.

A Administração Pública Municipal, por sua vez, disse que a autora/apelante desrespeitou os arts. 161 e 162, da Lei Municipal n. 134/1963, pois deixou de providenciar a identificação do túmulo do seu marido, ônus que lhe competia, daí por que não se pode afirmar que o corpo foi removido do local, pois a autora sequer tem como confirmar o local do sepultamento.

Sem razão o Município.

Denota-se dos autos que, em 15.10.2007, foi expedida autorização de translado dos restos mortais do marido da apelante pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Serviços Públicos de Lages, assinada pela Diretora Helena Estelita de Souza Dias:

"Fica autorizado a transladação dos restos mortais de Aristides Cordova dos Santos sepultado no Cemitério Nossa Senhora da Penha, em Lages - com área de 2,75m Q J F 05 N. 31 SC tendo como esta declaração a autorização para exumação e translado ao Cemitério Parque da Saudade em Lages - SC", ou seja, independentemente de a autora ter providenciado ou não a lápide com a identificação do nome do "de cujus", os adornos do túmulo e a limpeza do local, ressalta-se que foi o próprio Município quem apontou como certo o local do sepultamento e da exumação, sem que, aliás, houvesse impugnação por parte da apelante/autora, que consentiu com a indicação feita. A indicação do local do sepultamento, feita naquele documento, tem supedâneo nos registros constantes do livro de sepultamentos a cargo da administração do Cemitério. A indicação feita pelo administrador não incidiu sobre o lote 31, da fila 5, da quadra J, conforme os dados inscritos no livro de sepultamentos e no documento de autorização para exumação. Ninguém, do Município, soube informar onde se localiza tal sepultura. Apenas indicam sepulturas próximas, em que estão enterradas outras pessoas indicadas no livro.

Nesse contexto, torna-se evidente a responsabilidade civil do Município pelo desaparecimento do corpo (ou restos mortais) que se encontrava sob sua proteção no Cemitério Nossa Senhora da Penha, em Lages.

Sobre o caso em tela, ponderou o magistrado sentenciante:

"[...] o pedido de exumação e sua autorização pelo poder público se deram antes do prazo máximo de 5 [cinco] anos para a manutenção do corpo nas covas gratuitas concedidas a título temporário, como descrito no art. 161 da Lei nº 134/63, citado mais acima. O argumento utilizado pelo ente público de descaso da autora para com o túmulo do extinto, igualmente não merece acolhimento. Tanto havia preocupação dos familiares que, aproximando-se o prazo de vencimento da ocupação gratuita dos restos mortais de Aristides no cemitério da Penha, todos os procedimentos cabíveis para a exumação e transferência do corpo foram adotadas pela requerente. Ademais, 3 (três) filhos do casal acomapanharam a infrutífera exumação, fato este que demonstra satisfatoriamente o interesse da família com a destinação do corpo do finado. A responsabilidade do Município é objetiva, ou seja, basta comprovar o nexo de causalidade entre o fato e os danos suportados pela autora, para que o réu seja compelido a indenizar."

Vale lembrar, por oportuno, que o desaparecimento dos restos mortais do marido da autora/apelante, além de caracterizar um desrespeito tremendo aos mortos (arts. 208 a 212, do Código Penal), causa evidente dano moral aos familiares do falecido, sobretudo quando há dificuldade em identificar o exato local do jazigo ou dos restos mortais, como é o caso dos autos, impossibilitando a família de prantear os seus mortos. Acrescente-se, ainda, que de acordo com a Constituição Federal de 1988, "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício de cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias" (art. 5º, inciso VI), de sorte que, configurado o ato ilícito (destruição das sepulturas), cabe à Administração Pública ser condenada ao pagamento de verba indenizatória.

Não é demasiado lembrar, também, que a proteção dos direitos da personalidade do "de cujus" recebeu atenção especial no Código Civil de 2002 que, no que interessa à causa, assim preconiza:

"Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

"Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.

"[...]

"Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

"Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes."

Este Tribunal de Justiça, em casos de violação de túmulos, tem reconhecido a responsabilidade civil do Poder Público e, via de consequência, a obrigação de indenizar os parentes dos mortos:

"APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RESTOS MORTAIS DE ASCENDENTES REMOVIDOS ILEGALMENTE - SEPULTAMENTO DE OUTRA PESSOA NO MESMO LOCAL - REMOÇÃO PARA OSSÁRIO COMUM DEVIDO AO SUPOSTO ABANDONO DO TÚMULO - DANO MORAL CONFIGURADO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO - REFORMA DA SENTENÇA PARA QUE O SEPULTAMENTO SEJA REALIZADO EM OUTRO JAZIGO, COMPATÍVEL COM O ANTERIOR - PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. (TJSC - AC n. 2006.034960-1, de Blumenau, Rel. Des. Orli Rodrigues, julgada em 19.12.2006).

"APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RESTOS MORTAIS DE ASCENDENTE REMOVIDOS SEM A DEVIDA ANUÊNCIA DOS FAMILIARES - REMOÇÃO PARA OSSÁRIO COMUM DEVIDO A FALTA DE PAGAMENTO DE TAXA DE RENOVAÇÃO - TAXA MUNICIPAL INSTITUÍDA POR DECRETO - IMPOSSIBILIDADE PELO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE - EXEGESE DOS ARTS. 150, I, CF E 97, I, CTN - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO - PREJUÍZO PRESUMIDO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ESTABELECIDOS SEGUNDO OS CRITÉRIOS DO ART. 20, § 4° DO CPC - APELOS DESPROVIDOS.

"É evidente que há abalo emocional quando familiares vão prestar homenagens à ente falecido e encontram, no lugar, sepulcro de pessoa estranha, devido a remoção de seus restos mortais para ossário comum sem a anuência da família.

"'A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que, na concepção moderna do ressarcimento por dano moral, prevalece a responsabilização do agente por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto, ao contrário do que se dá quanto ao dano material' (REsp 556745/SC).

"'A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, ocorre diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa" (REsp. 179.147)" (TJSC - AC n. 2003.030626-9, de Brusque, Rel. Des. Francisco Oliveira Filho, julgada em 04.05.2004).

"ADMINISTRATIVO - AFORAMENTO DE ÁREA EM CEMITÉRIO MUNICIPAL - REOCUPAÇÃO INDEVIDA - REINTEGRAÇÃO DE POSSE - DANOS MORAIS

"1. O documento firmado pelo Município referente à aquisição de espaço em cemitério municipal para sepultamento constitui prova suficiente para garantir a posse e a inviolabilidade do túmulo nele sediado.

"2. O Município responde objetivamente pela violação de túmulo e transferência dos restos mortais sem autorização ou notificação da respectiva família. Esse proceder causa abalo emocional nos parentes envolvidos e autoriza a indenização por danos morais." (TJSC - AC n. 2001.016185-0, de Rio do Sul, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, julgada em 18.04.2006).

Há, portanto, o dever de Município de indenizar a autora/apelante.

2. Do "quantum" indenizatório.

É cediço que o dano moral não tem caráter de reposição, porque a moral não pode ser ressarcida, mas tem exclusivamente o objetivo de tentar compensar a dor sofrida pelo lesado em razão de atitudes equivocadas, errôneas ou dolosas de terceiros, para que estes venham a tomar as cautelas necessárias para evitar que novos fatos, como o dos autos, venham a se repetir.

Valor nenhum é capaz de ressarcir ou mesmo compensar os transtornos ocorridos. No entanto, como não existem outros critérios para compensar a dor sofrida, atualmente se vem decidindo no sentido de que as indenizações pecuniárias são a melhor solução para se tentar amenizar as amarguras sofridas pela ofensa ou pelo abalo moral.

Nesse sentido são os precedentes do Supremo Tribunal Federal, reproduzidos pelo Superior Tribunal de Justiça:

"Não indenizar o dano moral é deixar sem sanção um direito, ou uma série de direitos. A indenização, por menor e mais insuficiente que seja, é a única sanção para os casos em que se perdem ou se têm lesados a honra a liberdade, a amizade, a afeição, e outros bens morais mais valiosos de que os econômicos" (STF - RE n. 97.097, Min. Oscar Correa; STJ 108/287-295).

Reza o art. 5º, da Constituição Federal de 1988, nos seus incisos V e X:

"V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".

"X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

O atual Código Civil (Lei n. 10.406, de 10/01/2002), em vigor desde 12/01/2003, também prevê expressamente a obrigação de indenizar qualquer espécie de dano causado a alguém, ainda que somente moral:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".

Não há, contudo, parâmetros legais para a fixação do valor da indenização dos danos morais. Como não tem base financeira ou econômica própria e objetiva, o "quantum" da reparação dos danos morais é aleatório. Cabe ao magistrado, consultando o seu bom senso e a prudência, arbitrar o valor que entender justo, adequado, razoável e proporcional.

CARLOS ALBERTO BITTAR, acerca do valor da indenização, explica que:

"[...] diante da esquematização atual da teoria em debate, são conferidos amplos poderes ao juiz para definição da forma e da extensão da reparação cabível, em consonância, aliás, com a própria natureza das funções que exerce no processo civil (CPC, arts. 125 e 126). Com efeito, como julgador e dirigente do processo, pode o magistrado ter conhecimento direto das partes, dos fatos e das respectivas circunstâncias, habilitando-as, assim, à luz do direito aplicável, a definir de modo mais adequado, a reparação devida no caso concreto" (Reparação civil por danos morais. RT, 1993, p. 205-6).

Adiante, destaca que:

"[...] a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que se não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expresso, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante" (Reparação civil por danos morais. RT, 1993, p. 220).

Sobre o assunto, ensina HUMBERTO THEODORO JÚNIOR:

"O arbitramento da indenização do dano moral é ato exclusivo e indelegável do Juiz.

"Por se tratar de arbitramento fundado exclusivamente no bom senso e na eqüidade, ninguém além do próprio juiz está credenciado a realizar a operação do quantum com que se reparará a dor moral". (Dano Moral, 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 41).

A jurisprudência deste Tribunal acompanha:

"INDENIZAÇÃO FIXAÇÃO DO QUANTUM - APRECIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO - ARBITRAMENTO EM VALOR QUE EXPRESSA A FINALIDADE A QUE SE DESTINA - DESPROVIMENTO DO RECURSO PRINCIPAL.

"Incumbe ao juiz o arbitramento do valor da indenização, observando as peculiaridades do caso concreto, bem como as condições financeiras do agente e a situação da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco que seja inexpressivo ao ponto de não atender aos fins a que se propõe" (TJSC - AC n. 00.013683-2, de Lages, Rel. Des. Sérgio Paladino).

Portanto, examinados e sopesados esses critérios, e considerando-se a flagrante ofensa à moral do apelado e da sua família, é imprescindível que se modifique a parte dispositiva da sentença recorrida, a fim de condenar o Município de Lages ao pagamento de indenização no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de danos morais.

O valor arbitrado deverá ser corrigido, desde a data da sentença em que deveria ter sido fixado (Súmula n. 362, do Superior Tribunal de Justiça: "A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento"), conforme o índice adotado pela douta Corregedoria-Geral de Justiça, com juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, desde a data do evento danoso (Súmula n. 54, do Superior Tribunal de Justiça: "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual").

Ante o exposto, dá-se provimento parcial ao recurso da autora a fim de majorar para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) o valor fixado a título de indenização por danos morais e se nega provimento ao recurso do Município.

DECISÃO

Nos termos do voto do Relator, por votação unânime, a Câmara negou provimento ao recurso do Município e deu provimento parcial ao recurso da autora.

Conforme disposto no Ato Regimental n. 80/2007-TJ, publicado no Diário de Justiça Eletrônico de 07.08.2007, registra-se que do julgamento realizado em 01.07.2010, participaram, com votos, além do Relator, os Exmos. Srs. Desembargadores Cláudio Barreto Dutra (Presidente) e Rodrigo Collaço.

Florianópolis, 01 de julho de 2010.

Jaime Ramos
Relator




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