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terça-feira, 13 de julho de 2010

JURID - Responsabilidade civil. Ação de indenização por danos morais [13/07/10] - Jurisprudência


Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação de indenização por danos morais. Denúncia infundada.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2010.013730-8, de Canoinhas

Relator: Des. Henry Petry Junior

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DENÚNCIA INFUNDADA QUE DEU AZO À INSTAURAÇÃO DE SINDICÂNCIA E OFENSAS PÚBLICAS. PROCEDÊNCIA EM PRIMEIRO GRAU. I - CONDUTA ILÍCITA DA RÉ CARACTERIZADA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. NÃO COMPROVAÇÃO. NEXO CAUSAL MANTIDO. DANO MORAL CONFIGURADO. II - QUANTIA INDENIZATÓRIA ARBITRADA. PRETENDIDA MINORAÇÃO. DESCABIMENTO. SENTENÇA QUE A FIXOU CONFORME A RAZOABILIDADE. FINS REPARATÓRIO, PEDAGÓGICO E INIBIDOR. - SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA RÉ DESPROVIDO.

I - Configurado o ato ilícito, nasce para o responsável o dever de indenizar os danos dele decorrentes. À luz do que orienta o art. 333, II, do CPC, incumbe à ré demonstrar que agiu em exercício regular de direito, circunstância hábil a solapar o nexo causal existente entre a sua conduta e o resultado danoso.

II - "A indenização por danos morais deve ser fixada com ponderação, levando-se em conta o abalo experimentado, o ato que o gerou e a situação econômica do lesado; não podendo ser exorbitante, a ponto de gerar enriquecimento, nem irrisória, dando azo à reincidência." (TJSC, Apelação Cível n. 2006.013619-0, de Laguna. Terceira Câmara de Direito Civil, Rel. Des. FERNANDO CARIONI, j. em 03.08.2006).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2010.013730-8, da comarca de Canoinhas (1ª Vara Cível), em que é apelante Rosa Galvão da Rocha, e apelado Rogério Iurkiv:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por unanimidade, negar provimento ao recurso.

RELATÓRIO

1. A ação

Na comarca de Canoinhas, Rogério Iurkiv ajuizou ação de indenização por danos morais em face de Rosa Galvão da Rocha, relatando que, em 13 de agosto de 2004, atendeu, na condição de policial militar, uma ocorrência de invasão de domicílio, cuja autoria era imputada à ré. Destacou que, na oportunidade, a demandada proferiu contra si inúmeros impropérios, asseverando que o demandante era "porco", "vagabundo", "porco do governo".

Alegou, outrossim, que, a partir desse dia, a ré iniciou verdadeira perseguição profissional contra o demandante, dando causa à instauração de sindicância pela Corporação, por meio da qual se apuraram denúncias de que o autor teria ofendido a ré, ameaçado e disparado com arma de fogo contra a casa desta, todas elas arquivadas porquanto inverídicas.

Em razão do abalo moral sofrido, requereu, ao final, a condenação da ré ao pagamento de indenização a ser arbitrada pela autoridade judicial.

Regularmente citada (fl. 48 v.), Rosana Galvão da Rocha apresentou resposta na forma de contestação (fls. 52/63).

Houve impugnação à contestação, às fls. 69/70.

Saneado o feito e rechaçada a proeminal aventada (fl. 71), promoveu-se audiência de conciliação, a qual restou inexitosa (fl. 76). Seguiu-se, então, a audiência de instrução e julgamento, em que foram ouvidas três testemunhas (fl. 108). Na sequência, o processo foi suspenso, por conta do que alude o art. 265, IV, "a", do CPC. Findo o procedimento penal acerca dos mesmos fatos, acostaram-se aos autos cópias dos depoimentos lá colhidos, ocasião em que, após a ciência das partes, sobreveio a sentença.

1.a. A sentença

No ato compositivo da lide, o magistrado de primeiro grau, André Alexandre Happke, em 14/05/2009, julgou procedente o pedido inicial e condenou a ré ao pagamento dos danos morais, no valor equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), bem como ao adimplemento das custas e honorários advocatícios, no importe de R$ 900,00 (novecentos reais).

1.b. O recurso

Irresignada, apelou a ré, aduzindo, em breve resumo, que: a) inexistem elementos de prova hábeis a comprovar a efetiva ocorrência de prejuízo extrapatrimonial; b) as denúncias veiculadas perante a instituição militar consubstanciam exercício regular de direito, motivo por que não há falar em responsabilização, já que ausente o necessário nexo causal; e c) a exorbitância da quantia fixada a título de danos morais e de honorários advocatícios.

Requereu, ao cabo, o provimento do recurso para total improcedência do pleito inaugural e, subsidiariamente, caso mantido o provimento jurisdicional atacado, a redução das verbas indenizatória e honorária.

Contrarrazões, às fls. 147/150.

Ascenderam os autos a esta Corte.

É o relatório possível e necessário.

VOTO

2. A admissibilidade do recurso

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

2.1. O mérito

a. Do dano moral

Segundo narra a exordial, no dia 13 de agosto de 2004, o apelado Rogério Iurkiv foi chamado a atender uma ocorrência de invasão de domicílio, cuja autoria era imputada à apelante. Na ocasião, a recorrente proferiu inúmeros impropérios contra o policial militar, asseverando que este era "porco", "vagabundo", "porco do governo".

Por força do entrevero, a recorrente teria iniciado ferrenha perseguição contra o recorrido, o que teria lhe causado imenso dissabor e abalo moral hábeis a ensejar compensação em pecúnia.

São duas, portanto, as causas de pedir que alicerçam o pleito condenatório: de um lado, as ofensas irrogadas pela apelante; de outro, a instauração de procedimento administrativo disciplinar contra o recorrido.

Feita a ressalva, vislumbra-se que a responsabilidade civil subjetiva, aqui aplicável, tem como ponto nodal o ato ilícito. Nas palavras de SÍLVIO DE SALVO VENOSA, "o dever de indenizar vai repousar justamente no exame de transgressão ao dever de conduta que constitui o ato ilícito" (in: Direito Civil - Responsabilidade Civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 22).

Sua conceituação encontra eco no art. 186 do Código Civil, cujo teor é o seguinte: "Aquele que, por ação ou omissão, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano".

Dessume-se do dispositivo legal em apreço, por conseguinte, que esta modalidade de responsabilização encerra cinco requisitos, a saber: fato gerador, nexo de imputação, dano, cabimento no âmbito de proteção da norma e nexo de causalidade.

Fato gerador consiste em toda ação ou omissão ou fato natural antijurídico, ou seja, não permitido pelo direito em si mesmo ou em suas consequências.

FERNANDO NORONHA ensina que "a anitjuridicidade, quer diga respeito a um fato humano, quer um fato natural, é dado de natureza objetiva: existe quando o fato (omissão, ação, fato natural) ofende direitos alheios de modo contrário ao ordenamento jurídico, independentemente de qualquer juízo de censura que porventura possa estar presente e ser referido a alguém" (in: Direito das obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 469).

O nexo de imputação é o fundamento da atribuição de responsabilidade a uma determinada pessoa pelos prejuízos ocasionados à outra, em consequência de um determinado fato antijurídico. Em outras palavras, "é o elemento que aponta o responsável, estabelecendo a ligação do fato danoso com este" (NORONHA, FERNANDO. Direito das obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 471). Em regra, o supedâneo de tal imputação é a atuação culposa. Excepcionalmente, haverá imputação pelo risco.

O dano pode ser compreendido como a violação de um interesse legitimamente tutelado pelo ordenamento jurídico, cuja materialização se dá com o efetivo prejuízo suportado pela vítima.

Uma vez consumado o prejuízo, é preciso perquirir se ele está ou não contido no âmbito de proteção da norma tida por vulnerada, "isto é, exige-se que o dano verificado seja resultado da violação de um bem protegido" (NORONHA, FERNANDO. Direito das obrigações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 468).

Por fim, tem-se o nexo causal, que consiste no liame havido entre a conduta do agente e o dano provocado, o qual pode ser afastado acaso verificada alguma das excludentes elencadas no art. 188 do Código Civil.

Assim, tendo em conta a repartição do ônus probatório, fica evidente que, nos termos do art. 333, I, do Código de Processo Civil, em hipóteses como a presente, incumbe ao autor provar o fato constitutivo do seu direito, in casu, o adimplemento dos requisitos da responsabilidade civil.

Tal mister, registre-se, foi integralmente cumprido pelo apelado, de modo que não há reparos a fazer na sentença, cujos termos encontram amparo farto na prova testemunhal e documental amealhada na instrução processual.

Arnaldo Pape Filho, em seu depoimento de fl. 109, relata:

O depoente mora de frente à residência da ré e ao lado daquela do autor; faz algum tempo, viu quando a réu passou a desacatar o autor chamando-o de vagabundo, sem-vergonha, cachorro e outros impropérios; nessa ocasião o autor estava de serviço e realizava coincidentemente a ronda na rua que todos moravam [...] naquela oportunidade, a ré fez um escândalo para que todos os vizinhos escutassem as ofensas que lançava ao autor; o autor se manteve em silêncio diante das ofensas.

Rosilane Rentz Moro ratifica, à fl. 120, a versão apresentada:

Respondeu que reside em frente à casa da acusada há 6 anos, e nunca foi fácil de manter bom relacionamento de vizinhança com a mesma; [...] a vítima - Rogério Iurkiv - está construindo em um terreno ao lado da casa da depoente; a depoente se recorda que, certo dia, quando estava ao telefone ouviu a acusada discutindo com alguém e foi até a janela ver, quando constatou que a acusada estava "batendo boca" com a vítima e com um outro soldado; [...] a acusada chamava a vítima de vagabundo e de porco; esclarece a depoente que sempre passava a viatura na rua a acusada xingava os policiais de vagabundos e se sustentados pelas mulheres [...] que a depoente nunca viu a vítima transportando materiais de construção para o imóvel onde constrói sua morada; [...] que nunca ouviu disparo de arma de fogo no imóvel da vítima; os materias de construção eram entregues pelas próprias lojas, tendo a própria depoente, em algumas ocasiões, ficado com as notas, ante a ausência da vítima.

As declarações citadas foram reforçadas também pelas testemunhas Valdir Kondagéski (fl. 110), José Valcir Cavalheiro (fl. 111) e Ethel Jacomel (fl. 122).

Não bastasse, os documentos coligidos às fls. 08/40 dão conta de que a apelante, de fato, deu causa à instauração de sindicância em desfavor do apelado, noticiando o uso indevido da viatura policial para fins particulares, disparo de arma de fogo nas imediações de sua residência e ameaças de morte contra si proferidas.

Todas as acusações foram solenemente rechaçadas pela autoridade encarregada de conduzir os trabalhos investigativos, porque tidas como desprovidas do necessário substrato probatório. Tal conclusão foi ratificada pelo superior hierárquico do recorrido que, em decisório de fl. 40, determinou o arquivamento do processo disciplinar.

À fl. 122, a testemunha Ethel Jacomel acrescentou:

Concluiu que os fatos apontados pela vítima não eram verdadeiros, notadamente porque achou que o depoimento da ré era um tanto quanto confuso, inclusive envolvendo o Presidente da República e programas jornalísticos de ambito nacional (linha direta), nenhuma das testemunhas afirmou ter visto a vítima utilizando a viatura para fins particulares (transporte de materiais de construção); também negaram que a vítima tivesse efetuado disparos com arma de fogo ou ameaçado a ré de morte [...].

Assim, considerando o material probatório produzido, vislumbra-se que, ao contrário do que alude a apelante, o apelado se desincumbiu do ônus que lhe cabia, na medida em que comprovou satisfatoriamente a versão apresentada, adimplindo, portanto, o dever que lhe impõe o art. 333, I, do CPC.

b. Da excludente de exercício regular de direito

De outro norte, alega a recorrente que as denúncias veiculadas perante a Corregedoria-Geral da Polícia Militar consubstanciam exercício regular de direito.

Por certo, nos termos do que orienta o art. 188, I, do CC, o exercício regular do direito constitui uma das hipóteses excludentes de ilicitude chanceladas pelo ordenamento jurídico.

Na seara civil, sua configuração rende ensejo à descaracterização do nexo etiológico entre a conduta perpetrada pelo agente e o resultado danoso, de modo que há, nesses casos, isenção da responsabilidade respectiva.

Segundo sugere a insurgente, a intenção que lhe moveu foi, sim, noticiar fatos verídicos e abusos cometidos por Rogério Iurkiv no desempenho da função pública.

Ora, não se desconhece que é direito do cidadão acorrer às autoridades com o fito de comunicá-las acerca da ocorrência de eventuais condutas ilícitas praticadas pelos agentes públicos no exercício do mister que lhes foi confiado pelo Estado. Tal prerrogativa está albergada no texto constitucional, em especial no art. 5º, XXXIV, da Carta Magna.

Sucede, no entanto, que a aludida garantia não pode servir de pálio para a promoção de denúncias infundadas e sem lastro probatório mínimo. Tanto é verdade que tal proceder consubstancia crime, nos termos do art. 339 do Código Penal.

Conforme bem se denota da sindicância de fls. 08/40, não há um elemento informativo sequer que ampare as acusações da apelante. Além disso, no curso da instrução processual, Rosa Galvão da Rocha, a despeito do requerimento genérico de fl. 77, não produziu prova alguma, seja testemunhal, seja documental.

Ademais, mesmo que se reconhecesse o seu agir como exercício regular de direito, imperiosa, de igual, a sua responsabilização, diante das comprovadas ofensas dirigidas, em público, ao apelado quando em serviço.

Assim, em desrespeito à distribuição do ônus probatório a que alude o art. 333, II, do CPC, a recorrente não logrou êxito em comprovar a existência de fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito do autor, especial a configuração do exercício regular do direito, motivo pelo qual a sentença objurgada não merece qualquer reparo neste particular.

c. Da minoração da verba indenizatória

Pugna a apelante pela minoração da verba indenizatória, ao argumento de que o montante estipulado dá azo ao locupletamento ilícito do recorrido.

Mais uma vez, a assertiva não convence.

É sabido que, à mingua de critérios legais de quantificação, a fixação do montante a ser pago a título de danos morais relega-se ao prudente arbítrio do magistrado. As balizas para tanto, contudo, são delineadas pela jurisprudência.

Consoante farto entendimento desta Corte, a verba deve, a um só tempo, ter em conta a situação sócio-econômica de ambas as partes, de maneira a não representar enriquecimento sem causa para a vítima ou empobrecimento para o ofensor; o grau de culpa do agente; a extensão do prejuízo suportado pelo lesado; e, finalmente, deve inibir a prática de atos idênticos ou semelhantes.

Nesse sentido, colhe-se o seguinte aresto:

Assim é que se tem fixado o quantum indenizatório de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando em conta, sobretudo: a malícia, o dolo ou o grau de culpa daquele que causou o dano; as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas; os antecedentes pessoais de honorabilidade e confiabilidade do ofendido; a intensidade do sofrimento psicológico gerado pelo vexame sofrido; a finalidade admonitória da sanção, para que a prática do ato ilícito não se repita; e o bom senso, para que a indenização não seja extremamente gravosa, a ponto de gerar um enriquecimento sem causa ao ofendido, nem irrisória, que não chegue a lhe propiciar uma compensação para minimizar os efeitos da violação ao bem jurídico (TJSC, Apelação Cível 2008.024364-2, de Blumenau, Rel. Desa. MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA, j. em 17/11/2009).

Sendo assim, em atenção aos aludidos critérios, tem-se que o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) se mostra hábil à compensação pretendida, mormente quando se leva em consideração que o apelado teve de defender-se em procedimento administrativo disciplinar.

De outro norte, não há nos autos qualquer evidência de que a condição econômica da apelante não lhe permita suportar o pagamento da quantia, razão por que deve ser mantida tal qual estipulada no provimento jurisdicional entregue.

d. Da redução dos honorários advocatícios

Finalmente, a recorrente requer a redução da verba honorária para R$ 200,00 (duzentos reais).

Consoante dispõe o art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, nas causas de valor inestimável, os honorários advocatícios serão fixados de maneira eqüitativa pelo juiz, observando o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

No caso em análise, observa-se que, apesar de a causa não guardar complexidade, sendo matéria corriqueiramente apreciada pelos Tribunais, o patrono do autor funcionou no feito de maneira contundente, na elaboração da inicial e apresentação de impugnação à contestação apresentada. Posteriormente à prolação da sentença, o advogado do autor laborou na apresentação de contrarrazões, circunstâncias que permitem a manutenção do quantum fixado na sentença.

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso e mantém-se integralmente a decisão objurgada.

DECISÃO

Ante o exposto, nos termos do voto do relator, decide a Câmara, por unanimidade, negar provimento ao recurso.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto, dele participando o Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato.

Florianópolis, 15 de junho de 2010.

Henry Petry Junior
Relator




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