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quinta-feira, 1 de julho de 2010

JURID - Penal. Suposta prática de crime capitulado no artigo 334 CP. [01/07/10] - Jurisprudência


Penal. Suposta prática de crime capitulado no artigo 334 do cp. Princípio da insignificância jurídica.

Tribunal Regional Federal - TRF4ªR

QUESTÃO DE ORDEM EM RCCR Nº 0002197-20.2008.404.7106/RS

RELATOR : Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO : ALEX SANDRO DOS SANTOS GOMES

ADVOGADO : Luciano Loeblein

EMENTA

PENAL. SUPOSTA PRÁTICA DE CRIME CAPITULADO NO ARTIGO 334 DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA JURÍDICA. DÉBITO TRIBUTÁRIO INFERIOR AO TETO DE RELEVÂNCIA ADMINISTRATIVA. EXCLUDENTE DE TIPICIDADE.

1. Na linha da orientação jurisprudencial, aplica-se o princípio da insignificância jurídica, como excludente de tipicidade, aos crimes em que há elisão tributária não excedente ao teto previsto no artigo 20, caput, da Lei 10.522/2002, com a redação dada pela Lei 11.033/2004, correspondente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), porque patamar considerado irrelevante pela Administração Pública para efeito de processamento de execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União.

2. No caso de suposta prática de crime capitulado no artigo 334 do Código Penal, o cálculo do valor do crédito tributário relativo às mercadorias estrangeiras importadas ilegalmente, em conformidade com o inciso III do artigo 2º da Lei 10.865/2004, deve levar em consideração apenas o Imposto de Importação (II) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sem computar as quantias devidas a título de COFINS e PIS, bem assim observar o preconizado no artigo 65 da Lei 10.833/2003.

3. Afeiçoando-se a hipótese dos autos a esses parâmetros, uma vez que o montante dos tributos federais iludidos é inferior ao limite mínimo de relevância administrativa, está-se diante de conduta atípica.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, solver questão de ordem para negar provimento ao recurso em sentido estrito, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de junho de 2010.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

RELATÓRIO

O Ministério Público aviou denúncia em desfavor de ALEX SANDRO DOS SANTOS GOMES, dando-o como incurso, em tese, nas sanções do artigo 334 do Código Penal. Os fatos foram assim narrados na exordial:

"No dia 21 de junho de 2008, o denunciado introduziu clandestinamente no território nacional 1000 (mil) DVDs virgem, 800 CDs virgem, todos de origem e procedência estrangeiras, desacompanhadas de documentação comprobatória de sua regular importação.

O fato ocorreu no KM 560 da BR 158, em Santana do Livramento, quando por ocasião de uma fiscalização realizada por uma equipe da Inspetoria da Receita Federal efetuou a fiscalização em bagagens de turistas provenientes do exterior, a bordo do veículo GM/Vectra, placas LXB 6216, ocasião em que as mercadorias estrangeiras foram encontradas na posse do denunciado."

A denúncia foi rejeitada pelo Juízo a quo com fulcro no artigo 395, III, do CPP, tendo em conta a aplicação do princípio da insignificância jurídica (fl. 19-verso).

Nas razões de recurso (fls. 21/24), o Ministério Público Federal sustenta, em síntese, a inviabilidade de aplicação do princípio da insignificância, em face dos valores dos tributos sonegados.

Com contrarrazões (fls. 37/40).

O órgão ministerial, nesta instância, opinou pelo desprovimento o recurso em sentido estrito (fls. 43).

É o relatório.

Apresento em mesa.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

VOTO

Cinge-se a controvérsia à (im)possibilidade de reconhecimento da insignificância jurídica no caso sub judice.

A aplicação do princípio despenalizante tem lugar quando se puder verificar, em relação à conduta perpetrada pelo agente, uma ofensividade mínima, podendo esta assim ser considerada se a ação, apesar de encontrar tipificação no ordenamento pátrio, não vier a representar periculosidade social, bem como contar com grau de reprovabilidade irrisório, mercê de o ataque ou a omissão levados a efeito pelo suposto agente não implicarem lesão expressiva ao bem jurídico penalmente tutelado, permitindo o reconhecimento do chamado crime de bagatela que se caracteriza por não deter caráter criminal relevante.

Nos crimes em que há elisão tributária, tais como os inscritos na Lei 8.137/90 e nos artigos 168-A, 334 e 337-A do Estatuto Repressivo, incide o princípio da insignificância, como excludente de tipicidade, quando a supressão das exações consistentes no valor consolidado - principal mais acessórios - não exceder o montante previsto no artigo 20, caput, da Lei 10.522/2002, com a redação dada pela Lei 11.033/2004, hoje correspondente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), patamar este considerado irrisório pela Administração Pública para efeito de processamento de execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União.

A partir da adoção desse balizador, tendo em conta que o Direito Penal deve reger-se pelos princípios da subsidiariedade, intervenção mínima e fragmentariedade, posicionando-se como ultima ratio, não seria razoável, de um lado, a punição criminal de determinada conduta e, de outro, a desconsideração da mesma em sede administrativa sob o pálio da sua irrelevância, em função da ausência de grave violação ao bem juridicamente tutelado.

Essa é a orientação da Corte Suprema:

"HABEAS CORPUS. DESCAMINHO. MONTANTE DOS IMPOSTOS NÃO PAGOS. DISPENSA LEGAL DE COBRANÇA EM AUTOS DE EXECUÇÃO FISCAL. LEI N° 10.522/02, ART. 20. IRRELEVÂNCIA ADMINISTRATIVA DA CONDUTA. INOBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS QUE REGEM O DIREITO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ORDEM CONCEDIDA.

1. De acordo com o artigo 20 da Lei n° 10.522/02, na redação dada pela Lei n° 11.033/04, os autos das execuções fiscais de débitos inferiores a dez mil reais serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, em ato administrativo vinculado, regido pelo princípio da legalidade.

2. O montante de impostos supostamente devido pelo paciente é inferior ao mínimo legalmente estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia a referência a outros débitos em seu desfavor, em possível continuidade delitiva.

3. Ausência, na hipótese, de justa causa para a ação penal, pois uma conduta administrativamente irrelevante não pode ter relevância criminal. Princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima que regem o Direito Penal. Inexistência de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado.

4. O afastamento, pelo órgão fracionário do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, da incidência de norma prevista em lei federal aplicável à hipótese concreta, com base no art. 37 da Constituição da República, viola a cláusula de reserva de plenário. Súmula Vinculante n° 10 do Supremo Tribunal Federal.

5. Ordem concedida, para determinar o trancamento da ação penal." (HC 92.438, 2.ª Turma, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, D.E. 19-12-2008).

"HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PACIENTE PROCESSADO PELA INFRAÇÃO DO ART. 334, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL (DESCAMINHO). ALEGAÇÃO DA INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTE DESTE SUPREMO TRIBUNAL FAVORÁVEL À TESE DA IMPETRAÇÃO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO PARA DETERMINAR O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.

1. O descaminho praticado pelo Paciente não resultou em dano ou perigo concreto relevante, de modo a lesionar ou colocar em perigo o bem jurídico reclamado pelo princípio da ofensividade. Tal fato não tem importância relevante na seara penal, pois, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal, incide, na espécie, o princípio da insignificância, que reduz o Âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por conseqüência, torna atípico o fato denunciado.

2. A análise quanto à incidência, ou não, do princípio da insignificância na espécie deve considerar o valor objetivamente fixado pela Administração Pública para o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das ações fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União (art. 20 da Lei n. 10.522/02), que hoje equivale à quantia de R$ 10.000,00, e não o valor relativo ao cancelamento do crédito fiscal (art. 18 da Lei 10.522/02). Equivalente a R$ 100,00.

3. É manifesta a ausência de justa causa para a propositura da ação penal contra o ora Paciente. Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do Direito Penal, que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos.

4. Ordem concedida." (RE 96309-9, 1ª Turma, Rela. Ministra Cármen Lúcia, D.E. 24-4-2009).

A Terceira Seção, que reúne as Turmas do Superior Tribunal de Justiça com jurisdição criminal, também não discrepa desse entendimento:

"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 105, III, A E C DA CF/88. PENAL. ART. 334, § 1º, ALÍNEAS C E D, DO CÓDIGO PENAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

I - Segundo jurisprudência firmada no âmbito do Pretório Excelso - 1ª e 2ª Turmas - incide o princípio da insignificância aos débitos tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei nº 10.522/02.

II - Muito embora esta não seja a orientação majoritária desta Corte (vide EREsp 966077/GO, 3ª Seção, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 20/08/2009), mas em prol da otimização do sistema, e buscando evitar uma sucessiva interposição de recursos ao c. Supremo Tribunal Federal, em sintonia com os objetivos da Lei nº 11.672/08, é de ser seguido, na matéria, o escólio jurisprudencial da Suprema Corte.

Recurso especial desprovido." (REsp 1112748, Rel. Ministro Félix Fischer, DJe 13-10-2009)

De igual forma, a Quarta Seção deste Sodalício, que une as Turmas Criminais Regionais, uniformizou a jurisprudência nos mesmos moldes:

"PENAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - DELIMITAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SUBJETIVA - ABSTRAÇÃO. 1. É inadmissível que uma conduta seja considerada irrelevante no âmbito administrativo e não o seja na esfera penal, uma vez que o Direito Penal 'só deve atuar quando extremamente necessário para a tutela do bem jurídico protegido quando falharem os outros meios de proteção e não forem suficientes as tutelas estabelecidas nos demais ramos do Direito' (STF, HC 92438, 19/08/2008). 2. Uniformizando-se o trato da relevância na ótica do interesse público, enfocado tanto pelo prisma do Direito Administrativo como pelo prisma do Direito Penal, o parâmetro estabelecido para operar o princípio da insignificância em delitos de descaminho reside na cifra de R$ 10.000,00 (dez mil reais) - valor dado pela Lei n° 11.033/2004 ao artigo 20 da Lei n° 10.522/2002. 3. A incidência do princípio da bagatela é aferida apenas em função de aspectos objetivos, relativos à infração cometida, e não em função de circunstâncias subjetivas, as quais não obstam a sua aplicação." (EIACR 2006.70.07.000110-1, Rel. Desembargador Federal Amaury Chaves de Athayde, D.E. 27-10-2008)

Pois bem. A hipótese dos autos em tudo afeiçoa-se aos precedentes colacionados.

Com efeito, nos casos de suposta prática de crime capitulado no artigo 334 do Código Penal, esta Corte firmou entendimento no sentido de que o cálculo do montante dos tributos suprimidos deve basear-se tão-somente na cobrança do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), porquanto não há incidência de PIS e COFINS sobre a introdução em solo pátrio de bens estrangeiros que são objeto de pena de perdimento, conforme disposição do artigo 2º, inciso III, da Lei 10.865/2004, bem assim deve observar o preconizado no artigo 65 da Lei 10.833/2003.

Compulsando o caderno processual, verifico que, in casu, o valor aduaneiro da totalidade dos produtos apreendidos é de R$ 820,00 (oitocentos e vinte reais - fl. 10), de acordo com o auto de infração e o termo de apreensão e guarda fiscal, e o montante dos tributos federais iludidos (II e IPI), segundo o demonstrativo presumido lavrado pela Secretaria da Receita Federal, alcançaria R$ 410,00 (quatrocentos e dez reais - fl. 06).

Nessa senda, pode-se afirmar que o quantum estimado das exações devidas, em face da suposta importação de mercadorias forâneas sem regularidade fiscal, corresponde à importância inferior ao limite mínimo de relevância administrativa, o que permite o reconhecimento, na esfera penal, da atipicidade da conduta delituosa em tese praticada.

Ante o exposto, voto no sentido de solver a questão de ordem formulada para negar provimento ao recurso em sentido estrito.

Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/06/2010

RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002197-20.2008.404.7106/RS

ORIGEM: RS 200871060021977

INCIDENTE : QUESTÃO DE ORDEM

RELATOR : Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

PRESIDENTE : Paulo Afonso Brum Vaz

PROCURADOR : Dra. Maria Emília Correa da Costa

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO : ALEX SANDRO DOS SANTOS GOMES

ADVOGADO : Luciano Loeblein

Certifico que o(a) 8ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU ACOLHER A QUESTÃO DE ORDEM PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

RELATOR ACÓRDÃO : Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

VOTANTE(S) : Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Juiz Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

AUSENTE(S) : Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Lisélia Perrot Czarnobay
Diretora de Secretaria

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Documento eletrônico assinado digitalmente por Lisélia Perrot Czarnobay, Diretora de Secretaria, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e a Resolução nº 61/2007, publicada no Diário Eletrônico da 4a Região nº 295 de 24/12/2007. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3550339v1 e, se solicitado, do código CRC 61D5D12B.

Informações adicionais da assinatura:

Signatário (a): LISELIA PERROT CZARNOBAY:10720

Nº de Série do Certificado: 44365C89

Data e Hora: 23/06/2010 18:23:27

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