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segunda-feira, 12 de julho de 2010

JURID - Indenização. Procedência [12/07/10] - Jurisprudência


Hipermercado e fabricante terão de indenizar compradora de fogão defeituoso.


COMARCA DE PORTO ALEGRE

VARA CÍVEL DO FORO REGIONAL PARTENON



Processo nº: 001/1.08.0347854-6
Natureza: Sumário - Outros
Autor: Andreia Olino Bassani
Réu: Companhia Zaffari Comercio e Industria
Eletrolux do Brasil S/A
Juiz Prolator: Juíza de Direito - Dra. Fabiana dos Santos Kaspary
Data: 24/06/2010



Vistos etc.

ANDREIA OLINO BASSANI qualificada na inicial, ajuizou a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS contra COMPANHIA ZAFFARI COMÉRCIO E INDÚSTRIA e ELETROLUX DO BRASIL S.A. Disse que, no dia 31/05/2006, adquiriu no estabelecimento da primeira requerida, um fogão modelo 5Q2FN DX INOX 110V Eletrolux, pagando a vista o valor de R$ 2.402,50. Asseverou que, instalado em sua residência e posto a funcionar, o fogão, após mais ou menos cinco meses de uso, apresentou vários defeitos graves: a chama não se mantinha acesa e o forno não funcionava direito, pois aquecia somente um lado e não alcançava a temperatura necessária para que assar os alimentos. Gizou que diligenciou junto à assistência técnica da segunda requerida nove vezes, sendo que chegou a pagar pelo serviço em duas oportunidades, o que totalizou o custo de R$ 168,00. Salientou que em nada adiantou a assistência técnica, pois os defeitos persistiram, tornando o eletrodoméstico imprestável. Acrescentou que solicitou a troca do bem por um novo, sem sucesso. Frisou que, em virtude disso, sofreu diversos aborrecimentos, angústia, estresse constante e abalo de ordem moral. Teceu considerações sobre o dever de indenizar, citando doutrinas. Suscitou o CDC. Colacionou jurisprudências. Requereu o julgamento de procedência da ação, condenando os réus a indenizar-lhe pelos danos morais experimentados, no valor de 50 salários mínimos e bem assim, os danos patrimoniais, no valor de R$ 168,00. Postulou ainda, fossem condenados a restituir a quantia paga pelo bem, devidamente corrigida. Pediu AJG. Acostou documentos.

A gratuidade judiciária restou deferida. Foi designada audiência para tentativa de conciliação, ocasião em que a autora aditou a inicial, incluindo no polo passivo a Eletrolux do Brasil S.A.

Citados, os réus apresentaram contestação.

A Companhia Zaffari Comércio e Indústria sustentou ilegitimidade passiva, pois não participou das tratativas para conserto do produto, estar ajustadas entre a Eletrolux e a autora. Salientou não ter nenhuma ingerência sobre disposição de peças nas assistências autorizadas e argumentou que somente o fabricante poderia autorizar, no caso de não haver conserto pela assistência técnica, a troca do produto. Gizou que o art. 18 do só é aplicado quando o fabricante não é conhecido, o que não acontece no caso concreto. No mérito entendeu não ser responsável objetiva ou subjetivamente, pois não fabricou o fogão, apenas o revendeu. Transcreveu doutrinas. Aduziu serem descabidos os pedidos de danos materiais e morais. Sustentou que, embora haja incômodo quando bens adquiridos não funcionam ou não correspondem à expectativa,tal não configura dano moral. Arrolou jurisprudência. Asseverou que o ônus da prova incumbe ao autor, conforme art. 333 do CPC. Postulou pelo acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva. Pugnou fosse a ação julgada improcedente. Juntou documentos.

A Eletrolux do Brasil, por sua vez, arguiu, em preliminar a decadência do direito da autora, pois o fogão foi adquirido em 31/05/2006 e a demanda foi proposta somente no ano de 2008, após transcorridos dois anos desde a constatação do problema. Frisou que, se o consumidor deixou fluir o prazo de 90 dias sem tomar as medidas necessárias previstas na lei consumerista, verifica-se a decadência de seu direito em utilizar-se das opções previstas nos incisos do parágrafo primeiro do art. 18 do CDC. Colacionou doutrinas. No mérito, salientou que inexiste prova acerca do alegado vício de fabricação e que não se pode confundir nexo causal com culpa. Salientou que é impossível devolver os valores pagos. Entendeu que a autora não logrou êxito em demonstrar que o suposto prejuízo material de fato ocorreu no que diz respeito ao defeito no produto adquirido. Acrescentou que não há que se falar em lesão à honra ou dignidade, no caso em tela, podendo apenas ser presumido certo incômodo decorrente dos fatos narrados que, porém, não resultaram de ação ou omissão da ré. Rogou fosse a preliminar de decadência acolhida. Requereu o julgamento de improcedência da ação. Acostou documentos.

Houve réplica.

Instadas sobre a produção de provas, manifestaram-se a autora e a Companhia Zaffari, requerendo depoimentos pessoais. A Eletrolux requereu a realização de perícia de engenharia eletroeletrônica. As partes apresentaram quesitos. Manifestou-se a Eletrolux requerendo que o custo da perícia fosse suportado pela autora. Tendo o pedido rechaçado, a ré desistiu da perícia.

Designada audiência de instrução, proposta, novamente, a conciliação, restou inexitosa. Foi colhido o depoimento pessoal da autora. As partes apresentaram debates orais.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório. Segue fundamentação.

Intenta a autora ver-se ressarcida dos gastos com aquisição e tentativa de conserto de eletrodoméstico adquirido junto à primeira ré e fabricado pela segunda, bem como ver-se indenizada pelo transtorno causado em função dos defeitos do produto.

Nesse sentido, não há que se cogitar de ilegitimidade passiva da Cia Zaffari. Veja-se que, ao contrário do que sustenta a corré em sua contestação, aplicável aqui a regra do art. 18 do CDC, que fixa a responsabilidade solidária dos fornecedores do produto por vícios que o tornem inservíveis ao uso a que se destinavam quando da aquisição pelo consumidor. O dever de reparação aqui tem natureza contratual e decorre de falha na adequação e prestabilidade do produto, exatamente a hipótese dos autos, em que a autora reclama por mau funcionamento do eletrodoméstico comprado na loja da ré Cia Zaffari. Não se cuida, como se vê, de responsabilidade pelo fato do produto, prevista no art. 12 do CDC, esta e natureza extracontratual, estabelecida quando há falha na segurança do produto a causar danos extrínsecos que tenham sido gerados pelo defeito do produto. Ininvocável em favor da ré, dessarte, a regra do art. 13 da lei consumerista, esta que se reporta ao art. 12 e não ao art. 18.

Em assim sendo, a teor do art. 18, a responsabilidade entre vendedor e fabricante é solidária, pouco relevando tenha a autora procurado ou não a loja antes de procurar a assistência técnica. Aliás, pela experiência comum, pouco ou nada haveria de diferir caso a autora houvesse procurado primeiro a Cia Zaffari, já que, como é sabido, em caso de defeito do aparelho, a loja remete o consumidor à assistência do fabricante, jamais substituindo o produto de imediato ou providenciando ela mesma no encaminhamento do conserto, consoante a própria Zaffari reconhece na contestação ao dizer que "o fabricante tem que autorizar a troca".

Tampouco merece acolhida a prefacial de mérito sustentada pela Eletrolux. Com efeito, o bem de consumo durável foi adquirido em 31/05/2006, tendo a autora apresentado queixas quanto ao funcionamento pela primeira vez em 27/10/2006. Dessa data até 31/10/2008, o fogão fabricado pela corré Eletrolux, como adiante se verá e como fazem prova as ordens de serviço acostadas com a inicial, passou por inacreditáveis oito solicitações de conserto pela autora. Nesse interregno, evidentemente, viu-se a autora sob a condição regulada no § 2º., I, do art. 26 do CDC. Tendo em vista que a última resposta da assistência técnica data de 31/10/2008, quando do ingresso desta demanda, 19/12/2008, ainda não havia decorrido o prazo decadencial de 90 dias fixado pelo inciso II do mesmo art. 26.

No mérito, à autora assiste o Direito.

Em que pese a ré Eletrolux seja enfática ao preconizar pela inexistência de defeito, como fabricante, tinha plenas condições de refutar em juízo o alegado pela autora e comprovar, tecnicamente, que o fogão apresentava adequado funcionamento. Em vez disso, desistiu da prova pericial pleiteada. O ônus da prova era seu, mesmo que não determinada a inversão, por mero consectário do art. 333, II, do Código de Processo Civil.

Ainda que assim não fosse, as oito ordens de serviço acostadas pela autora nas fls. 14/21 são prova mais que robusta a demonstrar que o fogão jamais funcionou como deveria. Veja-se que já em maio de 2006 o aparelho não mantinha a chama acesa, função essa essencial, diga-se, a um fogão. A peça denominada "termopar" foi ajustada mais de uma vez e o defeito persistia, vide fls. 15, 16, 17, em dez/06, fev/07 e set/07. Em fev/08, portanto, mais de um ano depois, ainda não funcionava, tanto que foi substituído o termopar, fl. 18. O forno ainda não acendia, vide fl. 19, o que se seguiu até agosto, quando a autora ainda chamou a assistência técnica para solucionar o problema, fl. 20. Por fim, em outubro de 2008 o fogão ainda não se prestava ao fim ao qual adquirido, tanto que foi recolhido pela empresa autorizada da fabricante para uma derradeira tentativa de conserto.

Sem reparo o defeito que impedia o funcionamento do produto, ampara a pretensão da autora o disposto no art. 18, § 1º., II, do CDC, de sorte que devem as rés, solidariamente, devolver-lhe a integralidade o valor pago pelo fogão, R$ 2.402.50, corrigido pelo IGPM desde o desembolso e acrescido de juros de 1% ao mês a contar da citação.

Igualmente, demonstrado que os gastos efetuados perante a assistência técnica, na tentativa infrutífera de sanear o vício, não surtiram efeito algum, resultando a consumidora com um eletrodoméstico em sua casa que não é hábil a cozinhar os alimentos tal qual se propunha, vê-se que deve ser indenizada pelo prejuízo material daí advindo. As rés, portanto, devem ressarcir a autora pelo valor alcançado a titulo de visitas, troca de peça (termopar) e conserto pela empresa autorizada da Eletrolux, no total de R$ 168,00, também corrigidos desde o desembolso e acrescidos de juros de mora e 1% ao mês a contar da citação.

No que concerne ao pleito por dano moral, de regra, defeitos intrínsecos em produtos duráveis causam apenas prejuízo material, notadamente os já destacados gastos com a aquisição do próprio produto e com despesas nas tentativas de conserto.

Entretanto, o caso dos autos revela abuso injustificável digno de atenção do juízo. Com efeito, à toda evidencia a autora foi mais que tolerante com o vício apresentado pelo produto, sem solução por mais de dois anos. Ao longo desses dois anos, a autora amargou com idas e vindas dos técnicos da assistência autorizada da fabricante, vendo-se frustrada a cada final de serviço, ao constatar que ainda não conseguia utilizar o fogão. Ao todo foram oito, não uma, nem duas, mas oito chamadas para conserto. Nesse ínterim, a autora viu-se privada do uso do eletrodoméstico, uso esse essencial para qualquer residência. Teve por completo frustrada sua expectativa de contar com um aparelho com novos recursos e hábil, em tese, a oferecer maior conforto para si e sua família nas lides domésticas. Teve de contentar-se com uma visita em que o técnico, mesmo diante do já flagrante defeito recorrente, limitou-se a fornecer orientações sobre o funcionamento do fogão, em total desrespeito à reclamação da consumidora, subestimando-lhe por completo a inteligência e paciência. Por fim, o mais grave e merecedor de nota abuso perpetrado pela assistência técnica eleita pela fabricante-ré a fim de atender seus consumidores: tão-logo findo o prazo de garantia do bem, o defeito que não era identificado o foi, e a consumidora teve que pagar pela substituição da peça chamada termopar, que nunca funcionara antes. Não vejo coincidência alguma aí, mas, sim, clara tentativa de lograr a consumidora, negando-lhe a cobertura da peça pela garantia do fabricante.

A só cansativa descrição de todas as visitas dos técnicos à casa da autora e das ocasiões em que se viu alijada do uso do aparelho já incute a noção da situação estressante experimentada pela consumidora devido ao produto sem qualidade que lhe foi vendido e ao mau atendimento que lhe foi prestado. Importante salientar que não se eximem os fornecedores diante do fato de que houve também falha na prestação de serviço pela empresa de assistência. Não fosse defeituoso o produto, restaria a autora poupada de todo esse abalo. Mais que isso, cabe ao fabricante bem escolher e delegar funções a empresa que há de prestar a assistência ao consumidor, pena de causar, além do prejuízo pelo vício do produto, danos outros a que pode ser compelida indenizar.

O desconforto experimentado pela autora ao longo de dois anos de esperança em poder usar seu novíssimo e tecnológico forno ultrapassou e muito os limites do mero dissabor cotidiano. Aos fornecedores cabe indenizá-la de sorte a compensar pela angústia sofrida a cada insucesso das oito tentativas de conserto. A verba serve igualmente ao fim de suscitar aos fornecedores o aprimoramento da qualidade dos produtos que fabricam e vendem e, sobretudo, o respeito às queixas de seus consumidores e a solução gratuita e breve dos problemas por eles indicados.

Exagerada, entretanto, a pretensão pecuniária deduzida pela autora na inicial, superando em mais de cem vezes o valor do próprio produto. Arbitro, pois, por suficiente a confortar a autora e despertar a atenção das rés aos direitos de seus consumidores o valor de R$ 10 mil, corrigido monetariamente pelo IGPM e acrescido de juros de 1% ao mês a contar da prolação da sentença, porquanto ocasião em que fixada a verba.

DIANTE DO EXPOSTO, resolvendo o mérito do feito, forte no art. 269, I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE esta ação ordinária, para condenar os réus a solidariamente, pagar a autora:

a) o valor pago pelo fogão, R$ 2.402.50, corrigido pelo IGPM desde o desembolso e acrescido de juros de 1% ao mês a contar da citação;

b) o valor desembolsado com consertos, R$ 168,00, também corrigidos desde o desembolso e acrescidos de juros de mora e 1% ao mês a contar da citação;

c) a titulo de indenização por dano moral, o valor de R$ 10 mil, corrigido monetariamente pelo IGPM e acrescido de juros de 1% ao mês a contar da prolação da sentença.

Dada a sucumbência mínima da autora, somente no tocante ao arbitramento dos danos morais, condeno as rés a arcarem com as custas processuais e com honorários advocatícios ao advogado da parte autora, que fixo em 10% do valor da condenação, forte no art. 20, § 3º., do Código de Processo Civil.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Porto Alegre, 28 de junho de 2010.


Fabiana dos Santos Kaspary,
Juíza de Direito




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