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segunda-feira, 26 de julho de 2010

JURID - Horas extras. Motorista de caminhão. Atividade externa. [26/07/10] - Jurisprudência


Horas extras. Motorista de caminhão. Atividade externa compatível com controle da jornada de trabalho.

Tribunal Regional do Trabalho - TRT4ªR

(TRT 4ª R.; RO 01659-2007-281-04-00-7; Quinta Turma; Relª Desª Denise Pacheco; Julg. 13/05/2010; DEJTRS 23/07/2010; Pág. 88)

EMENTA: Horas extras. Motorista de caminhão. Atividade externa compatível com controle da jornada de trabalho. Para a incidência da hipótese de exceção prevista no artigo 62, inciso I, da CLT, imperiosa é a caracterização da incompatibilidade da atividade externa com a efetivação do controle de horário.

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara do Trabalho de Esteio, sendo recorrentes VOLMIR DO ROSÁRIO E CENTRAL DISTRIBUIÇÃO DE ALIMENTOS LTDA. E OUTRO(S) e recorridos OS MESMOS.

Inconformadas com a sentença proferida pela juíza Lígia Maria Belmonte Klein (fls. 516/533), dela recorrem ambas as partes.

A reclamada, em seu recurso das fls. 536/546, busca a reforma do julgado de origem para ver-se absolvida da condenação ao pagamento de horas extras, adicional noturno, adicional de periculosidade e honorários periciais. Insurge-se, ainda, contra o valor arbitrado à condenação.

O reclamante, em seu apelo das fls. 552/559, pretende a alteração da sentença quanto à média das horas extras arbitradas, caracterização do adicional de periculosidade, quilômetro rodado e descontos indevidos a título de uniforme.

Com as contrarrazões oferecidas pelo reclamante, sobem os autos ao Tribunal.

É o relatório.

ISTO POSTO:

I - Recursos das partes (matéria comum)

1. Horas extras. Adicional noturno. Jornada de trabalho arbitrada. Motorista de caminhão. O juízo de origem não acolheu a alegação defensiva de enquadramento do reclamante na regra de exceção do artigo 62, I, da CLT, assim decidindo:

"A teor do disposto no artigo 62, inciso I, da CLT, não basta o exercício de atividade externa para que o empregado fique isento de controle de horário, sendo necessário que tal atividade seja incompatível com o controle da jornada. No caso dos autos, a preposta da reclamada reconhece o pagamento de horas extras mediante informação prestada pelo autor. Ora, se a empresa deposita tamanha confiança em seus empregados, a ponto de realizar pagamento por jornada extraordinária na base da pura fidúcia, nada obsta que mantenha registros de acordo com a jornada informada pelo trabalhador, o que torna evidente inexistir a incompatibilidade exigida no dispositivo legal referido. Nesse caso, prevalece a jornada descrita na petição inicial, com as limitações trazidas na prova oral, a seguir apontadas" (fls. 523/524 - grifei).

Nesse rumo, a Magistrada arbitrou a jornada de trabalho do autor como sendo "das 18 horas às 10h30min (do dia seguinte), em seis dias por semana, sempre com 1h30min no total de intervalo para repouso e alimentação, totalizando 46 horas extras semanais, ou 207 horas extras mensais (7 horas extras diárias em 5 dias por semana = 35 horas extras + 11 horas extras em um dia da semana = 46 horas extras semanais X 4,5 semanas = 207 horas extras mensais)" (fl. 524). Condenou a reclamada ao pagamento de horas extras e diferenças de adicional noturno, observada a hora reduzida noturna, com reflexos salariais. Entendeu que os feriados trabalhados já se encontram englobados na jornada arbitrada.

Inconformadas, as partes recorrem da decisão.

A reclamada sustenta que era inviável o controle da jornada de trabalho do reclamante, pois não mantinha postos de fiscalização no percurso, conforme restou demonstrado na prova oral produzida. Defende o enquadramento do obreiro na regra de exceção legal do artigo 62, I, da CLT. Sucessivamente, preconiza a redução da jornada de trabalho arbitrada, alegando ser humanamente impossível a prestação de serviços nos moldes fixados na sentença, conforme se extrai do depoimento pessoal do autor e da prova testemunhal. Diz que, no máximo, poderia ser arbitrada uma média de 12 horas diárias trabalhadas.

O reclamante, por sua vez, não se conforma com a jornada de trabalho arbitrada na origem. Defende o arbitramento em 20 horas de efetivo trabalho diário, com duas noites de folga na semana, conforme demonstrado pela prova testemunhal e documentos que instruíram a petição inicial. Diz que dos dias trabalhados devem ser descontadas apenas as horas de sono, que se restringiam a 2 ou 3 horas por noite, bem como o período destinado a almoço e janta. Destaca que os feriados eram trabalhados, sem folga compensatória.

Examino.

Em que pese ser incontroverso que o autor realizava trabalho externo, tal fato, por si só, não o enquadra na situação prevista no artigo 62, I, da CLT. Imprescindível que as atividades exercidas sejam incompatíveis com o controle da duração da efetiva jornada.

Nesse aspecto, importante ressaltar que o preposto da reclamada confessou em seu depoimento o pagamento de horas extras ao reclamante, fato este que vai de encontro à tese patronal relativa ao seu enquadramento na regra de exceção do artigo 62 da CLT.

Além disso, a prova documental juntada com a petição inicial, nas fls. 21/39, revela a possibilidade de controle da jornada de trabalho do reclamante, tratando-se de "Relação de Débitos de Fretes", com o registro do horário de saída e retorno do caminhão na CD (Central de Distribuição), bem como as chegadas e saídas nas lojas e docas. Verifico que tais relações trazem variações, entre a saída e o retorno na Central de Distribuição, em torno de 23h, 21h30min, 21h, 23h30min, 19h, 20h, 22h, 19h, 24h, 23h, 23h, 19h, 13h, 25h, 26h30min, 28h, 26h30min, 26h e 23h, o que resulta em uma média de 22h30min, abrangendo períodos entre outubro de 2005 e junho de 2007 (o período contratual é de 24.05.1994 a 14.01.2008, com prescrição pronunciada na origem em relação às parcelas exigíveis anteriormente a 20.08.2003). Em tais documentos, entretanto, não constam os períodos de descanso do autor, o que poderia ser feito, tranquilamente, com base no disposto no § 3o do artigo 74 da CLT ("Se o trabalho for executado fora do estabelecimento, o horário dos empregados constará, explicitamente, de ficha ou papeleta em seu poder, sem prejuízo do que dispõe o § 1º deste artigo"; grifei).

Além da prova documental produzida pelo reclamante, a própria reclamada juntou, na audiência de instrução (ata das fls. 470/474), planilhas de horário que deram origem aos registros de ponto do autor, a partir de setembro de 2007, nas fls. 475/493, evidenciando a possibilidade de controle da jornada de trabalho. Tais planilhas indicam o horário de saída para a viagem, intervalo, chegada no destino, horário da saída para o retorno, intervalo, e horário de chegada. Todavia, os registros foram impugnados pelo reclamante, por não retratarem toda a jornada laborada, sob a alegação de que "iniciou antes e terminou depois do horário consignado nos referidos documentos. Devem ser totalmente desconsiderados, por não conterem a real jornada de trabalho" (fl. 470 - grifei).

Desse modo, diante da extensa prova oral produzida nos autos, constituída do depoimento pessoal das partes e de duas testemunhas (fls. 470/474), bem como da prova emprestada das fls. 494/499, referente aos processos nos 00275-2008-281-04-00-8 (testemunha Ronaldo Hereth, do reclamante) e 01659-2007-281-04-00-7 (testemunha Teobaldo Darci Hesper, da reclamada), verifico que as planilhas de horário mostram-se idôneas para retratar apenas os intervalos intrajornada e interjornadas. Fixo, assim, a fruição de intervalos interjornadas (períodos de sono entre as viagens), em média, por 4 horas e 30 minutos e os intervalos intrajornada, em média, por 1 hora e 45 minutos.

Por oportuno, transcrevo os seguintes trechos da prova oral produzida nos autos, bem como excertos da prova emprestada:

- depoimento pessoal do reclamante: "o depoente sempre foi motorista de viagens longas, viajando para a fronteira (Uruguaiana, Livramento, Missões); que normalmente o depoente saía da reclamada às 18h de um dia e retornava no dia seguinte, em torno das 20h; o depoente normalmente iniciava às 18h do domingo; que retornava em torno das 18 e 20 horas, descarregava o que sobrava, carregava de novo o caminhão e saía em viagem, em torno das 23 ou 24 horas, e voltava no dia seguinte, em torno das 17 horas; que fazia duas viagens seguidas; que ia de noite para casa, dormia uma noite, na terça, e voltava para trabalhar na quarta-feira, às 18 horas, fazia de novo duas viagens e retornava na sexta-feira, em torno das 18 ou 20 horas; então ou fazia a quinta viagem ou iria para casa e fazia outra viagem extra no sábado, pois sempre fazia cinco viagens na semana; se fizesse a quinta viagem sexta, chegava sábado; se não fizesse, viajava sábado, retornando às 21 ou 22 horas; domingo trabalhava a partir das 18 horas" (fls. 470/471);

- depoimento pessoal da preposta da reclamada: "em vista do recibo da fl. 218, a depoente esclarece que horas extras e adicional noturno eram pagos com base na informação do próprio funcionário, com base na confiança, porque não era possível controlar; era combinado com o funcionário que ele informasse o horário praticado e assim era paga a hora extra e o adicional noturno" (fl. 471);

- depoimento da testemunha do reclamante: "o depoente, em vista do documento da fl. 21, diz que registrava o horário de saída e depois os encarregados, na volta, preenchiam o horário de chegada; nos últimos 2 meses na empresa o depoente preencheu planilhas como as juntadas pela reclamada nesta audiência; que nestas planilhas tinha todo o horário de trabalho do depoente; (...) o depoente tinha que se apresentar para trabalhar domingo às 18h, chegando na empresa, no dia seguinte, às 16 ou 17 horas; descarregava, carregava e saía de novo, retornando na terça às 19 ou 20 horas mais ou menos; às vezes dormia terça de noite em casa ou saía de novo em viagem; o depoente dormia uma vez ou duas, no máximo, por semana, em casa; fazia 5 viagens por semana; o depoente almoçava de 30 minutos a 1h10min, no máximo; a janta era lanche, de 15 a 20 minutos" (fl. 472 - grifei);

- depoimento da testemunha da reclamada: "o depoente trabalha para as reclamadas desde 94, como motorista carreteiro; que as viagens do depoente têm saída num dia e retorno no outro; o depoente, normalmente, faz três viagens por semana; que o reclamante fazia mais ou menos o mesmo que o depoente, mas houve uma época, acha que até 2007, pediam para fazer mais uma; até 2007 faziam de 3 a 4 viagens, o mesmo com o reclamante; se fosse necessário, a empresa ligaria para o celular do motorista; o depoente acha que o rastreamento por viva-voz foi até por agosto ou setembro/2007 e depois passou para satélite; o depoente sai domingo, em torno das 18 ou 20 horas, retorna segunda, entre as 17 e as 19 horas, e dorme em casa segunda; terça, se a viagem for longa, sai das 18 às 20 horas; se a viagem for curta, pega às 22h, volta quarta, entre 17 e 19 horas e dorme em casa; quinta se apresenta da mesma forma e retorna sexta de tardezinha e dorme em casa; como o depoente folga sábado, começa a trabalhar domingo; o depoente não lembra se a semana do reclamante começava no domingo ou na segunda; o depoente recebe horas extras desde setembro ou outubro de 2007, quando começou o controle de horário (...) que o almoço do depoente é de 1 hora; quando é carga seca, durante a noite se dorme no caminhão; se o depoente chegasse às 4h, dormiria até as 6 ou 7 horas, que é o horário de descarregar; sendo carga seca, se não tem sono, segue em viagem; senão, para e dorme" (fl. 473);

- prova emprestada, depoimento da testemunha Ronaldo Hereth, do reclamante: "que o depoente trabalhava 5 dias na semana; que tinha uma folga semanal, na quarta ou na quinta-feira; que nas viagens longas não dormia durante a noite, dormindo apenas na volta, de 2 a 3 horas; (...) que havia um documento onde era preenchido, manualmente, o horário de saída para a viagem, de chegada e saída das lojas, e o retorno no estabelecimento em Porto Alegre; que o horário de saída para as viagens era preenchido pelo motorista e os demais horários eram consignados no documento pela loja ou pelo estabelecimento em Porto Alegre; que o reclamante tinha uma folga semanal, na terça ou na quarta-feira, e fazia 5 viagens por semana; que os horários das viagens dos motoristas eram variados; que no sábado à noite, até o domingo às 18h, não havia viagem para o depoente e o reclamante; (...) que o domingo era o primeiro dia de viagem dos motoristas na semana; que tanto o depoente quanto o reclamante iniciavam a viagem às 18h de domingo e retornavam para a empresa entre 16 e 18h do dia seguinte, momento em que já iniciavam outra viagem; que tal situação ocorria entre domingo até a quarta-feira, reiniciando às 18h de quinta-feira, até as 16 ou 17h do sábado; que os motoristas trabalhavam normalmente aos feriados; que não havia folga compensatória pelos feriados trabalhados; que o depoente fazia de 1h a 1h30min de intervalo diariamente e o reclamante em torno de 1h" (fl. 495);

- prova emprestada, depoimento da testemunha Teobaldo Darci Hesper, da reclamada: "que o horário de pico de chegada dos caminhões é das 15h30min até as 19h" (fls. 498/499).

Na instrução e julgamento do processo, o juiz deve atender ao princípio da busca da verdade real, valorizando os meios probatórios mais aptos a retratarem a realidade objeto da controvérsia instaurada nos autos.

Neste contexto, com base em todos os elementos probatórios dos autos, arbitro a jornada de trabalho do reclamante como sendo:

- saída às 18h do domingo e retorno às 18h do dia seguinte, segunda-feira;

- saída às 23h de segunda-feira e retorno às 17h do dia seguinte, terça-feira; (dormia em casa na terça-feira);

- saída às 18h de quarta-feira e retorno às 18h do dia seguinte, quinta-feira;

- saída às 23h de quinta-feira e retorno às 17h do dia seguinte, sexta-feira.

Conforme já fixado, a fruição de intervalos interjornadas ocorria, em média, por 4 horas e 30 minutos durante as viagens e os intervalos intrajornada, em média, por 1 hora e 45 minutos, em cada viagem.

Por tais razões, dou provimento parcial ao recurso da reclamada, para alterar a jornada de trabalho do reclamante arbitrada na origem, nos termos da presente fundamentação, mantidos os demais aspectos da condenação (reflexos das horas extras, diferenças de adicional noturno, incluída a prorrogação da jornada noturna, hora reduzida noturna e reflexos de adicional noturno), autorizada a dedução de valores pagos sob mesmo título. Por outro lado, dou provimento parcial ao recurso do reclamante, para considerar trabalhados os feriados que recaíram na jornada arbitrada, que deverão ser remunerados com a dobra legal, pois inexistente folga compensatória, conforme se extrai da prova dos autos.

2. Adicional de periculosidade. Caracterização. Com base no Anexo 2 da NR 16 da Portaria 3.214/78, o juízo de origem enquadrou as atividades do reclamante como perigosas, pelo ingresso em área de risco durante o abastecimento do caminhão, condenando a reclamada ao pagamento de adicional de periculosidade, com reflexos. Entendeu não caracterizada a periculosidade em relação à existência de tanque suplementar irregular, alegada pelo reclamante.

As partes não se conformam com a decisão.

Sustenta a reclamada que o ingresso do reclamante na área de risco se dava de modo eventual e por diminuto lapso temporal, não se enquadrando no conceito legal do artigo 193 da CLT, que prevê o ingresso permanente. Sucessivamente', pleiteia a exclusão dos reflexos do adicional de periculosidade em horas extras. Requer, por fim, a reversão da condenação em honorários periciais.

O reclamante, por sua vez, pretende o reconhecimento de periculosidade também pela adaptação de tanque suplementar, pela reclamada, ao caminhão por ele dirigido, pois não houve a produção de prova referente à autorização do DETRAN e INMETRO para confirmar a segurança do dispositivo.

Sem razão as partes.

Como bem mencionado pela julgadora de origem, o depoimento da testemunha Teobaldo Darcy Hesper, colhido no processo 01659-2007-281-04-00-7, juntado como prova emprestada, mediante convenção das partes, demonstra o ingresso habitual do reclamante em área de risco de inflamáveis, conforme o seguinte trecho: "que uma carreta tem tanque de 600 litros de diesel, mais uns 80 litros de diesel no baú; que cada abastecimento é de 400 ou 500 litros, porque já tem um pouco; que o abastecimento leva de 10 a 15 minutos; que a bomba é de 50 litros por minuto; que quando o frentista está abastecendo, o motorista fica na cabine do caminhão; que tem plaquinhas indicando essa regra desde 2002; que o próprio frentista orienta o motorista para cumprir o que está na plaquinha; que uma bomba dista da outra uns 10 ou 12 metros; que a bomba é automática, no momento em que o diesel encostar no bico da bomba, ela se desliga; que chega a ter até 5 caminhões na fila para abastecer" (fl. 498 - grifei).

Uma vez comprovado o ingresso do reclamante na área de risco, sempre no retorno das viagens, em torno de 15 minutos (conforme declarações da reclamada na inspeção pericial, fl. 368), e uma vez comprovado que a permanência do motorista na cabine do caminhão durante o abastecimento decorria de imposição patronal, tenho por preenchido o suporte fático do artigo 193 da CLT, nos termos do laudo pericial das fls. 367/371. Aplicável, portanto, o entendimento contido na Súmula 364, I, do TST:

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EXPOSIÇÃO EVENTUAL, PERMANENTE E INTERMITENTE. I - Faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido.

Diante da didática exposição do Relator, Ministro Ives Gandra Martins Filho, a respeito da matéria, transcrevo o seguinte aresto jurisprudencial:

"EMENTA: PERICULOSIDADE - CONTATO - EVENTUAL, INTERMITENTE OU PERMANENTE - QUANDO HÁ DIREITO AO ADICIONAL. Necessária se faz, para efeito de enquadramento da situação do empregado na norma concessiva do direito ao adicional de periculosidade, distinguir três hipóteses: a) contato eventual - aquele que pode se dar, ou não, pois o ingresso do empregado na área de risco não tem previsão de ocorrer, sendo esporádico; b) contato intermitente - aquele que é previsto, mas não contínuo, pois se dá pelas constantes entradas e saídas do empregado na área de risco, onde não permanece todo o tempo em que labora; e c) contato permanente - aquele em que o empregado trabalha o tempo todo na área de risco, continuamente exposto aos agentes perigosos. A equiparação do contato intermitente com o permanente se justifica pelo fato de que, no último caso, apenas aumenta a probabilidade do empregado ser afetado por eventual sinistro, mas como este não tem hora para ocorrer, pode atingir também aquele que, necessariamente, deve fazer suas incursões periódicas na área de risco. Já no caso do contato eventual, o próprio § 3º do art. 2º do Decreto nº 93.412/86 descarta a possibilidade de percepção do adicional, pois a eventualidade é situação a que qualquer ser humano está sujeito em qualquer atividade. Revista conhecida e não provida" (RR 414405/98, 4ª Turma, publ. 04.04.2001 - grifei).

Em relação à caracterização da periculosidade pela existência de tanque suplementar adaptado pela empresa-ré ao caminhão, não prospera o apelo do autor. O perito engenheiro, em seu bem lançado laudo, afirma que o tanque suplementar foi legalizado pelos órgãos oficiais, INMETRO e DETRAN (fl. 369/verso). Na impugnação à prova técnica, o reclamante formulou quesitos complementares (fls. 414/415), requerendo o retorno dos autos ao perito para esclarecimentos. Todavia, tal medida não foi adotada pelo juízo de origem, como se vê no despacho da fl. 459, sem que a parte reiterasse o requerimento na audiência de instrução (ata das fls. 470/474), pelo que concluo que houve desistência. Assim, considerando que o perito nomeado é de confiança do juízo, tenho por verazes as suas declarações constantes do laudo, não havendo prova em sentido contrário nos autos capaz de infirmá-las.

Quanto à negativa de repercussão do adicional de periculosidade na remuneração das horas extras, razão não assiste à reclamada. Com efeito, o adicional de periculosidade possui natureza salarial, pois é a contraprestação de trabalho sob condição adversa, no caso, perigosa. Desta sorte, compõe a base de cálculo das horas extras, consoante orientação consagrada na Súmula nº 264 do TST.

Mantida a sucumbência da reclamada na pretensão objeto da perícia, igualmente é mantida sua responsabilidade pelos honorários periciais.

Desse modo, nego provimento aos apelos.

II - Recurso do reclamante (itens remanescentes)

1. Quilômetro rodado. Pagamento sob a denominação de horas extras. Natureza salarial. Na petição inicial o reclamante sustentou que desde o ano de 1999 passou a perceber verba de natureza salarial, por estar vinculada à produção, genericamente chamada de 'quilômetro rodado', sendo que a reclamada sempre efetuou o seu pagamento de forma mascarada, usando diversas denominações diferentes e/ou efetuando o pagamento 'por fora'. Afirmou, ainda, que em janeiro/2003 tal verba passou a ser paga sob a rubrica 'horas extras'. Por todo o exposto, o autor postulou fosse declarada a natureza salarial dessa verba (com integrações), bem como a nulidade da alteração na forma de pagamento, além de diferenças em razão da alegada diminuição/supressão dos valores pagos (itens 'm', 'n', 'o' e 'p' da petição inicial).

Julgados improcedentes tais pedidos, insurge-se o reclamante alegando que a tese da defesa ampara seu pleito, bem como a prova oral produzida, pois reconhece que até 2007 não havia controle de horário. Destaca que: "causa estranheza o pagamento de horas extras, em valores variáveis, enquanto a reclamada alega a inexistência de controle de horário, o que confere efetivamente credibilidade à tese do autor de que a quantia tivesse referência com os quilômetros rodados" (fl. 557).

Sem razão.

Os contracheques juntados aos autos nas fls. 198/257, referentes ao período imprescrito (de 20.08.2003 a 14.01.2008), indicam, tão somente, o pagamento de horas extras, nada se referindo ao "quilômetro rodado". Ao contrário das alegações recursais lançadas pelo reclamante, verifico que a tese defensiva, examinada nos itens precedentes, diz respeito ao pagamento de horas extras com base nas informações obtidas junto aos motoristas, razão pela qual não haveria "estranheza" no pagamento de valores variáveis a título de jornada suplementar. Desse modo, não prospera o apelo, uma vez não demonstrada a alegada supressão, bem como não descaracterizado o pagamento efetuado a título de horas extras, ônus que incumbia ao reclamante.

A prova documental é tida pela legislação trabalhista como a prova por excelência dos pagamentos efetuados ao empregado, nos termos do artigo 464 da CLT, impondo-se, para a sua desconstituição como meio probatório, prova cabal e robusta em sentido contrário, o que não considero existente no conjunto probatório deste feito. Note-se, por exemplo, que o depoimento da testemunha apontada no apelo, Ronaldo Hereth (fl. 496), é impreciso quanto ao período da alegada supressão, afirmando ter ocorrido em 2005.

Nego provimento.

2. Descontos indevidos a título de uniforme. O reclamante não se conforma com o indeferimento dos pedidos q, r e s, referentes a descontos salariais indevidos. Admite que efetivamente recebia adiantamento quinzenal, que era descontado sob a rubrica "adiant quinzenal", mas que os demais descontos, a título de "vale após adian quin" são indevidos. Diz que a prova testemunhal inclusive comprova descontos irregulares a título de "uniforme".

Com razão parcial.

Como bem lançado na sentença de origem, os contracheques do autor (fls. 198/257) não revelam qualquer desconto a título de "uniforme" (pedido "q do petitório da fl. 15), razão pela qual o julgado mostra-se irreparável, no aspecto. Note-se que a prova testemunhal apontada no apelo (depoimento da testemunha Ronaldo Hereth, fls. 495/496) refere "que os uniformes não eram fornecidos de forma gratuita; que o desconto relativo ao uniforme aparecia no contracheque sob a rubrica 'adiantamento p'; que os motoristas utilizavam, em média, 4 uniformes por ano" (grifei). Todavia, não há descontos sob a rubrica "adiantamento p" nos recibos salariais do autor.

Em relação aos pedidos r e s, referentes aos descontos "adiant quinzenal" e "vale após adian quin", o autor admite o recebimento, exclusivamente, do adiantamento quinzenal. Em sua contestação, nas fls. 76/77, a reclamada sustenta que os descontos a título de "vale após adian quin" referem-se aos descontos pelo fornecimento de cesta básica ao reclamante, mediante regular inscrição junto ao Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT. Tal alegação, todavia, encontra-se em flagrante disparidade às normas e princípios de proteção ao salário. Determina o artigo 462 da CLT que "ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo". Na hipótese em exame, o desconto alegadamente praticado a título de "cesta básica", mas identificado como "vale após adian quin", encontra vedação no ordenamento jurídico, por tratar-se de lançamento complessivo, estando a matéria sedimentada na Súmula 91 do TST: "SALÁRIO COMPLESSIVO. Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador". Considerando a vedação genérica da lei aos descontos salariais, para a sua regularidade é imprescindível a correta identificação do fato gerador da dedução, não se admitindo a atribuição de valores a rubricas diversas, a bel prazer das teses defensivas dos empregadores quando questionados em juízo.

Por tais razões, dou provimento parcial ao recurso do reclamante, para condenar a reclamada a restituir os valores descontados nos contracheques e termo de rescisão do contrato de trabalho do empregado a título de "vale após adian quin".

III - Recurso da reclamada (item remanescente)

1. Valor arbitrado à condenação. Insurge-se a reclamada contra o arbitramento da condenação em R$ 150.000,00, "por demasiado, excessivo e oneroso" (fl. 546).

Analiso.

O valor arbitrado em sentença à condenação é fixado tão somente para efeito de cálculo das custas processuais, não guardando correlação direta com o valor do crédito do reclamante, o qual será calculado definitivamente em liquidação de sentença.

Nesse contexto, ressalto que a redução ora proposta do valor arbitrado à condenação não decorre de eventual necessidade de reforma da decisão recorrida, mas sim de sua adequação ao montante das verbas deferidas na origem e reconhecidas no presente julgamento, bem como o período contratual e a incidência de juros e correção monetária.

Por conseguinte, reduzo para R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) o valor arbitrado à condenação, para os fins legais.

Ante o exposto,

ACORDAM os Magistrados integrantes da 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA RECLAMADA, para alterar a jornada de trabalho do reclamante arbitrada na origem, nos termos da fundamentação, mantidos os demais aspectos da condenação (reflexos das horas extras, diferenças de adicional noturno, incluída a prorrogação da jornada noturna, hora reduzida noturna e reflexos de adicional noturno), autorizada a dedução de valores pagos sob mesmo título. Por maioria, vencido parcialmente o Presidente, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO RECLAMANTE, para considerar trabalhados os feriados que recaíram na jornada arbitrada, que deverão ser remunerados com a dobra legal; e para condenar a reclamada a restituir os valores descontados nos contracheques e termo de rescisão do contrato de trabalho do empregado a título de "vale após adian quin". Valor da condenação que se reduz para R$ 60.000,00, para efeitos legais.

Intimem-se.

Porto Alegre, 13 de maio de 2010 (quinta-feira).

Desembargadora DENISE PACHECO
Relatora




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