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segunda-feira, 12 de julho de 2010

JURID - Crime contra as relações de consumo. Condenação. [12/07/10] - Jurisprudência


Recurso de apelação criminal. Crime contra as relações de consumo. Condenação. Irresignação defensiva.
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Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 128832/2009 - CLASSE CNJ - 417 - COMARCA CAPITAL

APELANTE: JOSÉ LUIZ DEMENEGHI

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

Número do Protocolo: 128832/2009

Data de Julgamento: 23-6-2010

EMENTA

RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - CONDENAÇÃO - IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA - FRAGILIDADE DO CONTEÚDO PROBATÓRIO - IMPROCEDÊNCIA - EXISTÊNCIA MATERIAL DO CRIME DEVIDAMENTE CONFIRMADA PELO CONJUNTO PROBANTE EXISTENTE NOS AUTOS - CRIME FORMAL - DESNECESSIDADE DA OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO AO CONSUMIDOR - AUTORIA DELITIVA CONFESSADA PELO RECORRENTE - DECISÃO ESCORREITA - RECURSO DESPROVIDO.

Incabível o acolhimento do pleito de absolvição, quando o conjunto probatório é suficiente para comprovar a materialidade e a autoria delitiva do crime contra as relações de consumo previsto no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90, cabendo ressaltar que, para a consumação do delito, é dispensável a ocorrência de prejuízo ao consumidor, porquanto se trata de crime formal, que se aperfeiçoa com a simples indução do consumidor a erro, com a afirmação falsa a respeito da procedência ou qualidade do produto ou serviço.

RELATÓRIO

EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por José Luiz Demeneghi contra a sentença proferida pelo ilustre Juiz de Direito da 13ª Vara Criminal da Comarca da Capital - Especializada contra o Crime Organizado, Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica e Crimes contra a Administração Pública, que, nos autos da ação penal registrada sob n. 289/2008, condenou-o pela prática, em tese, do crime contra as relações de consumo, previsto no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90 (induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária), à pena de 2 (dois) anos de detenção, em regime inicialmente aberto, cabendo ressaltar que a pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos, consistente no pagamento de uma cesta básica, mensalmente, no valor de R$100,00 (cem reais), por igual período.

Inconformada, a defesa do apelante recorreu a esta instância revisora, forte nas razões recursais de fls. 243/250, pugnando pela sua absolvição, alegando, em abono de sua tese, que o estabelecimento comercial de sua propriedade revende produtos derivados de petróleo, os quais são comercializados por distribuidores de combustíveis, não havendo diferença de qualidade, de forma que, no seu entender, a omissão da origem de tais produtos não é capaz de levar o consumidor a erro.

Aduz, ainda, o autor da peça irresignativa, que não obstante ostente a marca Esso na fachada de seu posto revendedor, havia indicação expressa na bomba de combustível sobre a origem do produto comercializado, acrescentando que passou a vender combustíveis de outras marcas em virtude das dificuldades encontradas junto à distribuidora, que retirou desta Capital a sua base de fornecimento, ressaltando que esse é um dos motivos pelos quais o apelante ajuizou ação de rescisão contratual contra a mencionada empresa.

Assevera, igualmente, o recorrente, que deve ser aplicado ao presente caso o consagrado princípio da insignificância ou bagatela, pois afirma que a denúncia só retratou duas ocasiões em que o posto revendedor adquiriu produtos de outras distribuidoras, devendo, dessa forma, ser aplicado o mencionado princípio para absolver o réu das acusações atribuídas na denúncia.

Nas contrarrazões de fls. 254/263, o parquet rebate as argumentações defensivas, sustentando que a autoria e materialidade do crime contra as relações de consumo foram comprovadas pelo conjunto probatório colacionado aos autos, principalmente pela confissão do insurgente no processo administrativo.

Sustenta, também, o órgão ministerial, que o princípio da insignificância ou bagatela não deve ser aplicado ao caso vertente, porquanto o delito descrito no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90 é classificado como formal e de perigo, circunstância que impede a incidência do referido princípio, pois a consumação desse crime independe da ocorrência de prejuízo ao consumidor ou do fato de ele ter sido induzido ao erro. Com base nessas ponderações, o recorrido pugna pelo desprovimento do presente recurso, para manter a condenação do apelante nos termos da decisão ora objurgada.

Nesta instância revisora, o douto Procurador de Justiça Mauro Viveiros, no parecer de fls. 272/275, opinou pelo não provimento desta insurgência, asseverando que a conduta delitiva restou devidamente demonstrada pelas provas dos autos, das quais se extrai que ele agiu de maneira consciente e voluntária ao induzir os consumidores a erro, visando à obtenção de lucro.

É o relatório.

À douta revisão.

PARECER (ORAL)

O SR. DR. BENEDITO XAVIER DE SOUZA CORBELINO

Ratifico o parecer escrito.

VOTO

EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Consoante relatado, a defesa requer a reforma da sentença prolatada pelo culto Juiz de Direito da 13ª Vara Criminal da Comarca da Capital, nos autos da ação penal registrada sob n. 289/2008, que condenou José Luiz Demeneghi à pena de 2 (dois) anos de detenção, em regime inicialmente aberto, cabendo ressaltar que a pena privativa de liberdade foi substituída por uma restritiva de direitos, consistente no pagamento mensal de uma cesta básica no valor de R$100,00 (cem reais), por igual período, pelo suposto cometimento do crime contra as relações de consumo previsto no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90, almejando a absolvição do recorrente sob o argumento de que ele não praticou a conduta criminosa descrita na exordial acusatória.

Todavia, malgrado os argumentos lançados nas razões do apelo, a insurgência defensiva não merece prosperar, pois os elementos probatórios não revelam a necessidade de reforma da sentença invectivada, que se mostra escorreita e em conformidade com as provas produzidas neste processado.

Com efeito, consta do caderno processual que, nos dias 05 e 06 de abril de 2004, o apelante, na condição de proprietário e administrador do Posto de Revenda de Combustível Morado Auto Posto Ltda., localizado na Rua 03, s/n., Centro-Norte, Bairro Morada do Ouro, nesta Capital, induziu os consumidores, seu clientes, a erro, ao formular indicação e afirmação falsa sobre a origem da gasolina tipo C que revendia.

Colhe-se dos autos que o mencionado posto de abastecimento de combustível era, à época dos fatos, revendedor varejista de combustível da marca Esso, condição que demonstrava ostensivamente pela placa existente na entrada do seu estabelecimento comercial. Todavia, após diligências na sede do posto, o fiscal da ANP - Agência Nacional do Petróleo -, José Cláudio de O. Filho, constatou que o recorrente havia adquirido e revendia gasolina do tipo C de distribuidoras diversas daquela à qual estava vinculado (Aster Petróleo Ltda. e Petroluz Distribuidora Ltda.), motivo por que foi lavrado auto de infração contra sua pessoa.

Não obstante a defesa alegue que não se encontram no feito provas concretas capazes de demonstrar, efetivamente, a prática da conduta criminosa imputada a José Luiz Demeneghi na exordial acusatória, verifica-se, pelos elementos probantes colacionados ao presente caderno processual, que a existência material do crime e a sua autoria estão devidamente comprovadas.

Nessa linha de raciocínio, é mister deixar consignado que o art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90 estabelece que configura delito contra as relações de consumo a conduta de quem:

"induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária;".

Com relação à materialidade, cumpre ressaltar que, embora o delito acima referido se trate de crime formal, cuja consumação resulta da simples indução do consumidor a erro, fazendo-se, portanto, desnecessária a ocorrência de resultado, a sua existência material restou demonstrada pelo auto de infração de fls. 13/15 e pela cópia das fotografias acostadas à fl. 42. No que tange à autoria delitiva, observa-se dos autos que esta ficou comprovada pelas próprias declarações do recorrente, que, durante o processo administrativo e, também, em juízo, confessou que adquiriu combustíveis de distribuidoras diversas daquela à qual estava vinculado (Esso Brasileira de Petróleo Ltda.). Contudo, tenta justificar sua conduta alegando que só procedeu dessa forma diante das dificuldades impostas pela referida empresa, que mudou sua base de distribuição para a cidade de Campo Grande/MS e abriu, nesta Capital, postos de autoatendimento, que comercializavam combustíveis mais baratos, situação que alega ter inviabilizado a concorrência e obrigado o insurgente a comprar o produto de outras bandeiras para que pudesse manter o seu estoque, conforme se depreende do seu interrogatório constante no registro de áudio acostado à fl. 114.

Corroborando a assertiva acima consignada, é imperioso destacar trecho da defesa apresentada pelo apelante no processo administrativo, vazada nos seguintes termos:

"(...)

Ocorre, porém, que o Autuado em razão da disparidade de preços encontrada entre os produtos do Distribuidor Áster e Petroluz Ltda e da Distribuidora ESSO Brasileira de Petróleo - que pratica preços mais elevados em relação às primeiras distribuidoras ora mencionadas.

Na verdade, naquela ocasião o Autuado deixou de obedecer a norma da ANP para aplicar em seu benefício a Lei Maior que lhe garante o direito ao livre comércio, mais especificamente no seu artigo 170, inciso IX, Parágrafo Único que diz: (...) ". (Fl. 33).

Registre-se que, não obstante o apelante tenha invocado o direito ao livre comércio, não se pode olvidar que ele tinha outras maneiras de manter a sua prática comercial, sem infringir as normas do art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90, acima reproduzido.

Nesse contexto, cabe ressaltar que a vinculação a uma bandeira (no caso, a Esso) foi uma opção do apelante, que poderia ter escolhido operar com bandeira branca, situação que lhe possibilitaria comercializar produtos petrolíferos de qualquer marca. Assim, quando optou por se vincular a uma marca, o recorrente teve garantido o seu direito de livre comércio, de forma que o exercício da mencionada garantia constitucional não pode servir de justificativa para a prática de atos ilícitos, como o descrito na exordial acusatória.

Da mesma forma, a alegação de atipicidade da conduta do recorrente, sob o argumento de que os seus clientes não sofreram prejuízo, uma vez que eram informados da origem do produto que estavam adquirindo por meio de adesivos colados nas bombas de combustível, não merece prosperar, visto que a ocorrência de resultado (na hipótese versanda, o prejuízo) é irrelevante para a configuração do delito previsto no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90, porquanto, conforme já consignado, trata-se de crime formal, consumando-se com a simples indução do consumidor a erro com a afirmação falsa a respeito da procedência ou qualidade do produto ou serviço.

Nesse sentido, colaciona-se o julgado relatado pelo Desembargador Juvenal Pereira da Silva, em atuação junto à Primeira Câmara Criminal deste Sodalício, cuja ementa restou assim formatada:

"APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME CONTRA RELAÇÕES DE CONSUMO (ARTIGO 7º, VII DA LEI Nº 8.137/90) - ABSOLVIÇÃO - INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - ESTABELECIMENTO QUE COMERCIALIZAVA COMBUSTÍVEL QUE PROVINHA DE DISTRIBUIDORAS DIVERSAS DA MARCA OSTENTADA NAS BOMBAS MEDIDORAS - PROPAGANDA ENGANOSA - COMPROVAÇÃO DO EFETIVO ERRO OU PREJUÍZO DO CONSUMIDOR - DESNECESSIDADE - CRIME FORMAL - CONSUMAÇÃO QUE INDEPENDE DE RESULTADO - CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE - RECURSO PROVIDO. O tipo penal previsto no art. 7º, VII, da Lei nº 8.137/90 possui natureza formal, consumando-se independentemente do resultado, ou seja, independentemente de ter sido o consumidor efetivamente levado a erro, bastando a veiculação da propaganda enganosa." (TJMT - RAC n. 74044/2007 - Relator: Des. Juvenal Pereira da Silva - Primeira Câmara Criminal - Julgamento: 04-12-2007) (Destaquei).

Assim, do conjunto probatório existente nos autos é forçoso concluir que o apelante induziu os consumidores a erro ao ostentar, em seu estabelecimento mercantil, placa informando que o posto era revendedor dos produtos da marca Esso, quando, na verdade, fornecia combustível das Distribuidoras Áster e Petroluz, não havendo que se falar, portanto, em absolvição por atipicidade de sua conduta, pois, como bem asseverado pelo magistrado da instância de piso na sentença invectivada, "o convencimento do consumidor quanto à origem do combustível a ser adquirido foi formado ao ingressar no estabelecimento comercial a partir do totem existente em sua entrada e não pelo pequeno anúncio contido nas bombas". (Fl. 201).

No tocante à definição da conduta típica do crime contra as relações de consumo, é de bom alvitre destacar a lição doutrinária de Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, para quem:

"Induzir é incutir. Portanto, o sujeito ativo que incute, de forma dolosa, o sujeito passivo a erro, por meio de afirmações inverídicas quanto à procedência ou qualidade do produto ou serviço, utilizando-se de publicidade para tal fim, estará cometendo a conduta delituosa." (In Legislação criminal especial. (São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 852).

Dessarte, embora a defesa alegue a ausência de provas concretas para evidenciar a conduta, em tese, praticada pelo recorrente, a análise dos autos revela a improcedência das asserções deduzidas nesse sentido, uma vez que o acervo probatório demonstra a existência material do crime contra as relações de consumo previsto no art. 7º, inciso VII da Lei n. 8.137/90.

Não resta, pois, a menor dúvida de que, alicerçada na prova produzida durante a persecução penal, a autoria do crime descrito no libelo acusatório inaugural deve ser atribuída ao recorrente, como entendeu o douto magistrado de primeiro grau, estando, portanto, escorreito o édito condenatório reprochado.

Com base nas razões acima consignadas, em consonância com o parecer da ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, nego provimento ao presente apelo, mantendo inalterada a sentença reprochada, tal como foi redigida.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA (Relator), DR. ABEL BALBINO GUIMARÃES (Revisor convocado) e DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (Vogal convocado), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, EM SINTONIA COM O PARECER.

Cuiabá, 23 de junho de 2010.

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DESEMBARGADOR LUIZ FERREIRA DA SILVA - PRESIDENTE DA

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL EM SUBSTITUIÇÃO LEGAL E RELATOR

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PROCURADOR DE JUSTIÇA




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