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sexta-feira, 16 de julho de 2010

JURID - Constitucional. Mandado de segurança. Home care. [16/07/10] - Jurisprudência


Constitucional. Mandado de segurança. Assistência médica domiciliar do tipo home care.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN

Mandado de Segurança nº 2010.000544-1 - Natal

Impetrante: Odara Camila Sena Flora de Oliveira rep. p/ sua mãe Redivan Severina Sena de Oliveira

Advogado: Dr. Lupércio Luiz de Azevedo Segundo

Impetrado: Secretário da Saúde do Estado do Rio Grande do Norte

Ente Público: Estado do Rio Grande do Norte

Relator: Desembargador Armando da Costa Ferreira

Ementa: CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ASSISTÊNCIA MÉDICA DOMICILIAR DO TIPO HOME CARE. IMPETRANTE PORTADORA DA SÍNDROME LENNOX GAUSTAUT. GRAVÍSSIMO ESTADO DE SAÚDE. RECOMENDAÇÃO DE INTERNAÇÃO DOMICILIAR SOB PENA DE AGRAVAMENTO DA ENFERMIDADE. RISCO DE MORTE. GARANTIA CONSTITUCIONAL DO ACESSO UNIVERSAL AOS SERVIÇOS DE SAÚDE. DIREITO FUNDAMENTAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DEVER DO ESTADO. SEGURANÇA CONCEDIDA.

1. A assistência à saúde, direito constitucional do cidadão, é dever do Estado, devendo sua execução ser efetivada de forma universal e integral, abrangendo os tratamentos terapêuticos e farmacêuticos, em todos os seu níveis de complexidade, inclusive o atendimento do tipo home care.

2. A internação domiciliar tem a finalidade de oferecer tratamento mais eficiente, com menos riscos de infecções, além de proporcionar ao paciente em estado grave de saúde a proximidade com a familiar, privilegiando o princípio da dignidade da pessoa humana.

3. Não se pode negar o direito líquido e certo da impetrante à assistência médico domiciliar, conforme recomendação médica, máxime quando portadora da Síndrome de Lennox Gastaut, com comprometimento cognitivo e motor severo, atrofia muscular e hipertônica generalizada.

4. Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Decidem os Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Sessão Plenária, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da Douta Décima Quinta Procuradora de Justiça, em substituição à Décima Quarta Procuradoria de Justiça, confirmar a medida liminarmente deferida e conceder a segurança pleiteada para garantir à impetrante a assistência médica domiciliar, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Odara Camila Sena Flora de Oliveira rep. p/ sua mãe Redivan Severina Sena de Oliveira, por seu advogado, devidamente habilitado, impetrou Mandado de Segurança, com pleito liminar, em face do Secretário da Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Norte.

A impetrante alegou, em síntese, que:

a) é portadora de Síndrome de Lennox Gastau, com comprometimento cognitivo e motor severo, atrofia muscular e hipertônica generalizada, evoluindo em quadro de pneumonia aspirativa, além de parada cardiorespiratória revertida. Evolui vigil, não contactante, traqueostomizada, apresentando escara sacra;

b) seu internamento em quadro hospitalar não é adequado, haja vista se encontrar debilitada, correndo riscos de infecções hospitalares, o que torna necessário o tratamento intensivo domiciliar do tipo HOME CARE, consistindo em assistência ventilatória (M. De Venturi + Bipap), grastronomia, cuidados de enfermagem (curativos especiais na escara, aspiração traqueal freqüente, entre outras), fisioterapia motora e respiratória (02 vezes ao dia) e acompanhamento nutricional, além de continuar com nebulização durante 03 vezes ao dia;

c) necessário é o fornecimento de toda infra-estrutura para a instalação do tratamento, tais como, coma hospitalar, aparelho de BIPAP concentrador de oxigênio, colchão com capa impermeável, suporte para bomba e soro, suporte de profissionais de saúde;

d) recorreu a UNICAT para obter o referido tratamento domiciliar, não obtendo êxito, sob alegação de ausência de disponibilidade;

e) é dever do Estado garantir o fornecimento dos materiais necessários ao seu tratamento, conforme disposto nos arts. 6º, 30 e 196 da Carta Magna, arts. 8ª, 125, 126, 127 e 128 da Constituição Estadual e, ainda, nos arts. 2º, 3º e 6º da Lei nº 8.080/90.

Ao final, já em sede liminar, a impetrante pugnou pela concessão da segurança a fim de que lhe seja garantido atendimento domiciliar do tipo HOME CARE, com assistência ventilatória (m. de venturi + bipap, nutrição enteral), cuidados de enfermagem (curativos, aspiração traqueal freqüente), fisioterapia motora respiratória (02 vezes ao dia) e a acompanhamento nutricional, além de continuar com nebulização durante 03 vezes ao dia, além de outros procedimentos, medicamentos e aparelhos que, porventura, venha a ser solicitados pelo médico responsável.

Inicial indeferida por ausência de prova pré-constituída (fls. 22/24).

Em sede de agravo interno, verificado equívoco na juntada dos documentos não imputado à impetrante, retratando-se da decisão que indeferiu a inicial, foi deferido pleito liminar para garantir à impetrante a internação hospitalar do tipo "home care" (fls. 77/79).

Nos temos do art. 461, § 5º, do CPC, considerando o não cumprimento da medida liminarmente deferida, restou autorizada à impetrante contratar, às expensas do Estado e mediante pesquisa de mercado, a contratação de empresa especializada em atendimento do tipo "home care" (fls. 95/96).

Através da petição de fl. 111, a impetrante informou que a medida liminar foi cumprida espontaneamente pela autoridade impetrada.

Conforme certidão de fl. 94, apesar de notificada, a autoridade impetrada deixou de prestar informações.

Instada a se pronunciar (fls. 101/109), a Douta Décima Quinta Procuradora de Justiça, em substituição à Décima Quarta Procuradoria de Justiça, opinou pela concessão da segurança.

É o relatório.

Passo a proferir o meu voto.

VOTO

Conforme se infere da inicial, a impetrante pretende que o Estado lhe forneça atendimento médico domiciliar sob o argumento de que sua internação em hospital se apresenta inadequado ante os riscos de infecções hospitalares decorrentes do seu debilitado estado de saúde.

Nesse pórtico, pugna pela concessão de tratamento tipo home care, com toda estrutura necessária, incluindo cama hospitalar, aparelho de BIPAP concentrador de oxigênio, colchão com cama impermeável, suporte para bomba e soro, além da equipe que integra o tratamento médico domiciliar.

Nos termos do art. 6º da Constituição Federal, a saúde se insere dentro do elenco dos direitos sociais, juntamente com a educação, a segurança e outros.

Já o art. 196 da mesma Carta Magna dispõe que "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Em harmonia com a norma constitucional, o art. 6º da Lei nº 8.080/1990, prescreve que na atuação do Sistema Único de Saúde inclui-se a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica, a formulação da política de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos e outros insumos de interesse para a saúde e a participação na sua produção.

Os incisos I, II e IV do art. 7º da referida Lei nº 8.080/1990 rezam, respectivamente, que as ações do SUS serão realizadas em obediência aos princípios:

a) da "universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência";

b) da "integralidade de assistência entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema"; e

c) da "igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie".

No mesmo caminho palmilhou a Constituição Estadual, nos seus arts. 8º, 125 e 128.

Quanto à internação domiciliar, trata-se de subsistema incluso no sistema único de saúde, como novidade surgida através da Lei nº 10.424/2002, quando acrescentou o art. 19-I à Lei nº 8.080/1990, que regula as ações e serviços de saúde em todo o território nacional.

Infere-se do mencionado dispositivo legal que no atendimento e na internação domiciliar incluem-se os procedimentos médicos, de enfermagem, fisioterapêuticos, psicológicos e de assistência social, entre outros necessários ao cuidado integral dos pacientes em seu domicílio e que deverão ser realizados por equipes multidisciplinares que atuarão nos níveis da medicina preventiva, terapêutica e reabilitadora.

A internação domiciliar tem a finalidade de oferecer um tratamento mais eficiente, com menos riscos de infecções, além de proporcionar ao paciente em estado grave de saúde a proximidade com os entes familiares, privilegiando o princípio da dignidade da pessoa humana.

Sendo assim, não resta dúvida de que a assistência à saúde é dever do Estado, devendo sua execução se dá de forma universal e integral, abrangendo os tratamentos terapêuticos e farmacêuticos, em todos os seu níveis de complexidade, inclusive a assistência domiciliar quando, assim, recomendada.

No caso dos autos, conforme consta do laudo de fls. 74/75, a impetrante "é portadora da Síndrome de Lennox Gastaut, com comprometimento cognitivo e motor severo, com atrofia muscular e hipertônica generalizada, evoluindo com quadro de pneumonia aspirativa e parada cárdio respiratória revertida. Evolui vígil, não contactante, traqueostomizada, apresentando escara sacra. Pelo exposto, trata-se de uma paciente com quadro grave, inclusive com risco de morte."

Consta ainda do mencionado laudo que, considerada a gravidade do estado de saúde da impetrante, o internamento hospitalar não se mostra adequado, sob pena do aumento dos riscos de complicações, inclusive, o óbito.

Nesse pórtico, não há como deixar de enxergar o direito líquido e certo da impetrante, não havendo que se falar em lesão aos princípios da legalidade orçamentária e da reserva do possível, devendo prevalecer a garantia de acesso universal à saúde pública e aos serviços de saúde, sob pena de violação ao direito fundamental da dignidade da pessoa humana.

Nesse sentido, já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, in verbis:

"Ementa: PRELIMINAR - Ilegitimidade passiva - Inocorrência - A assistência integrai à saúde da população é obrigação solidária dos três entes federativos, isolada ou conjuntamente (Arts. 196 e 198, § Io, da CF) - Preliminar rejeitada. APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - Prestação de Serviço Público - Assistência 'Home Care' para menor impúbere, portador de "Doença de Pompe' e "Insuficiência Respiratória Crônica", internado há vários anos em unidade de terapia semi-intensiva - Única alternativa de alta hospitalar - Hipossuficiência para o custeio - Resistência do Poder Público - Inadmissibilidade - A assistência integral à saúde é dever do Estado - Imposição da Constituição Federal e Estadual e da Lei Federal n° 8.080/90 - Jurisprudência pacífica dos Tribunais - Reexame necessário e recurso voluntário da FESP improvidos." (Apelação nº 99406573098 (5188335100), 12ª Câmara de Direito Público, julgamento: 14/04/2010, Registro: 27/04/2010).

"Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA - Prestação de Serviço Público - Impetração visando compelir o Estado ao fornecimento do aparelho "BIPAP", com assistência "home care", necessitado por pessoa portadora de "Distrofia Muscular de Duchenne", doença caracterizada por degeneração muscular progressiva e generalizada, inclusive musculatura respiratória - Resistência do Poder Público - Inadmissibilidade - Obrigação de fornecimento do Estado - Incidência dos artigos 196 da Constituição Federal e 219 da Constituição Estadual - Jurisprudência dominante estabelece dever inarredável do Poder Público - Reexame necessário e apelo voluntário da Fazenda Estadual improvidos." (Apelação com Revisão 994071295998 (7354425000), 8ª Câmara de Direito Público, julgamento: 04/06/2008, Registro: 11/06/2008).

Na esteira do mesmo entendimento, são os precedentes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, in verbis:

"AGRAVO REGIMENTAL - MANDADO DE SEGURANÇA - LIMINAR PARA ASSEGURAR AO IMPETRANTE TRATAMENTO DOMICILIAR - ALEGAÇÃO DE QUE O PACIENTE VEM RECEBENDO TRATAMENTO AMBULATORIAL - NECESSIDADE DE ALTA HOSPITALAR - RECURSO IMPROVIDO.

I - O fato de o Impetrante encontrar-se em tratamento ambulatorial não retira o seu direito de obter o tratamento domiciliar, ainda mais se considerada a gravidade da doença que lhe acomete - doença intersticial pulmonar, que lhe acarreta tosse seca e dispnéia aos pequenos esforços, podendo progredir para sobrecarga cardíaca em câmaras direitas e posterior insuficiência cardíaca.

II - Ademais, sendo, o paciente, morador de Samambaia, é inconteste a longa distância que é obrigado a percorrer até chegar ao Hospital de Base, localizado na região central do Plano Piloto.

III - Outrossim, não me parece crível que o custo de uma internação seja menor que o fornecimento do aparelho que o Impetrante necessita para ter uma condição de vida razoável, ainda mais quando se sabe que o Distrito Federal carece de leitos tanto na rede pública como na rede particular." (20090020142133MSG, Relator LECIR MANOEL DA LUZ, Conselho Especial, julgado em 27/10/2009, DJ 18/11/2009 p. 27).

"SAÚDE PÚBLICA. ATENDIMENTO E INTERNAÇÃO NO DOMICÍLIO DA PACIENTE. DIGNIDADE AO TRATAMENTO NO SEIO FAMILIAR. ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL - AME, TIPO-1. DOENÇA CRÔNICA E DEGENERATIVA. EXPECTATIVA DE SOBREVIDA DE 2 A 3 ANOS. SENDO GRAVÍSSIMA A DOENÇA, O ARTIGO 19-I, § 3º, DA LEI Nº 8.080, DE 19/09/1990, QUE INSTITUIU O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS, AUTORIZA QUE O TRATAMENTO MÉDICO SEJA FEITO NA CASA DO ENFERMO, ONDE GOZE DE MELHOR QUALIDADE DE VIDA, DE MAIOR CONTATO FAMILIAR E DE MENOR RISCO DE INFECÇÃO HOSPITALAR. A INTERNAÇÃO DOMICILIAR, ALÉM DE SER MAIS ECONÔMICA PARA O ESTADO, PODE SIGNIFICAR A ÚNICA FORMA DE GARANTIR CONDIÇÕES MAIS DIGNAS DE TRATAMENTO. A SAÚDE É UM DIREITO FUNDAMENTAL DO SER HUMANO, DEVENDO O ESTADO PROVER AS CONDIÇÕES INDISPENSÁVEIS AO SEU PLENO EXERCÍCIO (ART. 2º). ASSIM, CORRETA A DECISÃO QUE DEFERIU A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E DETERMINOU AO DISTRITO FEDERAL QUE FORNEÇA À PACIENTE, PORTADORA DE ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL - AME, TIPO-1, QUE TEM EXPECTATIVA DE SOBREVIDA DE DOIS A TRÊS ANOS, OS EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS À MANUTENÇÃO DE SUA VIDA, DE ACORDO COM ORIENTAÇÃO MÉDICA; EQUIPE DE AUXILIARES OU TÉCNICOS DE ENFERMAGEM, SUPERVISIONADOS POR ENFERMEIRO, DE ACORDO COM AS NECESSIDADES DA PACIENTE; E MATERIAL DESCARTÁVEL, MEDICAMENTOS E ALIMENTAÇÃO ESPECIAL, NO PRAZO MÁXIMO DE SETENTA E DUAS HORAS, SOB PENA DO PAGAMENTO DE MULTA DIÁRIA DE QUINHENTOS REAIS." (20050020006147AGI, Relator ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 3ª Turma Cível, julgado em 04/04/2005, DJ 24/05/2005 p. 154).

Ante o exposto, em consonância com o parecer da Douta Décima Quinta Procuradora de Justiça, em substituição à Décima Quarta Procuradoria de Justiça, confirmando a medida liminarmente deferida, concedo a segurança pleiteada para garantir à impetrante a internação domiciliar com cama hospitalar, suporte e colchão adequado, assistência ventilatória (Máscara de Venturi e Bipap), gastronomia, cuidados de enfermagem (curativos e aspiração traqueal freqüentes), fisioterapia motora e respiratória, nebulização, nutrição enteral, com acompanhamento médico, nutricional e fisioterapêutico..

É como voto.

Natal, 23 de junho de 2010.

Des. Rafael Godeiro
Presidente

Des. Armando da Costa Ferreira
Relator

Drª. Mildred Medeiros de Lucena
Procuradora-Geral de Justiça Adjunta




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