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terça-feira, 11 de maio de 2010

JURID - Responsabilidade civil. Descarga elétrica em catraca. [11/05/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Descarga elétrica em catraca eletrônica. Negligência e imprudência da empresa administradora.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2007.063023-7

Publicado em: 27.04.2010

Apelação Cível n. 2007.063023-7, de Criciúma

Relatora: Desembargadora Substituta Sônia Maria Schmitz

RESPONSABILIDADE CIVIL. DESCARGA ELÉTRICA EM CATRACA ELETRÔNICA. NEGLIGÊNCIA E IMPRUDÊNCIA DA EMPRESA ADMINISTRADORA DO TERMINAL URBANO DE PASSAGEIROS. FALTA DE MANUTENÇÃO. DANOS MORAIS.

Evidenciada a relação de causalidade entre o fato e a omissão da Concessionária, que deixou de adotar as medidas necessárias para garantir a segurança e a integridade física dos usuários do transporte coletivo municipal, inevitavelmente estará obrigada a suportar os prejuízos e conseqüências que sua inércia acarretou, por força do dispositivo constitucional, que contempla a teoria do risco administrativo.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.063023-7, da comarca de Criciúma (Vara da Faz., Acid. de Trab. e Registros Públicos), em que é apte/rdoad Empresa Pública de Trânsito e Transportes de Criciúma S.A. - CRICIUMATRANS, e apda/rtead Camila Bez Birolo dos Santos e outro:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por votação unânime, conhecer e desprover os recursos. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Camila Bez Birolo dos Santos, representada por seu pai, Pedro João dos Santos e, Cristiano Conti Zanetta, representado por seus genitores, João Jaime Zanetta e Fátima Maria Conti Zanetta, ajuizaram ação indenizatória por danos morais em face do Município de Criciúma e da Empresa Pública de Trânsito e Transporte de Criciúma - EPTC - CRICIÚMATRANS S.A., narrando que em 12/04/2004, ao utilizarem a catraca eletrônica, situada no terminal de ônibus do bairro Pinheirinho, receberam forte descarga elétrica, do que lhes resultou desmaios, dores extremas e dormência em todo o corpo, além de violento abalo psíquico a que foram submetidos.

Imputaram à negligência dos réus a causa do sinistro, porquanto, deixaram de oferecer a segurança necessária, a fim de evitar riscos a integridade física da população que transita diariamente por aquele terminal, bem como de prestar a devida assistência durante e após o sinistro, decorrendo daí o dever de indenizar.

Após tecer outras considerações, arremataram postulando o acolhimento da pretensão (fls. 02-15).

Citados, os réus contestaram. A CRICIÚMATRANS, arguiu, preliminarmente, denunciação da lide. No mérito, defendeu, em síntese, caso fortuito, já que a descarga elétrica foi causada por infiltração de água da chuva na tubulação da rede energizada. O Município, por sua vez, suscitou, ilegitimidade passiva ad causam, denunciação da lide, responsabilidade subjetiva, ausência de negligência da Administração e de prova do dano (fls. 48-59 e 169-181).

Após a réplica (fls. 275-278), saneado o feito, com a exclusão do Município do polo passivo da demanda (fl. 295-296), CRICIÚMATRANS interpôs agravo de instrumento (fls. 310-322), o qual restou desprovido (fls. 504-505).

Em seguida, realizada audiência de conciliação, instrução e julgamento, foram inquiridas as testemunhas (fls 451-456) e apresentadas as alegações finais (fls. 460-467 e 468-470). Sobreveio então a r. sentença, julgando procedente o pedido, para condenar a Empresa ao pagamento de R$ 5.700,00 (cinco mil e setecentos reais) para cada autor a título de danos morais (fls. 474-483).

Irresignada, a vencida apelou e os autores aderiram. A primeira, repisando suas teses defensivas, dando ênfase a redução do quantum indenizatório e a exclusão das custas processuais e dos honorários advocatícios. Já os segundos, pleitearam a majoração dos valores arbitrados no decisum, bem como da verba honorária (fls. 488-501 e 518-543).

Com as contrarrazões (fls. 507-517 e 546-549), ascenderam os autos a esta Corte, deixando de serem remetidos à Procuradoria-Geral de Justiça, por força dos Atos n. 103/04 e 089/05 emanados pelo Conselho Superior do Ministério Público, bem como dos enunciados interpretativos deles decorrentes.

É o relatório.

VOTO

No dia 12/04/2004, por volta das 12h30min, Camila Bez Birolo dos Santos e Cristiano Conti Zanetta, ambos com 15 anos de idade, após utilizaram o transporte público municipal, desembarcaram no Terminal Urbano do Bairro Pinheirinho, administrado pela CRICIÚMATRANS, objetivando alcançarem o Colégio CEDUP, onde assistiriam aula naquela tarde. Ocorre que, ao passarem pela catraca eletrônica ali instalada, receberam forte descarga elétrica, ficando com as mãos presas na roleta, situação que lhes acarretou desmaio, dormência e dores pelo corpo.

Roboram essa narrativa os documentos acostados (fls..23-29 e 31-36), bem como os depoimentos colhidos (fls. 452-456), confortando, por conseguinte, a maneira negligente e imprudente com que a Empresa prestava o serviço na região, haja vista que as condições dos cabos elétricos que passavam sob a catraca naquele terminal não eram as mais adequadas para garantir a segurança da população.

Elucidativo, a respeito, é o testemunho de Vivaldo Carvalho Villa, funcionário do Município de Criciúma que, ao ser inquirido pelo magistrado, assim relatou:

[...] que o depoente afirma que no dia dos fatos estava no terminal do Gabinete Desa. Substituta Sônia Maria Schmitz (ICSF)

Pinheirinho, no lado direito da plataforma e, quando retornava para o lado das catracas observou que havia fita de isolamento em duas catracas; que um funcionário da empresa Forquilhinha, no dia dos fatos, estava no local tentando tirar a voltagem das catracas que realmente estavam dando choque; que o depoente afirma que quando chegou próximo percebeu que o funcionário da empresa Forquilhinha, mesmo com a chave de isolamento não conseguia desligar a catraca em virtude do choque que a mesma estava emitindo; que naquele momento foi medido a voltagem porque o funcionário da empresa Expresso Coletivo Forquilhinha tinha um aparelho que acusou 180 volts; que não presenciou a hora que os autores levaram o choque mas ficou sabendo de que os mesmos teriam levado choque, só que quando chegou no local das catracas os mesmo já haviam saído; que o choque ocorreu porque os fios que passavam por debaixo da catraca não estavam bem isolados e inclusive havia emendas e, com o contato da umidade e chuva ocorreu o choque; [...]." (fl. 455) (original sem grifo)

A par da falta de manutenção preventiva na estrutura física do terminal de passageiros, verifica-se ainda que sequer foi oferecida aos autores qualquer tipo de assistência durante e/ou após o sinistro, a fim de amenizar as conseqüências, seja por funcionários, seja pela própria administração da empresa. Mesmo estando visivelmente debilitados, os autores foram desconsiderados pela CRICIÚMATRANS que demonstrou evidente descaso para com os usuários do serviço público.

Nesse sentido, Aline Nogueira Augusto confirma "[...] que no dia dos fatos tinha chegado com o ônibus, indo em direção a catraca quando percebeu que os autores Camila e Cristiano estavam levando um choque na catraca [...]; que a única pessoa que viu ajudando Camila foi Cristiano e que não viu ninguém do terminal ajudando os autores [...]." (fls. 453) (original sem grifo)

De todo modo, a responsabilidade da CRICIÚMATRANS sobressai do seu dever de fiscalizar todos os serviços disponibilizados a população, nos terminais de passageiros por ela administrados na região de Criciúma (Lei n. 4.580/03), para que sejam prestados de forma adequada, eficientemente e segura, pois em caso de descumprimento será compelida a reparar os danos que sua inércia acarretar a terceiros.

Como é cediço, "A natureza da atividade estatal impõe aos seus agentes um dever especial de diligência, consistente em prever as conseqüências de sua conduta ativa e omissiva, adotando todas as providências necessárias para evitar a consumação de danos a terceiros.

"Se o agente estatal infringir esse dever de diligência, atuando de modo displicente, descuidado, inábil, estará configurada a conduta ilícita e surgirá, se houver dano a terceiro, a responsabilidade civil." (Marçal Justen Filho. A Responsabilidade do Estado. In: Responsabilidade civil do estado. Freitas, Juarez (org). Malheiros, São Paulo, 2006. p. 233).

O mesmo autor explicita que "[...] existe outra situação que é o núcleo do problema. É aquela em que não há norma impondo explicitamente o dever de agir, mas em que o agir é o meio para evitar a consumação de um resultado danoso e prejudicial, reputado antijurídico. Tal se passa, por exemplo, quando um servidor público deixa de sinalizar a existência de um defeito na pavimentação rodoviária, Gabinete Desa. Substituta Sônia Maria Schmitz (ICSF) dando oportunidade à consumação de acidente de trânsito. Não é necessário existir lei determinando o cumprimento o dever de agir. Ele se configura como inerente ao cumprimento diligente das funções públicas exercidas." (op. cit. p. 236).

O debate, já se vê, direciona-se ao comando do § 6° do art. 37 da CRFB/88, que contempla a teoria do risco administrativo, pela qual o Poder Público tem o dever de indenizar os danos que suas atividades, serviços e inações causarem a particulares, bastando, para tanto, a comprovação do efetivo prejuízo e sua relação causal com a conduta da administração.

É bem de ver que se tratando de comportamento omissivo, faz-se indispensável a comprovação da culpa do agente público, conduzindo a análise da questão aos contornos da responsabilidade subjetiva.

Da lição de José dos Santos Carvalho Filho retira-se:

[...] a responsabilidade objetiva é um plus em relação à responsabilidade subjetiva e não deixa de subsistir em razão desta; além do mais, todos se sujeitam normalmente à responsabilidade subjetiva, porque essa é a regra do ordenamento jurídico. [...] Quer-nos parecer, assim, que o Estado se sujeita à responsabilidade objetiva, mas, quando se tratar de conduta omissiva, estará ela na posição comum de todos, vale dizer, sua responsabilização se dará por culpa. (Manual de Direito Administrativo. 15 ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2006. p. 465).

Outro não é o posicionamento da jurisprudência:

Nos casos de omissão por parte do Estado, a responsabilidade é considerada subjetiva. Cumpre, portanto, àquele que sofreu os efeitos do fato danoso demonstrar que a Administração, através de seus agentes, incorreu em uma das modalidades de culpa - negligência, imprudência ou imperícia. (TJSC - AC n. 1999.0021117-3, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros).

Tais razões é que sustentam a responsabilização pelos danos morais sofridos pelos autores, ainda mais porque o réu não demonstrou qualquer causa elisiva da conduta que lhe é imputada, certo que "Em todos os casos em que o Estado é chamado a ressarcir prejuízos decorrentes de conduta omissiva, bem como nas comissivas, poderá ele defender-se demonstrando quaisquer das circunstâncias excludentes da responsabilidade." (João Agnaldo Donizete Gandini et al. A Responsabilidade Civil do Estado por Conduta Omissiva. Disponível em www.cjf.gov.br/rev/numero23/artigo. Acesso em 07.03.07).

Partindo dessa conclusão, assentada a responsabilidade, resta aquilatar o quantum indenizatório que a omissão acarretou, tendo-se que:

[...] O que se chama de 'dano moral' é, não um desfalque no patrimônio, nem mesmo a situação onde só dificilmente se poderia avaliar o desfalque, senão a situação onde não há ou não se verifica diminuição alguma. [...] dano moral é empregada com sentido traslado ou como metáfora: um estrago ou uma lesão (este o termo jurídico genérico), na pessoa mas não no patrimônio.[...] O dinheiro pago, por sua vez, não poderia recompor a integridade física, psíquica ou moral lesada.

Não há correspondência nem possível compensação de valores. Os valores ditos morais são valores de outra dimensão, irredutíveis ao patrimonial. (Walter Moraes apud Rui Stoco. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 457-458).

Em relação ao equivalente que daí decorre, tarefa das mais tormentosas Gabinete Desa. Substituta Sônia Maria Schmitz (ICSF) do julgador, pois ao tempo em que não pode ser considerado irrisório, a ponto de menosprezar a dor sofrida, também não pode dar margem ao enriquecimento ilícito.

Entre outros termos, o arbitramento há de levar em consideração "[...] a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do ofensor e as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes." (Sergio Cavalleri Filho. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 81-82), a fim de que possa proporcionar a reparação mais abrangente possível.

A capacidade econômica das partes, como se percebe, constitui critério a ser observado na fixação da indenização, aspecto que merece especial distinção.

Do Superior Tribunal de Justiça, colhe-se:

Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do dano; condição sócio-econômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima." (REsp 355392/RJ, rel. Min. Castro Filho, DJ 17.06.02).

Nessa tessitura, diante das minudências do caso, revela-se adequado o valor fixado no decisum, atendendo aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, revestindo-se plenamente do caráter compensatório, pedagógico e punitivo.

Já os honorários advocatícios, por terem sido fixados com a observância do grau de zelo do profissional, da natureza da causa, do trabalho realizado pelo mandatário, bem como do tempo por ele despendido, mantêm-se no patamar de 15% sobre o valor da condenação.

Ante o exposto, vota-se pelo conhecimento e desprovimento dos recursos.

DECISÃO

Nos termos do voto da Relatora, a Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, decidiu conhecer e desprover os recursos.

O julgamento, realizado no dia 20 de abril de 2010, foi presidido pelo Desembargador Pedro Manoel Abreu, com voto, e dele participou o Desembargador Wilson Augusto do Nascimento.

Florianópolis, 28 de abril de 2010.

Sônia Maria Schmitz
RELATORA

Gabinete Desa. Substituta Sônia Maria Schmitz (ICSF)




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