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terça-feira, 6 de abril de 2010

JURID - HC. Constitucional. Processual penal. Tráfico de drogas. [06/04/10] - Jurisprudência


Habeas corpus. Constitucional. Processual penal. Tráfico de drogas. Prisão preventiva. Superveniência da sentença.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Supremo Tribunal Federal - STF

Coordenadoria de Análise de Jurisprudência

DJe nº 27 Divulgação 11/02/2010 Publicação 12/02/2010

Ementário nº 2389 - 3

01/12/2009 PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 98.504 MINAS GERAIS

RELATORA: MIN. CARMEN LÚCIA

PACTE.(S): GUILHERME CORRÊA FONSECA

IMPTE.(S): NÉGIS MONTEIRO RODARTE E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. NOVO TÍTULO PRISIONAL. NÃO OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO DA AÇÃO NO CASO DE TRÁFICO DE DROGAS. NECESSIDADE DE ESTAR SOLTO PARA RECORRER EM LIBERDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA DA DECISÃO QUE DECRETOU A PRISÃO NÃO OCORRÊNCIA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA E PERICULOSIDADE DO PACIENTE CIRCUNSTÂNCIAS SUFICIENTES PARA A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. IRRELEVÂNCIA DE CONDIÇÕES SUBJETIVAS FAVORÁVEIS. DESNECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DA MANUTENÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR NA SENTENÇA CONDENATÓRIA NO CASO DE TRÁFICO DE DROGAS. APLICAÇÃO DO ART. 59 DA LEI 11.343/05. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. ORDEM DENEGADA.

1. A superveniência da sentença condenatória, apesar de constituir novo título da prisão, não prejudica a ação no caso de tráfico de drogas, uma vez que o réu somente poderá apelar em liberdade se estiver solto ao tempo da condenação. Habeas corpus conhecido.

2. A custódia cautelar do Paciente, embora sucinta, mostra-se suficientemente fundamentada, não havendo, portanto, como se reconhecer o constrangimento, notadamente porque, ao contrário do que se afirma na petição inicial, existem nos autos elementos concretos, e não meras conjecturas, que apontam a quantidade de droga apreendida e a periculosidade do Paciente como circunstâncias suficientes para a decretação da prisão processual. Precedentes.

3. A alegação de ter o Paciente condições subjetivas favoráveis é irrelevante para a revogação da segregação cautelar, já que presentes nos autos elementos concretos a recomendar a manutenção da custódia.

4. O art. 59 da Lei 11.343/05 somente permite que o réu recorra em liberdade se estiver solto na data da sentença, preenchidos os demais requisitos legais, apresentando-se como exceção à sistemática do Código de Processo Penal e à jurisprudência deste Supremo Tribunal, que exigem fundamentação idÔnea na decisão condenatória para a decretação ou manutenção da prisão cautelar.

5. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do ministro Carlos Ayres Britto, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto da Relatora. Vencido o Ministro Marco Aurélio.

Brasília, 01 de dezembro de 2009.

Ministra CARMEN LUCIA - Relatora

01/12/2009 PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 92.504 MINAS GERAIS

RELATORA: MIN. CARMEN LÚCIA

PACTE.(S): GUILHERME CORRÊA FONSECA

IMPTE.(S): NÉGIS MONTEIRO RODARTE E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - (Relatora):

1. Habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado pelo advogado NÉGIS MONTEIRO RODARTE, em favor de GUILHERME CORRÊA FONSECA, contra decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus 119.119/MG, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima.

2. O Paciente teve sua prisão preventiva decretada em 2.4.2008, e não há nos autos informação sobre a data do cumprimento do mandado. Na mesma data, foi denunciado pelo crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06 (tráfico ilícito de entorpecentes). Em 29.8.2009, foi condenado a 2 anos e 6 meses de reclusão em regime inicialmente fechado e 250 dias-multa, em processo que tramita no Juízo da Vara Criminal e da infância e Juventude da Comarca de Lavras/MG (fls. 294-302 do Apenso 2).

3. Houve recurso da acusação e da defesa, e, em 4.3.2009, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais rejeitou as preliminares, deu provimento ao apelo ministerial, negou provimento aos recursos defensivos e fixou a pena definitiva do Paciente em 6 anos de 10 meses de reclusão e 650 dias-multa.

4. Atualmente o processo de conhecimento está pendente de decisão no Superior Tribunal de Justiça, uma vez que foi interposto recurso especial pela defesa.

5. Com relação á decisão pela qual se decretou a prisão preventiva do Paciente, impetrou-se o Habeas Corpus 1.0000.08.472931-8/000 no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que, em 11.6.2008, denegou a ordem.

6. Inconformada com a decisão, a defesa impetrou, no Superior Tribunal de Justiça, o Habeas Corpus 119.119/MG, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, ao qual a Quinta Turma, por unanimidade, em 10.3.2009, denegou a ordem:

"EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. IMPOSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO-CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA.

1. O inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal estabelece que os crimes hediondos são inafiançáveis. Não sendo possível a concessão de liberdade provisória com fiança, com maior razão será a não-concessão de liberdade provisória sem fiança.

2. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a vedação imposta pelo art. 2º, II, da Lei 8.072/90 é fundamento suficiente para o indeferimento da liberdade provisória (HC 76.779/MT, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ 4.4.08).

3. A Lei 11.343/06, expressamente, fez constar que o delito de tráfico de drogas é insuscetível de liberdade provisória.

4. Ordem denegada" (fl. 41).

7. Contra essa decisão impetra-se o presente habeas corpus, no qual o Impetrante alega ter sido "decretada [a] prisão preventiva [do Paciente] sem qualquer fundamentação em dados concretos do processo" (fls. 2-3).

8. Afirma o Impetrante, ainda, que "em momento algum se apontou a necessidade comprovada do encarceramento cautelar, não podendo o decreto de prisão preventiva basear-se em meras conjecturas, pois é imprescindível a existência de atos inequívocos que indiquem a necessidade incontrastável da medida, o que não existe" (fl. 12) e "que a ação penal já foi sentenciada, havendo condenação do paciente, sem entretanto dizer se o paciente deverá aguardar o julgamento de eventual recurso em liberdade" (fl. 40).

9. Deduz, finalmente, seu pedido nos seguintes termos:

"Isto posto, deve ser a ordem, liminarmente concedida, para deferir-lhe a liberdade provisória até o julgamento deste 'Writ', visto a presença solar do 'Fumus Boni Iuris', que está amplamente demonstrado na impetração, na exata medida em que se cuida de pleito encontrando eco tanto na Doutrina quanto na Jurisprudência. Já o 'Periculum in Mora' reside exatamente no fato de o paciente está sofrendo constrangimento ilegal, encarcerado desde o dia 04 do andante, para, posteriormente, a concessão do remédio heróico, mantendo a liminar acaso deferida. Assim, caso a medida liminar não seja concedida, o prejuízo do paciente será ainda maior, trazendo conseqüências por demais desagradáveis.

N. t., em razão do mencionado constrangimento ilegal, referente, 'data vênia', a ilegalidade da prisão diante da ausência de motivação para sua mantença, deve a liminar ser deferida concedendo a liberdade provisória e, no mérito, sua colimação, tudo isto por ser de Direito e Justiça" (fl. 40 -sic) .

10. Em 17.4.2009, indeferi a liminar pleiteada ao decidir que:

"7. Inicialmente, cumpre destacar equivoco no julgado aqui atacado, o qual faz constar no relatório ter sido o ora Paciente preso em flagrante. Contudo, a prova documental indica que a prisão se deu por decreto judicial de preventiva (fl. 59/61 - apenso 1), acolhendo representação da autoridade policial (fl. 41 - apenso 1).

Aquele engano não compromete, todavia, no essencial, a análise do caso.

8. Neste exame preambular, tenho por certo que os fundamentos do acórdão ora questionado são bem expostos e suficientes juridicamente para evidenciar não ser caso de deferimento da liminar por ausência de seus pressupostos legais.

9. De outra parte, a liminar requerida tem natureza nitidamente satisfativa, e embora plausíveis os argumentos apresentados pelos Impetrantes, não se comprova, de plano, ilegalidade ou abuso de poder ensejados da liminar, cujo objeto, como antes acentuado, se confunde com o pedido principal, o que impõe apreciação do mérito da impetração.

10. Da documentação juntada em anexos, consta acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais de 4.3.2009, publicado em 20.3.2009, que rejeitou preliminares e deu provimento apenas ao apelo do Ministério Público (fls. 444-456 - apenso 3). Não há comprovação de ter sido interposto recurso especial e/ou extraordinário contra aquela decisão.

11. Pelo exposto, indefiro a liminar.

12. Suficientes os elementos de instrução, dê-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República" (fls. 54-55).

11. Em 21.5.2009, a Procuradoria-Geral da República opinou pela denegação da ordem (fls. 58-61).

É o relatório

V O T O

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - (Relatora):

1. Primeiramente, observo que, no processo de conhecimento, apesar de ter sido proferida sentença condenatória, bem como acórdão confirmando a condenação, as peculiaridades do caso me levam a entender que não houve a perda do objeto da impetração.

2. Tal ocorreu porque a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus 95.584, de minha relatoria, DJe 6.2.2009, ao apreciar a preliminar relativa à eventual prejuízo do pleito de concessão de liberdade provisória em razão da superveniência de sentença condenatória, conheceu do habeas corpus, na linha do meu voto, e entendeu que não estava prejudicada a pretensão de concessão de liberdade provisória para desconstituir a prisão em flagrante por tráfico de entorpecente, uma vez que a solução dessa controvérsia tem influência direta na discussão quanto â possibilidade de o Paciente apelar em liberdade.

Na ocasião, afirmei que, tendo o Paciente respondido o processo preso em razão do flagrante e sendo correta a tese sustentada de que deveria ter sido concedida a liberdade provisória, ele, ao tempo da sentença, estaria em liberdade e, portanto, poderia, em princípio, suscitar a aplicação do art. 59 da Lei 11.343/06, segundo o qual, nos crimes "previstos nos arts. 33, caput [caso do Paciente] e § 1º, e 34 a 37, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória".

3. Dessa forma, o ora Paciente somente poderia apelar em liberdade se fosse revogada sua prisão em flagrante, que perdurou até a sentença condenatória, pois esse beneficio, segundo jurisprudência pacificada neste Supremo Tribunal, aplica-se exclusivamente ao réu que estava em liberdade quando proferida a sentença .

4. É certo que, na espécie vertente, está-se diante de prisão preventiva, contudo, assim como a prisão em flagrante, trata-se de espécie de prisão provisória e, conforme mencionado, para que o réu possa apelar em liberdade, é necessário que esteja solto ao tempo da condenação, o que não se verifica estando ele acautelado em razão de flagrante ou de prisão preventiva.

Neste sentido:

"EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ARTS. 33, CAPUT, 40, III, E 59, TODOS DA LEI 11.343/2006. LIBERDADE PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. ART 5º, XLIII, DA CONSTITUIÇÃO. INAFIANÇABILIDADE. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. SÚMULA 691 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE, TERATOLOGIA, ABUSO DE PODER OU AFRONTA Á JURISPRUDÊNCIA. INOCORRÊNCIA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I - A proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados decorre da própria inafiançabilidade imposta pelo art. 5°, XLIII, da Constituição Federal à legislação ordinária. Precedentes. II - A apelação em liberdade prevista no art. 59 da Lei 11.343/2006 pressupõe a cumulação dos pressupostos da primariedade e da inexistência de antecedentes com o fato de ter o réu respondido em liberdade à ação penal, tanto pela inocorrência de prisão oriunda de flagrante delito quanto pela inexistência de decreto de prisão preventiva. III - A ausência de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão atacada faz incidir o teor da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal. IV - Decisão que, ademais, não se mostra contrária à jurisprudência desta Suprema Corte. V - Agravo a que se nega provimento" (HC 94.521-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 10.8.2008).

5. Anoto, também, que, ao julgar o Habeas Corpus 93.302, de minha relatoria, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal reafirmou o entendimento consolidado na jurisprudência deste Supremo Tribunal, no sentido de que ser insusceptível a liberdade provisória aos presos em flagrante por crimes hediondos ou equiparados, (v.g., HC 93.653, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 27.6.2008; HC 93.991, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 27.6.2008; HC 92.495, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 13.6.2008; HC 94.52/AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 10.8.2008; HC 92.874, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 20.6.2008; HC 92.757, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 25.4.2008; e HC 93.300, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 25.4.2008).

Ressalto, ademais, que esse entendimento não foi alterado com a superveniência da Lei nº 11.464/2007, verbis:

'EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO DE DROGAS. EXCESSO DE PRAZO. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. QUESTÃO PREJUDICADA. LIBERDADE PROVISÓRIA. INADMISSIBILIDADE. PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELA CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO PARA QUE O JUÍZO DAS EXECUÇÕES ANALISE EVENTUAL CABIMENTO DA PROGRESSÃO DE REGIME. INVIABILIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. A superveniência da sentença condenatória - novo titulo da prisão - prejudica a questão referente ao excesso de prazo da prisão. Não prejudicial idade do habeas corpus, nas circunstâncias do caso, do pedido de liberdade provisória. 2. A proibição de liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e equiparados, decorre da própria inafiançabilidade imposta pela Constituição da República á legislação ordinária (Constituição da República, art. 5º, inc. XLIII): Precedentes. O art. 2º, inc. II, da Lei nº 8.072/90 atendeu o comando constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. Inconstitucional seria a legislação ordinária que dispusesse diversamente, tendo como afiançáveis delitos que a Constituição da República determina sejam inafiançáveis. Desnecessidade de se reconhecer a inconstitucionalidade da Lei nº 11.464/07, que, ao retirar a expressão 'e liberdade provisória' do art. 2º, inc. II, da Lei nº 8.072/90, limitou-se a uma alteração textual: a proibição da liberdade provisória decorre da vedação da fiança, não da expressão suprimida, a qual., segundo a jurisprudência deste Supremo Tribunal, constituía redundância. Mera alteração textual, sem modificação da norma proibitiva de concessão da liberdade provisória aos crimes hediondos e equiparados, que continua vedada aos presos em flagrante por quaisquer daqueles delitos. 3. A Lei nº 11.464/07 não poderia alcançar o delito de tráfico de drogas, cuja disciplina já constava de lei especial (Lei nº 11.343/06, art. 44, caput), aplicável ao caso vertente. 4. Irrelevância da existência, ou não, de fundamentação cautelar para a prisão em flagrante por crimes hediondos ou equiparados: Precedentes. 5. Licitude da decisão proferida com fundamento no art. 5º, inc. XLIII, da Constituição da República, e no art. 44 da Lei nº 11.343/06, que a jurisprudência deste Supremo Tribunal considera suficiente para impedir a concessão de liberdade provisória. Ordem denegada. 6. Inviabilidade da proposta de concessão de habeas corpus de ofício (parecer da Procuradoria-Geral da República), no sentido de que se determine que o Juízo das Execuções analise os requisitos da progressão de regime: nas informações prestadas após aquele parecer se demonstra que o Ministério Público local também recorreu da sentença: se provido aquele recurso, com o qual se objetiva a majoração da pena imposta ao Paciente, não se teria o período mínimo para eventual progressão de regime. Incide, no caso, a jurisprudência prevalecente neste Supremo Tribunal, que não admite - enquanto pendente de julgamento a apelação interposta pelo ministério Público com a finalidade de agravar a pena do réu - a progressão de regime prisional sem o cumprimento do lapso temporal necessário, segundo a pena atribuída em abstrato ao crime ou o máximo que se poderia alcançar se eventualmente provido o recurso da acusação: Precedentes" (HC 93.302, de minha relatoria, DJ 9.5.2008).

6. Foi nessa linha jurisprudencial que se fundamentaram a decisão do Superior Tribunal de Justiça e o parecer da Procuradoria-Geral da República. Contudo, esses fundamentos não se aplicam à espécie vertente uma vez que não se está a analisar a possibilidade de liberdade provisória no caso de prisão em flagrante por crime de tráfico de substâncias entorpecentes, mas, sim, a alegação de ilegalidade da prisão preventiva devido â falta de fundamentação da decisão em fatos concretos imputáveis ao Paciente.

7. Feitas essas observações preliminares, no mérito, tenho que razão jurídica não assiste ao impetrante.

8. Ao decretar a prisão preventiva do Paciente, o Juízo da Vara Criminal e da Infância e da Juventude da Comarca de Lavras/MG asseverou que:

"O decreto de prisão preventiva, no presente caso, fundamenta-se na necessidade de garantir a devida instrução criminal e assegurar futura aplicação da lei penal, em caso de condenação. Há fortes indícios nos autos de que o representado seria o destinatário de vultosa quantidade de substância entorpecente trazida para esta cidade.

Para a decretação da custódia cautelar, exigem-se indícios suficientes de autoria e não a prova cabal da mesma, o que somente poderá ser verificado em eventual decisum condenatório, após a devida instrução dos autos.

Em situações como esta, o Poder Judiciário tem o dever de zelar pela garantia da ordem pública que se encontra ameaçada, tendo em vista o volume significativo de entorpecentes apreendido e que teria sido trazido para esta cidade peio requerente. Nota-se, portanto, que a medida extrema torna-se indispensável diante da evidente periculosidade do agente, devendo o Poder Judiciário zelar pela coletividade, ameaçada pela manutenção do representado em liberdade" (fl. 60 do Apenso 1).

9. Assim, está claro que a decisão que decretou a prisão preventiva fundamentou-se em fatos concretos, devidamente identificados nos autos

Verifica-se que a magistrada sustenta que a prisão preventiva é necessária para "zelar pela garantia da ordem pública" devido ao "volume significativo de entorpecentes apreendido" e à "evidente periculosidade do agente".

De fato, foram apreendidos, aproximadamente, 5 quilos de substância entorpecente conhecida como "crack", conforme laudo de constatação de fl. 24 do Apenso 1, o que, realmente, configura grande quantidade e evidencia a periculosidade do agente referida na decisão que decretou a prisão preventiva.

10. Nesse sentido, entre outros, o julgamento do Habeas Corpus 84.480, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, verbis:

"EMENTA: PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. RÉU FORAGIDO. GRANDE QUANTIDADE DE ENTORPECENTES. FUNDAMENTAÇÃO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. APLICAÇÃO DA LEI PENAL. - A prisão preventiva está fundamentada na necessidade de se garantir a aplicação da lei penal e a preservação da ordem pública, em virtude da grande quantidade de entorpecentes apreendida com o paciente e de sua evasão do distrito da culpa. Precedentes. - Inexiste mácula no decreto de prisão, de modo que não há constrangimento ilegal. - Recurso a que se nega provimento." (HC 84.480, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 18.2.2005).

11. De igual forma manifestou-se a Subprocuradora-Geral da República Cláudia Sampaio Marques ao afirmar que:

"Cinco quilos (5Kg) de crack representam a grande quantidade de substância entorpecente a que se refere o magistrado singular e que, repita-se, teria como destinatário o paciente. De fato, a significativa quantidade de droga aponta para a periculosidade do paciente e a necessidade de sua segregação, resguardando-se, por conseguinte, a instrução do processual" (fl. 50).

12. Assim, no que se refere â alegação de falta de fundamentação da decisão de primeiro grau que decretou a prisão provisória, tem-se que, embora sucinta, a decisão está fundada em elementos concretos devidamente comprovados nos autos, o que afasta a alegação de não observância das regras de motivação:

"Ementa: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO FUNDAMENTADA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. Possível constrangimento ilegal sofrido pelo paciente devido à ausência dos requisitos autorizadores para a decretação de sua prisão preventiva e pela falta de fundamentação idônea da decisão que a decretou. 2. Diante do conjunto probatório dos autos da ação penal, a manutenção da custódia cautelar se justifica para a garantia da ordem pública e da conveniência da instrução criminal, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. Fundamentação idônea, ainda que sucinta, à manutenção da prisão processual do paciente, não tendo a magistrada se valido de "referências genéricas", como alega o impetrante. Não houve, portanto, violação ao art. 93, IX, da Constituição da República. 4. Como já decidiu esta Corte, "a garantia da ordem pública, por sua vez, visa, entre outras coisas, evitar a reiteração delitiva, assim resguardando a sociedade de maiores danos" (HC 84.658/PE, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 03.06.2005), além de se caracterizar "pelo perigo que o agente representa para a sociedade como fundamento apto à manutenção da segregação" (HC 90.398/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 18.05.2007). Outrossim, "a garantia da ordem pública é representada pelo imperativo de se impedir a reiteração das práticas criminosas, como se verifica no caso sob julgamento. A garantia da ordem pública se revela, ainda, na necessidade de se assegurar a credibilidade das instituições públicas quanto à visibilidade e transparência de políticas públicas de persecução criminal" (HC 98.143, de minha relatoria, DJ 27.06.2008). 5. Habeas corpus denegado" (HC 96.956, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 3.4.2009).

13. Acrescente-se, ainda, que a jurisprudência do Supremo Tribunal firmou-se no sentido de que "A presença de condições subjetivas favoráveis ao paciente não obsta a segregação cautelar, desde que presentes nos autos elementos concretos a recomendar sua manutenção, como se verifica no caso presente" (HC 94.465, Rel. Min. Menezes Direito, DJ 15.5.2009).

14. Dessa forma, reconhecida a legalidade da prisão preventiva do Paciente, no caso de crime de tráfico de entorpecentes, entendo ser desnecessária que a manutenção da custódia seja fundamentada na sentença condenatória ou no acórdão que confirma a condenação, uma vez que o art. 5º da Lei 11.343/06 somente permite que o réu recorra em liberdade se estiver salto na data da sentença, preenchidos os demais requisitos legais.

Ou seja, estando o réu preso deverá permanecer automaticamente preso, por força de dispositivo legal.

Tal sistemática apresenta-se como exceção ao que estabelecido pelo Código de Processo Penal e firmado pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, que exigem a fundamentação idônea, na decisão condenatória, para a decretação ou manutenção da prisão cautelar.

15. Pelo exposto, encaminho a votação no sentido de denegar a ordem.

É o meu voto.

01/12/2009 PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 98.504 MINAS GERAIS

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Presidente, levou-se em conta, para se presumir a periculosidade do agente - leio o que está na preventiva, a gravidade do crime:

"Há fortes indícios nos autos de que o representado seria o destinatário de vultosa quantidade de substância entorpecente trazida para esta cidade." - Cinco quilos (5kg) de crack.

Indago: o que encerra essa preventiva? A meu ver, a presunção da culpa, a partir de indicias da autoria do crime de tráfico. Tem-se enfoque conflitante com a garantia constitucional. A culpa só resta realmente estabelecida quando se tem decisão condenatória não mais sujeita à modificação na via recursal.

Segue o ato que está transcrito no parecer, ato do Juízo, revelando:

Para a decretação a custódia cautelar, exigem se indícios suficientes de autoria e não a prova cabal, da mesma, ...".

A prova cabal, evidentemente, só ocorrerá após a instrução do processo-crime e a imposição da pena.

"...o que somente poderá ser verificado em eventual decisum (está certo) condenatório, após a devida instrução dos autos.

Em situações como esta, o Poder Judiciário tem o dever de zelar pela garantia da ordem pública que se encontra ameaçada, tendo em vista o volume significativo de entorpecente apreendido e que teria sido trazido para esta cidade pelo requerente". Seria destinatário do entorpecente.

"Nota-se, portanto, que a medida extrema torna-se indispensável diante da evidente periculosidade do agente,...".

E deu-se de barato, portanto, a culpa do próprio agente e, a partir dessa culpa que não estava selada, à altura da preventiva, mediante pronunciamento judicial precluso na via da recorribilidade, proclamou-se a periculosidade.

Presidente, por mais que o tráfico nos dias de hoje assuste, não tenho como abandonar as franquias legais e constitucionais e apontar que, em se tratando dessa imputação, a prisão se faz automática.

Não há, a meu ver, com a devida vênia dos colegas que entendem de forma diversa, uma linha da decisão proferida que se enquadre no disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal.

Por isso, peço vênia para entender que - e parece que as condições pessoais dele são favoráveis - fez-se, ao mundo jurídico, uma decisão sem a indispensável fundamentação,

01/12/2009 PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 98.504 MINAS GERAIS

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - São ponderáveis as razões do eminente Ministro Marco Aurélio, como invariavelmente acontece.

Agora, o fato em si é de extrema gravidade porque portar consigo e destinar ao paciente...

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Mas, Presidente, o que está na decisão é que há "fortes indícios nos autos" de que o representado "seria" o destinatário. Por isso, não houve a prisão em flagrante. Pelo que percebi e pelo que está aqui, em termos de fundamentação, ele não foi surpreendido portando os cinco quilos. Os cinco quilos estariam em viagem, destinados a ele. Os "indícios" seriam nesse sentido. É isso?

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - O substantivo "indícios" foi adjetivado de "fortes", "fortes indícios" de que a destinação da droga era exatamente o paciente. Ou seja, aqui o que se tem são fatos concretos a sinalizar a incomum periculosidade de agente.

Na jurisprudência do Supremo, isso é suficiente para legitimar o decreto da custódia preventiva com base, sobretudo, na ordem pública, porque a segregação processual ou cautelar do paciente tem essa virtude de acautelar o meio social.

É possível que estejamos todos aqui influenciados pela grande quantidade de droga apreendida e pela natureza dessa droga, que vicia o consumidor em tempo muito mais rápido do que qualquer outro; tem sobre a estrutura psicofísica do consumidor um efeito destroçante, devastador.

Também entendo, data veria do voto do Ministro Marco Aurélio, que o artigo 312 do Código de Processo Penal foi devidamente homenageado. Por isso vou acompanhar a eminente Relatora.

01/12/2009 PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 98.504 MINAS GERAIS

EXPLICAÇÃO

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - Ministra-Relatora, foi prisão em flagrante?

A SENHORA MINISTRA CARMEN LÚCIA (RELATORA) - Alega-se, algumas vezes, que foi prisão em flagrante, por isso fiz referência à jurisprudência que tomei de empréstimo, porque, neste caso, houve prisão preventiva decretada

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - Certo.

A SENHORA MINISTRA CARMEN LÚCIA (RELATORA) - Ele estava preso, quando sobreveio a sentença condenatória, e ele quer que seja relaxada essa prisão. Estou afirmando, na esteira da jurisprudência, que a fundamentação apresentada é absolutamente coerente, tanto com a jurisprudência quanto com a legislação: cinco quilos (5kg) de crack apreendidos e isto devidamente demonstrado.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - O crack é a mais devastadora das drogas; o crack é o lixo do lixo.

PRIMEIRA TURMA

EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 98.504

PROCED.: MINAS GERAIS

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

PACTE.(S): GUILHERME CORRÊA FONSECA

IMPTE.(S): NÉGIS MONTEIRO RODARTE E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator; vencido o Ministro Marco Aurélio. Presidência do Ministro Carlos Ayres Britto. 1ª Turma, 01.12.2009.

Presidência do Ministro Carlos Ayres Britto. Presentes à Sessão os Ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, a Ministra Cármen Lúcia e o Ministro Dias Toffoli.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.

Ricardo Dias Duarte
Coordenador

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JURID - HC. Constitucional. Processual penal. Tráfico de drogas. [06/04/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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