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segunda-feira, 12 de abril de 2010

JURID - Apelação cível. Prepostos de empresa de ônibus [12/04/10] - Jurisprudência


Apelação cível. Prepostos de empresa de ônibus que agridem moralmente o apelado por ter esquecido o dinheiro.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV

Tribunal de Justiça de Santa Catarina -TJSC

publicado em 18/03/2010

A.C. 2007.015625-0

Apelação Cível n. 2007.015625-0, de São Bento do Sul

Relator: Des. Edson Ubaldo

APELAÇÃO CÍVEL. PREPOSTOS DE EMPRESA DE ÔNIBUS QUE AGRIDEM MORALMENTE O APELADO POR TER ESQUECIDO O DINHEIRO DA PASSAGEM. INJÚRIA. EMBASAMENTO EM PROVA TESTEMUNHAL. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL OBSERVADOS. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.015625-0, da comarca de São Bento do Sul (2ª Vara), em que é apelante Reunidas S/A Transportes Coletivos e apelado José Abrão Dana:

ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se assim os R$ 4.000,00 (quatro mil reais) fixados em sentença, acrescidos de correção monetária desde o arbitramento e juros legais desde o evento danoso, conforme preceitua a Súmula 54 do STJ. Custas legais.

RELATÓRIO

José Abrão Dana ajuizou ação de indenização por danos morais em face de Reunidas S/A Transportes Coletivos, sob a alegação de que teria sido ameaçado de ser expulso de um ônibus e injuriado por prepostos da empresa ré.

Sustentou que, ao entrar num ônibus às 6h45min (seis horas e quarenta e cinco minutos) para ir trabalhar, percebeu ter esquecido o dinheiro no bolso de uma outra bermuda quando da cobrança da passagem, razão pela qual desenvolveu-se o ocorrido. Juntou cópia do registro de boletim de ocorrência policial, requisitou a produção de provas e requereu a condenação da ré em valor a ser arbitrado a título de reparação moral. (fls. 02/09)

Deferida a gratuidade judiciária. (fl. 20)

Em contestação, a ré refutou a versão fática descrita na inicial. Disse que, além de os prepostos não terem injuriado o autor, teriam agido no exercício de um direito por não aceitarem prestar serviço a um cliente que por ele não pagou. Requereu a produção de provas e a improcedência da ação. (fls. 25/29)

Houve réplica. (fls. 38/41)

Em audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas duas testemunhas arroladas pelo autor (fls. 59/62). As partes ainda apresentaram alegações finais: o autor à fl. 65 e a ré às fls. 71/72.

Sobreveio aos autos a sentença, na qual o MM. Juiz Substituto da 2ª Vara Cível da Comarca de São Bento do Sul, Dr. Luis Paulo Dal Pont Lodetti, julgou procedente o pedido inicial, condenando a ré ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a título de reparação moral, acrescido de juros legais desde o evento danoso e correção monetária desde o arbitramento. Ainda condenou a ré a arcar com as custas processuais e honorários de advogado, fixados estes em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. (fls. 74/80)

Reeditando os argumentos expendidos na contestação, a empresa ré interpôs recurso de apelação. Requereu a reforma da sentença ou, alternativamente, a minoração do quantum arbitrado. (fls. 84/88)

Não foram apresentadas contrarrazões.

Os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Cuida-se de apelação cível interposta contra a sentença que, em ação de indenização por danos morais ajuizada por José Abrão Dana em face de Reunidas S/A Transportes Coletivos, julgou procedente o pedido articulado na inicial.

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

De plano, cabe ressaltar que é absolutamente reconhecível a responsabilização civil em função de injúria, ou seja, da imputação de ofensas à honra e à boa imagem. Nesse sentido, em conformidade ao disposto no artigo 953 do Código Civil, tem-se a obrigação de reparação por parte do ofensor ao injuriado.

Sobre o tema, já decidiu esta Primeira Câmara de Direito Civil:

Nas ações em que se pleiteia reparação por dano moral advindo da prática de injúria, calúnia ou difamação é imprescindível a demonstração do prejuízo sofrido, do elemento intencional (dolo ou culpa) e do nexo de causalidade estabelecido entre o fato e o resultado danoso. (AC. n. 2003.025293-2, de Chapecó, Rel. Des. Joel Dias Figueira Júnior, j. em 04/11/2008)

Sendo assim, pelo o que se passa a expor, a prova testemunhal contida nos autos é clara na caracterização de que houve o dano moral passível de indenização. De tal sorte, disse em juízo a testemunha Rosélia de Jesus Schapievski (fl. 60):

"(...) que dentro do ônibus, a depoente sentou dois bancos atrás do autor; que isso ocorreu por volta das 07:00 horas da manhã; que a depoente, dentro do ônibus, percebeu que ocorria uma conversa entre o cobrador do ônibus e o autor, percebendo também que estava ocorrendo um problema, porque o autor esquecera o dinheiro da passagem; que a depoente tentou interceder e avisar o cobrador que ela própria pagaria a passagem para o autor, porque este é conhecido de seu marido; que o cobrador foi em direção ao motorista e a depoente foi atrás dele; que o cobrador disse ao motorista para que este parasse o ônibus, para que o vagabundo (referindo-se ao autor), descesse do mesmo; que a depoente disse que não havia necessidade de fazer isso, porque ela pagaria a passagem; que ainda assim, o motorista do ônibus chegou a encostar o veículo no acostamento da rodovia, chegando inclusive a parar, mas em razão da interferência da depoente, o autor não precisou descer; (...) que o cobrador também mencionou que o autor esqueceu o dinheiro, porque ingeriu bebida alcóolica; que o cobrador foi extremamente mal educado e grosseiro, tanto com o autor, quanto com a depoente, demonstrando não estar preparado para lidar com pessoas; que a depoente avisou ao cobrador que registraria queixa na polícia." [não grifado no original]

Corroborando a versão dos fatos, Francisco Nivaldo Hack informou (fl. 61):

"Que o depoente estava dentro do ônibus no dia dos fatos, sentado seis sofás para trás do autor; que como o autor esqueceu seu passe, o motorista e o cobrador queria colocá-lo para fora do ônibus, mesmo havendo uma pessoa que se prontificou a pagar a passagem; que o autor disse ao cobrador que chamaria seu patrão para pagar, mas isso também não adiantou; que os funcionários da ré foram mal educados; que o depoente considera que não se trata um ser humano como o autor foi tratado aquele dia; que o autor foi chamando de vagabundo, tendo sido indagado se estava dormindo, por ter esquecido o passe; que algumas pessoas dentro do ônibus, em razão do ocorrido, fizeram piadinhas com o autor; que o ônibus chegou a parar para a retirada do autor de dentro dele; (...) que há quatro anos, utiliza diariamente essa linha de ônibus; que costumava ver o autor utilizando a mesma linha; que o tratamento dado pela empresa aos usuários é terrível, colocando, como ocorreu hoje, oitenta pessoas em um ônibus onde só cabem quarenta; que o autor sempre pagava pela passagem dele." [não grifado no original]

Extrai-se daí que o apelado utilizava o transporte coletivo, na linha viária de Rio Negrinho com destino a São Bento do Sul, há um tempo considerável, tendo em vista seu deslocamento diário até o local de trabalho, a Padaria Pão de Mel. Ocorre que, numas dessas viagens, esqueceu-se do dinheiro da passagem; o que motivou os prepostos da empresa apelante a vociferar ofensas e a ameaçar o passageiro de ser retirado do ônibus compulsoriamente, de forma humilhante. Tal atitude se torna ainda mais grave diante da oferta de outra passageira de pagar o valor do transporte, o que não causaria qualquer prejuízo à empresa.

Mais do que um mero dissabor, a situação suportada fugiu dos padrões normais de incômodo, tendo o apelado sido chamado de vagabundo e acusado de estar embriagado em frente a dezenas de passageiros. Além do que, já não bastasse a situação vexatória, quando do estacionamento do ônibus no acostamento da via, sugeriram-lhe, motorista e cobrador, que descesse do veículo.

No mais, mesmo tendo sido ofertado por outra passageira o custeio da passagem e tendo o apelado dito que pediria o dinheiro emprestado do seu patrão quando o ônibus alcançasse o destino do trajeto, os prepostos não aceitaram as soluções e continuaram a dispensar-lhe maus tratos.

Ratifica-se também o consignado em sentença de que é irrelevante ao caso o fato da passagem não ter sido paga, isto porque é inadmitida a ofensa injusta à moral, à honra, à personalidade, o que por óbvio é capaz de gerar desprestígio social e humilhação pública. Portanto, preenchidos os pressupostos da responsabilização civil, faz-se farto na jurisprudência deste Tribunal o dever de indenizar.

De tal sorte:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INJÚRIA E/OU DIFAMAÇÃO - PROVAS TESTEMUNHAIS - ATO ILÍCITO CARACTERIZADO - ABALO MORAL CONFIGURADO - DEVER DE INDENIZAR - QUANTUM INDENIZATÓRIO - ADEQUAÇÃO DESNECESSÁRIA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. (AC n. 2007.022961-8, de Chapecó, Rel. Des. Fernando Carioni, Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Civil, j. em 12/09/2007)

No mesmo sentido, as apelações cíveis nº 2004.035739-6 e 2008.051303-7.

Em relação ao quantum indenizatório, esta Câmara o tem fixado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando em conta a malícia, o dolo ou o grau de culpa daquele que causou o dano; as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas; os antecedentes pessoais de honorabilidade e confiabilidade do ofendido; a intensidade do sofrimento psicológico gerado pelo vexame sofrido; a finalidade admonitória da sanção, para que a prática do ato ilícito não se repita; e o bom senso para que a indenização não seja extremamente gravosa, gerando enriquecimento sem causa ao ofendido, nem irrisória, que não tenha o cunho de propiciar uma compensação, minimizando os efeitos da violação ao bom nome do ofendido.

Sendo assim, melhor sorte não assiste à empresa apelante quando pleiteia a minoração da verba arbitrada, isto porque a indenização a título de reparação moral também tem a função de, comprovada a ilicitude, coibir e punir o mau atendimento, o péssimo serviço prestado e evitar que situações como esta venham a se repetir.

Por todo o exposto, vota-se no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se assim os R$ 4.000,00 (quatro mil reais) fixados em sentença, acrescidos de correção monetária desde o arbitramento e juros legais desde o evento danoso, conforme preceitua a Súmula 54 do STJ ("Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual").

DECISÃO

Ante o exposto, a Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se assim os R$ 4.000,00 (quatro mil reais) fixados em sentença, acrescidos de correção monetária desde o arbitramento e juros legais desde o evento danoso, conforme preceitua a Súmula 54 do STJ.

O julgamento, realizado no dia 2 de março de 2010, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Carlos Prudêncio, e dele participou a Excelentíssimo Senhor Desembargador Stanley da Silva Braga.

Florianópolis, 05 de março de 2010.

Edson Ubaldo
Relator




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