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segunda-feira, 19 de abril de 2010

JURID - Adulteração de sinal identificador de veículo automotor. [19/04/10] - Jurisprudência


Recurso especial. Adulteração de sinal identificador de veículo automotor. Aposição de fita isolante na placa.
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Superior Tribunal de Justiça - STJ

RECURSO ESPECIAL Nº 503.960 - SP (2003/0004872-8)

RELATOR: MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RECORRIDO: BLEY DO NASCIMENTO DE AMORIM

ADVOGADO: EURO BENTO MACIEL FILHO

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. APOSIÇÃO DE FITA ISOLANTE NA PLACA. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. ABSOLUTA IMPROPRIEDADE DO MEIO UTILIZADO. FÉ PÚBLICA QUE PERMANECE INCÓLUME. NENHUMA LESIVIDADE AO BEM JURÍDICO TUTELADO. ATIPICIDADE DA CONDUTA.

1. A aposição de fita isolante na placa de veículo automotor é facilmente perceptível, o que torna o crime de falsidade impossível, por absoluta impropriedade do meio utilizado.

2. O delito descrito no artigo 311 do Código Penal prevê no seu preceito secundário pena severa de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão e multa. Dentro desse contexto, não se pode perder de vista o bem jurídico tutelado pelo tipo penal incriminador, qual seja, a fé pública e, especialmente, a proteção da propriedade e da segurança no registro de automóvel.

3. No caso concreto, observa-se que a colocação de fita isolante para alterar letra da placa de identificação do veículo é perceptível a olho nu. O meio empregado para a adulteração não se presta à ocultação de veículo objeto de crime contra o patrimônio. Qualquer cidadão, por mais incauto que seja, tem condições de identificar a falsidade que, de tão grosseira, a ninguém pode iludir. Em suma, a fraude é risível, grotesca. Logo, a fé pública não é sequer atingida

4. Extrai-se da conduta do denunciado a intenção de ludibriar a fiscalização eletrônica - radar com dispositivo fotográfico, também chamado de pardal - e obstar, assim, o recebimento de multas por infrações administrativas. Contudo, o direito penal tem caráter fragmentário não devendo se ocupar de condutas que não danificam o bem jurídico penalmente protegido.

5. Não se está a defender a atipicidade em razão de suposta bagatela. A crença na veracidade dos sinais públicos merece proteção penal mesmo se minimamente arranhada. Porém, a situação é outra. Verifica-se atipicidade da conduta praticada porquanto o meio utilizado é absolutamente inócuo ao delito de adulteração de veículo automotor.

6. A punição de mera infração administrativa com a sanção criminal prevista tipo descrito no artigo 311 do Diploma Penal desafia a razoabilidade e proporcionalidade, porquanto a fé pública permaneceu incólume e, à míngua de lesividade ao bem jurídico tutelado, a conduta praticada pelo recorrido é atípica. Não é possível que se dê a uma molecagem - que merece sanção administrativa - o mesmo tratamento dispensado à criminalidade organizada.

7. Recurso especial ao qual se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves, Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 16 de março de 2010(Data do Julgamento)

MINISTRO CELSO LIMONGI
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)
Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (Relator): Trata-se, na origem, de habeas corpus impetrado em favor do recorrido Bley do Nascimento de Amorim, apontando como autoridade coatora o Juiz de Direito da 6ª Vara Criminal de São Paulo.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu a ordem, em acórdão assim ementado:

"Habeas Corpus" objetivando o trancamento de ação penal, por falta de justa causa, promovida contra proprietário de automóvel que teria modificado letra da chapa individualizadora de veiculo. Fato atípico.

Mera infração administrativa. Ordem conhecida e concedida para travar o persecutório, ante a inexistência de sustentação fátíco-jurídica.

Inconformado, o Ministério Público do Estado de São Paulo interpôs recurso especial, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea "c", da Constituição da República.

Alega o recorrente que o acórdão impugnado divergiu do entendimento deste Superior Tribunal, no julgamento do HC 8949/SP, Relator Ministro Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ de 25/10/1999. Sustenta, em síntese, que a conduta é típica, pois o recorrido alterou a placa do veículo, ato que se insere no tipo penal descrito no artigo 311, caput, do Código Penal.

Com contrarrazões, o recurso foi admitido.

O Ministério Público Federal opina pelo provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (Relator):

Em meu ver o acórdão vergastado não merece reparos.

Primeiramente observo que a aposição de fita adesiva ou isolante na placa de veículo automotor é facilmente perceptível, o que torna o crime de falsidade impossível, por absoluta impropriedade do meio utilizado.

Ressalte-se que o delito descrito no artigo 311 do Código Penal prevê no seu preceito secundário pena severa de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão e multa.

Dentro desse contexto, não se pode perder de vista o bem jurídico tutelado pelo tipo penal incriminador, qual seja, a fé pública e especialmente a proteção da propriedade e da segurança no registro de automóvel.

Nesse sentido é o escólio de Paulo José da Costa Júnior, in Código Penal Comentado, Ed. Saraiva, 7ª edição, pág.:

1. Conceito

Os veículos automotores dispõem, em seu chassi, ou em alguma parte visível do motor, de número e sinal identificador. Para proceder à revenda do veículo subtraído, os meliantes principiam pela remarcação dos sinais identificadores do mesmo, sobretudo o chassi.

2. Objetividade Jurídica

O dispositivo em foco destina-se precipuamente a impedir ou dificultar a remarcação ou adulteração do chassi ou de qualquer sinal identificador do veículo automotor, na luta contra a criminalidade do furto e do roubo de carros. Assim, empresta-se tutela igualmente ao patrimônio. (pág. 976/977)

Na mesma esteira, sob a coordenação de Alberto Silva Franco e Rui Stocco, in Código Penal e sua Interpretação, Editora Revista dos Tribunais, 8ª edição, pág. 1429, José Silva Júnior e Guilherme Madeira Dezem, ao comentar o delito imputado ao paciente lembram os motivos que levaram à sua criação:

A "Exposição de Motivos", acostada à Mensagem 784-MJ, da Presidência da República, encarece que 'procurando coibir a adulteração ou remarcação de chassi ou sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento', foi criado tipo autônomo - Lei 9.426, de 24.12.1996, ora sob análise - no Capítulo IV De outras falsidades., do Título X (Dos crimes contra a fé pública). Para tanto, o legislador alterou os artigos antecedentes - o art. 310 passou a parágrafo do art. 309, enquanto o 311 (primitivo veio a ocupar aquele lugar. No espaço aberto , insere-se o novo dispositivo sob a rubrica: "Adulteração de sinal identificador de veículo automotor. Aos órgãos de persecução penal, deferem-se instrumentos legais adequados à repressão de uma grave e crescente forma de criminalidade no momento em que avultam os prejuízos patrimoniais, acompanhados, em grande número de casos de violência, contra pessoa, corrupção e criminalidade organizada'. Está clara a finalidade de proteger a confiança que o público em geral deposita em sinais a que a lei atribui valor jurídico.

Objetiva o legislador resguardar a intangibilidade desses sinais." (grifamos)

No caso concreto, observa-se que a colocação de fita adesiva ou isolante para alterar letra ou número da placa de identificação do veículo é perceptível a olho nu. O meio empregado para a adulteração não se presta à ocultação de veículo objeto de crime contra o patrimônio. Qualquer pessoa, por mais incauta que seja, tem condições de identificar a falsidade que, de tão grosseira, a ninguém pode iludir. Em suma, a fraude é risível, grotesca. Logo, a fé pública não é sequer atingida

Na realidade, extrai-se da conduta do denunciado a intenção de ludibriar a fiscalização eletrônica - radar com dispositivo fotográfico, também chamado de pardal - e obstar, assim, o recebimento de multas por infrações administrativas.

Contudo, o direito penal tem caráter fragmentário não devendo ocupar-se de condutas que não danificam o bem jurídico penalmente protegido.

Sabe-se que a doutrina e jurisprudência são refratárias à aplicação do princípio da insignificância aos crimes praticados contra a fé pública. Entretanto, friso que não se está a defender a atipicidade em razão de suposta bagatela. De fato, a crença na veracidade dos sinais públicos merece proteção penal mesmo se minimamente arranhada. Porém, a situação é outra. Verifica-se atipicidade da conduta praticada porquanto o meio utilizado é absolutamente inócuo ao delito de adulteração de veículo automotor.

Cabe, de tal arte, a preciosíssima lição de Ruperto Nunez Barbero: "A norma penal não vige na abstração, mas opera na concreta realidade dos fatos, e no contexto efetivo e real destes, deve ser examinada, para eventual aplicabilidade, à vista da idoneidade de meio empregado ou impossibilidade de incidência na hipótese de inaptidão da conduta para ofender o bem jurídico tutelado." ("El delito imposible", pág. 110).

Por derradeiro, observo que a punição de mera infração administrativa com a sanção criminal prevista tipo descrito no artigo 311 do Diploma Penal desafia a razoabilidade e proporcionalidade, porquanto a fé pública permaneceu incólume e, à míngua de lesividade ao bem jurídico tutelado, a conduta praticada pelo recorrido é atípica. Não é possível que se dê a uma molecagem - que merece sanção administrativa - o mesmo tratamento dispensado à criminalidade organizada.

Posto isso, nego provimento ao recurso especial.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2003/0004872-8 REsp 503960 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 050020142080 3875603

PAUTA: 09/03/2010 JULGADO: 16/03/2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ALCIDES MARTINS

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RECORRIDO: BLEY DO NASCIMENTO DE AMORIM

ADVOGADO: EURO BENTO MACIEL FILHO

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra a Fé Pública - Adulteração de Sinal Identificador de Veículo Automotor

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves, Maria Thereza de Assis Moura e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 16 de março de 2010

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 953319 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 19/04/2010




JURID - Adulteração de sinal identificador de veículo automotor. [19/04/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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