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sexta-feira, 23 de abril de 2010

JURID - Ação Ordinária. Medicamento [23/04/10] - Jurisprudência


Paciente com hepatite será tratado pelo Estado.


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA

Proc: 001.10.006047-2
Autor: Edelvino Albuquerque da Silva
Advogado: Rodrigo Arruda Carriço
Réu: Estado do Rio Grande do Norte e outro


DECISÃO


Edelvino Albuquerque da Silva, qualificado na inicial e representado por advogado, ajuizou AÇÃO ORDINÁRIA com pedido de antecipação dos efeitos da tutela contra o Estado do Rio Grande do Norte, pleiteando provimento jurisdicional que lhe assegure o recebimento da medicação consistente em Interferon Peguilado 120 mg e Ribavirina 250 mg, por ser portador de hepatite crônica C, genótipo 3a.

Alegou que necessita da medicação especificada, consoante demonstra as declarações médicas acostadas à inicial, não possuindo, entretanto, condições econômicas de arcar com a aquisição dos medicamentos. Informou ainda que os remédios só são fornecidos pelo SUS mediante determinação judicial ou em caso do paciente não mostrar resultado com o tratamento, quando do uso inicial com o Interferon Standart.

Sustentou sua postulação no direito constitucional à saúde. Depois da fundamentação, requereu a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do art. 273 do CPC, tendo em vista a verossimilhança do direito postulado e o perigo da demora na prestação jurisdicional, de modo que os produtos lhe sejam fornecidos gratuitamente, sob pena de multa a ser arbitrada.

Antes de apreciar o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, este juízo determinou a notificação do Ente-ré e do Secretário Estadual de Saúde para esclarecer a situação descrita nos autos.

Em resposta, o Estado peticionou às fl. 32/34, suscitando que a doença do autor é assistida pelo CEAF e no protocolo específico resta claro a utilização do medicamento Interferon alfa para tratamento da hepatite C, genótipo 3, não podendo o réu modificar o protocolo.

É o relatório. Passo a decidir.

A par da declaração da parte autora de que não possui condições financeiras de arcar com as despesas processuais, sem prejuízo do sustento próprio e da família, defiro o pedido de justiça gratuita formulado à exordial, nos termos da Lei nº 1.060/50, com suas alterações posteriores.

No que concerne ao pedido de tutela antecipada, busca-se a concessão dos medicamentos especificados na exordial, sob o argumento de serem essenciais à garantia da saúde da autora.

Sobre a tutela antecipada, sabe-se que o instituto se distingue em duas espécies. Acompanha-se, neste particular, a linha do autorizado ensinamento de Kazuo Watanabe:

"O art. 273, nos incisos I e II consagra duas espécies de tutela antecipatória: a) a de urgência (nº I), que exige o requisito do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; b) a de proteção ao autor, que muito provavelmente tem razão e por isso não deve sofrer as conseqüências da demora do processo, decorrente do abuso do direito de defesa ou de manifesto propósito protelatório do réu (nº II). Para ambas as hipóteses, porém, exige o legislador o juízo de verossimilhança fundado em prova inequívoca". (1)

A hipótese sob exame refere-se à tutela antecipatória de urgência (art. 273, I do CPC).

No que diz respeito à urgência ou "periculum in mora", afigura-se plausível em face da concreta situação pelo qual passa o autor, uma vez que a demora na utilização dos medicamentos pode acarretar-lhe graves prejuízos à saúde, causando dificuldades às suas atividades cotidianas. Se o autor tiver que esperar pelo julgamento final do processo - o qual, se favorável, se sujeita, em regra, ao duplo grau de jurisdição, impedindo a eficácia da decisão enquanto não houver o reexame pelo Tribunal de Justiça, ainda que não haja recurso voluntário - o longo período já terá lhe trazido graves transtornos.

Quanto à prova inequívoca suficiente para o convencimento da verossimilhança da alegação, a considerar o momento no qual se faz o exame do processo, deve corresponder ao conceito de probabilidade, na dicção do Mestre Cândido R. Dinamarco(2).

Em sendo o direito à saúde um direito amplo e universal, os motivos apresentados pela demandante revelam-se, numa primeira análise, convincentes, mais do que simples "fumaça".

A Constituição Federal, em seu art. 196, diz que a saúde é "direito de todos e dever do Estado", que deverá ser garantido através de políticas públicas que possibilitem o acesso universal e igualitário às ações e aos serviços. Basta este dispositivo previsto no texto Constitucional para que se tenha como dever da Administração garantir o direito de todos à saúde. As normas infraconstitucionais que procuraram dar efeito integrador ao texto Constitucional, seriam até despiciendas se existisse a consciência, por parte de todos os responsáveis pelas administrações dos entes federados, de que a Constituição Federal não é apenas um pedaço de papel como chegou a dizer Lassale(3). A Constituição, com sua força normativa, constitui força que deve influir na realidade, merecendo, neste aspecto, ser transcrita a seguinte lição de Konrad Hesse:

"Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar esta ordem" (4).

O dever da Administração de concretizar o direito à saúde dos cidadãos, imposto pela Constituição, não pode ser inviabilizado através de entraves burocráticos ou qualquer outra justificativa, pois o que a Constituição da República impõe é a obrigatoriedade do Estado de garantir a saúde das pessoas, seja através de uma boa e eficiente qualidade do serviço de atendimento ou pela aquisição de medicamentos, quando indispensáveis à efetiva garantia da saúde de qualquer cidadão, para melhor lhe servir e não para aumentar seus sofrimentos e angústias.

Diante do exposto, defiro a antecipação dos efeitos da tutela requerida quanto ao pedido formulado na inicial, determinando ao Estado do Rio Grande do Norte que garanta e viabilize, imediatamente, o fornecimento do medicamento INTERFERON PEGUILADO 120 mg, aplicação subcutânea, 1 vez por semana e RIBAVIRINA 250 mg, com ingestão de 05 comprimidos ao dia, enquanto durar a prescrição médica, ou aqueles que contiverem o mesmo princípio ativo e que possam ser substituídos, no caso concreto da paciente, sob avaliação médica, para evitar que se imponha ao Estado o dever de comprar determinada marca de produto, quando for possível a substituição por outro, em respeito ao que dispõe a Lei de Licitações Públicas (n° 8.666/93) - que regulamenta o art. 37, XXI da Constituição Federal, dispondo sobre a forma de aquisição de bens e serviços pela Administração para garantir a aplicação do princípio constitucional da isonomia e a proposta mais vantajosa para o ente público contratante - vedando a adoção do critério marca nas compras efetuadas: "Art. 15. Omissis § 7°. Nas compras deverão ser observadas, ainda: I - a especificação completa do bem a ser adquirido sem indicação de marca".

Não pode então o Juiz conceder provimento jurisdicional que vincule a Administração Pública ao fornecimento de uma determinada marca ou laboratório de fabricação, se existe à disposição do jurisdicionado medicação com o mesmo perfil de atuação sendo distribuída nas unidades de saúde.

Fica estipulada a multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de R$ 10.000,00, a ser aplicada em caso de eventual descumprimento. Para o cumprimento desta decisão, o Sr. Secretário de Saúde do ente demandado deverá ser notificado pessoalmente.

Cite-se o demandado para responder à ação no prazo legal, observando-se, quanto ao mandado, o disposto nos art. 285 e 225, ambos do CPC. Se a defesa contiver matéria preliminar ou apresentar documentos, intimar a parte autora para se pronunciar, conforme preceitua o art. 327 do referido Código. Após, dê-se vista ao Representante do Ministério Público. Conclusos a seguir.

Publique-se e intime-se.


Natal, 26 de março de 2010.


Ibanez Monteiro da Silva
Juiz de Direito em substituição legal


1 - Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 33. coord. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. [Voltar]

2 - A reforma do código de processo civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 145. [Voltar]

3 - Apud GILMAR FERREIRA MENDES. apresentação à monografia A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO de KONRAD HESSE. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1991. p. 05. [Voltar]

4 - Op. cit.; p. 19. [Voltar]



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