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sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

JURID - Recurso especial. Remédio manipulado. Moderador de apetite. [15/01/10] - Jurisprudência


Recurso especial. Remédio manipulado. Moderador de apetite.
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Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 799.158 - SP (2005/0188768-2)

RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RECORRIDO: JOSÉ CARLOS DA SILVA

ADVOGADA: ANA CAROLINA MOREIRA SANTOS E OUTRO(S)

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. REMÉDIO MANIPULADO. MODERADOR DE APETITE. EXERCÍCIO ILEGAL DA MEDICINA. POSTULAÇÃO PELO TRÁFICO DE ENTORPECENTE. PROVA PERICIAL INCONCLUSIVA QUANTO AOS EFEITOS DO MEDICAMENTO. EXAME DA PROVA. SÚMULA 7.

Ao afastar o tráfico de entorpecente, o aresto deixou claro que a prova pericial não comprovou a materialidade delitiva, haja vista que a substância manipulada pelo réu não foi confirmada, pelo laudo do perito, como apta a causar a dependência química, situação que envolve o exame da prova e a verificação, por outros elementos, da tipificação penal pretendida.

Aplicação da Súmula 7 desta Corte.

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora." Os Srs. Ministros Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Nilson Naves votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 24 de novembro de 2009(Data do Julgamento)

Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora

RELATÓRIO

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):

Cuida-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público, com fundamento no art. 105, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão da Sexta Câmara do extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, proferido nos autos da Apelação n.º 1.462.051-1.

Segundo os autos, o Recorrido, JOSÉ CARLOS DA SILVA, foi condenado em primeiro grau de jurisdição em 3 anos de reclusão, por incurso nas penas do art. 12, caput, da Lei n.º 6368/76 (tráfico de entorpecentes); mais 1 ano de reclusão, em virtude da prática do crime previsto no art. 299 do Código Penal (falsidade ideológica); e a 6 meses de detenção, por conduta tipificada no art. 282, parágrafo único, do Código Penal (exercício ilegal da medicina).

Em sede de apelação da defesa, o extinto Tribunal de Alçada bandeirante resolveu absolver o Apelante da imputação de falsidade ideológica, bem assim decidiu aplicar o princípio da consunção em que restou o crime de tráfico absorvido pelo exercício irregular da medicina. Considerou, nessa extensão, que a posse das substâncias entorpecentes era conduta meio em relação à prática final, qual seja, a prática da medicina por quem não tinha habilitação específica, bem como de que não restou comprovada a materialidade delitiva.

Inconformado, o Ministério Público estadual interpôs o presente recurso excepcional, sustentando a existência de violação ao art. 12, caput, da Lei 6368/76, bem como dissídio jurisprudencial, este também extensivo à alegação de nulidade por descumprimento do rito previsto no art. 38 da lei 10.409/2002.

Diz que não é possível haver a absorção do crime de tráfico pelo crime de exercício ilegal da medicina, porquanto este é delito menos grave.

Postula-se, ao final, o provimento do recurso para reestabelecer a r. sentença condenatória.

Em contra-razões, às fls. 571/582, a defesa aduz que não foi comprovado o dissídio jurisprudencial, tampouco restou aferida a negativa de vigência do art. 12, caput, da Lei 6.368/76, havendo de se aplicar à hipótese a recomendação do enunciado 7 da Súmula desta Corte.

Em primeiro juízo de admissibilidade, o então 2º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo admitiu o apelo especial.

Nesta Corte, colheu-se o parecer do Ministério Público Federal, o qual opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):

O ponto ardoroso da discussão, sem dúvida, diz respeito à aplicação do princípio da consunção na hipótese vertente.

Como visto da exposição, o Recorrido, atuando como falso médico, prescrevia medicamento manipulado com propriedade moduladora de apetite, sendo o princípio ativo controlado pelo Ministério da Saúde e previsto em portaria como substância que causa dependência química.

Em princípio, pode-se afirmar que a questão se subsume ao crime de tráfico de entorpecentes, conforme já vem edificando esta Corte:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. CLORETO DE ETILA. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL.

1. Encontrando-se o cloreto de etila listado pela Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, no seu Regulamento técnico sobre substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial (Portaria 344, DOU de 19.5.1998), como psicotrópico - substância que causa dependência física ou psicológica, está sujeito à incidência da Lei 6368/76, art. 12 (norma penal em branco de complementação heteróloga). Por conseguinte, não há falar-se em ofensa ao princípio da reserva legal.

2. Embargos rejeitados." (EDcl no RHC 10.334/SP, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, QUINTA TURMA, julgado em 14/11/2000, DJ 18/12/2000 p. 218)

Não era, portanto, o caso de aplicar-se o princípio da consunção, haja vista a independência das condutas e, principalmente, a sobreposição do crime mais grave, na espécie, o de tráfico de entorpecentes.

No entanto, a espécie traz particularidades em face das quais me levam a curvar-se ao entendimento do Ilustre representante do Ministério Público Federal, que assim consignou:

"...tenho que prevalece o último fundamento do v. acórdão. Ainda que ele tenha sido apresentado apenas a título de força dos fundamentos precedentes (aqui tidos por insustentáveis), por si só, ele se sustenta: No 'laudo complementar de fls. 316/319, a perícia não foi capaz de precisar a quantidade de cada substância encontrada em cada cápsula do composto apreendido', e, conseqüentemente, não atestou a aptidão do fármaco receitado pelo réu para causar dependência em suas vítimas.

Com efeito, indagado se 'a mistura das substâncias ali mencionadas acarreta desaparecimento dos efeitos entorpecentes e capazes de gerar dependência', o sr. Perito, após indicar as 'doses terapêuticas preconizadas para o diazepam, um dos benzodiazepínicos mais prescritos', respondeu que 'Não há referência na literatura consultada sobre as doses utilizadas quando do uso abusivo desses medicamentos' (fl. 318). Por outro lado, ao quesito 'Qual a quantidade detectada do composto do grupo dos [dietilpropiona, anfetamínicos e benzodiazepínicos] em cada uma das misturas encontradas nas cápsulas verificadas' respondeu que 'As técnicas cromáticas utilizadas no Núcleo de Toxicologia, permitem somente a identificação das substâncias e não sua quantificação, o que torna o presente quesito prejudicado' (fl. 319).

Portanto, não restou provado se a substância ministrada pelo réu, no exercício ilegal da medicina, encontrava-se dentro dos parâmetros médicos ou se, excedendo-o, tinha potencial para causar dependência aos pacientes-vítimas."

Sem embargo do entendimento desta Corte nos seguintes termos:

"HABEAS CORPUS. EXERCÍCIO ILEGAL DA MEDICINA. CONCURSO FORMAL. ARTIGO 12 DA LEI 6.368/76. PRESCREVER MEDICAÇÃO QUE CAUSE DEPENDÊNCIA FÍSICA E/OU PSÍQUICA. NECESSIDADE DE LAUDO TOXICOLÓGICO.

FUNDAMENTAÇÃO DA CULPABILIDADE. REGIME PRISIONAL. APLICAÇÃO DO ARTIGO 44 DO CÓDIGO PENAL. AUSÊNCIA DE DOLO. CRIME PRÓPRIO.

ATIPICIDADE DA CONDUTA. MATÉRIA NÃO VENTILADA NA CORTE ESTADUAL.

SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

1. Não se conhece do pedido de habeas corpus quando a matéria impugnada não foi objeto de apreciação pela Corte Estadual, é o que se tem, na espécie, quanto à substituição da pena.

2. Dispensável o laudo toxicológico para configuração do artigo 12 da Lei 6.368/76, na hipótese de prescrição de medicamento relacionado na Portaria nº 28/86 - DIMED/MS.

3. Desnecessidade de prova efetiva da dependência física ou psíquica da vítima, por sê-lo crime de perigo abstrato, além de não ser elemento constitutivo do tipo.

4. Unidade de ação e pluralidade de crimes, tendo consciência e vontade em relação a cada um, caracteriza o concurso formal.

5. A desintenção do paciente em provocar dependência nas vítimas em nada se comunica com a existência de dolo em sua conduta, eis que caracterizada pela vontade consciente em praticar o crime, qual seja, prescrever o medicamento.

6. A discussão sobre a natureza jurídica do tipo, como próprio ou não, é, in casu, despiciente, por isso que a conduta do condenado não enseja dúvida quanto à tipificação e aplicação da lei penal imposta (artigo 12 da Lei 6.368/76).

7. Afora casos excepcionais, fazem-se estranhos ao cabimento do habeas corpus os pedidos de modificação de pena ou de regime prisional, por indispensável à individualização da pena, na sua quantidade e na definição do regime inicial do cumprimento da prisional, o exame aprofundado do conjunto da prova dos autos, no referente ao fato criminoso, às suas circunstâncias, aos seus antecedentes e suas conseqüências, e aos sujeitos do crime, o que em nada se identifica com a só consideração da sentença ou do acórdão.

8. Habeas corpus conhecido em parte e denegado nesta extensão." (HC 9.126/GO, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 05/12/2000, DJ 13/08/2001 p. 265)

A controvérsia, no meu entender, está mesmo acobertada pela incomprovação da materialidade do delito.

Tal se dá pelo fato de que o medicamento era manipulado pelo próprio réu, o que significava dizer que não havia a indicação predeterminada dos componentes da fórmula. Quando se está diante da prescrição de medicamentos encontrados no mercado, cuja formulação já é conhecida do meio médico, é fácil considerar que a perícia em nada vai acrescentar à qualificação do princípio ativo e dos efeitos dos seus componentes.

No caso dos autos, não é essa a conclusão que se pode extrair.

De fato, era de se esperar que a perícia comprovasse efetivamente o teor e a quantidade das substâncias, sob pena de se permitir a configuração do tráfico de entorpecente, que pressupõe substância química viciante (entorpecente), em situação que, na prática e pela análise química do composto, jamais poderia causar tais efeito.

Seria o mesmo que aceitar o tráfico de substância cuja característica química psicotrópica já não lhe é mais persistente em razão do tempo de sua elaboração. Estar-se diante do crime impossível, pois a saúde pública, mesmo que no plano abstrato, não seria atingida pela comercialização do produto; obviamente pela vertente do tipo penal em análise.

Dessa maneira, devo concordar com a fundamentação da defesa no sentido de antever ao recurso especial o obstáculo do exame de prova, na medida em que o acórdão recorrido inseriu elemento probatório contra a materialidade, que somente pode ser afastado pela produção de novos elementos.

Veja-se, nesse ponto, que o aresto fez menção ao depoimento de várias testemunhas, todas elas asseverando que vendiam ao Recorrido matéria-prima de ervas naturais e que não tinham conhecimento da venda de "substância controlada" (fl. 516). De igual modo foi o depoimento dos pacientes tratados pelo "falso médico": eram informados de que o medicamento continha "ervas medicinais" (fl. 515).

É de se aplicar, portanto, o enunciado 7 da Súmula desta Corte.

"PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 14 DA LEI Nº 10.826/2003.

PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE ARMA DE FOGO. SÚMULA 07 DESTA CORTE.

Inviável nesta instância, a teor do enunciado nº 7 da Súmula desta Corte, a análise de fatos que não restaram incontroversos nas instâncias ordinárias, pois demandam, necessariamente, a incursão na seara fático-probatória (Precedentes).

Recurso especial não conhecido." (REsp 980.571/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 08/11/2007, DJ 18/02/2008 p. 63)

"PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO.

SÚMULA 07 DESTA CORTE.

Em relação a alegada dispensabilidade do exame pericial para a caracterização do delito de porte ilegal de arma de fogo, inviável nesta instância, a teor do enunciado nº 7 da Súmula desta Corte, a análise de fatos que não restaram incontroversos nas instâncias ordinárias, pois demandam, necessariamente, a incursão na seara fático-probatória (Precedentes).

Recurso não conhecido." (REsp 959.005/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 25/09/2007, DJe 09/06/2008)

Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2005/0188768-2 REsp 799158 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 12982002 14620511 4440723 50020617836

PAUTA: 24/11/2009 JULGADO: 24/11/2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RECORRIDO: JOSÉ CARLOS DA SILVA

ADVOGADA: ANA CAROLINA MOREIRA SANTOS E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas - Tráfico de Drogas e Condutas Afins

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora."

Os Srs. Ministros Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Nilson Naves votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 24 de novembro de 2009

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 932064

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 14/12/2009




JURID - Recurso especial. Remédio manipulado. Moderador de apetite. [15/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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