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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

JURID - Mandado de segurança. Artigo 241 da lei nº 8.069/90. [07/01/10] - Jurisprudência


Mandado de segurança. Artigo 241 da lei nº 8.069/90. Utilização da rede mundial de computadores (internet).


Tribunal Regional Federal - TRF 3ª Região.

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 2009.03.00.009883-9/SP

RELATOR: Desembargador Federal HENRIQUE HERKENHOFF

IMPETRANTE: Ministerio Publico Federal

ADVOGADO: MARTA PINHEIRO DE OLIVEIRA SENA e outro

IMPETRADO: JUIZO FEDERAL DA 8 VARA CRIMINAL SAO PAULO SP

No. ORIG.: 2009.61.81.001416-0 8P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ARTIGO 241 DA LEI Nº 8.069/90. UTILIZAÇÃO DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES (INTERNET). DELITO PREVISTO EM CONVENÇÃO INTERNACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. QUEBRA DE SIGILO TELEMÁTICO. POSSIBLIDADE DE INVESTIGAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. SEGURANÇA CONCEDIDA.

1. Indeferimento do pedido formulado pelo MP, no procedimento de quebra de sigilo telemático instaurado para apurar delito de veiculação de imagens de cunho pornográfico, com menores e adolescentes pela internet.

2. Considerando-se o disposto na convenção sobre os direitos da criança e quando praticado por meio da rede mundial de computadores (internet),compete à justiça federal processar e julgar o crime de divulgação de imagens pornográficas envolvendo crianças ou adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 241), a teor da regra do inciso V do artigo 109 da Constituição Federal.

3. A legitimidade do Ministério Público para conduzir diligências investigatórias decorre de expressa previsão constitucional, regulamentada pela Lei Complementar n.º 75/93. É consectário lógico da própria função do órgão ministerial - titular exclusivo da ação penal pública -, proceder a coleta de elementos de convicção, a fim de elucidar a materialidade do crime e os indícios de autoria.

4. A competência da polícia judiciária não exclui a de outras autoridades administrativas. Inteligência do art. 4º, § único, do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ.

5. Segurança concedida, para suspender os efeitos da decisão impugnada, decretando a quebra do sigilo telemático da página do sítio de relacionamentos ORKUT, identificada pelo ID "15814835566812185840", possibilitando o Ministério Público o acesso irrestrito aos seus dados, bem como para tornar possível a prática de outros atos necessários à investigação do crime objeto dos autos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, conceder a segurança, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 15 de outubro de 2009.

Henrique Herkenhoff
Desembargador Federal

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF (Relator):

Na dicção da Lei, cabe mandado de segurança tanto para reprimir como para prevenir, isto é, para evitar os efeitos de um ato iminente. É o que dispõe o artigo 1.º da Lei n.º 1.533/51:

"Art. 1.º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas corpus", sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça."

In casu, o exame dos autos revela, a iminência de que o ato inquinado de ilegal pode vir a ser perpetrado, isto é, conforme ressaltado pela Ilustre representante do órgão ministerial oficiante em segunda instância: caso seja mantida a decisão recorrida, é muito provável que, no lapso entre a instauração do inquérito e a nova manifestação pela quebra de dados, estes sejam perdidos, o que acarretaria a falta de punição do crime. (folha 132 verso)

No que tange à competência, dúvida não há de que cinge-se à esfera federal, de acordo com a mesma autoridade, cuja argumentação adoto:

É competência da Justiça Federal processar e julgar crimes de pornografia infantil veiculada na rede mundial de computadores. O simples fato de imagens contendo pornografia infantil terem sido veiculadas em um sítio eletrônico, que pode ser acessado por pessoas de todo o mundo, atrai para a Justiça Federal a competência em conhecer do feito. Nesse caso, as imagens podem ser acessadas por qualquer pessoa que possua um computador com acesso à internet, esteja ela localizada dentro ou fora do território nacional. Não existindo meios, portanto, de aferir a dimensão real do delito praticado, correto o entendimento de que é da competência da Justiça Federal a análise do caso. Assim, é de atribuição da Justiça Federal e do Ministério Público Federal a repressão aos crimes de pornografia infantil praticados pela internet (artigo 241, do Estatuto da Criança e do Adolescente). Os casos excepcionais, que terão seu processamento e julgamento feitos pela Justiça Estadual, são aqueles em que a transmissão de imagens com pornografia envolvendo criança ou adolescente ocorrer de maneira individualizada entre pessoas localizadas no território nacional, o que acontece em uma troca de emails, por exemplo. No caso em exame, como acima explicitado, isso não ocorreu, uma vez que a página de relacionamentos Orkut não é privativa de pessoas localizadas no território nacional, podendo ser acessada e integrada por indivíduos de qualquer ponto do planeta, alargando sobremaneira as consequências desse nefasto crime. A rede mundial de computadores - internet- tem sido sistematicamente utilizada para o cometimento de crime de pedofilia, subjugando crianças e adolescentes na covardia do suposto anonimato. A pornografia infantil encontrou seu auge na internet. (fl. 136 verso)

A rede mundial de computadores mostra-se como meio eficaz, se não o mais, a tornar públicas informações de quaisquer gêneros, incluindo aquelas que a lei penal tipifica como ilícitas, ao aplicar-lhes as respectivas sanções, como é o caso do artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

É certo, ainda, que tais informações são acessíveis em qualquer parte do mundo em que se disponha de um terminal de computador conectado à referida rede.

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE DIVULGAÇÃO DE IMAGENS PORNOGRÁFICAS ENVOLVENDO CRIANÇAS E ADOLESCENTES. LEI N.º 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE), ART. 241. UTILIZAÇÃO DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES (INTERNET). CONDUTA TÍPICA, MESMO ANTES DO ADVENTO DA LEI N.º 10.764/2003. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.

1. Mesmo antes do advento da Lei n.º 10.764/2003, a conduta de veicular, pela rede mundial de computadores (internet), imagens pornográficas envolvendo criança ou adolescente já configurava o crime previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

2. Considerando-se o disposto nos artigos 19 e 34 da convenção sobre os direitos da criança (Resolução n.º 44 da assembléia geral da organização das nações unidas, de 20 de novembro de 1989, incorporada no território pátrio pelo Decreto Legislativo n.º 28/90 e pelo Decreto n.º 99.710/90), bem assim a regra do inciso V do art. 109 da Constituição Federal, compete à justiça federal processar e julgar o crime de divulgação de imagens pornográficas envolvendo crianças ou adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 241), quando praticado por meio da rede mundial de computadores (internet).

3. Recurso ministerial provido.

(TRF3R-RCCR 3541; Proc. 2004.61.81.000663-2; SP; Segunda Turma; Rel. Desembargador Federal Nelton dos Santos; J. 31/8/2004; DJU 24/9/2004; P.395)

PENAL. RECURSO CRIMINAL. ARTIGO 241 DA LEI Nº 8.069/90. DELITO PREVISTO EM CONVENÇÃO INTERNACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.

1. Procedimento de quebra de sigilo telemático instaurado para apurar delito de veiculação de imagens de cunho pornográfico, com menores e adolescentes pela internet.

2. Convenção sobre os direitos da criança incorporados ao direito pátrio pelo Decreto Legislativo Nº 28, de 24.09.90 e Decreto Nº 99.710, de 21.11.90.

3. Divulgação de fotos pornográficas de menores pela rede mundial de computadores (internet). Delito que produz efeitos além do território nacional.

4. Configurado o crime previsto em tratado internacional (art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente), aplica-se o disposto no artigo 109, V, da Constituição Federal.

5. Recurso a que se dá provimento, para reconhecer a competência da justiça federal e determinar o processamento do feito perante a 8ª Vara Federal criminal de São Paulo.

(TRF3R-RCCR 3450; Proc. 2003.61.81.000927-6/SP; Primeira Turma; Relª Desembargadora Federal Vesna Kolmar; J. 30/11/2004; DJU 10/02/2005; P. 81)

Corroborando o entendimento acima exposto, extrai-se das lições de Carla Rodrigues Araújo Castro, ao comentar o aludido artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente, o seguinte excerto:

Publicar é tornar público, divulgar. Quem insere fotos de crianças ou adolescentes em cena de sexo na Internet está publicando e, assim, cometendo a infração. O crime pode ser praticado através de sites ou homepages , muitas delas destinadas à pornografia. É importante salientar que não importa o número de internautas que acessem a página, ainda que ninguém conheça seu conteúdo, as imagens estarão à disposição de todos, configurando a infração. Aliás, o crime se consuma quando as imagens estão a disposição do público.

(Crimes de Informática e seus Aspectos Processuais, 2ª Ed. rev. amp. e atual., Editora Lumen Juris, 2003, p. 46).

A consumação do ilícito previsto no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente ocorre no ato de publicação das imagens pedófilo-pornográficas, sendo indiferente a localização do provedor de acesso à rede mundial de computadores onde tais imagens encontram-se armazenadas, ou a sua efetiva visualização pelos usuários.

In casu, do pedido de quebra de sigilo de dados telemáticos formulado pelo Ministério Público Federal infere-se que, em cumprimento ao Termo de Ajustamento de Conduta - (TAC - fls. 35/46 e 54/65) - firmado entre a Procuradoria da República no Estado de São Paulo (compromissária) , tendo, de um lado, como interveniente anuente a organização não governamental SAFERNET BRASIL e de outro, na qualidade de compromitente a empresa GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., na página do sítio de relacionamentos ORKUT, identificada pelo ID "15814835566812185840", foram encontradas fotografias contendo pornografia infantil.

A notícia da prática delitiva foi levada a efeito pela empresa compromitente GOOGLE, em cumprimento ao disposto na cláusula segunda, alínea "e" do TAC, cujas provas foram devidamente preservadas para serem entregues mediante ordem judicial, nos termos da alínea "a" da cláusula segunda do documento em epígrafe. (fls. 27/30)

Em face dos indícios de prática delitiva perpetrada contra crianças, a autoridade impetrada determinou a extração de cópia integral dos autos e remessa ao departamento de Polícia Federal para a instauração de inquérito, sob o fundamento de que a atribuição de investigar é privativa da polícia, postergando-se, assim, a análise do pedido para após a formalização do referido procedimento investigatório.

Destacou, naquela oportunidade, o posicionamento emanado da Excelsa Corte no julgamento do Recurso em Habeas Corpus nº 81.326/DF,da Relatoria do Excelentíssimo Ministro Nelson Jobim, em 06 de maio de 2003, cuja fundamentação baseou-se em paradigma datado de 1936, sobre a ausência de legitimidade do órgão ministerial para realizar diretamente investigações e diligências em procedimentos administrativos investigatórios com o escopo da apuração de crime cometido por funcionário público. (fls. 50/52).

Dispõe o artigo 129 da Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I- promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

[...]

VI- expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;

VII- exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;

VIII- requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais. (grifos acrescidos.)

Esse dispositivo encontra-se regulamentado pela Lei Complementar n.º 75/93 que estabelece:

Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:

I - notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada;

[...]

V - realizar inspeções e diligências investigatórias ;

VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; (grifos acrescidos.)

Nesse contexto, verifica-se que a legitimidade do Ministério Público para realizar diligências investigatórias, que não se confunde com investigação direta, decorrente de expressa previsão constitucional e regulamentada pela citada Lei Complementar.

Proceder à colheita de elementos de convicção, a fim de elucidar a materialidade do crime e os indícios de autoria, é um consectário lógico da própria função do órgão ministerial de promover, com exclusividade, a ação penal pública.

O próprio Código de Processo Penal é claro ao estabelecer, no parágrafo único do seu artigo 4º, que a sua competência não exclui a de outras autoridades administrativas, de onde se conclui que a Polícia Judiciária não possui o monopólio da investigação criminal.

Exemplos disso são as investigações efetuadas pelas Comissões Parlamentares de Inquérito, inquérito judicial presidido pelo juiz de direito da vara falimentar e o inquérito em caso de infração penal cometida na sede ou dependência do Supremo Tribunal Federal (artigo 43 do RISTF).

"Aliás, entender de forma diversa, é o mesmo que passar às polícias a titularidade da ação penal, pois o Ministério Público, ao denunciar, estaria adstrito aos fatos ilícitos que a polícia achasse por bem investigar. Criar-se-ia, então, um absurdo jurídico em que a polícia teria o controle sobre as ações do Ministério Público. Isso se tornaria ainda mais grave em casos como o sub judice em que a própria autoridade policial é a investigada. Não foi por outra razão, senão esta, a atribuição de controle externo da atividade policial dada ao Ministério Público. E também não existe "justa causa" maior do que essa a legitimar a atitude do Ministério Público."

(STJ - Habeas Corpus n.º 12.704/DF, Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJ de 18/11/2002)

CRIMINAL. RESP. PUBLICAR CENA DE SEXO EXPLÍCITO OU PORNOGRÁFICA ENVOLVENDO CRIANÇA E ADOLESCENTE VIA INTERNET. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALÍNEA "A" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. MATÉRIA DEBATIDA NA INSTÂNCIA A QUO A DESPEITO DA NÃO INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. INVESTIGAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. SÚMULA 234/STJ. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ANÁLISE DOS TERMOS PUBLICAR E DIVULGAR. IDENTIFICAÇÃO DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES PARA A CONFIGURAÇÃO DO DELITO. DESNECESSIDADE. ECA. DESTINATÁRIOS. CRIANÇAS E ADOLESCENTES COMO UM TODO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. PRERROGATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. TITULAR DA AÇÃO PENAL PÚBLICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

[...]

IV. Afasta-se a idéia da exclusividade da polícia judiciária para proceder às investigações de infrações penais, uma vez que o Ministério Público tem competência para tanto, e essa atuação não o impede dar início à ação penal correspondente. Súmula 234/STJ.

V. Hipótese em que o Tribunal a quo afastou a tipicidade da conduta dos réus, sob o fundamento de que o ato de divulgar não é sinônimo de publicar, pois "nem todo aquele que divulga, publica", entendendo que os réus divulgavam o material, "de forma restrita, em comunicação pessoal, utilizando a internet", concluindo que não estariam, desta forma, publicando as imagens.

VI. Se os recorridos trocaram fotos pornográficas envolvendo crianças e adolescentes através da internet, resta caracterizada a conduta descrita no tipo penal previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma vez que permitiram a difusão da imagem para um número indeterminado de pessoas, tornando-as públicas, portanto.

VII. Para a caracterização do disposto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, "não se exige dano individual efetivo, bastando o potencial. Significa não se exigir que, em face da publicação, haja dano real à imagem, respeito à dignidade etc. de alguma criança ou adolescente, individualmente lesados. O tipo se contenta com o dano à imagem abstratamente considerada.".

VIII. O Estatuto da Criança e do Adolescente garante a proteção integral a todas as crianças e adolescentes, acima de qualquer individualização.

IX. A proposta de suspensão condicional do processo incumbe ao Ministério Público, titular da ação penal pública, sendo inviável sua propositura pelo julgador.

X. Recurso parcialmente provido, para cassar o acórdão recorrido, dando-se prosseguimento à ação penal instaurada contra os réus.

(STJ - REsp 617.221/RJ, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 19/10/2004, DJ 09/02/2005, p. 214)

CRIMINAL. HC. TORTURA. CONCUSSÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. ATOS INVESTIGATÓRIOS. LEGITIMIDADE. ATUAÇÃO PARALELA À POLÍCIA JUDICIÁRIA. CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL. ÓRGÃO MINISTERIAL QUE É TITULAR DA AÇÃO PENAL. INEXISTÊNCIA DE IMPEDIMENTO OU SUSPEIÇÃO. SÚMULA N.º 234/STJ. ORDEM DENEGADA.

1- São válidos os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público, na medida em que a atividade de investigação é consentânea com a sua finalidade constitucional (art.129, inciso IX, da Constituição Federal), a quem cabe exercer, inclusive, o controle externo da atividade policial.

2- Esta Corte mantém posição no sentido da legitimidade da atuação paralela do Ministério Público à atividade da polícia judiciária, na medida em que, conforme preceitua o parágrafo único do art. 4º do Código de Processo Penal, sua competência não exclui a de outras autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Precedentes.

3- Hipótese na qual se trata de controle externo da atividade policial, uma vez que o órgão ministerial, tendo em vista a notícia de que o adolescente apreendido pelos policiais na posse de substância entorpecente teria sofrido torturas, iniciou investigação dos fatos, os quais ocasionaram a deflagração da presente ação penal.

4- Os elementos probatórios colhidos nesta fase investigatória servem de supedâneo ao posterior oferecimento da denúncia, sendo o parquet o titular da ação penal, restando justificada sua atuação prévia.

5- "A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia" (Súmula n.º 234/STJ).

6- Ordem denegada.

(STJ - HC 84.266/RJ, Rel. Min. JANE SILVA, Desembargadora convocada do TJMG, DJ 22/10/07)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS . ABUSO DE AUTORIDADE E PRIVAÇÃO DE LIBERDADE DE ADOLESCENTE SEM ORDEM JUDICIAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. PODERES DE INVESTIGAÇÃO. LEGITIMIDADE.

1. A legitimidade do Ministério Público para conduzir diligências investigatórias decorre de expressa previsão constitucional, oportunamente regulamentada pela Lei Complementar n.º 75/93.

2. É consectário lógico da própria função do órgão ministerial - titular exclusivo da ação penal pública - proceder à coleta de elementos de convicção, a fim de elucidar a materialidade do crime e os indícios de autoria, mormente quando se trata de crime atribuído a autoridades policiais que estão submetidas ao controle externo do Parquet.

3. A ordem jurídica confere explicitamente poderes de investigação ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da Lei Complementar n.º 75/1993.

4. A competência da polícia judiciária não exclui a de outras autoridades administrativas. Inteligência do art. 4º, parágrafo único, do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ.

5. Recurso desprovido.

(STJ - RHC 18.845/DF, Relatora Ministra LAURITA VAZ, DJ 11/02/08)

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. PECULATO (ART. 317 DO CPB). POLICIAL MILITAR. CONDENAÇÃO A 7 ANOS E 3 MESES DE RECLUSÃO, EM REGIME SEMI-ABERTO, E MULTA. PERDA DO CARGO PÚBLICO. NULIDADE DO PROCESSO. COLHEITA DE PROVAS NA FASE INQUISITIVA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR. EXCESSO DE PRAZO. PROLAÇÃO DE SENTENÇA. VEDAÇÃO DO APELO EM LIBERDADE. MANUTENÇÃO DOS ELEMENTOS ENSEJADORES DA CUSTÓDIA PREVENTIVA. ILEGALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.

1. [...]

5. O Ministério Público tem legitimidade para instaurar procedimento investigativo com o fim de apurar eventual prática de ilícito penal.

6. Parecer do MPF pela denegação da ordem.

7. Ordem denegada.

(STJ - HC 89.062/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 21/8/2008, DJe 15/9/2008)

Como se sabe, a atuação do Parquet não está adstrita à existência do inquérito policial, podendo este ser dispensado, na hipótese de já existirem elementos suficientes para embasar a propositura da ação penal.

Se o inquérito é dispensável, e assim o diz expressamente o artigo 39, parágrafo 5º, do Código de Processo Penal, e se o Ministério Público pode denunciar com base apenas nos elementos que possui, nada há que imponha a exclusividade às polícias para investigar os fatos criminosos sujeitos à ação penal pública.

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS PREVENTIVO. ART. 1º, INCISO XIII, DO DECRETO-LEI Nº 201/67. PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES SEM CONCURSO PÚBLICO CONTRA EXPRESSA DISPOSIÇÃO DE LEI E EM OFENSA AO DISPOSTO NO ART. 37, INCISO II, DA LEX FUNDAMENTALIS. CONDUTA QUE SE ENQUADRA, EM TESE, NO TIPO PENAL IMPUTADO AO PACIENTE. DENÚNCIA QUE DESCREVE SATISFATORIAMENTE A CONDUTA APARENTEMENTE TÍPICA. O AFASTAMENTO DO CARGO DE PREFEITO EM RAZÃO DO RECEBIMENTO DE DENÚNCIA É PREVISTO NA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA QUE EXIGE A DEVIDA FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DADOS QUE COMPROVE QUE O PACIENTE ESTÁ NA IMINÊNCIA DE SOFRER CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

I - Na esteira de precedentes desta Corte, malgrado seja defeso ao Ministério Público presidir o inquérito policial propriamente dito, não lhe é vedado, como titular da ação penal, proceder investigações. A ordem jurídica, aliás, confere explicitamente poderes de investigação ao Ministério Público - art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, e art. 26 da Lei nº 8.625/1993 (Precedentes).

II - Por outro lado, o inquérito policial, por ser peça meramente informativa, não é pressuposto necessário à propositura da ação penal, podendo essa ser embasada em outros elementos hábeis a formar a opinio delicti de seu titular. Se até o particular pode juntar peças, obter declarações, etc., é evidente que o Parquet também pode. Além do mais, até mesmo uma investigação administrativa pode, eventualmente, supedanear uma denúncia.

[...] Habeas corpus denegado.

(STJ - HC 107.939/BA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 24/11/2008, DJe 02/02/2009)

HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. EXISTÊNCIA DE SUPORTE PROBATATÓRIO MÍNIMO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. POSSIBLIDADE DE INVESTIGAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DELITOS PRATICADOS POR POLICIAIS. ORDEM DENEGADA.

1. A presente impetração visa o trancamento de ação penal movida em face dos pacientes, sob a alegação de falta de justa causa e de ilicitude da denúncia por estar amparada em depoimentos colhidos pelo ministério público.

2. A denúncia foi lastreada em documentos (termos circunstanciados) e depoimentos de diversas testemunhas, que garantiram suporte probatório mínimo para a deflagração da ação penal em face dos pacientes.

[...] 5. É perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito. Tal conclusão não significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também a formação da opinio delicti.

6. O art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao parquet a privatividade na promoção da ação penal pública. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia.

7. Ora, é princípio basilar da hermenêutica constitucional o dos "poderes implícitos", segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim - promoção da ação penal pública - foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que "peças de informação" embasem a denúncia.

8. Cabe ressaltar, que, no presente caso, os delitos descritos na denúncia teriam sido praticados por policiais, o que, também, justifica a colheita dos depoimentos das vítimas pelo Ministério Público.

9. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.

(STF - HC 91.661, Relatora Ministra ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 10/3/2009, DJe-064 DIVULG 02-4-2009 PUBLIC 03-4-2009, v. 5, n. 29, 2009, p. 103-109)

Ainda que assim não fosse, o artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, dispõe que a cláusula da reserva de jurisdição incide exclusivamente sobre as comunicações telefônicas, cujo sigilo apenas poderá ser afastado pelo Judiciário, para fins de investigação criminal.

Por outro lado, a Lei nº 9.296/96, que regulamentou o referido dispositivo constitucional, estendeu sua aplicação à interceptação de comunicações em sistemas de informática e telemática.

E o artigo 3º, da Lei 9.296/96 confere legitimidade ao Ministério Público para formular o pedido de quebra de sigilo de dados telemáticos.

É firme o entendimento do STJ no sentido de que é prescindível a prévia instauração de inquérito ou ação penal para a decretação de sigilo telefônico, exigindo-se apenas a demonstração da existência de indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal punida com reclusão.

CRIMINAL. HC. QUEBRA DE SIGILOS BANCÁRIO, FISCAL, TELEFÔNICO E TELEMÁTICO. QUEBRA BASEADA NAS DECLARAÇÕES DE UMA SÓ PESSOA. ANÁLISE RESTRITA À SUA CAPACIDADE DE CONFIGURAR INDÍCIO DE AUTORIA E PARTICIPAÇÃO. APTIDÃO NÃO-ATACADA. INEXISTÊNCIA DE OUTROS MEIOS DE PROVA. DISPONIBILIZAÇÃO ESPONTÂNEA DE INFORMAÇÕES PELO PACIENTE. DESNECESSIDADE AFASTADA EM RELAÇÃO AOS SIGILOS TELEFÔNICO E TELEMÁTICO E FALTA DE INTERESSE JURÍDICO EM RELAÇÃO AOS SIGILOS BANCÁRIO E FISCAL. INSTALAÇÃO PRÉVIA DE INQUÉRITO POLICIAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. VIOLAÇÃO À LIBERDADE DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. INOCORRÊNCIA. PARTICIPAÇÃO DEVIDO A FATORES DE ORDEM FAMILIAR E PESSOAL. PRERROGATIVAS QUE NÃO PODEM ACOBERTAR DELITOS. NATUREZA ABSOLUTA INEXISTENTE. DIVULGAÇÃO DE DADOS DECORRENTES DAS QUEBRAS. DETERMINAÇÃO EM CONTRÁRIO. ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO DA DENÚNCIA. IMPROPRIEDADE. CRIMES DIVERSOS DOS ORA ANALISADOS. LEGALIDADE DA MEDIDA DEMONSTRADA. LIMINAR CASSADA. ORDEM DENEGADA.

[...] Não se pode condicionar a quebra do sigilo bancário, fiscal, telefônico e telemático à instauração prévia do procedimento investigatório, devendo-se exigir, apenas, que a necessidade de sua realização para a apuração da infração penal seja demonstrada, em consonância com os indícios de autoria ou participação no ilícito e desde que a prova não possa ser feita por outros meios disponíveis. A legislação fala em "investigação criminal", não prevendo, para a interceptação telefônica, a instalação prévia de inquérito policial.

[...] Não há ilegalidade na decisão que decreta a quebra dos sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático do paciente, se devidamente demonstrada tanto a presença de indícios suficientes de participação em crime, como a peculiaridade de ser a única forma eficaz e disponível para a elucidação dos fatos.

Ordem denegada, cassando-se a liminar anteriormente deferida.

(STJ - HC 20.087/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 19/8/2003, DJ 29/9/2003, p. 285)

Dessarte, mostra-se cabível a impetração, uma vez presentes a liquidez e certeza do direito vindicado.

É competência da Justiça Federal processar e julgar crimes de pornografia infantil, delito insculpido no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a uma, em razão de que as suas imagens são veiculadas na rede mundial de computadores e, a duas, por tratar-se de crime previsto em tratado internacional, aplicando-se o disposto no artigo 109, inciso V, da Constituição Federal.

Plausível, outrossim, a tese veiculada pelo órgão ministerial, uma vez que o membro do Parquet tem legitimidade para requerer ao Judiciário o afastamento do sigilo de dados telemáticos, assim como para promover atos próprios de investigação penal.

Com tais considerações, CONCEDO A SEGURANÇA para suspender os efeitos da decisão impugnada, decretando a quebra do sigilo telemático da página do sítio de relacionamentos ORKUT, identificada pelo ID "15814835566812185840", possibilitando o Ministério Público o acesso irrestrito aos seus dados, bem como para tornar possível a prática de outros atos necessários à investigação do crime objeto dos autos.

É o voto.

Henrique Herkenhoff
Desembargador Federal

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF (Relator):

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pelo Ministério Público Federal contra ato da Juíza Federal da 8ª Vara Criminal de São Paulo, que exigiu prévia instauração de inquérito policial, sob o fundamento de que o representante do Parquet Federal não possui poderes investigatórios nos autos do processo nº 2009.61.81.001416-0, que postula a quebra do sigilo de dados telemáticos.

O quanto formulado no mencionado feito tende à obtenção de informações relativas ao responsável pela criação de uma página no sítio do ORKUT, que veicula conteúdo de pornografia infantil (crime tipificado no artigo 241 da Lei nº 8.069/90, com a redação dada pela Lei nº 11.829/2008).

A impetrante assegura que detém legitimidade para a impetração, em razão da presença de direito líquido e certo assegurado pela Constituição Federal, pela Lei Complementar nº 75/93 e pela Lei nº 8.625/93, bem como para requerer ao Judiciário o pedido epigrafado, independentemente de instauração de inquérito policial.

Requer liminarmente a cassação da decisão, "a fim de ser garantida a iniciativa e legitimidade do Ministério Público Federal para a formulação do pedido de quebra de sigilo de dados telemáticos diretamente ao Juízo competente, bem assim para a realização de atos de investigação do grave crime de pornografia infantil objeto dos referidos autos. (fls. 05/06)"

Aponta para a competência da Justiça Federal, uma vez verificado o requisito da transnacionalidade, exigido pelo inciso V do artigo 109 da Constituição da República.

Por último, vindica a decretação do sigilo dos autos.

O pedido de liminar e da determinação do segredo de justiça foram deferidos. (fls. 111/114)

A autoridade impetrada prestou informações, que foram encartadas às folhas 122/123.

Das cópias dos documentos colacionados pela MM. Juíza, infere-se que o requerimento de quebra de sigilo telemático formulado pelo órgão ministerial foi indeferido.

A magistrada entende ser necessário que o delito em testilha seja consumado em território estrangeiro para que a competência seja atraída para o âmbito federal. (fls. 124/126)

O Ministério Público Federal opinou pela concessão da segurança. (fls. 132/137)

É o relatório.

Henrique Herkenhoff
Desembargador Federal

D.E. Publicado em 27/11/2009




JURID - Mandado de segurança. Artigo 241 da lei nº 8.069/90. [07/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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