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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

JURID - Contribuição previdenciária. [19/01/10] - Jurisprudência


Contribuição previdenciária não incide sobre o trabalho do preso.
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Poder Judiciário

JUSTIÇA FEDERAL

Seção Judiciária do Estado de Sergipe

Processo nº 2008.85.00.003187-5 - Classe 29 - 3ª Vara

Ação: Ordinária

Partes: Autor: ESTADO DE SERGIPE

Ré: UNIÃO FEDERAL

PREVIDENCIÁRIO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA INCIDENTE SOBRE REMUNERAÇÃO DECORRENTE DO TRABALHO DO PRESO. INEXIGIBILIDADE.INEXISTÊNCIA DE NORMA LEGAL ELEGENDO O PRESO COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. REVOGAÇÃO DA NORMA PREVISTA NO ART. 9º, V, "O", DO DECRETO Nº 3048/99. EFICÁCIA DO ART. 97, III, DO CTN. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.

SENTENÇA:

Vistos etc.

O ESTADO DE SERGIPE, pessoa jurídica de direito público interno, ingressa com a presente AÇÃO SUMÁRIA em desfavor da UNIÃO, relatando que a incidência de contribuição previdenciária sobre a remuneração auferida pelo apenado, preso nos regimes fechado e semi-aberto, em contraprestação pelo trabalho exercido no interior do estabelecimento ou fora dele, tornou-se prevista no art. 9º, inciso V, alínea o, do Decreto nº 3.048/99 - Regulamento da Previdência Social, com redação dada pelo art. 1º do Decreto nº 4.729/2003, passando a autarquia previdenciária, a partir desta data, a cobrar a exação fiscal correspondente, sem observar que estaria extrapolando os limites da lei de custeio.

Esclarece que a Instrução Normativa INSS/DC nº 100/2003 estabeleceu, em seu art. 12, XXV, a filiação obrigatória, ao Regime Geral da Previdência Social, dos apenados recolhidos à prisão, sob os regimes fechado e semi-aberto, que prestam serviços remunerados dentro ou fora do presídio, a uma ou mais empresas, como também daqueles que exercem atividade artesanal por conta própria.

Enfatiza que a Lei nº 8.212/91 não prevê a contribuição individual do apenado que trabalha dentro ou fora do presídio, mediante remuneração, salientando que a forma genérica que, supostamente, serviu de base para a indigitada norma regulamentar inclui na categoria de contribuinte individual aquele que "presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego", não se enquadrando o preso nesta hipótese, nem em qualquer hipótese discriminada na lei, razão pela qual entende que é ilegal a inovação da base de incidência da contribuição previdenciária por meio de decreto.

Salienta que a ampliação das bases de incidência da contribuição previdenciária, com inclusão do trabalho remunerado do preso condenado apresenta o inconveniente de ser nociva aos fundamentos da política nacional de execução penal, visto que cria embaraços à contratação de serviços dos internos pelas empresas.

Requer, liminarmente, com o fito de suspender a exigibilidade do tributo questionado, provimento jurisdicional que lhe possibilite depositar, mensalmente, o quantum supostamente devido, bem como o valor referente ao período de 03/2007 a 02/2008, cujos consectários de juros e multa, acrescidos do principal, atingem o montante de R$ 104.844,54 (cento e quatro mil, oitocentos e quarenta e quatro reais e cinqüenta e quatro centavos) e que, afinal, seja reconhecida a ilegalidade da norma regulamentar prevista no art. 9º, inciso V, alínea "o", do regulamento da Previdência Social, que considerou segurado obrigatório da Previdência Social a pessoa recolhida à prisão que presta serviços remunerados.

Junta documentos de fls. 13/336.

Deferida a medida liminar requestada, fls. 341/345, determinando o depósito do valor da contribuição previdenciária questionada, convertendo o rito do feito em ordinário.

A União Federal oferta a sua contestação, fls. 349/352, argüindo, preliminarmente, a incompetência deste Juízo para processar e julgar a lide, nos termos do art. 102, inciso I, alínea "f", da Constituição Federal, pleiteando que seja anulada a liminar deferida e determinada a remessa dos autos ao Egrégio Supremo Tribunal Federal.

No mérito, a ré sustenta a legitimidade da exigência da contribuição previdenciária em tela, embasando-se na norma contida no art. 109 do Código tributário Nacional, na alínea "g", do inciso V, do art. 12, da Lei nº 8.212/91 e no art. 9º, inciso V, alínea "o", do Decreto nº 3.048/99, pedindo a improcedência da postulação.

Manifestando-se sobre a contestação, o autor repele a preliminar de incompetência deste Juízo para processar e julgar a lide, salientando que nos casos em que se discute questões de natureza tributária o conflito federativo não se perfaz, afastando-se a aplicação do art. 102, inciso I, alínea "f", da Carta Magna, trazendo à colação jurisprudência favorável à sua tese.

Quanto à matéria de fundo, o Estado de Sergipe reitera os argumentos expendidos na proemial.

É o breve relato.

Decido.

I- DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

A argüição não prospera. O próprio Supremo Tribunal Federal já assentou a melhor interpretação a ser extraída do art. 102, I, "f", da Carta Política, positivando que a referida competência originária " (...) tem caráter de absoluta excepcionalidade, restringindo-se a sua incidência às hipóteses de litígios cuja potencialidade ofensiva revele-se apta a vulnerar a harmonia do pacto federativo."

Óbvio que não é a situação retratada nos autos, onde uma questão de ordem previdenciária ou tributária de ínfima relevância financeira jamais poderia por em risco a estabilidade da Federação.

A ementa abaixo é bastante elucidativa:

"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA. CONFLITO ENTRE AUTARQUIA FEDERAL E ESTADO-MEMBRO. AUSÊNCIA DE RISCO AO PACTO FEDERATIVO. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 102, I, "F", DA CB/88. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que a competência originária que lhe é atribuída pelo artigo 102, I, "f", da Constituição do Brasil, tem caráter de absoluta excepcionalidade, restringindo-se a sua incidência às hipóteses de litígios cuja potencialidade ofensiva revele-se apta a vulnerar a harmonia do pacto federativo. Precedentes. 2. Incompetência deste Supremo Tribunal para processar e julgar, originariamente, causas entre Estado-membro e autarquia federal com sede ou estrutura regional de representação no território estadual respectivo. Competência da Justiça Federal. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento." (STF, RE-AgR 512468).

II - DO MÉRITO

No mérito, pretende o requerente que seja declarada a inexistência de relação jurídica tributária que o obrigue ao recolhimento das contribuições previdenciárias previstas no art. 22, inciso III, da Lei nº 8.212/91, bem assim do desconto e recolhimento previsto no art. 4º da Lei nº 10.666/2003, incidentes sobre os pagamentos feitos em decorrência de remuneração de trabalho dos detentos do Sistema Penitenciário do Estado de Sergipe.

No caso sub examine, encontra-se em discussão o interesse do ente federado à manutenção do programa de reabilitação dos presos, já que, com a obrigatoriedade de recolhimento da contribuição previdenciária, em razão da contraprestação paga ao apenado, as empresas contratam os aludidos apenados em menor quantidade, e o interesse da União, à cobrança do referido tributo, com vistas ao custeio dos benefícios previdenciários e das ações de assistência social.

O trabalho da pessoa sujeita à pena privativa de liberdade tem como objetivo precípuo a recuperação do preso, reinserindo-o no meio social, motivo pelo qual a remuneração percebida não se encaixa exatamente como contraprestação pelo serviço prestado. Acresça-se, também, que a referida remuneração visa compensar a despesa do Estado com a manutenção do apenado no cárcere, bem como indenizar os danos causados pelo crime. É o que se infere dos artigos 28 e 29, da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84).

Não se pode, todavia, esquecer que a política da Seguridade Social, na hipótese em tela, é resgatar a dignidade do preso, promovendo a sua inserção no âmbito da Previdência Social, para que, no futuro, tenha, tanto ele quanto a sua família, o amparo social do Estado, podendo usufruir dos benefícios securitários proporcionados pelo Estado a si e aos seus dependentes.

Examinando a legislação questionada, vejamos o que dispõe o art. 12, inciso V, alínea "g", da Lei nº 8.212/91:

"Art. 12 - São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

(...)

V - como contribuinte individual:

(...)

g) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego;

(...)."


Por seu turno, o art. 9º, inciso V, alínea "o", do Decreto nº 3.048/99, com a redação introduzida pelo Decreto nº 4.729/2003, assim dispunha:

"Art. 9º. São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes pessoas físicas: (...)

V - como contribuinte individual:

(...)

o) o segurado recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto, que, nesta condição, preste serviço, dentro ou fora da unidade penal, a uma ou mais empresas, com ou sem intermediação da organização carcerária ou entidade afim, ou que exerce atividade artesanal por conta própria;

(...)"

Estabelecendo um cotejo entre a norma legal e a norma regulamentar, restava claramente perceptível que, a partir da alteração introduzida pelo Decreto nº 4.729/2003, no art. 9º, V, do Decreto nº 3.048/99, com a inclusão da alínea "o", houve uma ampliação ilegal da sujeição passiva da contribuição previdenciária, com a criação de nova espécie de contribuinte, na condição de segurado individual, qual seja, o preso sob regime fechado ou semi-aberto, que, nesta condição, preste serviço, dentro ou fora da unidade penal, a uma ou mais empresas, com ou sem intermediação da organização carcerária ou entidade afim, ou que exerce atividade artesanal por conta própria.

A definição do sujeito passivo da obrigação tributária, onde se inclui a obrigação previdenciária, é matéria de reserva de lei no sentido estrito, consoante prevê o art. 97, III, do CTN.

"Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

(...)

III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo;

(...)."

Logo não poderia espécie normativa diversa da lei formal prever nova hipótese de contribuinte da Previdência Social, razão por que o Decreto nº 7.054, de 28 de dezembro de 2009, revogou o aludido dispositivo, sendo, neste sentido, de viés afirmar que é inexigível a exação reclamada em relação aos presidiários, bem assim inaplicável na relação jurídica em questão o disposto no art. 4º da Lei nº 10.666/2003, que determina a retenção da contribuição previdenciária individual pela empresa.

Remanesce a análise da exigência contida no art. 22, inciso III, da Lei nº 8.212/91:

"Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:

(...)

III - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços;

(...)."

Também não prospera a cobrança da contribuição previdenciária em tela do Estado de Sergipe como empresa ou equiparado a empresa, eis que, como já afirmado, os presos em questão não são contribuintes individuais por definição legal, o que desobriga o ente estatal de recolher o mencionado tributo na forma pretendida pela Fazenda Nacional, ante a inocorrência do respectivo fato gerador.

O trabalho do preso, sob o ponto de vista da legislação vigente, está disciplinado nos artigos 28 e 29 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), onde colho as seguintes normas:

"Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.

§ 1º Omissis.

§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho."

"Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.

§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:

a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;

b) à assistência à família;

c) a pequenas despesas pessoais;


d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.

§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade."

Em que pese reconheça seja salutar a inclusão dos presos no Regime Geral de Previdência Social, tal somente pode ocorrer em virtude de lei.

POSTO ISSO, julgo procedentes os pedidos, declarando a inexistência de relação jurídica tributária que obrigue o autor ao recolhimento das contribuições previdenciárias previstas no art. 22 da Lei nº 8.212/91, bem assim do desconto e recolhimento previsto no art. 4º da Lei nº 10.666/2003, incidentes sobre os referidos pagamentos aos indigitados presos.

Condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa.

Sem condenação em custas processuais, face à isenção prevista, art. 4º, I, da Lei 9.289/96.

P.R.I.

Aracaju/SE, 14 de janeiro de 2010.

Juiz Edmilson da Silva Pimenta


JURID - Contribuição previdenciária. [19/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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