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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

JURID - DF é condenado a indenizar casal. [02/12/09] - Jurisprudência


DF é condenado a indenizar casal que perdeu bebê por complicações no parto.


Circunscrição: 1 - BRASÍLIA

Processo: 2004.01.1.063168-4

Vara: 113 - TERCEIRA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO DF

SENTENÇA

Vistos etc.

WESLEI CASTRO DE SOUSA e SUELI GOMES DA SILVA ajuizaram a presente ação de reparação por danos morais, pelo rito comum ordinário, contra o DISTRITO FEDERAL. Alegam que a primeira Autora SUELI GOMES DA SILVA no dia 11 de junho de 2006, às 20h, deu entrada no Hospital Regional da Asa Norte - HRAN aos nove meses de gestação, sentindo intermitentes contrações. Afirmam que ao ser atendida, o médico plantonista afirmou que os sintomas da Autora tratavam-se de gases e prescreveu-lhe medicação adequada. Acrescentam que na manhã do dia 24 de junho as dores ressurgiram fortemente, ocasião que a gestante retornou ao hospital e foi internada de imediato. Todavia, mesmo diante do quadro médico, os médicos que atendiam a Autora induziram o rompimento da bolsa somente às 17h. Após aplicações de anestesia e a constatação de 08 centímetros de dilatação, o parto de KELEN EDUARDA GOMES DE CASTRO ocorreu naquele dia, às 18h45min.

Narram que a criança nasceu com peso e dimensões normais, porém a mãe, desde logo, percebeu que ela não chorava, o que levou os funcionários do hospital a encaminhar a recém-nascida para a realização de exames e, posteriormente, transferi-la ao Hospital Materno-Infantil de Brasília - HMIB, ao argumento de que ela apresentava um problema no pulmão. Sustentam que a criança recebeu vários medicamentos, mas não reagia a estímulos, até que entrou em estado de coma. Afirmam que na terceira semana de julho a criança foi levada para uma ala de isolamento do hospital, lá permanecendo em berço aberto, sem segurança alguma, muito próxima às crianças infectadas. Dias depois, alegam ter sido comunicados de que a criança apresentava ruptura no intestino, até que veio a óbito na tarde do dia 25 de julho. Alegando que o óbito da filha ocorreu em função de duas causas específicas, demora na realização do parto e falha no tratamento dispensado à criança desde o seu ingresso no HMIB, os Autores, ao final, pedem a condenação do Réu ao pagamento de R$ 150.000,00, a título de compensação pelo dano moral que alegam ter experimentado.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 18/209.

Citado, o Distrito Federal afasta a possibilidade de aplicação aos fatos narrados na inicial da responsabilidade objetiva do Estado, alegando que, em se tratando de danos eventualmente causados por omissão, sobressai a responsabilidade subjetiva da pessoa jurídica. Defende não ter existido falha no atendimento dado à gestante, uma vez que a monitorizarão do parto foi realizada de acordo com os critérios estabelecidos pela Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), bem como do Ministério da Saúde. Ao final,pugnou pela improcedência dos pedidos.

Juntou documentos (fls. 226/233).

Réplica às fls. 237/239.

Em especificação de provas, a parte autora requereu a prova pericial, ao passo que a parte ré requereu a prova testemunhal.

Deferida a prova pericial, cujo laudo elaborado pelo Dr. Marcos Gutemberg Fialho da Costa, CRM-DF 6370, foi carreado às fls. 282/287 dos autos.

Pedido do Réu de esclarecimentos do laudo pericial (fl. 307 verso), cuja resposta foi apresentada à fl. 317.

Sobrevém pedido de designação de audiência de instrução e julgamento para oitiva do laudo pericial e do assistente técnico indicado pelo Réu.

É o relatório dos fatos dignos de registro.

Fundamento e Decido.

De início destaco que, dada a realização de elucidativa prova pericial, tenho que a produção de novas provas, bem assim a intimação dos peritos responsáveis pela realização dos laudos acostados aos autos, se torna despicienda. Cabe ao magistrado decidir quais as provas pertinentes ao deslinde da controvérsia instaurada e quais devem ser indeferidas, por desnecessárias, não constituindo cerceamento de defesa a negativa da produção de prova testemunhal quando desnecessárias à solução do litígio

Considerando que o juiz é o destinatário das provas, tenho por suficiente a comprovação dos fatos narrados na inicial, o que me permite decidir pelo INDEFERIMENTO dos pedidos de fls. 326, 328 e 335.

Com relação ao pedido alinhavada na inicial, tenho que ele deve ser atendido, com ressalva.

Deflui do relatório que o cerne do debate instaurado, o qual se vê centrado na pretensão compensatória (dano moral) externada pelos autores, em decorrência do óbito de sua filha recém-nascida que, segundo eles, não recebeu o tratamento adequado da equipe médica da rede pública, seja por ocasião do parto, realizado tardiamente, seja pelo tratamento dispensado à menor quando da internação no Hospital Materno-Infantil de Brasília - HMIB, onde permaneceu internada em função de complicações no pulmão. Os demandantes apontam a conduta médica negligente como causa da lesão física, dando ensejo aos danos materiais e morais experimentados, suscetíveis da reparação pecuniária vindicada.

O DISTRITO FEDERAL, como apontado no relatório, limitou-se a classificar como subjetiva a responsabilidade civil do Estado, para os casos narrados na inicial, bem assim a defender a inexistência de falha no atendimento médico prestado à Autora e à recém-nascida.

No limiar do exame sobressaem incontroversos os fatos de que a Autora SUELI GOMES DA SILVA deu à luz ao bebê KELEN EDUARDA GOMES DE CASTRO no dia 24 de junho de 2003, às 18h45min, cujo parto fora realizado no Hospital Regional da Asa Norte. Incontroversa, também, foi a transferência da recém-nascida para o Hospital Regional da Asa Sul - HRAS, em razão de não apresentar respiração espontânea (fl. 229).

A prova pericial realizada ratifica a causa do óbito da recém- nascida, como é possível depreender das considerações e respostas realizadas pelo perito judicial em atenção aos quesitos elaborados pelas partes.

Denuncia o laudo que a causa mortis foi de infecção hospitalar, septicemia e perfuração intestinal (fl. 193), tendo a morte ocorrida, em outras palavras, por respiratória aguda conseqüente à broncopneumonia com abcedação em paciente com pneumoperitônio e perfurações duodenais.

Relata ainda o laudo que a recém-nascida nasceu com índice de apgar (utilizado para avaliar a vitalidade do recém-nascido) 2 no 1º minuto e 2 no 5º minuto, o que, segundo literatura médica, representa recém-nascido deprimido, o qual, por sua vez, apresentam seqüelas neurológicas em decorrência de asfixia (diminuição de afluxo de oxigênio para o cérebro e outros tecidos). Identifica ainda que o quadro de asfixia perinatal foi em conseqüência de sofrimento fetal ocorrido durante o trabalho de parto e não diagnosticado na maternidade do HRAN; que a identificação tempestiva conduziria ao procedimento cirúrgico cesariano e, pro fim, que a submissão da parturiente à analgesia de parto concorreu para que a menor desenvolvesse quadro de asfixia perinatal grave evoluindo para o óbito (fls. 285/6).

Mais esclarecedor é o laudo pericial complementar de fl. 317. Nele, o expert afirma ser incompatível o fato do partograma não apresentar anormalidade em seu trabalho de parto e recém-nascido com asfixia perinatal grave. Acrescenta ainda que, acaso submetida a parturiente à ausculta fetal de 5 em 5 minutos durante o período expulsivo, seria, desde logo, diagnosticado o sofrimento fetal agudo.

Do cotejo desses dados, tenho que não são necessários maiores elementos para a identificação da culpa, negligência, dos agentes públicos da área de saúde que prestaram atendimento à Autora e à recém-nascida. Não há dúvida de que a criança ficou com seqüelas decorrentes do parto, pois teve de ser imediatamente internada em outra unidade médico-hospitalar, especializada no atendimento de recém-nascidos. As convulsões após o parto somente reforçam o sofrimento fetal e a resistência da equipe médica em antecipar o parto da Autora, por meio da cesárea.

Nesse cenário, é necessário destacar que se mostram presentes os elementos ensejadores da responsabilidade civil do Estado, ainda que, como no caso dos autos, a responsabilidade revista-se de natureza subjetiva, caracterizada pela falha na prestação do serviço público.

Tratando-se de omissão do poder público, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva, fazendo-se necessária a comprovação de que os danos causados ao administrado, em decorrência de suposto ato omissivo, se deu por falha do serviço. Esta, aliás, é a exceção prevista ao § 6º do artigo 37 da Constituição Federal, o qual, por sua vez, preceitua, como regra, a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito púbico e das de direito privados prestadores de serviços públicos pelos danos que seus agente, nessa qualidade, causarem a terceiros.

No ordenamento jurídico, a responsabilidade civil pressupõe a existência de três elementos: conduta, dano e nexo de causalidade entre o primeiro e o segundo elemento. Em se tratando de responsabilidade civil do Estado, a conduta se reveste em fato administrativo, considerado como qualquer forma de conduta (comissiva ou omissiva) atribuída ao Poder Público.

No caso da responsabilidade subjetiva, o fato administrativo nasce necessariamente de uma conduta omissiva ou falha no serviço público. Ou seja, somente quando o Estado não toma as diligências necessárias à prevenção ou impedimento da ocorrência do dano é que será civilmente responsável e obrigado a reparar os prejuízos.

No caso dos autos, restou comprovada a negligência dos médicos que realizaram o parto quando deixaram de submeter a mãe da criança aos procedimentos necessários à verificação do sofrimento fetal que, por sua vez, reclamaria o procedimento cirúrgico da cesárea,.

Não fosse isso, basta verificar que o laudo realizado por meio das análises nos prontuários e exames tanto da gestante quanto da criança aponta pela negligência do atendimento médico, ou até mesmo imperícia do profissional, que não diagnosticou a tempo as condições do feto. Tanto assim o é que o índice de apgar, utilizado para avaliar a vitalidade do recém-nascido) 2 no 1º minuto e 2 no 5º minuto, demonstra sobejamente o baixo índice de sobrevida da menor, ocasionados pela diminuição de afluxo de oxigênio para o cérebro e outros tecidos.

Merece destaque que, no tocante à modalidade subjetiva, cumpre ao lesado a demonstração no sentido de que a Administração tenha incorrido em omissão, quer em vista de sua negligência, imperícia ou imperícia. Não menos corrente ainda a imprescindível comprovação dos pressupostos inerentes à conduta do agente, o dano e a relação de causalidade entre os mesmos.

Assim, o tema posto em deslinde merece enfoque na perspectiva em realce, qual seja a responsabilidade civil do Estado na modalidade subjetiva e não objetiva, visto que, na hipótese vertente, salta aos olhos a natureza da imputação negligente levada a efeito em desfavor dos agentes públicos. Negligência esta centrada na falha do atendimento prestado à gestante durante o parto.

Ainda é de se ressaltar, por ser relevante, que, de acordo com entendimento jurisprudencial dominante acerca da necessidade de a vítima comprovar o fato constitutivo do seu direito, quando a responsabilidade estatal for classificada como de natureza subjetiva, os autores desincumbiram-se desse mister, na forma do artigo 333, inciso I, do CPC, quando comprovaram a negligência dos agentes públicos.

Nesse diapasão, evidenciados os elementos aptos a firmar o dever de indenizar a vítima (conduta, dano e nexo de causalidade), resta tão-somente aquilatá-los, ou mensurá-los adequadamente.

Com relação aos danos morais, esses são evidentes. A dor dos pais pela perda da filha os acompanhará por toda vida. Não se olvida aqui a relevância do direito subjetivo ou objetivo da dignidade da pessoa e sua induvidosa elevação à estatura constitucional e, nesse diapasão, deve ser assim visualizada sua dimensão. Conquanto o dano moral não mais se restrinja à dor, tristeza e sofrimento, se estendendo a todos os bens personalíssimos, sem necessária vinculação ao elemento psíquico pessoal, o próprio autor reconhece, mais adiante, "só deve ser reputado dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar" . Certamente tal aplicação encontra ressonância ao campo da violação a direito subjetivo e constituem efeitos e não causas. E, seguindo a trilha da lógica do razoável, para a configuração da violação à dignidade da pessoa humana seguramente não basta mera contrariedade, aborrecimento irritação ou sensibilidade exacerbada, sob pena de banalização de instrumento extremamente importante, cuja via não traduz propriamente reparação pecuniária de um dano imaterial, por si só insuscetível de valoração, mas de uma estimação prudencial, no dizer de Walter Moraes, de caráter pedagógico, punitivo e compensatório

No caso vertente, evidentes a gravidade, repercussão e conseqüentes reflexos na esfera da dignidade da pessoa dos autores, pois o sofrimento deles perdurará eternamente pelo óbito da filha.

Outrossim, o montante deve ser fixado em harmonia com princípios da razoabilidade e proporcionalidade recomendados ao caso em espécie e atendidos os efeitos compensatórios, punitivos e preventivos, observando-se ainda demais circunstâncias valorativas relacionadas às partes, tais como condição econômico-financeira de cada qual e gravidade da repercussão da violação.

Tomando por base esse nortes, entendo razoável a fixação do montante arbitrado de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) para cada um dos autores, totalizando R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Forte nessas razões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para condenar o Réu ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais), rateados em partes iguais entre os demandantes, à título de compensação por dano moral. Sobre esse valor, deverá incidir, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à Caderneta de Poupança, com base na recente alteração promovida pela Lei nº 11.960/2009 no art.1º-F da Lei nº 9.494/1997. E mais, o termo a quo para a correção monetária (cujo índice é a remuneração básica da Caderneta de Poupança) será contado a partir desta data (Enunciado de Súmula 362 do STJ), ao passo que para os juros de mora (cujo índice deve ser os juros aplicados à Caderneta de Poupança), o termo a quo será a data do evento danoso, qual seja, 24 de outubro de 2007 (Enunciado de Súmula 54 do STJ).

Em conseqüência, declaro resolvido o mérito da demanda, com fundamento no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Sem custas, pois os autores litigam sob o pálio da gratuidade de justiça e o réu goza de isenção legal. Todavia, em razão da sucumbência, arcará o Réu com os honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do § 3º do artigo 20 do CPC.

Realizada a perícia e sendo acolhido o pedido dos Autores, o Réu também deverá arcar com os honorários periciais, cuja correção monetária deve ocorrer desde a data da entrega do laudo, qual seja, 09 de março de 2006 (fl. 282) pelo INPC, e juros de mora pelo índice legal, contados desta data.

Sentença submetida ao reexame necessário, nos termos do art. 475, I, do CPC.

Sentença registrada eletronicamente nesta data. Publique-se. Intimem-se por publicação no DJE.

Brasília - DF, quinta-feira, 12/11/2009 às 16h33.



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