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segunda-feira, 9 de novembro de 2009

JURID - Uso de documento falso. Impedimento do julgador. [09/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Uso de documento falso. Impedimento do julgador.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 121.416 - RS (2008/0257736-6)

RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES

IMPETRANTE: HENRIQUE LEMANSKI

ADVOGADO: LUÍS MAXIMILIANO LEAL TELESCA MOTA E OUTRO(S)

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PACIENTE: ARI GONÇALVES COUTO

EMENTA

HABEAS CORPUS. USO DE DOCUMENTO FALSO. IMPEDIMENTO DO JULGADOR. MAGISTRADA QUE ATUOU NA PRIMEIRA INSTÂNCIA RECEBENDO A DENÚNCIA E REALIZANDO OUTROS ATOS INSTRUTÓRIOS, INCLUSIVE INTERROGATÓRIO, E, QUANDO DO JULGAMENTO DA APELAÇÃO, ATUA COMO REVISORA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E IMPARCIALIDADE DOS JULGADORES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO.

1. O impedimento e a suspeição de Magistrado são circunstâncias que afetam a garantia constitucional da imparcialidade do julgador.

2. No caso, a Magistrada titular da Vara Criminal atuou na instrução, recebendo a denúncia, procedendo ao interrogatório e, posteriormente, recebendo o apelo defensivo.

3. Mesmo não tendo sido ela a prolatora da sentença, não se pode afastar que sua participação criaria empecilhos à sua atuação em outra instância, a teor do que estabelece o art. 252, III, do Código de Processo Penal.

4. De se ressaltar, ainda, que hoje em dia se confere primordial atenção ao interrogatório, tanto que, após as reformas processuais, se explicitou o princípio da identidade física do julgador.

5. Assim, está configurada a ofensa aos princípios do devido processo legal e também da imparcialidade dos julgadores. Ratificar tais condutas, por certo, refogem ao modelo penal garantista, compatível com nossa Constituição.

6. Como efeito da anulação aqui procedida, de rigor se assegurar ao paciente que aguarde em liberdade o desfecho da ação penal, sob pena de violação ao princípio da razoável duração do processo.

7. Ordem concedida para, de um lado, anular o acórdão da apelação, determinando que outro julgamento seja realizado, apontando-se o impedimento da Desembargadora que atuou em primeira instância; de outro lado, assegurar possa o paciente aguardar em liberdade o desfecho do processo.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Sustentou oralmente o Dr(a). LUÍS MAXIMILIANO LEAL TELESCA MOTA, pela parte PACIENTE: ARI GONÇALVES COUTO

Brasília (DF) , 15 de outubro de 2009 (data do julgamento).

MINISTRO OG FERNANDES
Relator

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Cuida-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Ari Gonçalves Couto, contra acórdão da Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Depreende-se dos autos que o paciente foi condenado à pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, em regime semiaberto, bem como ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa, pela prática do delito tipificado no art. 304 do Código Penal.

O acórdão impugnado ostenta a seguinte ementa:

APELAÇÃO CRIME. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSIFICADO. ART. 304 DO CP. MÉRITO CONDENATÓRIO. MANUTENÇÃO.

Conjunto probatório convincente e suficiente a amparar o édito condenatório. Apresentação á autoridade policial de carteira de identidade, cuja falsidade foi atestada por laudo pericial. Réu que admitiu a confecção do documento, através da justaposição de partes da carteira de identidade verdadeira a partes de outro documento obtido com dados falsos. Relatos do Delegado de Polícia e do policial civil que participaram das investigações, dando conta de que, por ocasião do cumprimento do mandado de busca, o acusado identificou-se com a carteira de identidade falsa. Desimportância, à configuração do crime em questão, o fato de a carteira ter sido espontaneamente exibida pelo acusado ou por determinação policial. Precedentes. Conduta prevista no art. 304 do CP, plenamente caracterizada. Condenação que se impunha (fl. 46).

Aponta o impetrante a existência de constrangimento ilegal, uma vez que a Juíza Titular da Vara Judicial Criminal do Foro Regional do 4º Distrito da Comarca de Porto Alegre/RS, que recebeu a denúncia contra o paciente e determinou outros atos instrutórios posteriores, é a mesma Magistrada que atuou como Revisora do Acórdão do recurso de Apelação no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tendo sido convocada para compor a Oitava Câmara Criminal.

Diante disso, postula a nulidade absoluta do referido julgado por violação do art. 252, III, do Código de Processo Penal, o qual prescreve que o juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que tiver atuado em outra instância, pronunciando, de fato ou de direito, sobre a questão.

Requer, por fim, seja anulado o acórdão de apelação, por ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição.

Indeferida a liminar às fls. 26/27, foram prestadas informações às fls. 31/57.

O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral da República Paulo da Rocha Campos, opinou pelo não conhecimento da impetração que, "acaso enfrentado quanto à questão de fundo, desmereceria concessão" (fls. 59/64).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): Tenho que a ordem comporta concessão.

Das informações que foram prestadas pelo Juízo da 4ª Vara Criminal da Comarca de Porto Alegre, colhe-se o seguinte:

O paciente ARI GONÇALVES COUTO foi condenado nesta Vara à pena de 02 anos e 05 meses de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 304, do Código Penal. A decisão foi proferida em 16.11.2005 pela Dra. Bernadete Coutinho Friedrich, Juíza de Direito em regime de substituição.

Inconformado, o paciente interpôs recurso de apelação, que foi julgado pela 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul no dia 12.12.2007, no qual foi mantida a sentença condenatória. Deste julgamento, participou a Dra. Marlene Landvoigt, Juíza de Direito Titular desta Vara Criminal na qual foi condenado o paciente, a qual atua em regime de convocação perante o Tribunal de segunda instância.

Dentre os atos jurisdicionais praticados pela Dra. Juíza Titular, estão o recebimento da denúncia, o interrogatório do acusado e o recebimento do apelo. (sem destaques no original)

Como visto, a Magistrada titular daquela Vara Criminal atuou na instrução, recebendo a denúncia, procedendo ao interrogatório e, posteriormente, recebendo o apelo defensivo.

Mesmo não tendo sido ela a prolatora da sentença, não se pode afastar que sua participação criaria empecilhos à sua atuação em outra instância, a teor do que estabelece o art. 252, III, do Código de Processo Penal.

Penso, ainda, ser caso de ressaltar que hoje em dia se confere primordial atenção ao interrogatório, tanto que, após as reformas processuais, se explicitou o princípio da identidade física do julgador, o qual reza o seguinte:

Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente.

§ 1º O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação.

§ 2º O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.

Assim, está configurada a ofensa aos princípios do devido processo legal e também da imparcialidade dos julgadores. Ratificar tais condutas, por certo, refogem ao modelo penal garantista, compatível com nossa Constituição. Impõe-se, desse modo, a anulação do acórdão de apelação, com a consequente renovação do julgamento.

Anulado o julgamento da apelação, o último marco interruptivo da prescrição seria a publicação da sentença, a teor do que dispõe o art. 117 do Código Penal. Considerando a data em que proferida a sentença (16.11.05), e também a pena aplicada - 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de reclusão -, a prescrição da pretensão punitiva se regula em 8 (oito) anos, nos termos do art. 109, V, do Código Penal. Tal lapso, por certo, ainda não transcorreu.

Como efeito da anulação aqui procedida, de rigor assegurarmos ao paciente, caso ainda esteja preso, que aguarde em liberdade o desfecho da ação penal, sob pena de violação do princípio da razoável duração do processo.

Pelo exposto, concedo a ordem para, de um lado, anular o acórdão da apelação, determinando que outro julgamento seja realizado, apontando-se o impedimento da Desembargadora que atuou em primeira instância; de outro lado, assegurar possa o paciente aguardar em liberdade o desfecho do processo.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2008/0257736-6 HC 121416 / RS

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 120500335517 20500335517 70016639759 96562

EM MESA JULGADO: 15/10/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ZÉLIA OLIVEIRA GOMES

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: HENRIQUE LEMANSKI

ADVOGADO: LUÍS MAXIMILIANO LEAL TELESCA MOTA E OUTRO(S)

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PACIENTE: ARI GONÇALVES COUTO

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra a Fé Pública - Uso de documento falso

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr(a). LUÍS MAXIMILIANO LEAL TELESCA MOTA, pela parte PACIENTE: ARI GONÇALVES COUTO

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, concedeu a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 15 de outubro de 2009

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 920838

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 03/11/2009




JURID - Uso de documento falso. Impedimento do julgador. [09/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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