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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

JURID - Legitimidade do MP. Interceptação telefônica. [04/11/09] - Jurisprudência


Processual penal. Legitimidade do Ministério Público para promover investigação e produzir provas. Interceptação telefônica.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2008.016772-0, de Lages

Relator: Des. Irineu João da Silva

PROCESSUAL PENAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER INVESTIGAÇÃO E PRODUZIR PROVAS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA QUE OBEDECEU AO TRÂMITE EXIGIDO NA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. ELEMENTOS QUE SE ACOPLAM AO CONJUNTO PROBATÓRIO.

PREFACIAIS DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA E DE CORRELAÇÃO COM A DENÚNCIA. VEREDICTO QUE ATENDEU AO PRECEITO INSCRITO NO ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ATENTOU AOS TERMOS DAS IMPUTAÇÕES. EIVAS INOCORRENTES.

DELITOS CONTRA A FÉ PÚBLICA. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR, EM CONTINUIDADE DELITIVA (CP, ART. 311, § 2º). AGENTES QUE, EM CO-AUTORIA, RASPAM, DESTROEM E SUPRIMEM SINAIS DE IDENTIFICAÇÃO PARA, POSTERIOMENTE, REGULARIZAREM OS VEÍCULOS JUNTO AO SETOR OFICIAL DE TRÂNSITO. ELEMENTOS COLHIDOS, AO LONGO DO INQUÉRITO E DA INSTRUÇÃO, SOBREMANEIRA, OS TESTEMUNHOS E A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, CONDUZIDA SOB OS DITAMES DA LEI DE REGÊNCIA, QUE EXIBEM, COM SOLAR CLAREZA, AS CONDUTAS REPUDIADAS. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE.

CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CORRUPÇÃO PASSIVA QUALIFICADA EM CONTINUIDADE DELITIVA (CP, ART. 317, § 1º). DELEGADO E PERITA QUE, EM RAZÃO DO CARGO, RECEBERAM VANTAGEM INDEVIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DELITO CONFIGURADO.

CORRUPÇÃO ATIVA (CP, ARTS. 333 E 343). AGENTES QUE OFERECEM VANTAGEM INDEVIDA A FUNCIONÁRIO PÚBLICO E À PERITA NOMEADA PARA CALAR A VERDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS NO CONTEXTO PROBATÓRIO. CRIME CARACTERIZADO.

DELITO CONTRA A PAZ PÚBLICA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA (CP, ART. 288). CONDUTAS CRIMINOSAS QUE PERDURARAM NO TEMPO. EXISTÊNCIA DE DIVISÃO DE TAREFAS. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, NA FORMA RETROATIVA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA QUE NÃO INTERROMPE O TRANSCURSO TEMPORAL. LAPSO DECORRIDO ENTRE A DATA DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E A DESTE JULGAMENTO, CONSIDERADAS AS PENAS ORA COMINADAS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

ERRO MATERIAL NA PARTE DISPOSITIVA DA SENTENÇA. CORREÇÃO QUE SE PROMOVE, DE OFÍCIO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 2008.016772-0, da comarca de Lages (2ª Vara Criminal), em que são apelantes e apelados a Justiça Pública, por seu Promotor, Adelino Roberto Toigo, Luiz Carlos Freitas de Souza, Antônio Carlos de Souza, Paulino Orlandi e Marli Teresinha Petry:

ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer dos recursos e dar provimento, somente, ao do Ministério Público, para condenar os apelados Adelino Roberto Toigo, Luiz Carlos Freitas de Souza, Antônio Carlos de Souza, Paulino Orlandi e Marli Teresinha Petry, nos termos deste acórdão, declarando-se extintas as suas punibilidades no tocante ao crime do art. 288, "caput", do CP e, de ofício, corrigir erro material da sentença. Custas legais.

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público oficiante na Comarca de Lages (2ª Vara Criminal) ofereceu denúncia contra Adelino Roberto Toigo, Luiz Carlos Freitas de Souza ("Cardoso"), Antônio Carlos de Souza, Paulino Orlandi, Marli Teresinha Petry e Alcides Domingos Spiazzi, como incursos, o primeiro, nas sanções dos arts. 311, § 2º (duas vezes), 317, § 1º c/c art. 327, § 2º (três vezes), 343, "caput" (duas vezes) e 288, "caput", todos do Código Penal, o segundo, nas penas dos arts. 311, "caput" e § 2º (duas vezes), 332, parágrafo único (duas vezes), 333, parágrafo único (três vezes) , 343, "caput" (duas vezes) e 288, "caput", todos do Estatuto Repressivo, o terceiro e o quarto, nas sanções dos arts. 311, "caput" e 288, "caput", do mesmo Diploma Penal, a quinta, nas sanções dos arts. 311, § 2º (duas vezes), 317, § 1º (duas vezes) e 288, "caput", todos do Ordenamento Repressivo e, o último, nas penas do art 180, "caput", do Código Penal (fls. 9/16).

Versa a peça acusatória a respeito dos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, receptação e adulteração de sinal identificador de veículo automotor, praticados pelos denunciados, a partir da cidade de Lages e região.

Quadrilha:

Os denunciados Adelino Roberto Toigo, Luiz Carlos Freitas de Souza, Marli Teresinha Petry, Paulino Orlandi e Antônio Carlos de Souza, na cidade de Lages, no decorrer do ano 2001, estavam associados, de maneira permanente, para a prática de delitos relacionados ao desmanche de veículos, como os de adulteração de sinal de identificação de veículo automotores e de corrupção ativa e passiva, dentre outros.

Liderado por Luiz Carlos Freitas de Souza, conhecido como "Cardoso", o grupo contava com o auxílio dos policiais Adelino Roberto Toigo, titular do cargo de Delegado de Polícia, com exercício em Lages, que usava a sua função para possibilitar o registro irregular de veículos automotor, junto ao setor de trânsito. A denunciada Marli, por sua vez, auxiliava o grupo elaborando perícias equivocadas, omissas ou alheias à realidade, de forma deliberada, também contribuindo para o registro de automóveis de procedência ilícita. Para tanto, de modo constante e corriqueiro, Toigo e Marli recebiam vantagem ilícita de "Cardoso", com o qual criaram um vínculo permanente, através do auxílio ilícito mútuo.

A associação criminosa contava, ainda, com a participação de Antônio Carlos de Souza e Paulino Orlandi. O primeiro, empregado de "Cardoso", sabia da atividade ilícita, cooperando com seus crimes, de forma permanente. Além de emprestar seu nome para que "Cardoso" criasse uma empresa fachada chamada "Raphcar, Indústria e Comércio de Automóveis Ltda.", Antônio costumava levar documentos e dinheiro para Toigo, ciente de que tal procedimento era ilícito. De outra banda, Paulino Orlandi, proprietário de uma oficina, era o responsável pela adulteração manual da numeração da identificação dos chassis ou componentes dos veículos que lhe eram encaminhados por "Cardoso", a quem estava unido por vínculo de permanência.

Os crimes a seguir narrados, por si, atestam o caráter duradouro e estável da associação criminosa, revelando, dentre outros, um dos seus modos de operação, cingido ao registro irregular, junto ao órgão de trânsito, de veículo com a identificação dos seus componentes adulterada.

I. A caminhonete F-4000

No ano de 1998, na cidade de Bom Retiro, José Diomar Peixer, conhecido por "Zezinho", adquiriu uma caminhonete, marca Ford, modelo F-4000, ano 1981, cor amarela, placas LYW-0651, registrando-a em nome de sua mulher Ivonete Moraes. O motor dessa caminhonete, todavia, estava com seu sinal de identificação adulterado. O lado do bloco do motor MWM, onde comumente repousa a sua numeração, foi planado.

Mesmo assim, em 18 de agosto de 2001, ao adquirir um caminhão, "Zezinho" entregou a referida caminhonete para Élcio Nass e Roland Mandel, proprietários de uma garagem de carros com sede na cidade de Blumenau. Ocorreu, contudo, que Élcio e Roland não lograram efetuar a transferência da propriedade da caminhonete junto ao DETRAN de Blumenau, em razão de irregularidade na identificação do motor. Portanto, voltaram a falar com "Zezinho", o qual ficou com a caminhonete para resolver o problema.

Em seguida, "Zezinho" procurou Paulino Orlandi, proprietário de uma oficina de chapeação em Lages, indagando-lhe se não poderia auxiliá-lo. Paulino disse-lhe que conhecia o denunciado Luiz Carlos Freitas de Souza ("Cardoso"), esclarecendo ser pessoa que lida com revenda de peças de veículos e que tem influência junto a algumas autoridades policiais ligadas ao setor de trânsito de Lages, razão pela qual, provavelmente, poderia resolver o impasse.

Juntos, Paulino e "Zezinho" encontraram-se posteriormente com "Cardoso", na loja de sua propriedade, chamada "Multi Peças", situada na cidade de Lages, explicando-lhe o problema. De pronto, "Cardoso" esclareceu que poderia lograr a transferência da caminhonete, mesmo em face da irregularidade da numeração do motor, por desfrutar de influência junto à determinadas autoridades de trânsito de Lages. Todavia, sob o pretexto de exercer essa influência, "Cardoso" solicitou o pagamento da importância de R$ 1.000,00, alegando, ainda, que teria que dar parte desse dinheiro para comprar a complacência criminosa de alguns funcionários públicos, em especial, do denunciado Adelino Roberto Toigo, Delegado de Polícia lotado em Lages, então, junto à Delegacia de Trânsito.

Fechado o "negócio", "Zezinho" deu R$ 20,00 em dinheiro para "Cardoso", mais dois cheques pré-datados, de propriedade de sua mulher, no valor de R$ 490, 00, cada um, deixando a caminhonete em sua loja, para vir buscá-la quando dos documentos de sua transferência estivessem prontos.

Em seguida, "Cardoso" procurou o denunciado Adelino Roberto Toigo e, não contente com o tráfico de influência, depois de explicar o acontecido, prometeu-lhe vantagem indevida no valor de R$ 500,00 em dinheiro, se o auxiliasse na obtenção dos documentos necessários para "esquentar" o motor da caminhonete em questão e, com isso, lograr a transferência indevida do veículo. Na condição de Delegado de Polícia, com atribuições junto à Delegacia de Trânsito, onde exercia função de direção na administração direta, Toigo tinha o dever funcional de zelar pela correção dos procedimentos administrativos que lhe eram afetos, porém, mesmo assim, aceitou a oferta de "Cardoso", para praticar ato ou deixar de praticá-lo, infringindo o seu dever funcional.

"Cardoso" e Toigo passaram a combinar como deveriam proceder. Não demoraram a concluir que precisariam de uma perícia "fria", que encobrisse a adulteração do identificador do motor, a fim de que a caminhonete pudesse ser, depois, normalmente transferida junto ao órgão de trânsito do domicílio do seu comprador, para não despertar suspeitas. Combinaram, pois, que o proprietário do caminhão deveria solicitar, oficialmente, a realização de uma perícia e apresentar nota fiscal que atestasse que o motor foi retificado, para justificar a irregularidade de sua numeração.

Precisavam, todavia, da complacência de um perito. Essa circunstância fez com que Toigo, previamente ajustado com "Cardoso", entrasse em contato com a denunciada Marli Petry, funcionária pública lotada na Delegacia Regional de Lages e perita nomeada, oferecendo-lhe vantagem ilícita para fazer a perícia nos moldes acima referidos, calando a verdade, em parte. A vantagem ilícita consistia em pequena quantia em dinheiro a ser paga por "Cardoso", o que foi imediatamente aceito pela denunciada Marli.

O denunciado Luiz Carlos Freitas de Souza, então, certificou-se do dia em que Marli estava de plantão. Determinou a confecção de um documento posteriormente assinado por Ivonete Moraes, proprietária da caminhonete, requerendo a realização da perícia ao Delegado de Polícia Adelino Toigo. "Cardoso" logrou obter, ainda, uma nota fiscal de uma retífica de motores, cujo teor atestou, falsamente, que o motor da caminhonete houvera sido recondicionado. Por fim, procedeu à pintura do motor, para que parecesse, realmente, recondicionado.

No dia 24 de agosto de 2001, requerida oficialmente a perícia e juntada no processo administrativo a nota fiscal acima referida, por ordem de Toigo, a quem estava subordinada, a denunciada Marli examinou a caminhonete F-4.000. Em seguida, elaborou o competente laudo pericial, concluindo, em síntese, que a numeração do motor apresentava-se "aplainada", mas que, como foi apresentada nota fiscal atestando que o motor havia sido retificado, sugeriu a liberação do veículo, o que, em tese, possibilitaria a transferência da sua propriedade.

Tal conclusão, porém, não coincidiu com a realidade da caminhonete. Isso porque a perita sabia que o recondicionamento do motor não importa na adulteração do número de sua identificação e, mesmo assim, aceitando a nota fiscal da retífica, deu a entender que o código de identificação havia sido apagado quando do recondicionamento do motor, o que não é verdade, conforme constatou posterior laudo oficial.

Em suma, tal acertiva deu azo a um laudo pericial, cuja conclusão foi equivocada de forma proposital, para possibilitar a transferência da caminhonete junto ao órgão de trânsito, como de fato veio acontecer, em seguida.

Concluída a perícia, os denunciados Marli e Toigo receberam a vantagem indevida prometida.

De posse do laudo, Toigo entregou-o para "Cardoso". Este, por sua vez, no interior da "Loja Multi Peças", repassou a perícia, em mãos, para "Zezinho", que, ato contínuo, encaminhou-o a Élcio Nass e Roland Mandel, os quais procederam à venda da caminhonete e lograram transferi-la para Celso Schawtz, normalmente, junto ao órgão de trânsito da cidade de Gaspar, onde a perícia firmada por Marli não foi contestada.

Consumado o serviço, "Zezinho" deu a "Cardoso" R$ 490,00, em dinheiro, em troca de um dos cheques que houvera emitido, restando, apenas, uma cártula para ser descontada, futuramente, em poder do denunciado "Cardoso". Entretanto, colocado em compensação, o segundo cheque de R$ 490,00 retornou por falta de fundos. Essa circunstância fez com que "Cardoso" mandasse Antônio Carlos de Souza, seu empregado, até Bom Retiro, a fim de cobrar a cártula pessoalmente. Porém, como "Zezinho" não dispunha do dinheiro, Antônio voltou com dois cheques de R$ 250,00 cada um, pertencentes a José Diomar Peixer, emitidos em troca do cheque de R$ 490,00. Ambos os títulos de R$ 250,00, posteriormente, retornaram, também, por falta de suficiente provisão de fundos.

Mas não foi só.

A caminhonete em questão estava com a numeração de um dos seus componentes adulterada, porque planado todo o lado do bloco do motor. Todavia, mesmo assim, na condição de funcionária pública, a denunciada Marli, ao confeccionar a perícia, de forma deliberada, fez paracer que a omissão do número do motor foi fruto do seu recondicionamento, o que não corresponde à verdade. O lado do motor foi planado justamente com o objetivo de apagar a sua identificação, longe do recondicionamento. Em conseqüência, pois, essa perícia possibilitou a transferência irregular do caminhão junto ao órgão de trânsito. Portanto, Marli, propositadamente, contribuiu para o registro de veículo adulterado, fornecendo indevidamente informação oficial.

De igual sorte, os denunciados Adelino Roberto Toigo e Luiz Carlos Freitas de Souza auxiliaram a denunciada Marli nesta empreitada criminosa, instigando-a e munindo-a dos documentos necessários para a realização da perícia, através de prévio acordo de vontades.

II. O caminhão Mercedez-Benz 1618.

Em meados de 1999, na cidade de Lages, o denunciado Alcides Spiazzi recebeu um motor de caminhão 1620, Mercedes-Benz e uma caixa de câmbio, pelo preço de R$ 5.000,00 e R$ 1.500,00, respectivamente, ciente da sua origem ilícita. Isso porque, tais peças estavam com sinal de identificação adulterado. As plaquetas típicas da indicação das suas respectivas numerações haviam sido arrancadas da base onde, comumente, deveriam estar, restando, apenas, os pinos de fixação em seus lugares. Não bastasse a adulteração da identificação, o valor pago, efetivamente, pelo motor e caixa de câmbio, foi bastante inferior ao preço de mercado. Ademais, a nota fiscal apresentada restou expedida por empresa fria, cujo CGC nunca existiu, conforme certidão da Secretaria de Estado da Fazenda.

Depois que recebeu o motor e a caixa de câmbio de procedência criminosa, o denunciado Alcides providenciou a instalação desses componentes, no lugar das peças originais do caminhão registrado em nome de Dione Daniel Guarda, tipo Mercedes-Benz, 1618, ano 1993, Chassi n. 9BM386014PB72052, placas LZQ-9472, de Celso Ramos/SC. Só para esclarecer, embora estivesse formalmente registrado em nome de Dione, de fato, o domínio do caminhão pertencia a Alcides.

Em seguida, já no mês de agosto de 2001, o denunciado Alcides Spiazzi vendeu o caminhão mencionado para José Mansuto Molon, residente no município de Iomerê/SC, comarca de Videira, fazendo Dione Daniel Guarda assinar e reconhecer firma no documento que permitia a transferência do veículo junto ao DETRAN.

O novo proprietário do caminhão, José Molon, todavia, em razão da irregularidade da identificação do motor e da caixa de câmbio, não logrou efetuar sua transferência junto ao órgão de trânsito do seu domicílio. Por isso, voltou a falar com Alcides Spiazzi, o qual lhe disse que providenciaria a documentação necessária, oportunidade em que teve início o seu envolvimento com outros denunciados.

No início de setembro de 2001, acompanhado do amigo José Darci Mota de Oliveira, o denunciado Alcides Spiazzi procurou o réu Luiz Carlos Freitas de Souza, na sua loja denominada "Multi Peças". Ato contínuo, tal qual o caso da caminhonete F-4.000, "Cardoso" afirmou ser possível a transferência pretendida, mesmo em face da irregularidade do motor e da caixa de câmbio do veículo. Para resolver o problema, no entanto, "Cardoso" solicitou, desta feita, R$ 2.000,00 pelo "serviço", devendo R$ 1.000,00 serem pagos como entrada e, os outros R$ 1.000,00 depois da obtenção dos documentos necessários à transferência do caminhão. "Cardoso" se justificou, dizendo que cobraria tal vantagem para influir nos atos das autoridades de trânsito de Lages, junto a quem desfrutava de prestígio. Esclareceu, ainda, que parte do dinheiro seria destinada a essas autoridades, em especial, ao denunciado Adelino Roberto Toigo.

Posteriormente, como na outra vez, Luiz Carlos Freitas de Souza procurou o denunciado Adelino Roberto Toigo. Novamente, prometeu-lhe vantagem indevida no valor de R$ 500,00, em dinheiro, para que, no exercício da função de Delegado de Polícia, inclusive, com atribuições na Delegacia de Trânsito, empreende-se os esforços necessários para permitir a transferência do caminhão. Essa oferta foi aceita por Toigo, mesmo em razão da adulteração da identificação nos números do motor e da caixa de câmbio.

Tal qual o relatado no item anterior, "Cardoso" e Toigo, novamente, concluíram que precisavam de uma perícia para disfarçar a adulteração da identificação do motor e da caixa de câmbio, permitindo a transferência do caminhão junto ao órgão de trânsito do domicílio de José Molon, sem causar desconfiança. Para tanto, outra vez, acordado previamente com "Cardoso", Toigo ofereceu vantagem à denunciada Marli Petry, funcionária pública e perita nomeada da Delegacia Regional de Lages, com o objetivo de que calasse a verdade, em parte, na perícia a ser realizada. Essa vantagem consistia em pequena quantia em dinheiro a ser paga por "Cardoso", o que foi, imediatamente, aceito por Marli, como de costume.

Novamente "Cardoso" certificou-se do dia em que Marli estava de plantão. Determinou a confecção de um documento que, posteriormente, foi assinado por Dione Daniel Guarda, proprietário legítimo do caminhão, requerendo a realização da perícia ao Delegado de Polícia Adelino Roberto Toigo. "Cardoso" logrou obter, ainda, uma nota fiscal em branco, de uma retífica de motores. Preencheu-a, posteriormente, com a anotação do número do chassi, atestando, falsamente, que o motor houvera sido recondicionado, razão pela qual inseriu declaração falsa em documento particular, visando a alterar a verdade sobre o fato juridicamente relevante.

Posteriormente, atendendo ao chamado de "Cardoso", no dia 6 de setembro de 2001, Alcides trouxe o caminhão para Lages, a fim de fazer a perícia. Nessa oportunidade, Alcides entregou a "Cardoso" um cheque no valor de R$ 1.000,00, como pagamento da metade do preço ajustado. Em seguida, "Cardoso" disse para Alcides ir até uma oficina, a fim de pintar o motor do caminhão, para parecer recondicionado, o que restou feito. Depois, Alcides levou o caminhão até o pátio da 3ª Delegacia de Polícia de Lages, onde a denunciada Marli efetuou o exame do caminhão, na presença de Toigo, procedendo, em seguida, ao laudo pericial respectivo.

Na confecção do laudo, de forma deliberada, em suma, Marli ateve-se a atestar que o motor não possuía numeração, mas que não havia irregularidade alguma, porque o proprietário informou, quando do requerimento da perícia, que a falta foi fruto do recondicionamento do motor operado na empresa "Pedrinho Autopeças", conforme a respectiva nota fiscal.

A denunciada Marli, todavia, deixou de atestar, no laudo pericial, que o sinal de identificação do motor havia sido adulterado, na exata medida em que as plaquetas contendo a indicação da sua numeração foram arrancadas da base de onde comumente deveriam estar, restando, apenas, os pinos de fixação em seus lugares, consoante atestou a perícia oficial, posteriormente.

Ademais, a denunciada Marli, perita nomeada, sabia que a realização do serviço de retificação do motor não tem o condão de danificar a sua numeração de identificação. Quando do recondicionamento do motor não há razão para retirada da plaqueta de identificação. Mesmo assim, no laudo pericial, Marli fez parecer crer ao contrário.

Ocorreu, também, que a perita Marli deixou de concluir que o motor foi trocado. Ora, o motor que estava instalado no caminhão tratava-se de um modelo diferente e mais potente do que o original. Não seria difícil perceber, para uma perita, que o motor original era do ano 1993, pertencente a um caminhão 1618 e, o motor adulterado, componente típico de um caminhão 1620, era de ano igual ou superior de 1996.

A omissão dessa informação pericial foi proposital e vital à pretensão dos denunciados. Caso viesse à tona o laudo pericial, por certo impediria a transferência do caminhão. Isso, porque, em face da troca do motor, além da autorização prevista no art. 98 do CNT, o êxito da transferência exigiria a apresentação de documento que atestasse a procedência lícita de novo motor. E, com efeito, a nota fiscal expedida por uma empresa de retífica de motores, evidentemente, não se presta para esse fim, como bem sabia a denunciada Marli, até porque, o próprio Manual de Registro de Licenciamento de Veículos, elaborado pelo DETRAN de Santa Catarina e aprovado por Portaria do Secretário de Segurança Pública, em observação entalhada na sua página 14, textualmente, assevera que, "no caso de troca de motor usado, quando adquirido de revendas (ferro-velho ou similares), exigir-se-á nota fiscal de entrada, nota fiscal de venda (ou saída) e nota fiscal de serviço ou declaração de instalação".

Não fosse suficiente, a denunciada Marli também deixou de indicar, na perícia, que a caixa de câmbio do caminhão tinha numeração adulterada, uma vez que a plaqueta da sua identificação havia sido arrancada e os pinos de fixação estavam em seus lugares.

Com feito, novamente, todas essas omissões geraram um laudo pericial omisso, cuja conclusão não coincidiu com a realidade do veículo examinado. Na qualidade de perita que relatou o laudo em tela, analisando, pessoalmente, o caminhão, ao contrário do perito revisor, a denunciada Marli tinha o dever de atestar as informações reais do veículo, e não o fez para permitir a sua transferência junto ao órgão de trânsito, como de fato veio a acontecer depois.

Logo após, no final da tarde, ainda no dia 6 de setembro passado, tão logo ficou pronto, o denunciado Toigo encaminhou para "Cardoso" o laudo pericial firmado por Marli. Em seguida, o próprio "Cardoso", na sua loja "Multi Peças Ltda.", foi quem o entregou, em mãos, para Alcides, recebendo o segundo cheque no valor de R$ 1.000,00.

Depois, o denunciado Alcides entregou o referido laudo para José Molon, o qual o apresentou junto ao órgão de trânsito da região de Videira e, com isso, logrou a transferência do caminhão, finalmente.

Pela realização da perícia, "Cardoso" recebeu de Alcides o total de R$ 2.000,00. Desse montante, "Cardoso" repassou R$ 500,00, em dinheiro para o denunciado Toigo e, uma parte menor para Marli, conforme anteriormente combinado.

Por derradeiro, nunca é demais repetir que o caminhão em de que se trata, estava com dois dos seus componentes (motor e caixa de câmbio) com o sinal de identificação adulterados. As plaquetas que continham a suas respectivas numerações foram arrancadas do local, onde, comumente, deveriam estar, restando, apenas, os pinos de fixação. Assim, se na condição de funcionária pública, a denunciada Marli Petry, ao confeccionar a perícia, de forma deliberada, omitiu várias informações sobre o veículo, as quais tinha o dever de informar e não o fez e, em conseqüência, se essa perícia possibilitou a transferência da propriedade do caminhão junto ao órgão de trânsito, não é difícil concluir que Marli contribuiu para o registro de veículo adulterado, fornecendo indevidamente material ou mesmo informação oficial.

O mesmo aconteceu com os denunciados Adelino Roberto Toigo e Luiz Carlos Freitas de Souza, na medida em que instigaram e auxiliaram Marli a fazer a perícia, mediante acordo de vontades, constituindo-se por co-autores do ilícito.

III. Os R$ 50,00

Ligados por vínculo permanente, no exercício da função de Delegado de Policia, o denunciado Toigo auxiliava "Cardoso", na obtenção de registros irregulares de veículos, junto ao órgão oficial de trânsito. Em contrapartida, "Cardoso" recompensava-o de forma constante, oferecendo-lhe vantagem ilícita, traduzida, comumente, em quantias em dinheiro.

Tão comum, simples e corriqueira era essa prática entre os denunciados que, no dia 9 de novembro de 2001, pela manhã, Adelino Roberto Toigo telefonou para "Cardoso", na cidade de Lages e, em razão da função pública que ocupava, diretamente, para si, solicitou-lhe vantagem indevida, cingida ao pagamento de R$ 50,00, em espécie, consoante claramente se pode perceber da degravação n. 23, do lado B, da fita n. 2.

Embora solicitada, "Cardoso" prometeu a vantagem indevida no valor de R$ 50,00 ao dizer que daria um jeito de arrumar o dinheiro. É claro que essa vantagem estava ligada ao exercício da função pública de Toigo, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício, vinculado às suas atribuições de Delegado de Polícia, como era comum acontecer.

IV. Adulteração do veículo Voyage

No início do ano de 2001, no interior da sua oficina mecânica, naquela cidade, o denunciado Paulino Orlandi adulterou o número do chassi do veículo VW/Voyage, ano 84, cor cinza, placas LZW 4790, registrado junto ao órgão de trânsito em nome de "Raphcar, Indústria e Comércio de Automóveis Ltda.", empresa que, de fato, pertencia a "Cardoso". Paulino recortou o numeral original do chassi do carro e, sobre ele, soldou uma chapa de aço, atribuindo-lhe uma outra numeração, o que permitiu um novo sinal de identificação.

O denunciado "Cardoso" foi quem determinou a Paulino que procedesse à adulteração referida. Todavia, também a mando dele, quem levou o veículo até a oficina de Paulino, ciente de que teria o seu chassi adulterado, foi o denunciado Antônio Carlos de Souza. Aliás, "Cardoso", inclusive, entregou ao denunciado Antônio Carlos a chapa nova que iria ser soldada no chassi do carro e ele, por sua vez, repassou-a para Paulino, o qual procedeu ao serviço. A propósito, era o denunciado Antônio Carlos quem utilizava o veículo em questão, o qual foi apreendido em seu poder, posteriormente.

Todas essas circunstâncias revelam que "Cardoso", Antônio Carlos e Paulino, em acordo de vontades, adulteraram sinal identificador de veículo automotor, unidos pelo mesmo vínculo psicológico, cada qual empreendendo atos próprios. Paulino foi o autor direto da adulteração. "Cardoso" foi o mandante desse procedimento. E, por fim, consciente, Antônio Carlos emprestou auxílio na prática do ilícito, levando o carro até a oficina e entregando a Paulino a chapa que seria soldada sob o número original do chassi, ciente da adulteração.

Concluída a instrução criminal, a denúncia foi julgada parcialmente procedente, para condenar:

- Alcides Domingos Spiazzi ao cumprimento da pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por violação ao art. 180, "caput", do Estatuto Repressivo, substituída a privativa de liberdade por uma restritiva direito, consistente em prestação de serviços à comunidade;

- Luiz Carlos Freitas de Souza ao cumprimento da pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime semi-aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por violação ao art. 332, parágrafo único (duas vezes), na forma do art. 71 do Código Penal, e 3 (três) anos e 6 (seis) meses, em regime semi-aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por infração ao art. 311, "caput" (duas vezes), na forma do art. 69, do mesmo Diploma Legal, absolvendo-o dos crimes previstos nos arts. 333, parágrafo único (três vezes), 343, "caput" (duas vezes), 311, § 2º (duas vezes) e 288, "caput", todos do Código Penal, nos termos do art. 386, incs. I e IV, do Código de Processo Penal;

- Antônio Carlos de Souza ao cumprimento da pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por violação ao art. 311, "caput", do Código Penal, substituída a privativa de liberdade por duas restritivas direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), em favor do Asilo Vicentino de Lages, absolvendo-o do crime previsto no art. 288, "caput", nos termos do art. 386, incs. I e II, do Código de Processo Penal;

- Paulino Orlandi ao cumprimento da pena de 3 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal, por violação ao art. 311, "caput", do Código Penal, substituída a privativa de liberdade por duas restritivas direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), em favor da APAE de Lages, absolvendo-o do crime previsto no art. 288, "caput", nos termos do art. 386, inc. I, do Código de Processo Penal;

Adelino Roberto Toigo e Marli Teresinha Petry restaram absolvidos das imputações que lhes foram feitas, com base no art. 386, inc. IV, do Código de Processo Penal (fls. 859/888).

Posteriormente, foi declarada a prescrição com relação ao art. 180, "caput" , do Código Penal, imputado ao réu Alcides Domingos Spiazzi, nos termos do art. 107, inc. IV, c/c o art. 109, inc. V e art. 110, § 2º, todos do Código Penal (fl. 1.147).

Inconformados com a prestação jurisdicional, apelaram tempestivamente:

- o Ministério Público, requerendo, em preliminar, o reconhecimento da legalidade das interceptações telefônicas, eis que possível a realização de investigações criminais pelo "parquet". No mérito, postulou a condenação dos réus Adelino Roberto Toigo, nas sanções dos arts. 317, § 1º, c/c o art. 327, § 2º (três vezes em continuidade delitiva), 343, "caput" (duas vezes em continuidade delitiva), 311 § 2º (duas vezes em continuidade delitiva) e 288, "caput", na forma do art. 69, todos do Estatuto Repressivo, Marli Teresinha Petry, nas penas dos arts. 317, § 1º (duas vezes em continuidade delitiva), 311, § 2º (duas vezes em continuidade delitiva) e 288, "caput", na forma do art. 69, do mesmo Codex, Luiz Carlos Freitas de Souza, nas sanções dos arts. 333, parágrafo único (três vezes em continuidade delitiva), 343, "caput" (duas vezes em continuidade delitiva), 311, § 2º (duas vezes em continuidade delitiva) e 288, "caput", na forma do art. 69, do citado Diploma Legal, e Antônio Carlos de Souza e Paulino Orlandi, nas penas do art. 288, "caput", todos do Código Repressivo.

- Paulino Orlandi, requerendo a absolvição, por insuficiência de provas para amparar o decreto condenatório (fls. 912/913);

- Antônio Carlos de Souza, objetivando, em preliminar, o reconhecimento de nulidade da sentença, por falta de fundamentação. No mérito, postulou a absolvição, ao argumento de ausência de dolo (fls. 1.010/1.015);

- Luiz Carlos Freitas de Souza, colimando, em preliminar, o reconhecimento de nulidade da sentença, por entender que o édito não guardou relação entre a fundamentação e a parte dispositiva. No mérito, pleiteou a absolvição dos delitos previstos nos arts. 332, parágrafo único, e 311, "caput", do Códex Penal, com base no art. 386, incs. II e IV, do Código de Processo Penal (fls. 1.078/1.087).

Com as contra-razões (fls. 985/1.007, 1.023/1.040, 1.104/1.142, 1.150/1.162, 1.171/1.210, 1.240/1.244, 1.251/1.253), nesta Instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Luiz Fernando Sirydakis, manifestou-se pelo conhecimento e provimento, apenas, do recurso interposto pelo Ministério Público, para condenar o réus, nos termos em que foram denunciados e, ainda, que seja determinada a juntada dos autos n. 039.01.008921-5, desentranhados, no juízo "a quo", depois da prolação da sentença monocrática (fls. 1.257/1.271).

Em despacho deste relator, foi desarquivado o incidente de escuta telefônica n. 039.01.008921-5 e apensado ao presente feito.

VOTO

Preliminares

Pretende o representante do Ministério Público o reconhecimento da legalidade do procedimento investigatório encetado pelo Órgão Ministerial e das interceptações telefônicas realizadas.

Razão lhe acode, porquanto, sobre a investigação realizada diretamente pelo Ministério Público, vale lembrar que, apesar da controvérsia ainda persistir, inclusive, no Supremo Tribunal Federal, por força dos princípios da unidade da Constituição - uma espécie de interpretação sistemática especializada , da máxima efetividade e da força normativa da Lei Fundamental - o que se percebe é que o texto da Lei Maior, mais do que permitir, na realidade, exige a eficaz atuação do Ministério Público para o fim de evitar a impunidade daqueles que atentem contra os bens jurídicos fundamentais da sociedade.

De outra banda, tanto a CF/88, quanto a Lei n. 8.623/83 e a Lei Complementar n. 77/93, atribuem ao Ministério Público legitimidade para exercer poderes de investigação criminal.

Sobre a matéria, cita-se, do Supremo Tribunal Federal:

Ainda que se tratasse da temática dos poderes investigatórios do Ministério Público, melhor sorte não assistiria ao recorrente. A denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do MPF sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal. Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal (RE 535478/SC, rel. Min. ELLEN GRACIE, DJ 20.11.2008).

Na mesma linha, do colendo Superior Tribunal de Justiça:

Ao Ministério Público, em princípio, não compete a abertura e condução, com colheita de provas, do inquérito policial, mas, apenas, a teor da norma constitucional do inc. VIII, do art. 129, "requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de sua manifestação". Neste sentido, precedente do STF - RE 205.473-9. 2. Em se tratando, porém, de procedimento com o fito de apurar fatos reputados delituosos, cuja autoria é atribuída a integrante da organização policial, cuja atividade é controlada externamente pelo Ministério Público, "in thesi", não existe nenhuma antinomia nesta atuação, cifrada na promoção da investigação pela Promotoria de Justiça. 3. O objeto do controle externo da atividade policial é exercido, segundo prestigiosa corrente, entre outras áreas, sobre a apuração de crimes em que são envolvidos os próprios policiais. 4. Compatível legalmente o procedimento investigatório, sua eventual irregularidade, por outro lado, por invasão das atribuições da Polícia Judiciária pelo Ministério Público, em nada repercute ou afeta a ação penal, mesmo porque o inquérito não é essencial ao oferecimento da denúncia, dele podendo prescindir a acusação, caso, evidentemente, disponha de dados suficientes e necessários à caracterização da materialidade e autoria da infração penal, segundo pacífico entendimento pretoriano. 5. Recurso de habeas corpus a que se nega provimento (RHC 10.947/SP, rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ 12.8.2003, p. 260).

Nesses termos, data venia das considerações do diligente e ilustre magistrado, concebe-se que a polícia não detém exclusividade no desempenho do mister exercido neste feito pelo Ministério Público, a quem se dirigiria, de qualquer forma, a investigação (por ser titular da ação penal pública), especialmente, como, no caso, em que se defronta com a possibilidade de esquema criminoso e organizado, envolvendo Delegado de Polícia, o que torna plenamente justificável e lícita a atuação direta do "Parquet" nos procedimentos investigatórios realizados.

Portanto, deve ser reconhecida a licitude do procedimento investigatório.

Não fosse isso, as interceptações telefônicas realizadas pelo Ministério Público obedeceram as diretrizes prescritas na Lei n. 9.296 de 24 de julho de 1996, o que confere legalidade à prova.

Constata-se às fls. 1/4 (dos autos apensos n. 039.01.008921-5) que o Órgão Ministerial da Comarca de Lages, com base em elementos colhidos no curso de diligências preliminares, representou ao juiz pela autorização para interceptar diversos telefones fixos e celulares, incluindo o de n. (49) 2226415, usado pelo acusado Luiz Carlos Freitas de Souza ("Cardoso"), o que restou deferido em despacho judicial (fls. 30/31).

Posteriormente, com o aprofundamento das investigações, a 11ª Promotoria de Justiça, encarregada das investigações, postulou, por cinco vezes, a prorrogação do monitoramento daquelas linhas, bem como, pela inclusão de outras, na interceptação, o que foi judicialmente deferido (fls. 34, 38, 40, 42 e 44 do incidente em apenso).

Findo o monitoramento, as conversas foram reproduzidas pelo Centro de Apoio de Investigações Especiais do Ministério Público, de forma sintética, e apensada aos autos, com o relatório sobre o início dos trabalhos, segundo o comando do art. 6º, § único, da lei de regência (fls. 47/174 dos autos em apenso n. 039.01.008921-5), de sorte que não se vislumbra qualquer irregularidade na produção da prova.

Outrossim, o douto magistrado reconheceu a legalidade das escutas telefônicas, posto que autorizadas judicialmente, insurgindo-se, tão somente, quanto ao fato de ter sido realizada pela Procuradoria-Geral, o que, como visto, não encontra óbice na constituição e, sequer, na lei processual penal.

Dessa feita, perfeitamente válido o conteúdo da interceptação telefônica como meio de prova, devendo ser incorporada aos demais elementos probatórios, a fim de avaliar a conduta dos denunciados.

Ainda, visa o réu Luiz Carlos Freitas de Souza ao reconhecimento da nulidade da sentença, por entender que o édito não guardou correlação entre a fundamentação e a parte dispositiva, ao entendimento de que foi condenado pelo crime capitulado no art. 311, "caput", do Código Penal, mas, a fundamentação ocorreu com base no § 2º do citado dispositivo.

Entretanto, tal pretensão não grassa, pois o réu foi denunciado, também, pela forma qualificada, nos termos do art. 29 do Código Penal, diante da unidade de desígnios com os acusados Adelino Roberto Toigo e Marli Teresinha Petry, funcionários públicos e autores imediatos do delito capitulado no art. 311, § 2º, do Codex Penal.

Ademais, ainda que conste na sentença a alusão ao delito na forma qualificada, ao final, condenou-o, tão-somente, pelo "caput". O que se vê, na verdade, é que não houve fato novo, ou circunstância elementar não descrita na denúncia e, tampouco, outra classificação jurídica dos fatos, tendo o juiz condenado pelo delito de adulteração de sinal de veículo na forma simples, pelo qual foi denunciado, não se demonstrando qualquer eiva.

Também, deve ser rechaçada a aventada nulidade da sentença, argüida pelo acusado Antônio Carlos de Souza, quanto à ausência de fundamentação, uma vez que é possível constatar, às fls. 871/874, que o magistrado descreveu, corretamente, o "modus operandi" do apelante e demais réus, trazendo os motivos de fato e de direito que o levaram à decisão condenatória pelo crime previsto no art. 311, "caput", do Código Penal.

Ora, o juiz de direito não está obrigado a refutar, pontualmente, todas as alegações suscitadas pela defesa, bastando que indique a motivação fática e legal que o levaram a desconsiderar o argumento defensivo. E, no presente caso, não houve qualquer omissão no decisório, com relação às teses defensivas apresentadas nas alegações finais, não existindo vício capaz de invalidar a sentença.

A propósito, ADA PELEGRINI GRINOVER, ANTÔNIO SCARANCE FERNANDES e ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO, ao escreverem sobre os vícios da sentença, assim se posicionam:

Se o julgador examinou e valorou a prova, conheceu as teses das partes, aceitando-as ou repelindo-as, fica satisfeito o objetivo da lei (As Nulidades no Processo Penal, RT, 6ª ed., SP, 1997, p. 208).

Em igual sentido, têm sido os julgados desta Segunda Câmara:

SENTENÇA. NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. VEREDICTO QUE ATENDEU AO PRECEITO INSCRITO NO ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E NO ART. 381 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PREFACIAL REJEITADA.

A sentença que atende aos preceitos inscritos no inciso IX do art. 93 da Constituição Federal e no art. 381 do Código de Processo Penal não padece de qualquer nulidade (Ap. crim. n. 04.025003-7, de Lauro Müller, rel. Des. Sérgio Paladino, j. 27.10.2004).

Assim, não há que se falar em nulidade da sentença.

Nesse passo, ficam arredadas as insurgências preambulares.

Mérito

Forçoso reconhecer que integral razão assiste ao Promotor de Justiça, pois as provas constantes dos autos apontam a participação dos réus nas empreitadas criminosas que lhes foram assacadas.

Segundo a denúncia, na cidade de Lages, durante os anos de 2001 e 2002, os denunciados Adelino Roberto Toigo, Marli Teresinha Petry, Luiz Carlos Freitas de Souza ("Cardoso"), Antônio Carlos de Souza e Paulino Orlandi uniram-se, de forma estável e permanente, para a legalização de veículos com identificação irregular, "in casu", um caminhão Mercedes-Benz 1618, ano 1993, placas LZQ-9472, uma caminhonete Ford/F-4000, ano 1981, cor amarela, placas LYW-0651, e o automóvel VW/Voyage, ano 84, cor cinza, placas LZW-4790.

Marli Teresinha Petry, nas duas fases procedimentais, não assumiu o seu envolvimento nos ilícitos, declarando, no contraditório, que, real-mente, realizou as perícias da caminhonete F-4000 e do caminhão Mercedes Benz 1618, a pedido do delegado Toigo, mas não foi coagida e, tampouco, recebeu qualquer dinheiro dele ou de "Cardoso" para falsear os laudos. Contou, que, no momento em que o veículo vai para perícia, desconhece a destinação e não acompanha a seqüência da documentação que é entregue ao delegado solicitante. Explicou que, nas duas hipóteses, não teve nenhum tipo de contato com "Cardoso" e, quanto à perícia da caminhonete, inseriu a expressão "sugere-se a liberação do motor", o que não deveria ter colocado. Ressaltou, por fim, que acredita que em seu laudo constem cópias das notas emitidas nos dois casos, embora não lembre se uma delas era aquela anexada às fls. 74, bem como, não manuseou a nota do caminhão e sim a nota referente à retífica do caminhão de fl. 124 (fl. 405).

Adelino Roberto Toigo, nas oportunidades em que foi ouvido, negou as acusações, sustentando, em juízo, que despachou o pedido do proprietário da F-4.000, porque o delegado Marlus não estava, encaminhando a perícia à Marli, por telefone, sendo os documentos, posteriormente, entregues pelo dono, que alegou que a perda da numeração se dera em virtude de retífica, não sabendo de quem se tratava, até porque, sequer conhecia José Diomar Peixer ou "Zezinho". Sobre a perícia do caminhão Mercedes-Benz 1618, disse que estava nesta capital, quando "Cardoso" falou por telefone que havia dado um problema no caminhão de Alcides Spiazzi e que seria em decorrência da retífica. Na ocasião, orientou-o para que pegasse a nota fiscal, constando a placa, o número do motor e o chassis, porém, em Lages, recebeu outra chamada de "Cardoso", dizendo que os documentos estavam prontos e com o proprietário. Em seguida, fez contato com Marli, combinando a perícia, junto à 3ª Delegacia, onde estava de plantão, pegando os documentos com o motorista e repassando a ela. Aduziu, também, que não recebeu dinheiro, tampouco, pagou a perita ou prestou favorecimento a "Cardoso", pois, segundo ele, desconhecia ter o réu cobrado do proprietário do veículo para regularizá-lo. Esclareceu, ainda, que não examinou as perícias, recebendo os trabalhos e repassando-os aos interessados, até, pela presunção de que eram adequadas, já que, havendo a indicação de entrega ao proprietário, poder-se-ia concluir que não existiam problemas. Ademais, frisou que é fornecido manual ao pessoal do Ciretran orientando que, no caso de troca da numeração que identifica o veículo, são necessárias nota fiscal de entrada e saída e nota de serviço ou declaração de instalação de peças identificadoras, não cabendo, todavia, ao perito ou ao delegado de trânsito, tarefa do declarante, examinarem estes requisitos, o que compete aos funcionários do Detran. Salientou que nunca trabalhou no Ciretran e não tem acesso aos documentos do setor. Sobre as degravações, reconheceu a sua voz e a veracidade das conversas de fl. 55, referente à fita n. 1, lado A n. 9 e fita 2 lado B n. 21, bem como, não contestou o conteúdo das demais gravações, envolvendo os diálogos dos quais participou. Salientou, no entanto, que a conversa que teve com "Cardoso", a respeito do valor de R$ 50,00, tratava-se, na verdade, de uma rifa beneficente do hospital que estava vendendo (fls. 401/403).

Paulino Orlandi, perante a Promotoria, declarou que "Zezinho" lhe procurou, dizendo que a caminhonete F-4000 estava com problemas, pois não havia numeração do motor, levando-o até "Cardoso", que mexia com automóveis e poderia auxiliar na transferência do veículo. Declarou, ainda, que "Cardoso" cobrou R$ 1.000,00, para regularizar a situação, justificando que "iria dar R$ 500,00 para o Dr. Toigo", pois ele, "com esse dinheiro, poderia 'ajeitar' o documento necessário para a transferência da caminhonete". Contou, também, que, na sua oficina, pintou o motor dela, por idéia de "Cardoso", cobrando o declarante R$ 100,00 de "Zezinho" pelos serviços. Esclareceu, também, que os policiais militares levaram-no até o pátio da delegacia, onde estava o veículo Voyage, placas LZW-4790, de Lages, apreendido com Antônio Carlos de Souza, reconhecendo-o como aquele em que havia feito adulteração de chassi, soldando uma placa, contendo um outro número, sobre o original. Disse que Antônio levou o carro a mando de "Cardoso", que pediu que fizesse a substituição, sob a justificativa de que havia multas e que precisaria registrá-lo com outro número. Garantiu, no mais, que Antônio sabia que o carro iria ter o seu sinal de identificação adulterado e que foi "Cardoso" quem forneceu a chapa contendo a numeração para ele, o qual entregou-a para o declarante (fls. 108/110).

Diante do magistrado, contou que é proprietário de uma oficina de chapeação, sediada em Lages e, que, em certa oportunidade, foi procurado por "Zezinho" para que trocasse o motor de sua caminhonete, que estava sem numeração. Então, levou-o até à loja de Luiz Cardoso, onde eles conversaram e deduziu que ele "ia fazer alguma coisa no motor, com o laudo". Falou que "Zezinho" pagou, apenas, um cheque, e que Luiz Cardoso passou a lhe dizer que era para dar um jeito de cobrar o outro de "Zezinho". Disse que adulterou o veículo Voyage a pedido de Luiz Cardoso, sendo o carro levado até sua oficina pelo acusado Antônio, que sempre ficava na loja daquele. Salientou que a chapa que foi soldada no Voyage já estava dentro do carro e, ainda, que adulterou a numeração do motor de um fusca velho. Na ocasião, "Cardoso" disse que não era carro roubado e que não teria problema. Por fim, deixou claro que nunca falou com o delegado Toigo sobre qualquer assunto e que não tem amizade com ele e, tampouco, com a perita Marli (fl. 422).

Antônio Carlos de Souza ("Negão"), no inquérito, contou que, em diversas ocasiões, entregou, para Adelino Toigo, envelopes enviados por Luiz Cardoso, com documentos de veículos e dinheiro, nos valores de R$ 150,00, R$ 200,00 e R$ 500,00 (fls. 66/68).

Perante o juiz, tentando dar outro tom à assertiva, disse que, realmente, por várias vezes, entregou, para Adelino Toigo, dinheiro enviado por Luiz Cardoso, mas os valores se referiam à venda de uma lancha e de uma caminhonete rural de Toigo, bem como à rifa. Contou, ainda, que desconhecia se haviam irregularidades entre Toigo e "Cardoso" e que não fez nenhuma tratativa com os funcionários do trânsito acerca do caminhão e da caminhonete. Com relação ao veículo Voyage, embora esteja em nome da empresa "Raphcar", pertence-lhe, mas não sabia da adulteração do chassis, tendo conhecimento somente na Promotoria. Falou que Paulino fazia raros serviços para "Cardoso", não sabendo se ele mexia em numeração de chassis e motor. Disse, também, que a caminhonete pertencia a uma pessoa de Bom Retiro, e que foi deixada para "Cardoso" vender. Contou que esteve em contato com tal pessoa, para cobrar um cheque, sob a alegação de "Cardoso" de que se referia à compra de peças. Por fim, disse que não conhecia o acusado Alcides Spiazzi, assim como, ignorava o pedido de R$ 50,00 formulado de Toigo a "Cardoso". Contou que conhecia Marli, mas nunca tratou nada com ela. Esclareceu, ao final, que a empresa "Raphcar" foi montada tendo como sócios o declarante e Rafael Freitas de Souza, filho de Luiz Cardoso, mas, na verdade, a firma pertencia a Luiz Cardoso e atuava no ramo de autopeças (fls. 427/428).

Luiz Carlos Freitas de Souza, nas duas etapas procedimentais, confessou parcialmente as condutas delitivas, afirmando ao magistrado que foi procurado por Alcides, pois ele precisava transferir um caminhão, mas não conseguia porque não havia número no motor, em virtude de ter sido retificado. Então, orientou-o que pegasse uma nota fiscal de retífica, justificando com os demais documentos a causa da ausência de número. Depois disso, "um tal de Geovani arrumou a nota de retífica e foi dado entrada no processo de regularização na delegacia" e, por isso, cobrou R$ 2.000,00 de Alcides, mas nada pagou ao delegado Toigo ou a perita Marli, apenas pediu ao delegado que "andasse mais depressa o processo". Sobre parte do diálogo mantido com Toigo, asseverou que, ao falar que lhe daria R$ 500,00, era para que "seu irmão não soubesse que ficou com mais dinheiro do que ele". Quanto à caminhonete de Bom Retiro, não falou com Toigo ou com a perita, contatou, apenas, com "Zezinho", fazendo o mesmo procedimento administrativo, sendo o veículo levado à retífica "PJ", onde foi emitida a nota fiscal. Falou que o telefonema que recebeu de Toigo,quanto à cobrança do valor de R$ 50,00, referia-se a uma rifa. Enfatizou que nunca deu placas ou documentos do automóvel Voyage para Antônio, que tinha um carro próprio em nome da firma de que era sócio, sendo um Voyage regular, que havia sido adquirido de um policial militar (fls. 436/437).

Alcides Domingues Spiazzi, na fase judicial, garantiu que pagou R$ 2.000,00 a "Cardoso" para a transferência do caminhão, asseverando que ele lhe disse que "dava um jeito de transferir o veículo", e que a documentação seria legalizada. Em seguida, de posse dos documentos e da perícia, entregou o carro José Marlon. Salientou que, apesar da facilidade e rapidez com que as coisas foram providenciadas, com relação à perícia efetuada no motor do caminhão e documentação de transferência, não desconfiou de nada, mesmo sendo pessoa do comércio, pois, pelo que soube à época, "tudo estava sendo encaminhando por um delegado" (fls. 461/462).

Luis Jair de Jesus, proprietário da empresa "PJ Ltda.", reconheceu, perante o magistrado, a emissão da nota 00292, a qual se refere a serviços de retífica prestados em um motor Ford, que, então, estava desmembrado do veículo. Disse que esteve no pátio da polícia militar examinando o Ford/F-4000, constatando que nele havia um motor MWM, que não correspondia ao motor em que foi efetuada a retífica. Afirmou, ainda, que "a retífica em motores MWM ou Ford não implica danos à numeração". Além disso, tal trabalho envolve, apenas, a parte de dentro do motor, enquanto a numeração fica registrada em sua lateral e, que, em condições normais, não há como causar danos à identificação. Esclareceu que recebe os motores desmontados, faz o serviço e os devolve, ainda desmontados, sendo que, algumas oficinas, pintam o motor após a retífica, outras não. Mas, mesmo nessa hipótese, não há porque ocorrer danos na numeração. Salientou que já fez serviços para o acusado Luiz Cardoso e que Antônio Carlos, por várias vezes, levava motores para reparos a pedido dele (fls. 519/520).

Pedro Henrique Brostolin, dono da empresa "Pedrinho Auto Peças", em juízo, contou que a nota fiscal, cuja a cópia repousa à fl. 124, aparentemente, pertencia à empresa de sua propriedade, porém, não havia sido emitida por ele, até porque, elas são sempre manuais. Por isso, empreendeu diligências, inclusive, junto à Receita Estadual, descobrindo que a nota fiscal era falsificada. Disse que o responsável pela extração irregular da nota foi Giovani Branco, que tinha pequena participação na firma, o qual admitiu que, a pedido de "Cardoso", forneceu o documento em branco. Explicou, ainda, que sua empresa, há 20 anos, trabalhava no ramo, assegurando que as retíficas não implicam danos nos motores, sejam marca Ford ou MWM, pois, na verdade, "não há danos, seja qual for a marca do motor no qual se realize o serviço", a não ser, quando alguém rasura, propositalmente. Garantiu, no mais, que não há como raspar a numeração do bloco acidentalmente, até porque, fica separada do local de abertura (fls. 520/521).

Suas palavras são confortadas por Giovane Branco, que, na presença do juiz, declarou que seu "compadre" Clésio foi procurado por Luiz Cardoso, que lhe pediu uma nota fiscal, sob a alegação de que precisava cobrar um serviço. Então, Clésio procurou-o, repassando-lhe o pedido, razão pela qual extraiu a primeira via da nota fiscal do bloco, cuja cópia se encontra à fl. 124, entregando-a nas mãos de Luiz Cardoso, ainda, em branco. Salientou que, na oportunidade, o acusado não especificou a que tipo de serviço se referia a cobrança de e nem de que pessoa. Assegurou, também, que costumava preencher as notas da empresa, manualmente, e que, naquela oportunidade, extraiu apenas a nota, sem preenchê-la, deixando as demais no talonário, intactas. Posteriormente, contou este fato a seu sócio Pedro Brostolin, transmitindo o motivo alegado por Luiz Cardoso, sendo que desconhece o que foi inserido no documento. Na esteira do que garantiu seu sócio, asseverou que a abertura de motores, para fim de retífica, não produz qualquer dano na numeração do motor, até, porque, "a plaqueta de identificação fica separada do local onde se procede a abertura do bloco". Falou que trabalhou seis ou sete anos nessa área, e, durante esse período, nunca viu danos na numeração do motor, em razão de retifica, o que pode ocorrer, excepcionalmente, em função de acidente, porém, não em condições normais de trabalho. Contou que eventual pintura, também, não altera a numeração, que se dá, somente, com a raspagem manual, sendo que a passagem do tempo ou ferrugem não produzem danos à numeração. Ressalvou que a plaqueta da numeração vem fixada de fábrica com lacre inviolável (fls. 522/523).

José Mansueto Molon, proprietário do caminhão Mercedez-Benz 1618, na fase judicial, disse que adquiriu o veículo de Alcides Spiazzi, porém, ao tentar a transferência, foi alertado de que o motor estava sem número, o que impediria a regularização. Então, buscou desfazer o negócio com Alcides, quando ele afirmou que resolveria o problema e efetuaria a transferência do veículo, pedindo-lhe que levasse o caminhão até Lages. Chegando lá, Alcides pegou o caminhão, voltando, à noite, com o veículo cheirando à tinta, dizendo que a documentação ficaria pronta no dia seguinte. Depois disso, Alcides lhe disse que o motor daquele caminhão não era mais o original da fábrica e que ele havia trocado por um motor 1620, ano 1998, justificando, ainda, que, no momento em que o mecânico trocou o motor, danificou a plaqueta, razão pela qual foi necessário pintá-lo para que passasse na vistoria. Durante o exame, na Delegacia de Polícia, Alcides sugeriu que não ficasse no local, sendo levado por uma outra pessoa, de volta ao posto, mas ele não lhe explicou o porquê da regularização do motor dever ser feita na cidade de Lages. Asseverou que entregou o documento recebido de Alcides, da Delegacia Regional de Lages, para o vistoriador, que liberou a vistoria, tendo levado os documentos necessários para a delegacia de Iomerê, para transferência do veículo em seu nome (fls. 570/572).

Jairo de Souza, investigador policial, no contraditório, disse que ouviu as conversas através das fitas gravadas, onde o acusado "Cardoso" narra a intermediação junto à autoridade policial, especificamente, com o "Dr. Toigo", para conseguir regularizar a transferência de um caminhão, o qual possuía problemas de identificação no motor. Falou, ainda, que, segundo "Cardoso", ele conseguiria uma nota como se tivesse perdido a numeração quando da retífica, o que na verdade não ocorreu. Salientou, também, que, em virtude da interceptação telefônica, localizou Alcides Spiazzi e obteve informações a respeito do destino do caminhão que havia sido vendido para Marlon. Disse que, em um trecho dos diálogos, constatou que "Dr. Toigo" orientava "Luiz Cardoso" onde pegaria a nota fiscal e o dia em que deveria ser levado para vistoria, bem como, que as gravações registram, ainda, a participação da acusada Marli, sempre que eram necessárias as vistorias, o que era feito através do delegado Toigo. Deixou certo que o trabalho feito contou com a colaboração da Promotoria, até porque havia no caso possível participação de policiais nos fatos (fl. 577).

Fernando de Arruda Matos, na etapa judicial, disse que trabalhou como secretário junto ao "Despachante Gasperin", o qual fazia serviços para "Cardoso" e para "João Caolho". Falou que lhe foi apresentado o documento onde Dione Daniel Guarda solicita a realização de uma perícia em seu veículo, o qual reconhece como sendo confeccionado por ele. Salientou que, no ano passado, Luiz Cardoso lhe telefonou pedindo que preenchesse o referido documento, recebendo R$ 10,00 pelo serviço (fl. 580).

Ivonete Moraes, contou ao juiz que seu marido José Diomar Peixer comprou uma caminhonete F-4000, registrando-a em seu nome e, quando a vendeu, não passou a documentação, porque inexistia o número do motor. Em vista disso, José Diomar pediu-lhe dois cheques, no valor de R$ 500,00, pois tinha alguém em Lages que iria resolver o problema, sendo que, posteriormente, uma das cártulas foi descontada. Informou que recebeu uma ligação de "Cardoso", cobrando-lhe os cheques, quando, então, apareceu em sua casa uma pessoa conhecida por "Negão" e levou um cheque de sua titularidade, no valor de R$ 490,00. Esclareceu, ainda, que nunca assinou nenhum documento para liberação do veículo (fl. 591).

José Diomar Peixer, conhecido por "Zezinho", em juízo, confirmou que existiam irregularidades no motor de sua caminhonete F-4000, fato que impedia a transferência de sua titularidade, motivo pelo qual entrou em contato com "Cardoso", por intermédio de Paulino, visando a regularizar a situação, pegando os documentos diretamente das mãos de Adelino Toigo. Antes disso, "Cardoso" falou que o serviço custaria R$ 1.000,00 e que queria R$ 500,00 adiantado, então, o declarante deu dois cheques de R$ 500,00. Disse que, no dia em que foi à Lages, levou o valor de R$ 500,00, em dinheiro, trocando-o por uma das cártulas (fl. 592).

Sérgio Nivam de Abreu, supervisor da Ciretran, perante o magistrado, esclareceu que ocupa o cargo, há vinte anos, e que o Dr. Toigo nunca assinava documentos de veículos, pois não era delegado regional. Disse que a delegacia de acidentes de trânsito não tem nenhuma ligação com o Ciretran e quem determina a vistoria nos veículos que vêm da perícia é o próprio delegado regional, cargo que Toigo nunca ocupou, nem em substituição, durante o período em que lá esteve. Salientou, no mais, que quando há uma danificação através da aplainagem, a própria retífica emite uma nota fiscal de serviço comunicando, ressaltando que, qualquer alteração de características em veículos deve ser por escrito, em formulário padrão, ou através do Cadastro de Renavam, no qual existem questões a serem respondidas pela pessoa que está solicitando a alteração (fl. 676).

No mesmo sentido, Antônio Marlus Arruda Maliverni, na etapa judicial, afirmou que o delegado Adelino nunca mexeu com veículos e, que, "quando se fala em delegacia de trânsito, estamos falando em acidente de trânsito", que era função de Adelino. Disse, ainda, que apenas a delegacia regional é que emite documentos de carros e faz vistoria (fl. 674).

A testemunha indicada pela defesa do denunciado Adelino, Maria Aparecida Melo Ramos, falou ao juiz que nunca teve conhecimento de qualquer delito praticado por Toigo e que ele havia repassado um bloco de rifa a "Cardoso", com quem a declarante contatou por telefone, solicitando sua devolução e a do numerário arrecadado. Por fim, esclareceu que uma pessoa ligada à empresa de "Cardoso" trouxe a quantia de R$ 50,00 e o bloco de rifas (fl. 614).

Dilson Freitas de Souza, irmão de "Cardoso", no contraditório, afirmou que presenciou a "negociata" com Alcides Toigo, aduzindo que seu irmão comentou a necessidade de fazer uma nota fiscal para que pudesse ser feita uma perícia ou vistoria na delegacia. Contou, ainda, que "Cardoso" havia lhe dito que era necessário aplainar o motor, para depois submeter o veículo à perícia. Falou que, efetivamente, ouviu seu irmão dizer que "iria dar R$ 500,00 para o doutor". Esclareceu, ainda, que "Cardoso" recebeu 1.500,00, do qual foram repassados 500,00 a ele próprio, calculando que "Cardoso" tenha recebido mais do que havia anunciado. Disse, ainda, que seu irmão usou a pessoa do delegado para justificar o montante menor que lhe foi entregue, alegando que "tinha um acerto com o delegado e que tinha que entregar o valor" (fl. 626).

Zilma Rizzana Fortuna, voluntária do Hospital Nossa Senhora dos Prazeres, disse, em juízo, que havia deixado um bloco de rifa com o delegado Toigo, pegando os valores, posteriormente, "com dona Cida" (fl. 628).

Darci Alfredo de Melo, Dirceu Varela, Paulo Luiz Gambá e Ivan Bertotto (fls. 619/632) nada esclareceram sobre os fatos narrados na denúncia, sendo meramente abonatórios das condutas dos réus Paulino Orlandi e Luiz Carlos Freitas de Souza.

Em defesa de Marli Terezinha Petry, o policiai civil Levy Inácio Filho disse que é comum a ocorrência de danos no motor, inclusive, com a ausência de plaqueta de identificação, o que também se deve à reformas. Falou que as plaquetas são fixadas, normalmente, por dois rebites, sendo usualmente de alumínio, e que os procedimentos, no caso, são diversos, desde a simples constatação do dano pela retífica, até a solicitação de carta-laudo do fabricante, dependendo. Acrescentou que, em alguns casos, a pessoa possuía nota fiscal relativo a retífica, inclusive informando o dano na numeração, mas as situações dependiam da aferição do perito e de seu desenvolvimento na espécie (fl. 633).

No mesmo rumo, Alexandre Silva Poroski contou que, nos casos da perda da numeração em função da retífica, a pessoa deverá provar que fez serviço junto a uma oficina, onde pode ocorrer a perda da numeração (fl. 635).

As escusas apresentadas pelos recorrentes não encontram suporte nas demais provas coligidas, das quais sobressaem que eles estavam associados, de maneira permanente, para a prática de delitos relacionados à adulteração de sinais de identificação de veículos automotores, com conseqüente legalização mediante a prática de corrupção ativa e passiva.

Não apenas os testemunhos dos agentes públicos são conclusivos, como, ainda, as conversas telefônicas transcritas nos autos em apenso n. 039.01.008921-5 demonstram o esquema entre os denunciados para legalizar automóveis adulterados.

Como se deduz, por exemplo, dos diálogos anotados às fls. 54/55, onde Luiz Cardoso pergunta a Toigo se ele ainda estava nesta Capital, pois "tem um pessoal lá de Anita Garibaldi, dos Spiazzi lá sabe?" que "tão com problema lá igual aquele da caminhonete, sabe?, dum número lá", tendo Toigo respondido "tem que trazê tudo pra cá pra fazê com a Marli" e, continuando a conversa, Luiz Cardoso fala "é, amanhã ela tá ali, posso ajeitá tudo aqui? Mas dai eu vô vê bem aqui, porque é um caminhão dezesseis dezoito (1618)", alertando Toigo de que "eu tinha que dá uma ligada pra ela, ela vai tá de plantão amanhã?". Em seguida, Luiz Cardoso, diz "vai de certeza eu me informei lá", e Toigo argumenta, "deixa, deixa aquela documentação ajeitada tudo lá", pra gente fazê o mesmo esquema né?", e Luiz Cardoso reponde, "tá doutor, e aí, é interessante ali, tá?", tendo Toigo respondido afirmativamente, enquanto o comparsa assegura que "pode ficá tranqüilo". Logo após, Toigo responde "tá bom" e pergunta "é, foi... foi.. foi.. retificado também?", recebendo em resposta "tudo, mas feito no Pocai ali tudo", e Toigo quer saber se "a nota é do Pocai?. Luiz Cardoso diz "parece que é". Despedem-se e Toigo ainda orienta: "tá joía", mas constá no fazé a nota, constá o serviço e o número do chassi do veículo, tá?".

Referem-se as conversas, por óbvio, à legalização indevida do caminhão Mercedez-Benz 1618. Mais adiante, deixa claro que Marli, perita nomeada, era quem faria o laudo fraudulento, para a transferência do veículo para outra pessoa, tanto que o denunciado Adelino Toigo perguntou se era ela quem estaria de plantão, o que foi confirmado por Luiz Cardoso, que já havia ligado para a delegacia para falar com ela. Ainda, ficou evidenciado que Adelino Toigo orientou Luiz Cardoso sobre como montar, falsamente, a documentação para regularizar o caminhão, para que nada desse errado.

Verifica-se, também, às fls. 74/75, que, justamente, no dia em que foi efetuada a perícia no caminhão Mercedes-Benz 1618 (6.9.2001), Luiz Cardoso e Clésio conversaram sobre a origem da nota em branco da "Retífica Pedrinho Auto Peças".

Segue-se a conversa entre eles:

Clésio:"falei ontem à noite com Giovani, dai ele disse assim, se era pro Luiz já entreguei", respondeu

Luiz Cardoso: "eu precisava urgente hôme do céu".

Clésio: "entreguei em branco".

Luiz Cardoso: "é? Eu tô fazendo lá, acho, acho que vai dar certo, acho".

Clésio: "É, ai se eu entrego em branco, é da boa né?"

Luiz Cardoso: "Claro", Clésio, pode faze o que qué"

Luiz Cardoso: "Ah.. Não, mas dai eu tive que fazé uma cópia aqui pra ela lá né, se não daí se dá uma zebra? E, ainda, eles tem que checá nê?"

Clésio: "Vai tê que ficá uma via com ele, não fica?"

Luiz Cardoso: "não, é, uma via. Ahã. Tô me virando aí pra dá certo, só falta... Agora ir pra vistoria né?"

Clésio: "Ahã".

Luiz Cardoso: "Depois eu te explico como é que é"

Clésio: "tá bom".

Observa-se, sem qualquer vacilo, que a nota fiscal era uma das bases da fraude, pois Luiz Cardoso, mesmo colocando os dados especificados por Adelino, cujo teor atestou falsamente, afirmando que o motor da caminhonete houvera sido recondicionado, acabou preenchendo-a à máquina, a fim de juntar ao procedimento da vistoria. No entanto, como o próprio dono da "Retífica Pedrinho Auto Peças" afirmou, embora a nota fiscal de fl. 124 fosse da sua empresa, não foi emitida por ele, porque discrepava da feitura habitual.

Além disso, a simulação de que o motor do caminhão, de fato, teria sido retificado, para justificar a irregularidade de sua numeração, restou desmascarada. Como se viu, além de não ter sido, realmente, feita essa operação no veículo, as testemunhas Pedro Henrique Brostolin e Giovani Branco garantiram que seria impossível danificar a numeração de um motor no momento em que fosse efetuada a retífica e, tampouco, acidentalmente, uma vez que fica separada do local de abertura do bloco.

E, por mais que os policiais civis Levy Inácio Filho e Alexandre Silva Poroski, arrolados pela defesa de Marli, falem sobre como a retífica poderia danificar a identificação de um motor, o fato é que José Mansueto Molon, proprietário do caminhão Mercedes-Benz, não mencionou qualquer tipo de retífica. Ao contrário, antes de comprar, o veículo passou por uma revisão, tendo o mecânico responsável chamado atenção para o fato de que estava sem identificação e nunca sobre a necessidade de qualquer retífica.

Mas não é só. A nota fiscal apresentada pelo co-denunciado Alcides Spiazzi, para justificar a origem do motor do caminhão, restou expedida por empresa fria, cujo CGC nunca existiu, conforme certidão da Secretaria de Estado da Fazenda de fl. 76, tanto é verdade que ele foi condenado por receptação nos presentes autos (fls. 874/875).

Veja-se, ainda, a conversação de fls. 55/56, quando Luiz Carlos Freitas liga para Fernando, secretário do "Despachante Gasperin":

Luiz Carlos: "eu tô com um senhor aqui, eu falei com o doutor por telefone, ele tava lá em Florianópolis. É o seguinte... Eu preciso fazê um pedido junto ao Departamento de Trânsito, tá, que faça uma perícia num motor dum veículo, dum caminhão, é para ... Devido a um problema de retífica, entendeu mais ou menos não?"

Fernando: "entendi, igual nós fizêmo esse dias né?"

Luiz Carlos: "Sim "fizêmo um é, igual aquele que foi feito, mais ou menos", daí o senhor passa ai, daí tu... É o mesmo preço ainda? Dez (10) pila?"

Fernando: "Não, é. Qualquer troco né?"

Luiz Cardoso: "Então tá, daí ele te paga dez (10) pila aí pra você tá?"

Fernando: "Tá beleza".

Luiz Carlos: "Faz esse requerimento bem batidinho pra mi ali, tudo direitinho, tá certo? Faz bonitinho, com data de hoje, ao Departamento de Trânsito... assim, assim, assim tá?".

Fernando: "Tá okei então".

Luiz Carlos: "Tem que sê no nome que vai o documento ali, tá?".

Fernando: "Tá jóia".

Ora, nesse particular, também ficou explícito que Luiz Carlos forjou um requerimento destinado ao Delegado Regional de Polícia de Lages, para a realização da perícia, o qual também foi juntado ao procedimento de vistoria. Este fato foi confirmado por Fernando, em seu depoimento perante o magistrado - que fez o requerimento a pedido de Luiz Carlos Freitas de Souza, recebendo R$ 10,00 pelo serviço (fl. 580). Mas, não houve nenhum tipo de manifestação e sequer assinatura dessa autoridade policial.

Tanto que, às fls. 68/70, Luiz Carlos, na posse da documentação forjada, trata com Toigo (que não respondia pela Delegacia Regional de Lages), a perícia do caminhão de Alcides Spiazzi, liga para a Terceira Delegacia e pergunta "quem tá falando? a pessoa responde "é Adeloni".

Segue-se o diálogo:

Luiz Carlos: "Adeloni, me diz uma coisa, será que o doutor Toigo tá ai? Pra mim falar com ele um minutinho".

(...)

Toigo: "Oi".

Luiz Cardoso: "Chegô de viagem?".

Toigo "Já, trabalhando".

Luiz Cardoso: "Tô com o processo tudo prontinho aqui, o pessoal tá aqui, daí".

Toigo: "Deixa eu vê se eu consigo localizar na casa dela. Qual o telefone que se tá?"

Luiz Cardoso: "Tô no dois dois dois meia quatro quinze (222.6415).

(...)

Luiz Carlos: "Dotor, que vê óh... Tá a documentação tudo certinha, tá a ficha do caminhão que foi comprado zero aqui em Lages, sabe?" (...) "Foi tirado ali na Mercedes, tá a nota fiscal do..."

Toigo: "Constaram o número do chassi na nota fiscal, direitinho?"

Luiz Carlos: "O número do chassi na nota fiscal, e anota fiscal é da retífica Pedrinho, tá?"

Toigo: "Ahã, o número que o motor tinha, não?"

Luiz Carlos: "Não, não tem número ali, na nota não tem número".

Toigo: "Não tem número".

Luiz Carlos: "Tá? Mas tem a ficha técnica do caminhão desde zero".

(...)

Toigo: "Tá bom então". (...) "E da onde é este caminhão?"

Luiz Cardoso: "Ele foi comprado aqui em Lages, na Corema. (...). "Tá emplacado em Celso Ramos". (...) "É dos "Spiazi lá".

Toigo: "Então tá. Deixa eu vê se consigo faze hoje".

(...)

Luiz Cardoso: "Dai o senhor vê... Só que esse caminhão é meio pesado pra entrá no centro". (...) "Podia se até ali em Cassis".

Toigo: "Ou qualquer coisa levá no pátio do 2º DP lá.

Luiz Carlos: "Ou pro senhor aí em cima, tanto faz né?'

Toigo: "É tanto faz, eu vô ve se faço dá certo com a baixinha".

Luiz Carlos: "Então, tá doutor, então tô lhe aguardando".

Esse trecho traz uma clara alusão ao desiderato do réu Toigo para que a perícia fosse realizada pela denunciada Marli, usando de sua influência para que a vistoria fosse efetivada, e, ainda, que ela receberia pelo serviço, embora o valor ajustado não tenha sido revelado na conversação.

Não fosse isso, ficou claro que Toigo combinou com Marli, que, no ato da perícia, ela deveria receber sua vantagem, conforme os diálogos de fls. 70/71, onde Toigo liga para Luiz Carlos e marca às "onze horas aqui no terceiro (3º)", justificando que "ela tá fazendo três (3) arrombamento", e orientando o acusado Luiz Carlos para colocar "tudo em um envelope" e "já manda aquela documentação dela junto tá?".

Transcreve-se:

Luiz Carlos: "Tá combinado", "tá bom doutor, pode deixa que não tem problema".

Toigo: "Onze horas aqui"

Luiz Carlos: "Dai oh doutor, é, eu só vô mandá o caminhão aí com o senhor, tá?".

Toigo: "Tá".

Luiz Carlos: "Vai o senhor Spiazzi mesmo aí, daí".

Toigo: Põe toda a documentação dentro de um envelope", (...) "inclusive a ... o material que ela precisa, tal ..."

Luiz Carlos: "Tá tudo prontinho ali".

Toigo: "E manda direto pra mim, aqui no pátio do terceiro (3º), explica aonde é que".

Luiz Cardoso: "Tá combinado doutor".

Nesse ponto, vê-se que o pedido de Toigo de que toda a documentação deveria estar dentro de um envelope era, na verdade, o numerário destinado a Marli, tanto que alertou a Luiz Carlos de que "era o material que ela precisa".

Em outro contato às fls. 76/77, demonstra que Adelino Toigo foi à loja "Multi-Peças", de Luiz Carlos, para receber a vantagem prometida:

Luiz Cardoso: "Eu não, gostaria muito de passá aí, né? Como é que faz?".

Toigo: "Eu tenho que dá uma saída, pegá a minha caminhonete que eu deixei ali no Fábio, daí eu passo ai".

Luiz Cardoso: "Então lhe aguardo".

Toigo: "Então tá".

Luiz Cardoso: "Tá bom".

No colóquio de fls. 58, dois dias antes da perícia, Luiz Carlos Freitas fala com seu irmão Dilson Freitas de Souza:

(...)

Luiz Carlos: "Eu tô aqui no seu Dorival". (...). "Vô resolvê já esse problema aqui da nota da fiscalização, vó lá já pra não deixá pra depois".

Dilso: "Então tá".

Luiz Carlos: "Outra coisa". (...). "Ali daquele do cara, sabe os Spiazzi, ali"..."

(...)

Luiz Carlos: "Eles já foram buscá o coisa lá e tudo, falei com o homem já lá embaixo, táva viajando, ma falei com ele, amanhã ele tá aí ... Dois mil (2.000), vô dá quinhentos (500) pra ele, sobra mil e quinhentos (1.500).

(...)

Tais diálogos revelam, inequivocamente, o montante que Luiz Carlos Freitas cobraria pelo serviço de transferência do caminhão Mercedes-Benz 1618 (R$ 2.000,00), deixando evidenciado que parte desse dinheiro (R$ 500,00) seria o valor da vantagem ilícita prometido ao Delegado Adelino Toigo.

Ademais, esse comportamento criminoso foi confirmado por Alcides Spiazzi (fls. 461/462) e Dilson Freitas de Souza (fl. 626), que, não só anunciaram o pagamento do valor de R$ 500,00 a Toigo, como, também, um acerto de valores que ambos os apelados tinham entre si. Ainda, o apelado Antônio Carlos de Souza, na presença do Ministério Público, afirmou que, várias vezes, entregou para Adelino Toigo documentos de veículos e dinheiro, nos valores de R$ 150,00, R$ 200,00 e R$ 500,00 (fls. 66/68). Por sua vez, Alcides Domingues Spiazzi confirmou que, "apesar da facilidade e rapidez com que as coisas foram providenciadas", com relação à perícia efetuada no motor do caminhão e documentos de transferênica, não desconfiou de nada, até porque, pelo que soube na época, "estava sendo encaminhado por meio de um delegado" (fls. 461/462).

Então, ao contrário do que tentam fazer crer Luiz Carlos Freitas e Dilson, o valor de R$ 500,00, em dinheiro, mencionado nas ligações, era, efetivamente, destinado ao denunciado Adelino Toigo, como pagamento da vantagem prometida pelo primeiro, para que, no exercício da função de Delegado de Polícia, inclusive, com atribuições na Delegacia de Trânsito, empreendesse os esforços necessários para permitir a transferência do caminhão, o que de fato ocorreu, pois Luiz Carlos admitiu que conversou com o delegado para que as coisas "andassem mais depressa", procedimento que não fazia estranhos às atribuições deste agente público.

Posterioremente, Marli Teresinha Petry, na posse da nota fiscal e dos requerimentos falsos, efetuou o laudo pericial no caminhão, constando como autoridade solicitante Adelino Roberto Toigo, cuja vistoria foi feita em atendimento à solicitação verbal da autoridade policial (fls. 119/121). No entanto, vê-se aí mais uma fraude, pois a perícia lavrada pela acusada Marli não corresponde à realidade e, tampouco, à perícia oficial de fls. 34/50, fato que se torna conforme à imputação acusatória formulada. Com efeito, embora tivesse indicado no laudo pericial que estava ausente a plaqueta de numeração do motor, certificou que o proprietário lhe apresentou documentos idôneos a superar tal omissão (fl. 121). Todavia, ouvida, conquanto negasse a influência de outrem, a perita disse que cometeu "um equívoco", pois a nota fiscal que lhe foi apresentada não era original, logo, deveria tê-la requisitado (fls. 55/56 e 405).

Está claro nos autos que não houve retificação do motor, porque, também, não há, sequer, registro de requerimento protocolado junto ao Ciretran solicitando a alteração de características do caminhão. Aliás, a perícia realizada por Marli vem desacompanhada de fotografias, e baseada somente na nota fiscal n. 001616 de fl. 124 e no requerimento solicitando a perícia de fl. 125.

Igualmente, as investigações encetadas pelo Ministério Público descobriram que, durante o mês de agosto de 2001, José Diomar Peixer, conhecido como "Zezinho", proprietário da caminhonete Ford/F-4000, ano 1981, cor amarela, placas LYW-0651, não conseguiu vender seu veículo, pois apresentava o mesmo problema na identificação do motor.

Consta, então, das peças processuais que a transferência da propriedade percorreu, praticamente, o mesmo caminho. Luiz Carlos, após a intermediação de Paulino, procurou Adelino Roberto Toigo, para que, em razão de seu cargo de delegado, junto à Delegacia de Trânsito de Lages, com a colaboração de Marli, efetuasse os procedimentos necessários para regularizar a caminhonete F-4000 de origem espúria, junto ao órgão de trânsito.

De fato, José Diomar Peixer deixou patente que entrou em contato com Cardoso, por intermédio de Paulino, visando a regularizar o seu veículo, pagando para ele R$ 1.000,00 pelo serviço.

Saliente-se, ainda, que José Diomar Peixer recebeu, diretamente de Adelino Roberto Toigo, a documentação e a caminhonete, atribuição, como se viu, exclusiva do Delegado Regional de Lages.

Ivonete Moraes falou que seu marido José Peixer comprou a caminhonete F-4000, registrando em seu nome e, quando a vendeu, não passou a documentação, porque estava sem o número do motor. Ainda, José lhe pediu dois cheques, dizendo que uma pessoa em Lages resolveria o problema. Depois, Luiz Cardoso lhe telefonou, cobrando os cheques que havia emitido para o pagamento pelo seu serviço de despachante. Chamou atenção, ainda, para o fato de que nunca assinou nenhum documento para liberação do veículo (fl. 591).

Percebe-se, ainda, facilmente, da cópia do documento acostado à fl. 208, que ele foi falsificado, não só porque Ivonete não assinou qualquer documento de liberação do veículo, como, também, ante as discrepâncias encontradas na assinatura dela, apostas à fl. 208 e em seu interrogatório à fl. 591.

Ademais, o próprio apelado Antônio Carlos de Souza ("Negão") admitiu ter ido até Bom Retiro para cobrar o cheque, pessoalmente, de Ivonete, cuja situação foi confirmada por ela (fl. 428).

Relevante assinalar que Luis Jair de Jesus, proprietário da empresa "PJ Ltda.", garantiu que a retífica em motores MWM ou Ford não implica em danos na numeração do motor, porque envolve, apenas, a parte de dentro, enquanto a numeração fica registrada na lateral. E disse mais, que, no dia 22 de fevereiro de 2002, vistoriou o veículo Ford/F-4000, ano 1981, cor amarela, placas LYW-0651, de Bom Retiro, o qual tinha sido apreendido e estava no pátio da polícia militar, e verificou que nele havia um motor MWM, o qual não correspondia ao motor Ford que foi instalado na retífica, conforme nota fiscal n. 000292 de fl. 112, evidenciando, com isso, a falsidade do documento e a fraude praticada pela quadrilha (fls. 436/437).

Consoante o laudo pericial efetuado por Marli, novamente, embora tivesse indicado que estava ausente a numeração da codificação do motor, porque teria sido aplainado na retífica, certificou que foi apresentada a nota fiscal n. 0000292, datada de 1.8.2001, da "Retífica PJ Ltda.", situada na cidade de Lages, a superar tal omissão (fls. 203/208).

Vê-se, portanto, que tal exame levou em consideração, somente, os documentos de fls. 112 e 208, ou seja, a nota fiscal n .000292 e o requerimento produzido por Luiz Carlos Freitas de Souza, no qual ele pede um laudo para o motor da caminhonete F-4000, sob o escopo de ter sido colocado em uma retífica para reparos e os mecânicos acabaram danificando o número do motor, o que o obrigava a fazer tal solicitação.

Ora, a razão alegada para liberar o veículo, expostas no requerimento produzido por Luiz Carlos Freitas de Souza, é desmentida pelo laudo oficial de fls. 35/44, conforme atesta o perito criminalístico, afirmando que "o aplainamento do bloco, quando realizado em um motor, tem como objetivo retificar a face superior do bloco que entra em contato com o cabeçote do motor, propiciando que o contato entre estas duas peças (bloco e cabeçote) seja o mais preciso possível, evitando vazamentos. Quando se torna necessário retificar a face superior do bloco, não se precisa retificar as laterais do mesmo". Mais adiante, as respostas aos quesitos formulados pelo Ministério Público são taxativas, quando, no item 1, pergunta "se o motor possuía vestígios de aplainamento do bloco", e os peritos responderam que "sim", e no item 2, "se, caso positivo, o aplainamento acarretaria no desgaste da numeração da identificação do motor", os peritos responderam que "não" (fl. 44).

Dessarte, analisando as respostas aos quesitos formulados, percebe-se que, efetivamente, não existiu nenhuma danificação a ponto de suprimir, totalmente, o número do motor da caminhonete F-4000. Contudo, o que existe é que, mesmo que ocorresse um descuido, ele não seria suficiente para apagar, completamente, a numeração do fabricante em um bloco de aço. Em verdade, as explicações trazidas pelos acusados estão dissonantes da realidade, não passando de mero expediente defensivo, elaborado com intuito de evitar a reprimenda penal.

O réu Paulo Orlandi, também na presença do Ministério Público, deixou evidente que "Cardoso" cobrou R$ 1.000,00, para regularizar a situação da caminhonete F-4000, sendo que R$ 500,00 se destinariam ao delegado Toigo, para "ajeitar o documento necessário para a transferência do carro". Contou, também, que, na sua oficina, pintou o motor da caminhonete, cuja idéia foi de "Cardoso" (fls.108/110).

Da mesma forma, restou devidamente comprovada a participação de Paulino Orlandi, Antônio Carlos de Souza e Luiz Carlos Freitas de Souza na adulteração do veículo VW/Voyage, ano 84, cor cinza, placas LZW-4790, registrado em nome da firma "Raphcar Indústria e Comércio de Automóveis Ltda"., conforme se lê no contrato social de fls. 116/118).

No caso, os três, previamente acordados, adulteraram sinal identificador de veículo automotor, unidos pelo mesmo vínculo psicológico, cada um desempenhando uma tarefa. Paulino foi o autor direto da adulteração. Luiz Carlos, o mandante desse procedimento, e Antônio, quem emprestou auxílio na prática do ilícito, levando o carro até a oficina e entregando a Paulino a chapa que seria soldada sob o número original do chassi, com vista à contrafação.

Acerca do "modus operandi" utilizado, recolhem-se da conversa de fls. 137/138, onde Luiz Carlos e Paulino falam sobre a adulteração de um número de motor. Em seguida, Luiz Cardoso avisa Paulino "que tem um amigo que tá com um probleminha aqui, mais é gente séria, gente boa", explicando se tratar "dum problema dum motor dum fusca", acrescentando que "ele foi fazê a vistoria e não passô, mais ele tem o número velho, tá tudo arrumadinho... Não consegue fazê aquele negócio pra nós ali, no bloco ali?", ao que Paulo responde "fazê eu faço, cem pila". Em função disso, Luiz Carlos reclama "não menos, não, o cara é gente. É pobre. Precisa é um carrinho ali, é ... Faça um favor ali. Senão daí eu vô ali e ajeito com os hômi, lá sabe?", acrescentando que "mais eu quero que você faça ali pra ele, certinho ali, resolva ali?. Paulino, então, concorda e afirma "manda ele vim que eu faço".

Também, no diálogo de fls. 114, Luiz Carlos recebe uma ligação de Paulino, que pergunta "Viu? Mandô o Voyage?", e Luiz Carlos responde "não, tão indo agora, porque eu liguei você não tava ainda".Paulino pergunta se o carro já veio, e Luiz Carlos diz: "dai já foi.. Já levô o talão tá...". Luiz Cardoso fala sobre um "xerox autenticado lá no cartório, e recomenda: "daí tu olha direitinho. Mas tu mesmo vai lá, e você mesmo senta com aquele cara lá, certo?", alertando que "qualquer coisa tu diz assim, 'não, ele não tá aí, o Luiz. Mais depois daí eu vô ligá pro celular dele para vê se ele vem até o horário pra assiná'. Tá? 'Ta carregando o caminhão'", destacando que ele saberá fazer o "agá".

Não há duvidas que esses diálogos eram entre Luiz Carlos e Paulino, acertando a adulteração do motor ou chassi do Voyage, cuja modificação seria feita na oficina de chapeação de Paulino.

Mas não são só as conversas que esclarecem o conluio criminoso entre eles, pois Paulino detalhou ao Ministério Público a atuação de cada membro da organização, revelando, de forma pormenorizada, a colaboração dos réus para o êxito da empreitada. Disse que os policiais militares levaram-no até o pátio da delegacia, onde estava o veículo Voyage, placas LZW-4790, de Lages, apreendido com Antônio Carlos de Souza, e que reconheceu como sendo aquele em que havia feito adulteração de chassi, soldando uma placa que continha um outro sobre a numeração original. Disse que Antônio levou o carro a mando de "Cardoso", que pediu que fizesse adulteração sob o argumento de que havia multas e, que, por isso, precisaria registrá-lo sob outro número. Garantiu, no mais, que Antônio sabia que o carro iria ter o seu sinal de identificação adulterado e entregou a chapa contendo a numeração para Antônio, fornecida por "Cardoso" (fls. 108/110).

Lembre-se que, em juízo, voltou a admitir que adulterou o veículo Voyage a pedido de Luiz Cardoso, e salientou que a chapa que foi soldada no Voyage já estava dentro do carro e, ainda, que adulterou a numeração do motor de um fusca velho e, que, na ocasião, "Cardoso", disse que não era carro roubado e não teria problema (fl. 422).

Por fim, como já explicitado, unido aos demais por vínculo permanente, no exercício da função de Delegado de Polícia, o apelado Adelino Roberto Toigo orientava Luiz Carlos Freitas de Souza, na obtenção de registros irregulares de veículos, junto ao órgão de trânsito. Em contra partida, "Cardoso" recompensava-o de forma constante, oferecendo-lhe vantagem ilícita, traduzida, comumente, em somas em dinheiro.

E isso ficou claro na conversa de fls. 150, entre Toigo e Luiz Carlos. Observa-se que o acusado Toigo liga para ele, conversam banalidades e, em seguida, Luiz Carlos diz que " o coisa me deu uns negócio aqui, sabe", "mais assim, uns picado longe. Dai eu vô ve se faço um negócio ali pra troca ali". Em função disso, Toigo pergunta se "não tem nada pra mim viajá ai?", ao que Luiz Cardoso indaga a que horas ele irá e se estará no celular, sendo informado por Toigo que ele viajará às 10h e estará com seu telefone. Então, Luiz Carlos avisa que ligará, em seguida, para ele, que responde que "com ciqüenta (50) pila eu já viajo". Luiz Carlos diz "eu dou um jeito já", e Toigo se dá por satisfeito.

É inafastável que as conversas demonstram, claramente, que Adelino Toigo, efetivamente, em razão de seu cargo público, solicitou a Luiz Carlos Freitas de Souza, vantagem indevida, restando-lhe prometido, "in casu", a quantia de R$ 50,00, e o argumento de que se tratava da quitação de uma rifa que Adelino estaria vendendo para o Hospital Nossa Senhora dos Prazeres não encontra qualquer sustentáculo.

Ademais, embora as testemunhas Maria Aparecida Melo Ramos e Zilma Rizzana Fortuna tenham amparado a versão de Adelino, não foi juntada qualquer prova concreta aos autos, o que fragiliza a sustentação defensiva.

Também, na espécie, como se viu, percebe-se, na atuação dos réus, vínculo subjetivo que autoriza concluir que eles mantinham associação estável e permanente para o objetivo de cometer crimes, perdurando de agosto de 2001 a meados de 2002, com planejamento e divisão de tarefas definidas.

Sobre o delito de formação de quadrilha, pondera-se que, na esteira da lição do que orienta CELSO DELMANTO, "consuma-se no momento da associação (STF, RT 565/409). Em relação aos fundadores, consuma-se no momento em que aperfeiçoada a convergência de vontades entre mais de três pessoas; quanto àqueles que venham posteriormente a integrar-se ao bando, no momento da adesão de cada qual; é crime formal, sendo irrelevante a realização ulterior de qualquer delito" (Código Penal Comentado, 5a ed., RJ: Renovar, 2000, p. 513).

Além disso, o fato de alguns dos crimes denunciados não terem sido praticados por todos os elementos não faz cessar a existência do crime, pois "não desnatura o crime de quadrilha a circunstância de alguns dos delitos terem sido cometidos por somente três executores" (DAMÁSIO E. DE JESUS, Código Penal Anotado, 10a ed., SP: Saraiva, 2000, p. 840).

Na espécie, os acusados cometeram, sim, crime de formação de quadrilha (art. 288 do CP), porque se congregaram para realizar a prática de diversos delitos, vínculo associativo claramente evidenciado nas circunstâncias supra mencionadas. Este desiderato restou concretizado em diversas atividades cometidas com nítida divisão de tarefas.

Dessarte, não remanesce qualquer dúvida acerca da prática dos delitos relativos à adulteração de sinais de identificação de veículo automotor, em associação, atribuídos aos acusados, porquanto o acervo probatório amealhado milita, integralmente, em desfavor de todos, demonstrando, ainda, que eles promoviam, em amplo espectro, e com primazia naquele município de Lages, a regularização, junto ao órgão de trânsito, com a complacência de autoridade local, de veículos com sinal de identificação adulterado. As provas sugerem, igualmente, que, para tanto, valiam-se, de forma organizada e permanente, de outros indivíduos, alguns deles, responsáveis pela captação dos automóveis, inclusive, ao que tudo indica, em outras cidades.

A partir dos depoimentos transcritos e das escutas telefônicas autorizadas judicialmente e dos documentos, é autorizado concluir que:

- Adelino Roberto Toigo, ao solicitar e receber, diretamente, para si, vantagem indevida que lhe foi oferecida por Luiz Carlos Freitas de Souza, no valor de R$ 500,00 (duas vezes), e R$ 50,00 (uma vez), em razão do seu cargo público, no exercício de função de direção (Delegado de Polícia, responsável pela Delegacia de Trânsito), para praticar ato de ofício, cometeu o crime previsto no art. 317, § 1º, c/c o art. 327, § 2º (três vezes) e, ainda, ao oferecer a perita nomeada Marli, em acordo de vontades com Luiz Carlos Freitas, vantagem indevida, para calar a verdade em perícia, praticou o delito previsto no art. 343, "caput" (duas vezes), e em acordo com os denunciados Luiz Carlos Freitas de Souza e Marli Teresinha Petry, em dois momentos distintos, contribuindo com o registro de veículo automor adulterado, cometeu o crime previsto no art. 311, § 2º (duas vezes), e, por fim, associado de forma permanente com os demais denunciados para prática de crimes praticou o crime do art. 288, "caput", todos os dispositivos do Código Penal.

Marli Teresinha Petry, ao receber vantagem indevida que lhe foi oferecida por Adelino Roberto Toigo e Luiz Carlos Freitas de Souza, em razão da sua função pública, para deixar de fazer ato de ofício que lhe competia, calando a verdade em perícia, cometeu o crime previsto no art. 317, § 1º (duas vezes), e em acordo de vontades com Luiz Carlos Freitas de Souza e Adelino Roberto Toigo, contribuindo com o registro de veículo automor adulterado, cometeu o crime previsto no art. 311, § 2º (duas vezes) e, por fim, associada de forma permanente com os demais denunciados para prática de crimes praticou o crime do art. 288, "caput", todos os artigos do Código Penal.

Luiz Carlos Freitas de Souza, ao oferecer ou prometer vantagem ilícita de R$ 500,00 (duas vezes) e de R$ 50,00 (uma vez) a Adelino Roberto Toigo, para determiná-lo a praticar ato que, na condição de funcionário público, tinha a obrigação de não fazer, sob pena de infrigir o dever funcional, o que veio efetivamente a acontecer, cometeu o crime previsto no art. 333, parágrafo único (três vezes) e, ainda, em acordo de vontades com Adelino Roberto Toigo, ao oferecer e dar vantagem indevida à perita nomeada Marli Teresinha Petry, praticou o delito previsto no art. 343, "caput" (duas vezes), e em acordo com os denunciados Adelino Roberto Toigo e Marli Terezinha Petry, em dois momentos distintos, contribuindo com o registro de veículo automor adulterado, cometeu o crime previsto no art. 311, § 2º (duas vezes) e, por fim, associado de forma permanente com os demais denunciados para prática de crimes, praticou o crime do art. 288, "caput", todos do Código Penal.

Antônio Carlos de Souza e Paulino Orlandi, por estarem unidos ao restante do grupo pelo sentimento de permanência da atividade criminosa, cometeram o crime do art. 288, "caput", do Código Penal.

Passa-se, portanto, à aplicação das penas.

Adelino Roberto Toigo é maior e mentalmente são. Sua culpabilidade é de grau elevado, porque, como homem público, senão por cargo, mas pela influência que exerce no seio da comunidade, deveria dar exemplo de retidão. Não possui antecedentes criminais, sua conduta social e personalidade registram dados abonadores, a motivação foi inerente à espécie dos delitos, assim como as circunstâncias e as conseqüências.

Assim, fixa-se a pena privativa de liberdade para o crime do art. 317 do Código Penal, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes. Na terceira fase dosimétrica, presente a causa especial do § 1º do art. 317 do CP, aumenta-se a reprimenda em 1/3 (um terço), tornando-a definitiva em 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa. Ainda, incidente a causa especial do § 2º do art. 327 do CP, eleva-se, também, em 1/3 (um terço), perfazendo-a, em 4 (quatro) anos, 1 (um) mês e 23 (vinte e três) dias e pagamento de 18 (dezoito) dias-multa. E, por fim, incidente a continuidade delitiva (3 vezes), aumenta-se a reprimenda em 1/5 (um quinto), totalizando, então, definitiva em 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão, e pagamento de 21 (vinte e um) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 343 do Código Penal, fixa-se a reprimenda em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 11 (doze) dias-multa. Ausentes agravantes, atenuantes e causas de especial aumento ou diminuição, mas presente a continuidade delitiva (duas vezes), elevando a reprimenda em 1/6 (um sexto), tem-se-a definitiva em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão, além do pagamento de 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o crime do art. 311, § 2º do CP, fixa-se a reprimenda em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Ausentes agravantes, atenuantes e causas de especial aumento ou diminuição, mas presente a continuidade delitiva (duas vezes), elevando a reprimenda em 1/6 (um sexto), tem-se-a definitiva em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão, além do pagamento de 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 288 do Código Penal, fixa-se a reprimenda em 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão, tornada definitiva ante a ausência de outras modificadoras.

A soma das penas aplicadas (14 anos e 3 meses de reclusão e pagamento de 45 dias-multa) impede a substituição por restritivas de direitos (CP, art. 44, I, 1ª parte), devendo iniciar o seu cumprimento no regime fechado, diante do comando do art. 33, § 2º, "a", do CP.

Marli Teresinha Petry é maior e mentalmente sã. Sua culpabilidade é de grau médio. Não possui antecedentes criminais, sua conduta social e personalidade registram dados abonadores, a motivação foi inerente à espécie dos delitos, assim como as circunstâncias e as conseqüências.

Assim, fixa-se a pena privativa de liberdade para o crime do art. 317 do Código Penal em 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes e, na terceira, presente a causa especial § 1º do art. 317 do CP, aumenta-se a reprimenda em 1/3 (um terço), tornando-a definitiva em 2 (dois) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 13 (treze) dias-multa. Ainda, em face da continuidade delitiva (1/6 - duas vezes), torna-se-a definitiva em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 13 (treze) de reclusão e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 311, § 2º do CP, fixa-se a reprimenda em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, e pagamento de 11 (onze) dias-multa. A seguir, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como causas de especial aumento ou diminuição, mas presente a continuidade delitiva, em face da presença de dois crimes, aumenta-se em 1/6 (um sexto), totalizando, então, definitiva em 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e pagamento de 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 288 do Código Penal, fixa-se a reprimenda em 1 (um) ano e 1 (um) mês de reclusão, tornada definitiva ante a ausência de outras modificadoras.

A soma das penas aplicadas (8 anos, 4 meses e 3 dias e 27 dias-multa) impede a substituição por restritivas de direitos (CP, art. 44, I, 1ª parte), devendo iniciar o o seu cumprimento no regime fechado, diante do comando do art. 33, § 2º, "a", do CP.

É de se ressaltar que, muito embora o art. 92, em seu inciso I, letra "a", preconize a perda de cargo ou função pública "quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública", tal comando não possui efeito automático, devendo ser explicitado na sentença (CP, art. 92, § único).

Porém, tem-se que tal medida, somente se justifica quando a conduta incriminada tiver natureza gravíssima, incompatível com a relevância e probidade do "munus" público e comprometa, indelevelmente, a reputação do apenado.

E, foi, exatamente, o que ocorreu no caso dos autos, pois não resta a menor dúvida que a conduta de Adelino Roberto Toigo e Marli Teresinha Petry comprometeu a dignidade e o decoro da função pública.

Aliás, é o que tem entendido a jurisprudência:

A aplicação da sanção da perda da função deve se ater aos casos em que, pela extensão de sua gravidade, se torne absolutamente incompatível a permanência do agente na função pública ou caso de reiteração na prática de ilícitos da mesma natureza (RT 562/359).

Desta forma, a medida em tela é necessária para que casos como este, repugnantes e estarrecedores - não se repitam.

Por força do art. 92, inc. I, letra "a", do CP, decreta-se a perda do cargo dos apelados Adelino Roberto Toigo e Marli Teresinha Petry.

Luiz Carlos Freitas de Souza é maior e mentalmente são. Sua culpabilidade é normal à espécie, pois dispunha de total arbítrio para optar pela conduta delitiva, oferecendo vantagem indevida a funcionário público. Possui antecedentes criminais, conforme as certidões de fls. 685/702, sua conduta social e personalidade não esboçam elementos nos autos para que se possa auferí-las, a motivação foi inerente à espécie dos delitos, assim como as circunstâncias e as conseqüências.

Assim, fixa-se a pena privativa de liberdade para o crime do art. 333, parágrafo único, do Código Penal, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes. Na terceira fase dosimétrica, presente a causa de especial aumento do parágrafo único do art. 333 do CP, aumenta-se a reprimenda em 1/3 (um terço), tornando-a definitiva em 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa. Ainda, nesta etapa, incidente a causa especial aumento da continuidade delitiva, em face da presença de três crimes de corrupção ativa, aumenta-se em 1/5 (um quinto), totalizando, então, definitiva em 3 (três) anos, 8 (oito) meses e 24 (vinte) dias de reclusão, e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 343 do Código Penal, fixa-se a reprimenda 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes. Na terceira fase dosimétrica, presente a causa de especial aumento da continuidade delitiva, em face da presença de dois crimes, aumenta-se em 1/6 (um sexto), totalizando, então, definitiva em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês e 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 311, § 2º do CP, fixa-se a reprimenda em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes. Na terceira fase dosimétrica, presente a causa de especial aumento aumento da continuidade delitiva, em face da presença de dois crimes, aumenta-se em 1/6 (um sexto), totalizando, então, definitiva em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês e 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos.

Para o delito do art. 288 do Código Penal, fixa-se a reprimenda em 1 (um) ano e 2 (meses) de reclusão, tornada definitiva ante a ausência de outras modificadoras.

Considerando-se as penas já aplicadas no édito - 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, e pagamento de 20 (vinte) dias-multa, somadas às sanções ora estipuladas, obtêm-se, a final, o montante de 19 (dezenove) anos, 5 (cinco) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, e pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, o que impede a substituição por restritivas de direitos (CP, art. 44, I, 1ª parte), devendo iniciar o o seu cumprimento no regime fechado, diante do comando do art. 33, § 2º, "a", do CP.

Antônio Carlos de Souza e Paulino Orlandi, também são maiores e mentalmente sãos. Suas culpabilidades foram normais à espécie. Antônio Carlos possui antecedentes, suas condutas na sociedade e personalidade registram dados abonadores, a motivação foi inerente à espécie dos delitos, assim como as circunstâncias e as conseqüências, devendo a pena para o delito do art. 288 do Código Penal ser fixada para o primeiro de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão e, para o segundo, em 1 (um) ano de reclusão, tornada definitiva, ante a ausência de outras modificadoras.

E, considerando as penas já aplicadas na sentença, tem-se para Antônio Carlos de Souza, o total de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa e para Paulino Orlandi em 4 (quatro) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa.

A soma das penas aplicadas impede a substituição por restritivas de direitos (CP, art. 44, I, 1ª parte), devendo iniciar o o seu cumprimento no regime semi-aberto, diante do comando do art. 33, § 2º, "b", do CP.

Entretanto, verifica-se, nos termos do art. 61 do CPP, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, referente à prescrição da pretensão punitiva, na forma retroativa, uma vez que as penas impostas aos acusados, no tocante ao delito do art. 288, do CP, admite o prazo prescricional de 4 (quatro) anos, previsto no art. 109, inc. V, do CP.

Deste modo, tem-se por operada a prescrição da pretensão punitiva, nos termos do artigo 109, inciso V, c/c os artigos 110, §§ 1º e 2º, 114, inc. II, todos do Estatuto Penal, pois, entre a data do recebimento da denúncia (8.3.2002 - fls. 02) e a data da presente decisão condenatória (18.8.2009) - a sentença absolutória não interrompe o prazo da prescrição - transcorreram mais de 04 (quatro) anos.

Por outro lado, o pedido de absolvição em face dos crimes de tráfico de influência e de adulteração dos sinais identificadores dos veículos, formulado Luiz Carlos Freitas, não pode ser acolhido, tendo em conta o farto acervo probatório em sentido inverso e as inúmeras razões elencadas ao longo deste acórdão, o que se verifica, igualmente, quanto ao pleito de Paulino Orlandi.

Concedo aos réus o direito de recorrer em liberdade, porque assim estiveram durante o curso do processo.

Por derradeiro, necessário corrigir o erro material da sentença, porque o magistrado elaborou em equívoco no tocante a capitulação do delito de adulteração de sinal de veículo imputado a Luiz Carlos Freitas. No caso, a fundamentação foi toda em relação ao crime previsto no art. 311, "caput", do Código Penal e ao final acabou condenando no art. 331, "caput", do Estatuto Repressivo.

Dessa feita, corrige-se o erro material do dispositivo da sentença para art. 311, "caput", do Código Penal.

DECISÃO

Diante do exposto, decidiu a Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer dos recursos e dar provimento, somente, ao do Ministério Público, para condenar os acusados Adelino Roberto Toigo, Luiz Carlos Freitas de Souza, Antônio Carlos de Souza, Paulino Orlandi e Marli Teresinha Petry, nos termos deste acórdão, declarando-se extintas as suas punibilidades no tocante ao crime do art. 288, "caput", do CP e, de ofício, corrigir erro material da sentença.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Sérgio Paladino, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Salete Silva Sommariva, lavrando parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Luiz Fernando Sirydakis.

Florianópolis, 25 de agosto de 2009.

Irineu João da Silva
RELATOR

Publicado em 06/10/09




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