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sábado, 14 de novembro de 2009

JURID - Juiz usa súmula vinculante. [13/11/09] - Jurisprudência


Juiz usa súmula vinculante aprovada há duas semanas e garante direito de frigorífico recorrer sem pagar multa


PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 23ª REGIÃO

FÓRUM TRABALHISTA DESEMBARGADOR JOSÉ SIMIONI

ATA DE AUDIÊNCIA

AUTOS Nº 01321.2009.051.23.00-5

Aos três dias de novembro do ano de 2009, na E. Vara do Trabalho de TANGARÁ DA SERRA - MT, presente o Excelentíssimo Sr. Juiz do Trabalho, PLINIO GEVEZIER PODOLAN, que ao final assina, para a audiência relativa aos autos em epígrafe, entre partes:

IMPETRANTE: MARFRIG FRIGORÍFICOS E COMÉRCIO DE ALIMENTOS S.A.

IMPETRADO: CHEFE DO NÚCLEO DE MULTAS E RECURSOS DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO DE MATO GROSSO

Às 14h10, aberta a audiência, foram de ordem do M. Juiz, apregoadas as partes, que não compareceram. Submetido o processo a julgamento, foi proferida a seguinte

SENTENÇA

I - RELATÓRIO

Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por MARFRIG FRIGORÍFICOS E COMÉRCIO DE ALIMENTOS S.A. contra ato do CHEFE DO NÚCLEO DE MULTAS E RECURSOS DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO DE MATO GROSSO, onde a impetrante descreveu ato tido como ilegal e coator por ferir o direito líquido e certo de recorribilidade das decisões administrativas independentemente de depósito prévio.

Acostou os documentos de fls. 13/46 e deu à causa o valor de R$ 4.025,33 (quatro mil e vinte e cinco reais e trinta e três centavos).

Liminar deferida nos termos da decisão de fls. 47/48.

A autoridade apontada como coatora apresentou as informações solicitadas às fls. 57/72, defendendo a constitucionalidade da exigência em tela.

No mesmo sentido foi o parecer do Ministério Público do Trabalho, o qual se manifestou pela denegação da segurança, por entender inexistir ofensa a direito líquido e certo.

Autos conclusos para julgamento.

Era o que merecia registro.

FUNDAMENTO E DECIDO.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1. DO DIREITO INTERTEMPORAL

Como se destaca dos autos, o presente mandamus fora intentado em 15 de julho de 2009 (fls. 02), ainda sob a égide da Lei 1533/51, sendo que no dia seguinte fora apreciada a liminar requerida (fls. 47/48).

Nesse interstício, aportou no ordenamento jurídico a Lei 12.016, de 07 de agosto de 2009, a qual revogou as disposições anteriores sobre mandado de segurança, atribuindo novo regulamento.

Observo que através do despacho de fls. 56, concedeu-se prazo para manifestação do órgão ministerial nos termos no novel artigo 12 da referida lei, já em vigor.

Ocorre que, pela redação da nova lei, em seu artigo 7º, II, o juiz, ao despachar a inicial, deverá dar ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada para que, querendo, ingresse no feito.

Todavia, como se registrou alhures, no primeiro momento em que a presente lide fora "despachada", ainda não estava em vigor a lei em análise, de modo que, reputo desnecessário a conversão em diligência apenas para esse fim.

Tal medida, além de não causar prejuízo, uma vez que possibilitou a manifestação da autoridade tida por coatora, pode ser sanada com a intimação da pessoa jurídica correlata da presente sentença. E ainda, configura-se em medida célere compatível com a razoável duração do processo, quanto mais diante da natureza da ação sub oculis.

Feitos esses esclarecimentos, passo a análise do direito aventado.

2. DO MÉRITO

Através da presente ação, a impetrante pretende ver garantido seu direito líquido e certo de ampla defesa, insculpido no artigo 5º, LV, da Constituição da República. Informou que fora autuada por infração administrativa o que motivou a interposição do Recurso Administrativo 46210.003732/2008-42. Tal recurso, entretanto, teve seu seguimento negado ao argumento de que não houve "comprovação do depósito integral da multa no prazo recursal, conforme exigência do artigo 636, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho" (fls. 45).

Por conta disso, a impetrante entende que a exigência do depósito da multa recorrida administrativamente é inconstitucional, razão porque cerceou seu direito de defender-se amplamente.

Citando precedentes da Suprema Corte, tanto a autoridade coatora como o MPT manifestaram-se pela constitucionalidade do referido artigo celetista e, por conseguinte, da exigência do depósito prévio em análise.

Pois bem.

Deveras que são numerosos os precedentes decorrentes da Corte Constitucional acerca da possibilidade de exigência de depósito prévio como pressuposto de admissibilidade dos recursos administrativos.

Todavia, o presente magistrado jamais perfilhou tal entendimento, reputando incabível a referida exigência, eivada, a meu juízo, de inconstitucionalidade.

Isso porque, diferentemente do depósito recursal cobrado na esfera judiciária, o qual possui o objeto de garantir a satisfação de um crédito definido em sentença, o depósito prévio administrativo visa garantir a satisfação de uma multa - como no presente caso - cuja legalidade é passível não apenas de reanálise pela própria Administração Pública, como também de análise primária e secundária do Poder Judiciário.

Não é demais ressalvar que a decisão administrativa não tem o condão de fazer coisa julgada, sendo que a denominada "coisa julgada administrativa" não vincula a apreciação do Judiciário.

O que sobressai, a meu ver, é que a garantia constitucional inserta do artigo 5º, LV, da Constituição da República não possibilita, quer por limitação legal, quer por interpretação extensiva, a imposição de obstáculo não previsto pelo legislador constituinte originário.

À propósito, tal raciocínio de há muito é defendido, por exemplo, pelo preclaro Ministro Marco Aurélio que, em 1997, aquilatou seu escólio no sentido de conferir a pecha de inconstitucional o artigo 636, §§ 1º e 6º, da CLT.

Aproveito-me dos seus fundamentos, citando como exemplos os julgamentos dos RE 210.246-6/GO e 210.234-2/GO:

"(...) Entendo que o inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal viabiliza a ampla defesa à exaustão.

E o que se tem na espécie dos autos? Tem-se a previsão, na Consolidação das Leis do Trabalho, do recurso contra multas aplicadas pelos inspetores do trabalho. Todavia, essa previsão do recurso, que é algo de nossa tradição administrativa, no campo da fiscalização, está jungida ao depósito da totalidade da multa por aquele que foi tido como infrator.

O que isso representa, pelo menos sob a minha óptica? Representa um óbice, em alguns casos, até mesmo ao exercício do direito de defesa (...).

Não vejo como ter a previsão do § 1, do artigo 636, da Consolidação das Leis do Trabalho como harmônica com o princípio constitucional, com a garantia que assegura a ampla defesa, inclusive no processo administrativo".

Nessa esteira, à despeito dos numerosos precedentes em sentido contrário, fato é que o Supremo Tribunal Federal tem revisto seu entendimento acerca da matéria em análise, sinalizando para a consolidação de uma nova exegese.

Tanto assim o é que, como citei às fls. 47, o julgado da lavra da brilhante Ministra Ellen Gracie, publicado em 05 de dezembro de 2008 no AI 698626 RG-QO, na Questão de Ordem convertida em Recurso Extraordinário em virtude do reconhecimento da repercussão geral que fomenta a matéria em apreço, decidiu por ratificar o entendimento exposto no RE 388.359, RE 389.383 e RE 390.513 no sentido de que "a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de recurso administrativo - assunto de indiscutível relevância econômica, social e jurídica - já teve a sua inconstitucionalidade reconhecida por esta Corte".

Aliás, nesse mesmo sentido, perfilhando-se às recentes decisões da Suprema Corte, assim decidiu o Tribunal Regional Caseiro:

EMENTA. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RECOLHIMENTO DE DEPÓSITO PRÉVIO PREVISTO NO ART. 636/CLT. MULTA ADMINISTRATIVA. CONSTITUCIONALIDADE. Consoante recente entendimento esposado pelo excelso STF (RE-ED 531415 - SP - 2ª T. - Rel. Min. Celso de Mello), o art. 636, § 1º, da CLT, que prevê a exigência do depósito prévio da multa como requisito para o recebimento de recurso administrativo carece de validade jurídica por obstar o princípio constitucional da ampla defesa, inserto no art. 5º, LV, da CR/88. Dessa forma, por revelar-se inconstitucional o art. 636, § 1º, da CLT, reforma-se a decisão primária e concede-se a segurança pleiteada no presente processo, a fim de que a autoridade apontada como coatora se abstenha de exigir o depósito recursal prévio (pagamento total da multa para interposição de recurso administrativo) para o recebimento da insurgência administrativa respectiva. Recurso provido.

(TRT - RO - 01497.2008.009.23.00-0 RELATOR: DESEMBARGADOR OSMAIR COUTO. Fonte: DJE/TRT 23ªR nº 0727 / 2009 de 19/06/2009)

Por derradeiro, toda exegese ora construída enfim se consolidou com a recente aprovação no último dia 29.10.2009, pelo Supremo Tribunal Federal, da redação da Súmula Vinculante 21, cujo teor é o seguinte:

"É INCONSTITUCIONAL A EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO OU ARROLAMENTO PRÉVIOS DE DINHEIRO OU BENS PARA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO ADMINISTRATIVO.".PSV 21/DF, 29.10.2009. (PSV-21)

Assim, diante dessas considerações e fulcrado em súmula vinculante já aprovada pelo pleno do STF, reconheço, incidentalmente, a inconstitucionalidade do artigo 636, §§ 1º e 6º da CLT, considerando que a exigência de depósito prévio para fins de recurso administrativo é indevida por ferir o artigo 5º, LV, da Constituição Brasileira.

III - DISPOSITIVO

Diante das razões então descritas, julgo procedente a presente ação mandamental movida por MARFRIG FRIGORÍFICOS E COMÉRCIO DE ALIMENTOS S.A. em face do CHEFE DO NÚCLEO DE MULTAS E RECURSOS DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO DE MATO GROSSO, e CONCEDO INTEGRALMENTE a segurança buscada a fim de determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir o depósito recursal prévio para seguimento do Recurso Administrativo correlato, tudo nos termos da fundamentação supra que integra este dispositivo para todos os efeitos jurídicos e legais.

Custas processuais às expensas do Impetrado, no importe de R$ 80,50, calculadas sobre o valor da ação atribuído em R$ 4.025,33, isento na forma da lei.

Intimem-se as partes.

Intime-se, ainda, a União, em atenção ao artigo 7º, II, da Lei 12.016/2009.

Notifique-se o Ministério Público do Trabalho.

Em não havendo recurso de quaisquer das partes ou interessados, proceda a revisão dos autos e a remessa obrigatória ao E. Tribunal Regional do Trabalho desta Região, nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei 12.016/2009.

Nada mais. Encerrou-se às 17h17min.

PLÍNIO GEVEZIER PODOLAN
Juiz do Trabalho Substituto



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