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quinta-feira, 19 de novembro de 2009

JURID - Habeas corpus. Furto qualificado pelo concurso de agentes. [19/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Furto qualificado pelo concurso de agentes. Teoria constitucionalista do delito. Princípio da insignificância.
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Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 124.185 - MG (2008/0279432-1)

RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA

IMPETRANTE: RÔMULO NOGUEIRA DOS SANTOS

ADVOGADO: LEONARDO CARVALHO CARREIRA - DEFENSOR PÚBLICO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE: RÔMULO NOGUEIRA DOS SANTOS

EMENTA

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES. TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. ORDEM CONCEDIDA.

1. O princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima.

2. Indiscutível a sua relevância, na medida em que exclui da incidência da norma penal aquelas condutas cujo desvalor da ação e/ou do resultado (dependendo do tipo de injusto a ser considerado) impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico.

3. A subtração, mediante o concurso de pessoas, de R$ 15,00, embora se amolde à definição jurídica do crime de furto, não ultrapassa o exame da tipicidade material, mostrando-se desproporcional a imposição de sanção penal, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do comportamento foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao bem jurídico se revelou inexpressiva.

4. Ordem concedida para determinar a extinção da ação penal instaurada contra o paciente, invalidando, por consequência, a condenação penal contra ele imposta.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília (DF), 20 de outubro de 2009(Data do Julgamento).

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA
Relator

RELATÓRIO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pela Defensoria Pública em favor de RÔMULO NOGUEIRA DOS SANTOS, condenado à pena de 3 anos de reclusão e 30 dias-multa pela prática do delito de furto qualificado pelo concurso de agentes (art. 155, § 4º, IV, do Código Penal), tendo em vista a subtração de R$ 15,00 da vítima DOMINGOS SÁVIO NATALÍCIO DOS SANTOS.

Insurge-se o impetrante contra acórdão proferido pela Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que negou provimento ao apelo defensivo, afastando o princípio da insignificância (Apelação Criminal 1.0024.07.490197-6/001).

Sustenta, em síntese, que, à conduta praticada pelo paciente, deve ser aplicado o postulado da insignificância, uma vez que "o diminuto valor da res furtiva evidencia a bagatela, tornando atípica a conduta" (fl. 5). Requer, por esses motivos, o deferimento do pedido liminar para suspender a pena imposta e, no mérito, a concessão da ordem para "cassar a sentença e o acórdão condenatório, trancando a ação penal nº 0024.07.490.197-6" (fl. 8).

Por decisão de fl. 73, indeferi o pedido liminar, ocasião em que dispensei o pedido de informações à autoridade apontada como coatora por estarem os autos devidamente instruídos.

O Ministério Público Federal, por meio do parecer exarado pelo Subprocurador-Geral da República DURVAL TADEU GUIMARÃES, opinou pela denegação da ordem (fls. 78/79).

É o relatório.

VOTO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA(Relator):

Conforme relatado, pretende o impetrante a aplicação, in casu, do princípio da insignificância.

O tema a respeito da aplicação do referido princípio é assaz controvertido, tanto na doutrina como na jurisprudência pátria.

A moderna doutrina (Teoria Constitucionalista do Delito) desmembra a tipicidade penal, necessária à caracterização do fato típico, em três aspectos: o formal ou objetivo, o subjetivo e o material ou normativo.

A tipicidade formal consiste na perfeita subsunção da conduta do agente ao tipo (abstrato) previsto na lei penal, possuindo como elementos: a conduta humana voluntária, o resultado jurídico, o nexo de causalidade e a adequação formal.

O aspecto subjetivo do fato típico expressa o caráter psicológico do agente, consistente no dolo.

A tipicidade material, por sua vez, implica a verificação se a conduta - subjetiva e formalmente típica - possui relevância penal, em face da significância da lesão provocada no bem jurídico tutelado, observando-se o desvalor da conduta, o nexo de imputação e o desvalor do resultado, do qual se exige ser real, transcendental, intolerável e grave (significante).

Nesse contexto, o princípio da insignificância, cuja análise deve ser feita à luz dos postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima, tem assento exatamente na análise da tipicidade material e implica, caso acolhido, a atipicidade da conduta. Na lição de CEZAR ROBERTO BITENCOURT, "é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal" ("Código Penal Comentado", 3ª edição atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2005, p. 6).

Duas são as hipóteses de insignificância: a insignificância da conduta (aceitação social) e a insignificância do resultado (lesão relevante). Ensina o Professor Luiz Flávio Gomes:

No delito de arremesso de projétil (CP, art. 264: "Arremessar projétil contra veículo, em movimento, destinado ao transporte público por terra, por água ou pelo ar: pena - detenção de 1 a 6 meses"), quem arremessa contra um ônibus em movimento um bolinha de papel pratica uma conduta absolutamente insignificante; no delito de inundação (CP, art. 254: "Causar inundação, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem: pena - reclusão de 3 a 6 anos, no caso de dolo, ou detenção de 6 meses a 2 anos, no caso de culpa"), quem joga um copo d´água numa represa de 10 milhões de litros de água pratica uma conduta absolutamente insignificante.

Nessas hipóteses, o risco criado (absolutamente insignificante) não pode ser imputado à conduta (teoria da imputação objetiva em conjugação com o princípio da insignificância). Estamos diante de fatos atípicos.

No delito de furto (CP, art. 155), quem subtrai uma cebola e uma cabeça de alho, que totaliza R$ 4,00, pratica uma conduta relevante (há desvalor da ação) mas o resultado jurídico (a lesão) é absolutamente insignificante (não há desvalor do resultado). Também nessa hipótese o fato é atípico. Não há incidência do Direito penal. (GOMES, Luiz Flávio. Prisão por furto de uma cebola/Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: . Acesso em: 31/1/08)

Significa dizer que a intervenção do direito penal apenas se justifica quando o bem jurídico tutelado tenha sido exposto a um dano impregnado de significativa lesividade. Não havendo, outrossim, a tipicidade material, mas apenas a formal, a conduta não possui relevância jurídica, afastando-se, por consequência, a intervenção da tutela penal, em face do postulado da intervenção mínima.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 84.412/SP, da relatoria do Ministro CELSO DE MELLO, concluiu, para a incidência do princípio da insignificância, ser necessária a incidência de quatro vetores, a saber: a) a mínima ofensividade da conduta do agente, b) nenhuma periculosidade social da ação, c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Segundo o relator, "O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social" (HC 84.412/SP, DJ de 19/11/04).

No caso posto em análise, tenho como impositiva a aplicação do princípio da insignificância.

Trata-se, conforme relatado, de furto qualificado de R$ 15,00 (fl. 10).

A conduta do réu, embora se amolde à definição jurídica do crime de furto, não ultrapassa o exame da tipicidade material, uma vez que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não houve nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do comportamento foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao bem jurídico se revelou inexpressiva

Ante o exposto, concedo a ordem impetrada para determinar a extinção da ação penal instaurada contra o paciente, invalidando, por consequência, a condenação penal contra ele imposta.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2008/0279432-1 HC 124185 / MG

MATÉRIA CRIMINAL

Número Origem: 10024074901976

EM MESA JULGADO: 20/10/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. MARIA CAETANA CINTRA SANTOS

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: RÔMULO NOGUEIRA DOS SANTOS

ADVOGADO: LEONARDO CARVALHO CARREIRA - DEFENSOR PÚBLICO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE: RÔMULO NOGUEIRA DOS SANTOS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra o Patrimônio - Roubo Majorado

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, concedeu a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 20 de outubro de 2009

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 922639

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 16/11/2009




JURID - Habeas corpus. Furto qualificado pelo concurso de agentes. [19/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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