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terça-feira, 10 de novembro de 2009

JURID - Estupro. Forma simples. Crime hediondo. [10/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Processual penal. Estupro. Forma simples. Crime hediondo.
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Supremo Tribunal Federal - STF.

DJe nº 186 Divulgação 01/10/2009 Publicação 02/10/2009 Ementário nº 2376 - 2

PRIMEIRA TURMA

HABEAS CORPUS 97.778-2 RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MIN. CARMEN LÚCIA

PACIENTE(S): CLÉRIO DA SILVA DOS SANTOS

IMPETRANTE(S): DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ESTUPRO. FORMA SIMPLES. CRIME HEDIONDO. AUSÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE JURÍDICA INCONTESTÁVEL. HABEAS CORPUS DENEGADO.

1. O julgado do Superior Tribunal de Justiça questionado neste habeas corpus está em perfeita harmonia com o entendimento do Supremo Tribunal sobre a hediondez do crime de estupro, mesmo que praticado na sua forma simples. Precedentes.

2. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministras do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do Ministro Carlos Ayres Britto, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade, em indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto da Relatora. Ausente, licenciado, o Ministro Menezes Direito.

Brasília, 23 de junho de 2009.

Ministra CARMEN LÚCIA - Relatora

RELATÓRIO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - (Relatora):

1. Habeas corpus, sem pedido de liminar, impetrado pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO em favor de CLÉRIO DA SILVA DOS SANTOS, contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, em 11 de dezembro de 2008, negou provimento ao Agravo Regimental no Recurso Especial 997.010, de relatoria do eminente Ministro Arnaldo Esteves Lima, nos termos seguintes:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO. FORMA SIMPLES. CRIME HEDIONDO. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor nas suas formas simples, ou seja, quando da prática não resulte lesão corporal de natureza grave ou morte, estão inseridos no rol dos crimes considerados hediondos, consoante estabelece o artigo 1º, V e VI, da Lei 8.072/90.

2. Agravo regimental improvido" (fl. 44).

Tem-se, ainda, nesse julgado:

"Cuida-se de agravo regimental manifestado por CLÉRIO DA SILVA DOS SANTOS contra decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul para reconhecer a hediondez do crime de estupro em sua forma simples, por ele praticado.

Alega o agravante que a decisão impugnada diverge da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que se caracterizam como hediondos apenas os delitos de estupro e atentado violento ao pudor praticados com violência real. Cita como precedentes o HC 78.305-9/MG, DJ 1º/10/99, e o HC 80.223-1/RJ, DJ 15/8/00.

(...)

Consoante afirmado pela decisão impugnada, foi a partir do julgamento proferido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 81.288/SC, em 17/12/01, que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor nas suas formas simples (o que inclui a violência presumida), ou seja, quando de sua prática não resulte lesão corporal de natureza grave ou morte, estão inseridos no rol dos crimes considerados hediondos, consoante estabelece o artigo 1º, V e VI, da Lei 8.072/90.

(...)

Desse modo, ao contrário do que pretende demonstrar o agravante, a divergência de entendimento entre os precedentes citados e a orientação adotada pela decisão recorrida encontra-se há muito superada" (fls. 41-43).

2. No presente habeas corpus, a Impetrante sustenta que:

"(...)

A questão jurídica a ser dirimida no julgamento do presente habeas corpus é bastante simples, e pode ser resumida da seguinte forma: Os crimes de estupro e o de atentado violento ao pudor devem resultar em lesão de natureza grave ou morte para serem caracterizados como crime hediondo?

Ao ver da Defesa Pública a indagação deve ser respondida afirmativamente.

(...) o legislador limitou a caracterização de crimes hediondos, nos casos dessas duas espécies de crimes contra os costumes, em suas respectivas tipificações básicas quando combinadas estas com o artigo 223, caput e parágrafo único, do Código Penal.

(...)

O que vale dizer que somente caracterizam-se como hediondos o estupro e o atentado violento ao pudor quando cometidos mediante violência real, afastados, assim, da definição legal de hediondos, quando praticados sem violência real ou com violência presumida (artigo 224 do Código Penal).

(...)

Estender à categoria de crime hediondo fato que a lei não define como tal, determinando sérias agravantes ao condenado (impossibilidade de anistia, graça e indulto; fiança e liberdade provisória; recolhimento obrigatório à prisão para fins de apelação; regime prisional integralmente fechado etc.), ofende, além do princípio da reserva legal a dignidade da pessoa humana.

(...)" (fls. 4-5 e 8 - transcrição conforme o original).

Este o teor dos pedidos:

"(...)

ANTE O EXPOSTO, a impetrante vem, perante Vossa Excelência, requerer:

a) seja concedida a ordem nó presente Habeas, para revogar o acórdão proferido pelo STJ, reconhecendo-se não tratar-se de hipótese de crime hediondo.

b) seja dada vista ao Ministério Público Federal para parecer.

(...)" (fl. 8 - transcrição conforme o original).

3. Não havendo pedido de medida liminar, determinei, em 13.2.2009, fosse dada vista destes autos ao Procurador-Geral da República (fl. 50).

4. Em 15 de abril de 2009, o Subprocurador-Geral da República, Edson Oliveira de Almeida, ofereceu parecer opinando pela denegação da ordem (fl. 55).

É o relatório.

VOTO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - (Relatora):

1. Razão de direito não assiste à Impetrante.

2. O acórdão do Superior Tribunal de Justiça questionado neste habeas corpus está em perfeita harmonia com a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal segundo a qual o crime de estupro, mesmo que praticado na sua forma simples, ê crime hediondo.

Refiro-me, por exemplo, ao Habeas Corpus 88.245, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ 20.4.2007, no qual fui Redatora para o acórdão, verbis:

"EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. CRIMES DE ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. ARTIGOS 213 E 214 DO CÓDIGO PENAL. FORMA SIMPLES. CONFIGURAÇÃO. CRIMES HEDIONDOS. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal firmou entendimento no sentido de que, nos casos de estupro e atentado violento ao pudor, as lesões corporais graves ou morte traduzem resultados qualificadores do tipo penal, não constituindo elementos essenciais e necessários para o reconhecimento legal da natureza hedionda das infrações. 2. Em razão do bem jurídico tutelado, que é a liberdade sexual da mulher, esses crimes, mesmo em sua forma simples, dotam-se da condição hedionda com que os qualifica apenas o artigo 1º da Lei n. 8.072190. 3. Habeas corpus denegado'.

No mesmo sentido, v.g., HC 90.706, de minha relatoria, DJ 23.3.2007; HC 93.674, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 23.10.2008; HC 89.554, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 2.3.2007, entre outros.

3. Destarte, não há sustentação jurídica nos argumentos apresentados pela Impetrante para assegurar o êxito do que pleiteia nesta ação.

4. Pelo exposto, encaminho a votação no sentido de se denegar a ordem.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Presidente, não posso atribuir ao legislador a inserção de palavras, de expressões inúteis em certo dispositivo.

Devo observar, até mesmo, a gradação, a ordem natural das coisas, a necessidade de distinguir-se coisas que apresentam peculiaridades próprias. Resisto, quanto posso, a colocar na vala comum estupro e atentado sem violência da qual resulte lesão corporal de natureza grave e atentado, estupro em que haja lesão grave decorrente da violência.

Se formos à Lei nº 8.072/90, veremos que se colou ao estupro e ao atentado especificidade. Por que? Porque, além da referência aos tipos, contida nos incisos V e VI do artigo 1º, alude-se à combinação. Combinação com que artigo, atraindo, portanto, a incidência desse artigo? Combinação com o artigo 223 do Código Penal. Nele está:

"Art. 223. Se da violência resulta lesão corporal de natureza grave:"

Então, tem-se a forma qualificada. Ou seja, o legislador da Lei nº 8.072/90 somente alçou ao patamar de crime hediondo o atentado, como também o estupro, quando verificada a lesão grave, e distinguiu, a meu ver, numa política criminal normativa salutar, onde cabia realmente distinguir.

Foi o que sustentei no Plenário e tive, inclusive, a respaldar essa óptica a visão do Ministro Néri da Silveira, mas o entendimento não frutificou. E, não havendo frutificado, porque estou a atuar em órgão fracionado, ressalvo o pensamento a respeito e acompanho a relatora, dizendo que estou pronto a rediscutir a matéria no Colegiado maior.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - Vossa Excelência coloca ênfase na combinação referida pelo artigo 1º, inciso V, da Lei nº 8.072.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - É interessante a matéria. Acabam sendo apenados com o afastamento de benefícios aqueles que praticam, a rigor, crimes diversos, vale dizer, a prática sem a causa de aumento também atrai o rótulo da hediondez, com as consequências próprias.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - No caso dos autos, Ministra Cármen Lúcia - o Ministro Marco Aurélio sempre nos leva a um repensar -, o estupro...

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - A violência foi presumida pela menoridade, não foi violência real, grave. Mas é o precedente do Plenário.

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (RELATORA) - Mas aqui o problema, a questão principal é que há um precedente do Plenário; como é que nós vamos considerar constrangimento ilegal do Superior Tribunal que acompanhou o Pleno do Supremo?

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Por isso, ressaltei na Turma: no Plenário, rediscutiria a matéria e me pronunciaria como o fiz quando, pela primeira vez, chegou à bancada.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - É violência presumida em função da idade menor da vítima. Eu também já me pronunciei assim.

Na verdade, para a estrutura psíquica da mulher, o estupro é de uma violência inominável; corresponde a um tratamento degradante, desumano, e, realmente, a liberdade sexual da mulher fica estilhaçada, violentada, a mais não poder, pelo crime de estupro. O estupro tem características inconfundíveis com qualquer outra figura criminal e provoca efeitos devastadores no psiquismo e na psicologia da mulher. E esse caráter de hediondez a meu ver em boa hora foi assentado pelo legislador.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - De qualquer forma, Presidente - já que Vossa Excelência feriu esse tema -, precisamos também conceber que estupro é a conjunção carnal contra a vontade da mulher, casada ou não, de vida normal ou dissoluta.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - Exato.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - E, nessa violência presumida, não se tem a resistência, de início, da vítima.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - A resistência de fato, necessariamente, não, porque é prescindível.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Há uma ficção jurídica: entende-se que, pela menoridade, a vítima não teria consentido. É interessante a matéria.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (PRESIDENTE) - É um caso típico em que o Direito cria as suas próprias realidades, na linha kelseniana de pensamento. Kelsen, sempre ele; sempre voltamos a ele. É impressionante. Foi, de fato, o jurista mais importante do Século XX, embora seguido de perto por Norberto Bobbio - a meu sentir.

EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 97.778-2

PROCED.: RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA

PACTE.(S): CLÉRIO DA SILVA DOS SANTOS

IMPTE.(S): DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Ausente, justificadamente, o ministro Menezes Direito. 1ª Turma, 23.06.2009.

Presidência do Ministro Carlos Ayres Britto. Presentes à Sessão os Ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e a Ministra Cármen Lúcia. Ausente, justificadamente, o Ministro Menezes Direito.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.

Ricardo Dias Duarte - Coordenador




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