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segunda-feira, 16 de novembro de 2009

JURID - Apelação criminal. Latrocínio. Sentença condenatória. [16/11/09] - Jurisprudência


Apelação criminal. Latrocínio. Sentença condenatória. Pretensão recursal.
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Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 111120/2008 - CLASSE CNJ - 417 - COMARCA DE BARRA DO GARÇAS

APELANTE: MARCELO GARCIA DA SILVA

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

Número do Protocolo: 111120/2008

Data de Julgamento: 15-9-2009

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL - LATROCÍNIO - SENTENÇA CONDENATÓRIA - PRETENSÃO RECURSAL - DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME CONTRA A PESSOA - PROVA - VEEMÊNCIA DA PRÁTICA DO ROUBO COM RESULTADO MORTE - REGRA ESPECIAL - IMPOSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO - RECURSO DESPROVIDO.

Incensurável a decisão condenatória quando os dados probatórios coligidos durante a persecutio criminis elegem a prática de delito patrimonial qualificado, para se excluir as entidades criminais consistente no homicídio e também nas lesões corporais.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. RUI RAMOS RIBEIRO

Egrégia Câmara:

Marcelo Garcia da Silva, qualificado, foi denunciado pela prática do delito tipificado no artigo 157, parágrafo 3º, segunda parte (duas vezes).

Consta da denúncia que em 22 de março de 2008, por volta das 19 horas, em uma residência situada na Rua Goiás, 1631, centro, em Barra do Garças/MT, mediante violência, consistente em emprego de socos e de uma faca, contra as vítimas José Norberto Pereira dos Santos e Agnes dos Santos, que vieram a óbito, subtraiu para si aproximadamente R$400,00 (quatrocentos reais) (fls. 10 e 11).

No Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças/MT, foi condenado como incurso nas sanções do artigo 157, parágrafo 3º, in fine, combinado com o artigo 71, combinados com os artigos 61, inciso I e 65, incisos III, 'd', todos do Código Penal, a cumprir a reprimenda de 52 (cinquenta e dois) anos de reclusão em regime fechado, e ao pagamento de 200 (duzentos) dias-multas (fls. 364 a 382).

Inconformado, através da Defensoria Pública do Estado, interpôs recurso de apelação (fls. 277), onde pleiteia, em síntese, a desclassificação do crime de latrocínio para homicídio, quanto a vítima José Norberto Pereira dos Santos, e, para o crime de lesão corporal grave seguida de morte, no que diz respeito a vítima Agne dos Santos.

Alega-se ter o apelante ido a casa das vítima para receber crédito trabalhista, uma vez que trabalhava para José Norberto, e quando da rescisão do contrato de trabalho, "(...) em razão do sumiço de pequenos bens, cuja autoria fora atribuída ao apelante, as vitimas entendera que a divida esta calculada em torno de R$120,00 (cento e vinte reais).", e, assim a " Rescisão trabalhista anularia o pagamento de possíveis verbas.", por não concordar com a compensação estabelecida pela vítima, haja vista ser vedada pela legislação trabalhista, o que deu enseja a uma discussão entre apelante e a vítima, culminando na morte desta.

Neste momento a segunda vítima entrou no local onde ocorreram os fatos, e disse que se o objetivo do apelante era dinheiro, que ela iria buscar no quarto, no que foi acompanhada pelo apelante, e, entregou-lhe a bolsa, retirando da carteira aproximadamente R$200,00 (duzentos reais) e alguns documentos da vítima.

Sustenta não restar delineado na denúncia o crime de latrocínio, expondo que contra a primeira vítima José Norberto, se evidenciaria o crime de homicídio descrito no artigo 121 do Código Penal, e quanto a segunda vítima Agnes, o crime de lesão corporal grave seguida de morte, assim pede a desclassificação. Alega ainda que as penas infligidas se mostram exacerbadas (fls. 277 a 284).

Em resposta, o Parquet pugnou pelo improvimento do recurso por entender que não ter restar dúvidas de que a intenção do apelante era de subtrair dinheiro da vítima, empregando meio violento, o que se evidenciaria da confissão extrajudicial e judicial do apelante e das declarações das testemunhas (fls. 286 a 294).

Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça requereu a conversão do julgamento em diligência, para que se procedesse a transcrição dos depoimentos colhidos e da sentença (fls. 307 a 309), o que foi deferido pelo Relator em substituição legal (fls. 312/13).

Efetuadas as degravações (fls. 312 a 357), as contrarrazões foram reiteradas (fls. 358), tendo a defesa, concordado com seu teor (fls. 359).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em Parecer (fls. 365 a 367) da lavra do eminente Procurador de Justiça Mauro Viveiros, manifestou-se pelo improvimento de recurso. Explicitou-se ter o apelante invadido a casa das vítimas com a intenção de subtrair dinheiro, e tendo-se deparado com as vítimas, empreendeu extrema violência, o que levou a óbito a primeira vítima no momento dos fatos e a segunda veio a falecer meses após em decorrência das lesões sofridas. Destacou serem contraditórias as declarações do apelante, quando interrogado em juízo, inicialmente disse ter ido até a casa das vítimas para cobrar o crédito trabalhista e logo em seguida que achava que a casa estava vazia, restando evidente que o objetivo era a subtração patrimonial.

A douta revisão foi realizada às fls. 374 TJ/MT.

É o relatório.

P A R E C E R (ORAL)

O SR. DR. JOSÉ DE MEDEIROS

Ratifico o parecer escrito.

V O T O

EXMO. SR. DES. RUI RAMOS RIBEIRO (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Como narrado, busca-se através do recurso de apelação a desclassificação do crime de latrocínio, referente a primeira vítima para o de homicídio simples, e quanto a segunda para lesão corporal seguida de morte.

Passo a análise do conjunto probatório.

Na fase extrajudicial (fls. 166 a 171) confirmaram-se as acusações.

Quanto as circunstância em que o crime ocorreu, disse que no dia dos fatos ingeriu bebida alcoólica e uso substância entorpecente juntamente com Vagner e Nilsmar. Declarou que ao chegar na residência das vítima acreditava não ter ninguém, e que conhecia a casa, pois já teria furtado carne do local em duas ocasiões, como achava que não havia pessoas na casa resolveu furtar mais carne, e ao adentrar no local acredita ter sido visto por José Norberto, pois assim que chegou no 'freezer" ele chegou atrás, pegando na perna do interrogado enquanto gritava o nome da filha, tendo a vítima o arrastado até a sala, onde encontrou uma faca sobre um móvel, e tomando-a passou a desferir-lhe golpes com a arma branca, momento que Agnes segurou seus braços pela costa, e em ato contínuo aplicou-lhe um soco em sua cabeça o que a fez cair, e, neste momento Norberto já estava desfalecido. Inquirido quanto ao dinheiro subtraído das vítimas disse:

"(...) Que, inquirido sobre o momento em que resolveu pegar o dinheiro das vítimas, já que a primeira intenção era de subtrair carnes, esclarece que foi após constatar que as duas vítimas estavam no solo, pensou que elas já estivessem mortas, ocasião em que, primeiro, pegou a carteira que estava no bolso da camisa da vítima, acreditando que pegou dinheiro da carteira, não recordando o valor, e não recorda se a carteira foi colocada dentro do bolso ou jogada na sala; QUE, em seguida, pegou dinheiro da vítima AGNES, que estava em cima da cama dela, acrescentando que a bolsa dela parecia sacola de feira; QUE, não sabe informar a importância do dinheiro que foi pego na bolsa de AGNES, contudo, após contar o dinheiro das duas vítimas, afirma que o valor fo próximo de R$400,00, (...)".(sic fls. 168).

Em juízo (fls. 321 a 329), disse ter entrado na casa das vítimas, mas que não teria a intenção de matá-las, tendo adentrado pela porta dos fundos que se encontrava aberta, mas não tinha conhecimento se as vítimas estavam na residência, e ao entrar encontrou o Sr. Norberto, passando a agredi-lo com "murro na cabeça dele", tendo ele o segurado e assim o arrastou até a sala onde encontrou uma faca em cima de um móvel, passando a desferir-lhe quatro golpes, e somente após a vítima o soltou.

Declarou quando a segunda vítima Agnes entrou na sala ainda segurava o Sr. Norberto, posto que chegou no início dos fatos, não tendo ouvido nada do que dizia, somente os gritos das vítima chamando um ao outro, sendo que Agnes tentou detê-lo e o apelante desferido-lhe "um murro na cabeça dela". Quanto ao dinheiro disse tê-lo pego na bolsa da segunda vítima, após ela já estar caído, sendo que na carteira da primeira vítima nenhum dinheiro foi encontrado.

Quanto às razões que o levaram a invadir a casa das vítimas disse:

"Com a intenção fui lá pra receber um dinheiro que eu tinha trabalhado pra ele no passado, tava me devendo uma quantia de R$150,00 ou uns R$ 135,00, por ai."

Questionado o motivo de não ter tocado a campainha, disse que iria esperar a vítima chegar pela área, indo esperá-la na área do fundo para que ninguém o visse, sendo que já havia tido entrevero entre ambos, em razão de uma vaca, o que ensejou sua demissão após uns seis ou sete anos trabalhando na fazenda da vítima, em períodos intercalados, e que o dinheiro que buscava receber, aproximadamente R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), referia-se a uma roçada de pasto, que já havia passado o dia de pagamento.

Disse que as agressões em ambas as vítimas se estenderam desde a área até a sala, sendo que em Agnes deferiu um único murro o que a fez cair, mas teria presenciado as agressões ao Sr. Norberto, inclusive os golpes com arma branca.

Às perguntas formuladas pela defesa, disse que ao ser visto por Sr. Norberto, este o questionou sobre o que fazia naquele local, tendo respondido que estava ali para receber os R$145,00 (cento e quarenta reais) que lhe devia, tendo o diálogo sido áspero, mas não foi a causa do aparecimento de Agnes, se contradisse ao dizer que somente teve acesso a carteira de uma das vítimas, haja vista que às perguntas do magistrado, havia dito ter sido as duas carteiras.

Sobre os furtos de carne, ocorridos duas semanas antes, tanto Norberto quanto Agnes haviam comentado com vizinhos (fls. 28/30, 345/46), sendo que Agnes teria citado a pessoa de "neguinho, quem Luiz da Silva Santana, reconheceu através de fotografia como o "supeito" de ser o autor dos crimes (fls. 30).

A testemunha Luiz Romão de Souza, disse à autoridade policial (fls. 32 e 33), que a vítima Norberto teria lhe dito que "Tizil", teria lhe ameaçado, pois não ficaria com o prejuízo e que iria até sua casa receber o que lhe era de direito, afirmando que a única pessoa com quem Norberto tinha "rixa" era como a pessoa conhecida com "Tizil", tendo ficado sabendo que Agnes teria reconhecido o "Tizil", como autor do crime contra seu pai.

Na delegacia de polícia, Valter Sousa Brito, irmão de Vagner Souza Brito, disse que estava assistindo televisão quando viu a reportagem sobre o caso oportunidade em que mostraram a foto possível autor, o qual reconheceu como sendo Marcelo José da Silva, conhecido como "Tizil", pessoa que estava hospedado em na residência, pois era amigo de Vagner, o que imediatamente informou à autoridade policial. Afirmou ainda, que no momento da reportagem "Tizil" ficou inquieto e ofegante, tendo evadido logo que o declarante saiu para ir até a delegacia de polícia (fls. 35).

Por sua vez Vagner Souza Brito (fls. 36 e 37), disse ter conhecido o apelante aproximadamente um mês antes dos fatos, mas que este nada lhe disse sobre o crime, sendo que somente tomou conhecimento através da reportagem, momento em que notou ter Marcelo mudado sua fisionomia, ficando assustado, mas nenhum comentário fez.

Ouvida pela autoridade policial, Agrea dos Santos Ibrahim Ali (fls. 39 e 40), irmã e filha das vítimas, disse que foi até o Pronto Socorro onde sua irmão estava inconsciente, apenas delirando, e somente então tomou conhecimento do falecimento do pai, sendo que no mesmo dia foi necessária a remoção de Agnes para a cidade de Goiânia/GO, em razão do ferimento, tendo sido acompanhada pela tia de nome Liria, e ao visitá-la foi informada por esta que nos primeiros dias de internação Agnes estava consciente e falante, tendo narrado:

"que estava na cozinha, momento em que ouviu um barulho na sala e foi ver momento que Agnes visualizou um elemento ferindo o seu pai com uma faca, momento em que disse para o elemento que iria lhe dar R$ 200,00 reais, para que o elemento parasse com a agressão, momento em que Aguines deu os R$ 200,00 reais e falou que iria até o quarto buscar mais dinheiro, momento em que se deslocou até o quarto, e o elemento veio atrás, momento em que foi atingida na cabeça perdendo os sentidos: QUE, a declarante afirma que Aguines reconheceu quando estava internada que o autor do Homicídio foi a pessoa conhecida como Neguinho, quando foi lhe mostrada a foto que foi enviada via email, (...)" (sic).

A declarante não soube informar se seu pai teria alguma "rixa" com Neguinho, desconhecendo o motivo do crime.

Em juízo (fls. 330 a 333), disse que ao chegar no pronto socorro onde estava sua irmã Agnes, ela se debatia e em delírio dizia "é o Neguim, foi o Neguim ele que fez isso."(fls. 330), mas a declarante disse que não tinha conhecimento de desavenças entre "Neguim" e seu pai, declarou que Agnes "(...) levou muito pancada na cabeça, o olho dela estava ate fora do lugar (...)"(fls. 331), transferida para Goiânia, após aproximadamente dez dias no Unidade de Tratamento Intensivo, ela teve uma melhora e foi levada para o quarto, onde retomou a lucidez e perguntava sobre o pai, após muito insistir, fora-lhe contado do falecimento de seu genitor, o que elevou sua pressão, retornando o cérebro a inchar necessitando assim, "(...) abrir, serrar a cabeça e tirar esse lado direito do osso (...)", declarou que durante o período lúcido fora apresentada uma foto do apelante à Agnes que o reconheceu como o agressor e disse:

"Ai ela escutou a voz do meu pai na sala falando alto, daí ela foi ate sala e ele já estava começando d ferir o meu pai, ai ela falava assim se você quer dinheiro? Se meu pai não tem para te dar eu dou um jeito eu tenho um pouco, não machuca ele, eu te dou o dinheiro, aí ela foi até o quarto e parece que ela pegou R$200,00 reais." (sic fls. 332).

À autoridade policial Lira Schirmbeck, quem acompanhou Agnes no internamento em Goiânia, disse (fls. 41/42) que a vítima, quando estava bem e com autorização médica fez o reconhecimento de Marcelo José da Silva, através da foto que consta nestes autos, como a pessoa que agrediu-lhe e a seu pai, e descreveu os fatos, disse que estava na cozinha começando a fazer um bolo quando chegou seu pai e em seguida uma outra pessoa que foi pedindo dinheiro, quando seu pai disse que não possuía e na sequência passou a ser agredido com golpes de arma branca, tendo Agnes dito que possuía R$200,00, pedindo para que cessasse as agressões, contudo não fora atendida, encaminhando-se para seu quarto pegou o dinheiro na bolsa e ao retornar recebeu um golpe na cabeça perdendo os sentido. Esclareceu ainda que no momento Agnes encontrava-se em coma induzido, devido o inchaço do cérebro o que necessitou a retirada de um pedaço do crânio.

Em juízo (fls. 340 a 342), disse que sua sobrinha estava conversando normalmente, e com autorização médica, a declarante mostrou lhe a foto de apelante, "(...) ela falou na hora, é o Neguinho, o Neguinho que bateu no meu pai, que esfaqueou o meu pai, que bateu em mim." (fls. 340), já no quarto a vítima recebeu acompanhamento psicológico, mas somente contou os fatos à declarante, pessoa em quem confiava, tendo dito:

"Ela disse eu estava na cozinha e o meu pai tava na sala, e daí eu ouvi duas vozes alterada e eu fiquei assustada, porque o meu pai não era de alterar a voz com ninguém, e daí eu fui pra sala, e quando eu cheguei na sala eu vi que o pai tava discutindo com o Neguinho, eles tratava ele de Neguinho, aí ela falou, ela viu ele pedir dinheiro pro pai, disse eu quero dinheiro, o pai ela respondeu eu não tenho dinheiro para ti dar, ai disse que a segunda vez que ele falou pediu dinheiro e pai dela disse que não tinha dinheiro, ele foi batendo no meu pai, foi esfaqueando meu pai, daí eu gritei com ele, eu vim pro lado pra ajudar acudi meu pai, eu gritei com ele se teu problema é dinheiro, não machuca meu pai, e quando eu falei isso ela , já virou e bateu em mim eu falei não faça isso, não machuca nós, porque eu tenho R$ 200,00 reais na minha bolsa no meu quarto, e eu vou buscar a bolsa e vou te dar os R$ 200,00 reais, aí ela foi ao quarto, e quando ela chegou no quarto que ela pegou a bolsa, o Neguinho já tava atrás dela, e parece que o pai dela tava atrás, que ela só lembra quando ela lançou a bolsa pra ele, e daí aconteceu alguma coisa ela não sabe o quê, porque daí ela não viu mais nada." (sic fls. 341).

No exame pericial em local de morte violenta (fls. 45 a 142), encontraram sinais de luta na sala e em dois quartos (fotos fls. 71/79, 83), sobre o tapete da sala de estar foi encontrado "(...) uma carteira de couro de cor marrom contendo documentos pessoais da vítima, sem dinheiro; (...)" (fls. 50, fotos fls. 81/82), no quarto anexo à sala de jantar foram encontrados "(...) documentos pessoais e papeis estavam sobre o piso cerâmico: uma bolsa feminina estava ancorada entre a cama e a cômoda." (fls. 51 fotos 121/123), e, "A penteadeira localizada no quarto anexo à sala de jantar possuía (02) gavetas entreabertas,(...)"(fls. 52 foto fls. 124), constando ainda que exceto a cozinha e o banheiro, todo interior da casa esta gotejado de sangue, parede, moveis, piso etc... (fotos fls. 70, 78/80, 83, 85/87, 91/93, 112/114, 117/119, 125/127), encontrando-se sobre móveis, talonários de cheque e cartão de conta bancária (fotos fls. 109/110), notas promissórias (foto fls. 11), documentos de veículos (foto fls. 108), aparelho celular (fotos fls. 88).

Diante do exposto, a tese defensiva de não ter o apelante praticado o crime de latrocínio, mas sim homicídio simples contra a Sr. Norberto e Lesão corporal seguida de morte no que se refere a Agnes, não merece prosperar.

Antes de mais nada devemos perquirir qual seria o motivo das mortes das vítimas.

Vê-se da confissão extrajudicial, das provas testemunhais e do material fotográfico restar devidamente evidenciado que o móvel da conduta do apelante era vontade deste de subtrair quantia em dinheiro que tivessem as vítimas.

Deste modo, restando comprovado o dolo no crime anterior (roubar) e dolo no posterior (matar), não há falar em desclassificação para homicídio.

Nesse sentido:

"APELAÇÃO - LATROCÍNIO - CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO - CONCURSO DE PESSOAS - DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO - INVIABILIDADE - PROVA DO ANIMUS DE ROUBAR - DESVIO SUBJETIVO DE CONDUTA - INOCORRÊNCIA - PARTICIPAÇÃO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO - INADMISSIBILIDADE - REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA - INICIALMENTE FECHADO. Se a violência exercida contra a vítima, acarretando-lhe a morte, foi exercida com o intuito de subtrair a quantia que lhe pertencia, configura-se o delito de latrocínio. Em tema de latrocínio não se deve reconhecer a cooperação dolosamente distinta, agasalhada pelo art. 29, § 2º, do CP, se o envolvido na empreitada criminosa dela participou ativamente, ainda que não tenha executado atos que culminaram na morte da vítima, mas assumiu o risco da produção do resultado mais grave. Em consonância com o posicionamento por mim adotado neste Sodalício, tendo o pleno do STF, por maioria de votos (HC 82959/SP), em sede de controle difuso, declarado a inconstitucionalidade do parágrafo 1.º, do artigo 2.º, da Lei n.º 8.072/90, por contrariar os princípios da individualização e humanização das penas, afastou o óbice que impedia a progressão de regime aos chamados crimes hediondos e a eles equiparados. Recursos parcialmente providos. (TJ/MG, Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, Apelação Criminal nº 1.0372.05.014103-8/001, Publicação: 12-5-2007). (grifo nosso).

Ressalto não se poder afastar o valor probante da confissão extrajudicial do apelante, especialmente se esta se apresenta coerente com as provas coligidas durante a persecutio, assim, revestem-se de força suficiente a sustentar o veredicto condenatório, como exposto por Weber Martins Batista, ao referendar Frederico Marques, que por sua vez citando Vito Gianturco explicitou:

"Constitui erro crasso, como diz mestre Frederico Marques, citando Vito Gianturco, o afirmar-se que nenhuma presunção, por mais veemente que seja, dará lugar à condenação, pois tal assertiva equivaleria a abolir-se a prova indiciária do processo penal." ("O Furto e o Roubo no Direito e no Processo Penal". 2 ed. Forense. Rio de Janeiro: 1997. pp. 459).

Sobre o valor da confissão extrajudicial leciona Damásio E. de Jesus:

"De acordo com a orientação do STF, a confissão feita no inquérito policial, embora retratada em juízo, tem valia, desde que não elidida 'por quaisquer indícios ponderáveis, mas ao contrário, perfeitamente ajustável aos fatos apurados' (RCrim 1.261, DJU 2.4.76, p 2225). Em outra oportunidade, decidiu que as 'confissões feitas na fase do inquérito policial têm valor probante, desde que testemunhadas e não sejam contrariadas por outros elementos de prova' (RCrim 1.352, RTJ 91/750; HC 71.242, RTJ 154/620; TJSP, JTJ 204/270; TACrimSP, RJTACrimSP 35/217 e 497). Assim, as 'confissões extrajudiciais valem pela sinceridade com que são feitas ou verdade nelas contida, desde que corroboradas por outros elementos de prova'" ("Código de Processo Penal". 22 ed. Saraiva. São Paulo:2006. p.182).

Cito os seguintes julgados:

"PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. PROVA. TESTEMUNHO POLICIAL. IDONEIDADE. - É idônea a prova testemunhal colhida no auto de prisão em flagrante e reafirmada em Juízo, com plena observância do contraditório, mesmo constituída apenas por depoimentos de policiais que realizaram o flagrante. - A confissão extrajudicial, mesmo negada em juízo, tem valor probante quando em sintonia com a versão dada por outros meios de prova. - Recurso especial parcialmente conhecido e nesta extensão provido." (STJ, RESP 162022 / GO ; Recurso Especial 1998/0001308-3 Rel, Ministro Vicente Leal T6 - Sexta Turma, Julgamento: 16/04/1999, Publicado DJ 10.05.1999 p. 233) (nosso grifo).

"APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO QUALIFICADO - CONDUTA TÍPICA PREVISTA NO ART. 157, § 2º, INCISOS I e II DO CP - DECISÃO DE 1º GRAU ESCORREITA QUANTO À CONDENAÇÃO - NEGATIVA DE AUTORIA EM JUÍZO ISOLADA - PROVAS SEGURAS E HARMÔNICAS - PENA PRÓXIMA DO MÍNIMO - REGIME INICIAL SEMI-ABERTO - RECURSO IMPROVIDO. A retratação em juízo da confissão feita na fase inquisitorial não tem eficácia se a negativa de autoria vem desmentida pelas provas, como depoimentos de testemunhas e reconhecimento realizado pela vítima." (TJ/MT, Primeira Câmara Criminal, Recurso de Apelação Criminal Nº 14387/2004 - Classe I - 14 Comarca de Sorriso, Número do Protocolo: 14387/2004, Rel. Desa. Shelma Lombardi de Kato, Data de Julgamento: 14-9-2004).

Ainda neste sentido:

"LATROCÍNIO. PROVA. OBTIDA NO INQUÉRITO POLICIAL. VALOR. CONDENATÓRIO. CONFISSÃO E RETRATAÇÃO. VALIDADE DA PRIMEIRA. CHAMADA DE CO-RÉU. VALOR. A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada, pelos elementos probatórios colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso. No caso em tela, a declaração de co-réu, prestada no inquérito policial, encontra apoio em depoimentos judiciais de pessoas que informaram que ela (declaração) foi prestada sem coação. Em conseqüência, pode-se afirmar que a retratação judicial não teve o condão de desautorizar a confissão policial, bem como as imputações que o co-réu fez a seus comparsas têm valor condenatório. (...) DECISÃO: Apelos defensivos desprovidos. Unânime." (Apelação Crime Nº 70022216162, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 19-12-2007).

Restando claro o objetivo de se subtrair bens da vítima, associado à morte da mesma, conclui-se pela ocorrência do crime de latrocínio, não havendo que se falar em desclassificação.

Por todo o exposto, em consonância com o douto Parecer, improvimento o recurso de apelação interposto em favor de Marcelo Garcia da Silva.

Custas na forma da lei.

É como voto.

V O T O

EXMA. SRA. DRA. GRACIEMA R. DE CARAVELLAS (REVISORA)

Colenda Câmara:

O reclamo defensivo proposto no sentido de desclassificar a conduta inicialmente assentada na forma do art. 157, § 3º, última figura c/c art. 71, ambos do Código Penal, para a de homicídio qualificado em relação a José Norberto, e de lesão corporal seguida de morte quanto a Agnes, é de todo descabida.

O próprio apelante se contradiz em Juízo (fls. 354/356) quando sustenta que se dirigiu à residência das vítimas para delas "cobrar uma dívida" decorrente de serviços prestados quando para elas trabalhou, "pensando que a casa estivesse vazia", de modo a propiciar s nítida conclusão de que havia se dirigido ao local com o nítido escopo de crime patrimonial.

Logrando acesso ao interior do imóvel, contudo, surpreendeu-se, primeiro, com a presença de José Norberto, a quem esfaqueou até a morte. Em seguida, observando que a filha deste, de prenome Agnes, bradava pelo nome do pai morto, atingiu-a com vários socos que acabaram por levá-la à morte.

Por fim, abatidas as vítimas, subtraiu do interior da residência a importância de R$ 400,00, evadindo em seguida.

Diante desse quadro fático, bem comprovado pelas inferências testemunhais transcritas às fls. 330/348, inclusive pela própria admissão do apelante em Juízo - antes mencionada -, é cristalina a adequação à figura típica do latrocínio ao fato atribuído a Marcelo, tal como expressado na sentença condenatória.

Ainda, como bem pontuado pelo nobre parecerista,

"O seu propósito podia não estar concebido, mas o animus de apropriar-se de cosa alheia é induvidoso e vem confessado pelo próprio condenado, ainda que argumente com a tese de que tinha crédito a receber por serviços prestados junto aquela vítima, circunstância não comprovada e que, mesmo que pudesse ser verdadeira, não tem relevância alguma para o pretendido efeito de desclassificação da figura penal não latrocínio." (parecer, fl. 366)

Assim, tenho como infundados os argumentos defensivos que informam o pedido desclassificatório ora analisado, razão pela qual, acompanhando integralmente o douto relator, desprovejo o recurso aviado por Marcelo Garcia da Silva, mantendo intacta a sentença condenatória de fls. 364/382.

É como voto.

V O T O

EXMO. SR. DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (VOGAL)

Acompanho os votos precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. RUI RAMOS RIBEIRO (Relator), DRA. GRACIEMA R. DE CARAVELLAS (Revisora convocada) e DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, DESPROVERAM O APELO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Cuiabá, 15 de setembro de 2009.

DESEMBARGADOR PAULO INÁCIO DIAS LESSA - PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

DESEMBARGADOR RUI RAMOS RIBEIRO - RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 06/11/09




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