Anúncios


quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Informativo STF 566 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 3 a 6 de novembro de 2009 - Nº 566.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

Download deste Informativo

SUMÁRIO

Plenário
Financiamento de Campanha Eleitoral: Peculato e Lavagem de Dinheiro
1ª Turma
Lei 6.368/76: Causa de Aumento e Bis In Idem - 1
Lei 6.368/76: Causa de Aumento e Bis In Idem - 2
2ª Turma
Liberdade Provisória e Tráfico de Drogas
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
Processo Legislativo Municipal - Poder de Iniciativa das Leis - Usurpação - Sanção - Irrelevância - Inconstitucionalidade Formal (AI 348800/SP)
Inovações Legislativas


PLENÁRIO

Financiamento de Campanha Eleitoral: Peculato e Lavagem de Dinheiro


O Tribunal iniciou julgamento de inquérito instaurado para apurar a suposta prática dos crimes de peculato (sete vezes) e de lavagem de dinheiro (seis vezes), previstos, respectivamente, no art. 312, § 2º, do CP e no art. 1º, V, da Lei 9.613/98, imputados a Senador da República e outros. Na espécie, o parlamentar acusado, na condição de Governador do Estado de Minas Gerais, supostamente teria organizado um esquema criminoso de desvio de verbas estatais, colocando em ação mecanismos que permitiriam a ocultação da origem criminosa desses recursos e o financiamento ilícito da sua reeleição. Narra a denúncia que o então Governador teria ordenado a expedição de ofícios à Companhia de Saneamento de Minas Gerais - COPASA, à Companhia Mineradora de Minas Gerais - CEMIG e ao Banco do Estado de Minas Gerais - BEMGE, determinando o patrocínio de evento esportivo, o que implicara a transferência de recursos estatais para determinada empresa de comunicação, responsável pela veiculação publicitária do evento, da qual o então candidato a Vice-Governador fora sócio. Por meio de acordo com os sócios dessa empresa, o parlamentar teria planejado a aplicação dessas verbas na sua campanha de reeleição ao Governo do Estado de Minas Gerais em 1998. Para tanto, e visando à ocultação da origem desses recursos, os sócios da referida empresa de comunicação teriam tomado empréstimos junto a banco, aplicando-os na campanha do parlamentar acusado. Tais empréstimos teriam sido parcialmente liquidados com os recursos públicos que deveriam ser destinados ao evento esportivo. O Min. Joaquim Barbosa, relator, após declarar a extinção da punibilidade de um dos acusados, em razão de sua morte (CP, art. 107, I), e de outros, pela prescrição da pretensão punitiva, tendo em vista as penas cominadas em abstrato aos crimes narrados na inicial e o fato de já possuírem, atualmente, mais de setenta anos de idade (CP, art. 107, IV, c/c o art. 115), recebeu a denúncia contra o parlamentar, relativamente aos dois crimes a ele imputados. Em seguida, pediu vista dos autos o Min. Dias Toffoli.
Inq 2280/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 5.11.2009. (Inq-2280)

1ª parte Audio
2ª parte Audio

Íntegra  Audio


1ª parte Vídeo
2ª parte Vídeo
3ª parte Vídeo

PRIMEIRA TURMA

Lei 6.368/76: Causa de Aumento e Bis In Idem - 1

Os crimes de auxílio ao tráfico ilícito de drogas (Lei 6.368/76, art. 12, § 2°, III) e de associação para o tráfico (Lei 6.368/76, art. 14) são autônomos, sendo possível a incidência da causa de aumento de pena prevista no art. 18, I, do mesmo diploma legal, de forma independente, sobre cada um desses delitos, desde que presente a elementar da transnacionalidade do crime [Lei 6.368/76, art. 18, I: “As penas dos crimes definidos nesta Lei serão aumentadas de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços): I - no caso de tráfico com o exterior ou de extra-territorialidade da lei penal;”]. Ao aplicar essa orientação, a Turma indeferiu habeas corpus em que condenado por tráfico internacional e associação para o tráfico de drogas em concurso material (art. 12, § 2º, III e 14 c/c o art. 18, I, todos da Lei 6.368/76 c/c o art. 69 do CP) alegava a impossibilidade de se aplicar a majorante disposta na antiga Lei de Entorpecentes simultaneamente às sanções previstas para os crimes mencionados, sob pena de bis in idem.
HC 97979/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 3.11.2009. (HC-97979)

Lei 6.368/76: Causa de Aumento e Bis In Idem - 2

Enfatizou-se, inicialmente, a jurisprudência da Corte segundo a qual os crimes praticados pelo paciente são autônomos, ou seja, constituem-se em infrações penais independentes uma da outra, o que tornaria possível a ocorrência do concurso material. Ademais, reputou-se que esse entendimento seria cabível já sob a égide da Lei 11.343/2006, que tipifica esses delitos de modo bastante semelhante à Lei 6.368/76. Ressaltou-se, ainda, que o bis in idem somente ocorreria quando uma mesma circunstância fosse utilizada mais de uma vez para sancionar o réu de maneira mais severa por um delito praticado. Salientou-se, contudo, que se estaria, na espécie, diante de dois delitos diversos, que o legislador, em virtude de política criminal, quisera reprimir de forma mais severa quando presente a transnacionalidade. Considerou-se, por fim, que poderia suceder o fato de somente o tráfico ilícito de drogas ser feito para o exterior e a associação ser unicamente para prática do crime dentro do país. Neste caso, apenas incidiria a causa de aumento quanto ao primeiro delito.
HC 97979/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 3.11.2009. (HC-97979)


SEGUNDA TURMA


Liberdade Provisória e Tráfico de Drogas

A Turma, superando a restrição fundada no Enunciado 691 da Súmula do STF, concedeu, de ofício, habeas corpus para assegurar a denunciado pela suposta prática do delito de tráfico de substância entorpecente (Lei 11.343/2006, art. 33) o direito de permanecer em liberdade, salvo nova decisão judicial em contrário do magistrado competente fundada em razões supervenientes. Enfatizou-se que a prisão cautelar do paciente fora mantida com base, tão-somente, no art. 44 da Lei 11.343/2006 (“Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.”) que, segundo a Turma, seria de constitucionalidade, ao menos, duvidosa.
HC 100742/SC, rel. Celso de Mello, 3.11.2009. (HC-100742)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno4 e 5.11.20091
1ª Turma3.11.200912
2ª Turma3.11.200930



R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJE de 6 de novembro de 2009

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 594.435-SP
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
COMPETÊNCIA - COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA - LEI ESTADUAL - REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral controvérsia sobre o alcance do artigo 114 da Constituição Federal considerado conflito a envolver a complementação de proventos e de pensões, disciplinada por lei estadual, e a incidência da contribuição previdenciária.

Decisões Publicadas: 1




C L I P P I N G  D O  DJ

6 de novembro de 2009

ADPF N. 130-DF
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). LEI DE IMPRENSA. ADEQUAÇÃO DA AÇÃO. REGIME CONSTITUCIONAL DA “LIBERDADE DE INFORMAÇÃO JORNALÍSTICA”, EXPRESSÃO SINÔNIMA DE LIBERDADE DE IMPRENSA. A “PLENA” LIBERDADE DE IMPRENSA COMO CATEGORIA JURÍDICA PROIBITIVA DE QUALQUER TIPO DE CENSURA PRÉVIA. A PLENITUDE DA LIBERDADE DE IMPRENSA COMO REFORÇO OU SOBRETUTELA DAS LIBERDADES DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, DE INFORMAÇÃO E DE EXPRESSÃO ARTÍSTICA, CIENTÍFICA, INTELECTUAL E COMUNICACIONAL. LIBERDADES QUE DÃO CONTEÚDO ÀS RELAÇÕES DE IMPRENSA E QUE SE PÕEM COMO SUPERIORES BENS DE PERSONALIDADE E MAIS DIRETA EMANAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. O CAPÍTULO CONSTITUCIONAL DA COMUNICAÇÃO SOCIAL COMO SEGMENTO PROLONGADOR DAS LIBERDADES DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, DE INFORMAÇÃO E DE EXPRESSÃO ARTÍSTICA, CIENTÍFICA, INTELECTUAL E COMUNICACIONAL. TRANSPASSE DA FUNDAMENTALIDADE DOS DIREITOS PROLONGADOS AO CAPÍTULO PROLONGADOR. PONDERAÇÃO DIRETAMENTE CONSTITUCIONAL ENTRE BLOCOS DE BENS DE PERSONALIDADE: O BLOCO DOS DIREITOS QUE DÃO CONTEÚDO À LIBERDADE DE IMPRENSA E O BLOCO DOS DIREITOS À IMAGEM, HONRA, INTIMIDADE E VIDA PRIVADA. PRECEDÊNCIA DO PRIMEIRO BLOCO. INCIDÊNCIA A POSTERIORI DO SEGUNDO BLOCO DE DIREITOS, PARA O EFEITO DE ASSEGURAR O DIREITO DE RESPOSTA E ASSENTAR RESPONSABILIDADES PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA, ENTRE OUTRAS CONSEQUÊNCIAS DO PLENO GOZO DA LIBERDADE DE IMPRENSA. PECULIAR FÓRMULA CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO A INTERESSES PRIVADOS QUE, MESMO INCIDINDO A POSTERIORI, ATUA SOBRE AS CAUSAS PARA INIBIR ABUSOS POR PARTE DA IMPRENSA. PROPORCIONALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS E MATERIAIS A TERCEIROS. RELAÇÃO DE MÚTUA CAUSALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E DEMOCRACIA. RELAÇÃO DE INERÊNCIA ENTRE PENSAMENTO CRÍTICO E IMPRENSA LIVRE. A IMPRENSA COMO INSTÂNCIA NATURAL DE FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA E COMO ALTERNATIVA À VERSÃO OFICIAL DOS FATOS. PROIBIÇÃO DE MONOPOLIZAR OU OLIGOPOLIZAR ÓRGÃOS DE IMPRENSA COMO NOVO E AUTÔNOMO FATOR DE INIBIÇÃO DE ABUSOS. NÚCLEO DA LIBERDADE DE IMPRENSA E MATÉRIAS APENAS PERIFERICAMENTE DE IMPRENSA. AUTORREGULAÇÃO E REGULAÇÃO SOCIAL DA ATIVIDADE DE IMPRENSA. NÃO RECEPÇÃO EM BLOCO DA LEI Nº 5.250/1967 PELA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL. EFEITOS JURÍDICOS DA DECISÃO. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). LEI DE IMPRENSA. ADEQUAÇÃO DA AÇÃO. A ADPF, fórmula processual subsidiária do controle concentrado de constitucionalidade, é via adequada à impugnação de norma pré-constitucional. Situação de concreta ambiência jurisdicional timbrada por decisões conflitantes. Atendimento das condições da ação.
2. REGIME CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA COMO REFORÇO DAS LIBERDADES DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, DE INFORMAÇÃO E DE EXPRESSÃO EM SENTIDO GENÉRICO, DE MODO A ABARCAR OS DIREITOS À PRODUÇÃO INTELECTUAL, ARTÍSTICA, CIENTÍFICA E COMUNICACIONAL. A Constituição reservou à imprensa todo um bloco normativo, com o apropriado nome “Da Comunicação Social” (capítulo V do título VIII). A imprensa como plexo ou conjunto de “atividades” ganha a dimensão de instituição-ideia, de modo a poder influenciar cada pessoa de per se e até mesmo formar o que se convencionou chamar de opinião pública. Pelo que ela, Constituição, destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade. A imprensa como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência. Entendendo-se por pensamento crítico o que, plenamente comprometido com a verdade ou essência das coisas, se dota de potencial emancipatório de mentes e espíritos. O corpo normativo da Constituição brasileira sinonimiza liberdade de informação jornalística e liberdade de imprensa, rechaçante de qualquer censura prévia a um direito que é signo e penhor da mais encarecida dignidade da pessoa humana, assim como do mais evoluído estado de civilização.
3. O CAPÍTULO CONSTITUCIONAL DA COMUNICAÇÃO SOCIAL COMO SEGMENTO PROLONGADOR DE SUPERIORES BENS DE PERSONALIDADE QUE SÃO A MAIS DIRETA EMANAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: A LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO E O DIREITO À INFORMAÇÃO E À EXPRESSÃO ARTÍSTICA, CIENTÍFICA, INTELECTUAL E COMUNICACIONAL. TRANSPASSE DA NATUREZA JURÍDICA DOS DIREITOS PROLONGADOS AO CAPÍTULO CONSTITUCIONAL SOBRE A COMUNICAÇÃO SOCIAL. O art. 220 da Constituição radicaliza e alarga o regime de plena liberdade de atuação da imprensa, porquanto fala: a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não sejam as figurantes dela própria, Constituição. A liberdade de informação jornalística é versada pela Constituição Federal como expressão sinônima de liberdade de imprensa. Os direitos que dão conteúdo à liberdade de imprensa são bens de personalidade que se qualificam como sobredireitos. Daí que, no limite, as relações de imprensa e as relações de intimidade, vida privada, imagem e honra são de mútua excludência, no sentido de que as primeiras se antecipam, no tempo, às segundas; ou seja, antes de tudo prevalecem as relações de imprensa como superiores bens jurídicos e natural forma de controle social sobre o poder do Estado, sobrevindo as demais relações como eventual responsabilização ou consequência do pleno gozo das primeiras. A expressão constitucional “observado o disposto nesta Constituição” (parte final do art. 220) traduz a incidência dos dispositivos tutelares de outros bens de personalidade, é certo, mas como consequência ou responsabilização pelo desfrute da “plena liberdade de informação jornalística” (§ 1º do mesmo art. 220 da Constituição Federal). Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do Poder Judiciário, pena de se resvalar para o espaço inconstitucional da prestidigitação jurídica. Silenciando a Constituição quanto ao regime da internet (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões, debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação.
4. MECANISMO CONSTITUCIONAL DE CALIBRAÇÃO DE PRINCÍPIOS. O art. 220 é de instantânea observância quanto ao desfrute das liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma forma, se veiculem pelos órgãos de comunicação social. Isto sem prejuízo da aplicabilidade dos seguintes incisos do art. 5º da mesma Constituição Federal: vedação do anonimato (parte final do inciso IV); do direito de resposta (inciso V); direito a indenização por dano material ou moral à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas (inciso X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV). Lógica diretamente constitucional de calibração temporal ou cronológica na empírica incidência desses dois blocos de dispositivos constitucionais (o art. 220 e os mencionados incisos do art. 5º). Noutros termos, primeiramente, assegura-se o gozo dos sobredireitos de personalidade em que se traduz a “livre” e “plena” manifestação do pensamento, da criação e da informação. Somente depois é que se passa a cobrar do titular de tais situações jurídicas ativas um eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios, ainda que também densificadores da personalidade humana. Determinação constitucional de momentânea paralisia à inviolabilidade de certas categorias de direitos subjetivos fundamentais, porquanto a cabeça do art. 220 da Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta manifestação do pensamento (vedado o anonimato), bem assim todo cerceio ou restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a informação, seja qual for a forma, o processo, ou o veículo de comunicação social. Com o que a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito de resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas. Direito de resposta e responsabilidades que, mesmo atuando a posteriori, infletem sobre as causas para inibir abusos no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa.
5. PROPORCIONALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. Sem embargo, a excessividade indenizatória é, em si mesma, poderoso fator de inibição da liberdade de imprensa, em violação ao princípio constitucional da proporcionalidade. A relação de proporcionalidade entre o dano moral ou material sofrido por alguém e a indenização que lhe caiba receber (quanto maior o dano maior a indenização) opera é no âmbito interno da potencialidade da ofensa e da concreta situação do ofendido. Nada tendo a ver com essa equação a circunstância em si da veiculação do agravo por órgão de imprensa, porque, senão, a liberdade de informação jornalística deixaria de ser um elemento de expansão e de robustez da liberdade de pensamento e de expressão lato sensu para se tornar um fator de contração e de esqualidez dessa liberdade. Em se tratando de agente público, ainda que injustamente ofendido em sua honra e imagem, subjaz à indenização uma imperiosa cláusula de modicidade. Isto porque todo agente público está sob permanente vigília da cidadania. E quando o agente estatal não prima por todas as aparências de legalidade e legitimidade no seu atuar oficial, atrai contra si mais fortes suspeitas de um comportamento antijurídico francamente sindicável pelos cidadãos.
6. RELAÇÃO DE MÚTUA CAUSALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E DEMOCRACIA. A plena liberdade de imprensa é um patrimônio imaterial que corresponde ao mais eloquente atestado de evolução político-cultural de todo um povo. Pelo seu reconhecido condão de vitalizar por muitos modos a Constituição, tirando-a mais vezes do papel, a Imprensa passa a manter com a democracia a mais entranhada relação de mútua dependência ou retroalimentação. Assim visualizada como verdadeira irmã siamesa da democracia, a imprensa passa a desfrutar de uma liberdade de atuação ainda maior que a liberdade de pensamento, de informação e de expressão dos indivíduos em si mesmos considerados. O § 5º do art. 220 apresenta-se como norma constitucional de concretização de um pluralismo finalmente compreendido como fundamento das sociedades autenticamente democráticas; isto é, o pluralismo como a virtude democrática da respeitosa convivência dos contrários. A imprensa livre é, ela mesma, plural, devido a que são constitucionalmente proibidas a oligopolização e a monopolização do setor (§ 5º do art. 220 da CF). A proibição do monopólio e do oligopólio como novo e autônomo fator de contenção de abusos do chamado “poder social da imprensa”.
7. RELAÇÃO DE INERÊNCIA ENTRE PENSAMENTO CRÍTICO E IMPRENSA LIVRE. A IMPRENSA COMO INSTÂNCIA NATURAL DE FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA E COMO ALTERNATIVA À VERSÃO OFICIAL DOS FATOS. O pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado. A crítica jornalística, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura, mesmo que legislativa ou judicialmente intentada. O próprio das atividades de imprensa é operar como formadora de opinião pública, espaço natural do pensamento crítico e “real alternativa à versão oficial dos fatos” (Deputado Federal Miro Teixeira).
8. NÚCLEO DURO DA LIBERDADE DE IMPRENSA E A INTERDIÇÃO PARCIAL DE LEGISLAR. A uma atividade que já era “livre” (incisos IV e IX do art. 5º), a Constituição Federal acrescentou o qualificativo de “plena” (§ 1º do art. 220). Liberdade plena que, repelente de qualquer censura prévia, diz respeito à essência mesma do jornalismo (o chamado “núcleo duro” da atividade). Assim entendidas as coordenadas de tempo e de conteúdo da manifestação do pensamento, da informação e da criação lato sensu, sem o que não se tem o desembaraçado trânsito das ideias e opiniões, tanto quanto da informação e da criação. Interdição à lei quanto às matérias nuclearmente de imprensa, retratadas no tempo de início e de duração do concreto exercício da liberdade, assim como de sua extensão ou tamanho do seu conteúdo. Tirante, unicamente, as restrições que a Lei Fundamental de 1988 prevê para o “estado de sítio” (art. 139), o Poder Público somente pode dispor sobre matérias lateral ou reflexamente de imprensa, respeitada sempre a ideia-força de que quem quer que seja tem o direito de dizer o que quer que seja. Logo, não cabe ao Estado, por qualquer dos seus órgãos, definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito por indivíduos e jornalistas. As matérias reflexamente de imprensa, suscetíveis, portanto, de conformação legislativa, são as indicadas pela própria Constituição, tais como: direitos de resposta e de indenização, proporcionais ao agravo; proteção do sigilo da fonte (“quando necessário ao exercício profissional”); responsabilidade penal por calúnia, injúria e difamação; diversões e espetáculos públicos; estabelecimento dos “meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente” (inciso II do § 3º do art. 220 da CF); independência e proteção remuneratória dos profissionais de imprensa como elementos de sua própria qualificação técnica (inciso XIII do art. 5º); participação do capital estrangeiro nas empresas de comunicação social (§ 4º do art. 222 da CF); composição e funcionamento do Conselho de Comunicação Social (art. 224 da Constituição). Regulações estatais que, sobretudo incidindo no plano das consequências ou responsabilizações, repercutem sobre as causas de ofensas pessoais para inibir o cometimento dos abusos de imprensa. Peculiar fórmula constitucional de proteção de interesses privados em face de eventuais descomedimentos da imprensa (justa preocupação do Ministro Gilmar Mendes), mas sem prejuízo da ordem de precedência a esta conferida, segundo a lógica elementar de que não é pelo temor do abuso que se vai coibir o uso. Ou, nas palavras do Ministro Celso de Mello, “a censura governamental, emanada de qualquer um dos três Poderes, é a expressão odiosa da face autoritária do poder público”.
9. AUTORREGULAÇÃO E REGULAÇÃO SOCIAL DA ATIVIDADE DE IMPRENSA. É da lógica encampada pela nossa Constituição de 1988 a autorregulação da imprensa como mecanismo de permanente ajuste de limites da sua liberdade ao sentir-pensar da sociedade civil. Os padrões de seletividade do próprio corpo social operam como antídoto que o tempo não cessa de aprimorar contra os abusos e desvios jornalísticos. Do dever de irrestrito apego à completude e fidedignidade das informações comunicadas ao público decorre a permanente conciliação entre liberdade e responsabilidade da imprensa. Repita-se: não é jamais pelo temor do abuso que se vai proibir o uso de uma liberdade de informação a que o próprio Texto Magno do País apôs o rótulo de “plena” (§ 1 do art. 220).
10. NÃO RECEPÇÃO EM BLOCO DA LEI 5.250 PELA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL.
10.1. Óbice lógico à confecção de uma lei de imprensa que se orne de compleição estatutária ou orgânica. A própria Constituição, quando o quis, convocou o legislador de segundo escalão para o aporte regratório da parte restante de seus dispositivos (art. 29, art. 93 e § 5º do art. 128). São irregulamentáveis os bens de personalidade que se põem como o próprio conteúdo ou substrato da liberdade de informação jornalística, por se tratar de bens jurídicos que têm na própria interdição da prévia interferência do Estado o seu modo natural, cabal e ininterrupto de incidir. Vontade normativa que, em tema elementarmente de imprensa, surge e se exaure no próprio texto da Lei Suprema.
10.2. Incompatibilidade material insuperável entre a Lei n° 5.250/67 e a Constituição de 1988. Impossibilidade de conciliação que, sobre ser do tipo material ou de substância (vertical), contamina toda a Lei de Imprensa: a) quanto ao seu entrelace de comandos, a serviço da prestidigitadora lógica de que para cada regra geral afirmativa da liberdade é aberto um leque de exceções que praticamente tudo desfaz; b) quanto ao seu inescondível efeito prático de ir além de um simples projeto de governo para alcançar a realização de um projeto de poder, este a se eternizar no tempo e a sufocar todo pensamento crítico no País.
10.3 São de todo imprestáveis as tentativas de conciliação hermenêutica da Lei 5.250/67 com a Constituição, seja mediante expurgo puro e simples de destacados dispositivos da lei, seja mediante o emprego dessa refinada técnica de controle de constitucionalidade que atende pelo nome de “interpretação conforme a Constituição”. A técnica da interpretação conforme não pode artificializar ou forçar a descontaminação da parte restante do diploma legal interpretado, pena de descabido incursionamento do intérprete em legiferação por conta própria. Inapartabilidade de conteúdo, de fins e de viés semântico (linhas e entrelinhas) do texto interpretado. Caso-limite de interpretação necessariamente conglobante ou por arrastamento teleológico, a pré-excluir do intérprete/aplicador do Direito qualquer possibilidade da declaração de inconstitucionalidade apenas de determinados dispositivos da lei sindicada, mas permanecendo incólume uma parte sobejante que já não tem significado autônomo. Não se muda, a golpes de interpretação, nem a inextrincabilidade de comandos nem as finalidades da norma interpretada. Impossibilidade de se preservar, após artificiosa hermenêutica de depuração, a coerência ou o equilíbrio interno de uma lei (a Lei federal nº 5.250/67) que foi ideologicamente concebida e normativamente apetrechada para operar em bloco ou como um todo pro indiviso.
11. EFEITOS JURÍDICOS DA DECISÃO. Aplicam-se as normas da legislação comum, notadamente o Código Civil, o Código Penal, o Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal às causas decorrentes das relações de imprensa. O direito de resposta, que se manifesta como ação de replicar ou de retificar matéria publicada é exercitável por parte daquele que se vê ofendido em sua honra objetiva, ou então subjetiva, conforme estampado no inciso V do art. 5º da Constituição Federal. Norma, essa, “de eficácia plena e de aplicabilidade imediata”, conforme classificação de José Afonso da Silva. “Norma de pronta aplicação”, na linguagem de Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto, em obra doutrinária conjunta.
12. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. Total procedência da ADPF, para o efeito de declarar como não recepcionado pela Constituição de 1988 todo o conjunto de dispositivos da Lei federal nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967.
* noticiado no Informativo 544

HC N. 93.876-RJ
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. PENAL. HABEAS CORPUS. PORTE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. ART. 16 DA LEI 10.826/2003. PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DO POTENCIAL LESIVO DA MUNIÇÃO. DESNECESSIDADE. SIGILO TELEFÔNICO JUNTADO AOS AUTOS APÓS AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE QUE NÃO PODE SER EXAMINADA SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. POSSIBILIDADE. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. IMPETRAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E DENEGADA A ORDEM NESSA EXTENSÃO.
I - A objetividade jurídica dos delitos previstos na Lei 10.826/03 transcende a mera proteção da incolumidade pessoal, para alcançar também a tutela da liberdade individual e de todo o corpo social, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia.
II - Despicienda a ausência ou nulidade do laudo pericial da arma ou da munição para a aferição da materialidade do delito.
III - A questão da nulidade decorrente do fato de o procedimento de quebra de sigilo telefônico ter sido juntado aos autos após a audiência de instrução e julgamento não pode ser conhecida, sob pena de indevida supressão de instância com o desbordamento dos limites de competência do STF descritos no art. 102 da Constituição Federal.
IV - No caso, o magistrado, ao fixar a pena-base dos pacientes, observou fundamentadamente todas as circunstâncias judiciais constantes do art. 59 do Código Penal, especialmente a grande quantidade de substância entorpecente e a qualidade de mentores intelectuais ostentada pelos pacientes, o que justifica a fixação do quantum da pena acima do mínimo legal.
V - Writ conhecido em parte, denegando-se a ordem na parte conhecida.
* noticiado no Informativo 544

HC N. 95.706-RJ
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME MILITAR. ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR. ACÓRDÃO. CONDENAÇÃO. NULIDADE POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 93, IX, DA CF. OCORRÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.
I - O acórdão recorrido, ao reformar a sentença absolutória, deixou de explicitar em quais elementos de prova fundou-se a condenação, o que viola a exigência constitucional de motivação das decisões.
II - Ofensa ao art. 93, IX, da CF.
III - Ordem concedida.
* noticiado no Informativo 559

HC N. 99.582-RS
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. TIPICIDADE. PORTE ILEGAL DE ARMA DESMUNICIADA E COM NUMERAÇÃO RASPADA. INCIDÊNCIA DO INCISO IV DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 16 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADA.
1. A tese da atipicidade do porte ilegal de arma desmuniciada não foi arguida perante a autoridade apontada como coatora. Impossibilidade de conhecimento pelo Supremo Tribunal Federal, pena de indevida supressão de instância.
2. No julgamento do RHC 89.889, da relatoria da ministra Cármem Lúcia, o Plenário desta colenda Corte entendeu que o delito de que trata o inciso IV do parágrafo único do art. 16 do Estatuto do Desarmamento é Política Criminal de valorização do poder-dever do Estado de controlar as armas de fogo que circulam em nosso País. Isso porque a supressão do número, marca, ou qualquer outro sinal identificador do artefato lesivo impede o seu cadastramento e controle.
3. A função social do combate ao delito em foco alcança qualquer tipo de arma de fogo; e não apenas armamento de uso restrito ou proibido. Tanto é assim que o porte de arma de fogo com numeração raspada constitui crime autônomo. Figura penal que, no caso, tem como circunstância elementar o fato de a arma (seja ela de uso restrito ou não) estar com a numeração ou qualquer outro sinal identificador adulterado, raspado ou suprimido.
4. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, denegada.
* noticiado no Informativo 558

RE N. 114.282-SP
RELATORA P/ O ACÓRDÃO: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MILITAR. PROMOÇÃO AO POSTO IMEDIATAMENTE SUPERIOR. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. PRECEDENTES.
1. Não há direito adquirido à promoção ao posto imediatamente superior quando o preenchimento das condições para a aposentadoria ocorre quando já vigente norma legal e constitucional não mais a admite.
2. Recurso extraordinário ao qual se dá provimento.
* noticiado no Informativo 545

RE N. 428.324-DF
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MINISTÉRIO PÚBLICO. Longe fica de vulnerar o inciso II do § 5º do artigo 128 da Constituição Federal pronunciamento judicial no sentido de não se mostrarem devidos honorários advocatícios em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público e julgada procedente considerada a articulação de a verba ser recolhida à Fazenda Pública.


Acórdãos Publicados: 127



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Processo Legislativo Municipal - Poder de Iniciativa das Leis - Usurpação - Sanção - Irrelevância - Inconstitucionalidade Formal (Transcrições)

AI 348800/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: PROCESSO LEGISLATIVO. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS QUE REGEM O PROCESSO DE FORMAÇÃO DAS LEIS. APLICABILIDADE AOS ESTADOS-MEMBROS E AOS MUNICÍPIOS. REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (RTJ 187/97, REL. MIN. CELSO DE MELLO). MATÉRIA SUJEITA À RESERVA DE INICIATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. PROCESSO LEGISLATIVO. INSTAURAÇÃO DEPENDENTE DE INICIATIVA CONSTITUCIONALMENTE RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. DIPLOMA LEGISLATIVO MUNICIPAL QUE RESULTOU DE INICIATIVA PARLAMENTAR. USURPAÇÃO DO PODER DE INICIATIVA. SANÇÃO DO PROJETO DE LEI. IRRELEVÂNCIA. INSUBSISTÊNCIA DA SÚMULA Nº 5/STF. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECURSO IMPROVIDO.

DECISÃO: O recurso extraordinário a que se refere o presente agravo de instrumento foi interposto contra decisão, que, proferida em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade (CF, art. 125, § 2º), pelo Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça local, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 21):

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
- Norma pertinente à admissão de deficiente, originária de proposta de membros do legislativo municipal – Inadmissibilidade – Estatutos referentes ao provimento de cargos e empregos públicos a constituírem-se em matéria de atribuição exclusiva do órgão executivo do Município – Ação procedente.” (grifei)

A análise dos autos evidencia que o acórdão questionado em sede recursal extraordinária ajusta-se à diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte firmou na apreciação da controvérsia em causa.
Com efeito, o tema suscitado na presente sede recursal concerne à cláusula de reserva constitucional de iniciativa em matéria de instauração do processo legislativo.
O Supremo Tribunal Federal tem advertido, em orientação jurisprudencial consolidada, que as diretrizes inscritas na Constituição da República - que regem, em seus aspectos essenciais, o processo de formação das leis - impõem-se à compulsória observância dos Estados-membros e dos Municípios, inclusive no que se refere à cláusula de iniciativa, consideradas, para tanto, as hipóteses taxativamente definidas, em “numerus clausus”, no art. 61, § 1º, da Carta Política (RTJ 174/75, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - RTJ 178/621, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RTJ 185/408-409, Rel. Min. ELLEN GRACIE - ADI 1.060-MC/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - ADI 1.729-MC/RN, Rel. Min. NELSON JOBIM - ADI 2.569/CE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - ADI 2.731/ES, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.):

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – POLICIAL MILITAR – REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS – PROCESSO LEGISLATIVO – INSTAURAÇÃO DEPENDENTE DE INICIATIVA CONSTITUCIONALMENTE RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO - DIPLOMA LEGISLATIVO ESTADUAL QUE RESULTOU DE INICIATIVA PARLAMENTAR – INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL – MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O PROCESSO LEGISLATIVO IMPÕEM-SE À OBSERVÂNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS.
- O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Carta da República, impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à observância incondicional dos Estados-membros. Precedentes.
- O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado.
Nem mesmo a ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Insubsistência da Súmula nº 5/STF, motivada pela superveniente promulgação da Constituição Federal de 1988. Doutrina. Precedentes.
SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (CIVIS E MILITARES).
- A locução constitucional ‘regime jurídico dos servidores públicos’ corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes.”
(RTJ 187/97, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

A natureza especial que assume a cláusula referente à iniciativa reservada das leis caracteriza, em nosso sistema de direito, derrogação que excepciona o princípio geral da legitimação concorrente para a instauração do processo de formação das espécies legislativas. Disso decorre, portanto, que não se deve presumir a incidência da cláusula de reserva, que deve resultar, necessariamente, de explícita previsão constitucional.
Dentro do quadro normativo delineado pela Lei Fundamental da República, a ação legislativa do Estado vê-se condicionar pela necessidade de fiel observância e submissão da instituição parlamentar ao postulado da reserva de iniciativa, quando ocorrentes as hipóteses taxativas constantes do texto constitucional.
O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, mediante usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo assim editado, que não se convalida, juridicamente, nem mesmo com a sanção manifestada pelo Chefe do Poder Executivo.
A matéria versada nos diplomas legislativos questionados em sede recursal extraordinária subsume-se, claramente, ao conceito de regime jurídico dos servidores públicos, cuja definição - tal como assinalado por esta Suprema Corte (ADI 1.381-MC/AL, Rel. Min. CELSO DE MELLO) - “corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes” (RTJ 157/460, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
No caso, como já enfatizado, o acórdão ora recorrido observou a diretriz jurisprudencial que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria ora em exame, adequando-se, por isso mesmo, por inteiro, à orientação prevalecente no âmbito desta Corte Suprema.
Devo observar, ainda, que a sanção do projeto de lei, de que resultou a Lei municipal nº 2.642/95, não assume qualquer relevo jurídico-constitucional nem afasta o vício de inconstitucionalidade que a infirma.
A sanção, pelo Prefeito Municipal, do projeto de lei em que se converteu a Lei nº 2.642/95 não tem o condão de validar a inconstitucionalidade formal desse diploma legislativo, cuja elaboração resultou da usurpação do poder de iniciativa, reservado, com exclusividade, ao Chefe do Executivo.
Cabe referir, neste ponto, que a jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em questão orienta-se no sentido de que a sanção (expressa ou tácita) não supre o vício resultante da usurpação de iniciativa, não mais subsistindo, em conseqüência, ante a sua manifesta incompatibilidade com o modelo positivado na vigente Constituição da República, a Súmula 5 enunciada por esta Corte (RTJ 174/75, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - RTJ 180/91, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - ADI 2.192-MC/ES, Rel. Min. MARCO AURÉLIO):

“(...) USURPAÇÃO DE INICIATIVA E SANÇÃO EXECUTIVA: A sanção a projeto de lei que veicule norma resultante de emenda parlamentar aprovada com transgressão à cláusula inscrita no art. 63, I, da Carta Federal não tem o condão de sanar o vício de inconstitucionalidade formal, eis que a só vontade do Chefe do Executivo - ainda que deste seja a prerrogativa institucional usurpada - revela-se juridicamente insuficiente para convalidar o defeito radical oriundo do descumprimento da Constituição da República. Precedente. (...).”
(RTJ 168/87, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Vale destacar, neste ponto, o que observou o eminente Ministro MARCO AURÉLIO, Relator da já mencionada ADI 2.192-MC/ES, a respeito do tema ora em análise:

“Surge, assim, a relevância do que articulado na inicial, valendo notar que a sanção do Governador não implica o afastamento do vício. O processo legislativo encerra atos complexos e cada qual deve estar afinado com os ditames constitucionais.” (grifei)

Cumpre assinalar que esse entendimento foi reafirmado em julgamento efetuado pelo Plenário desta Corte (ADI 2.840/ES, Rel. Min. ELLEN GRACIE), quando o Supremo Tribunal Federal, acolhendo o douto voto da eminente Ministra ELLEN GRACIE, enfatizou, a propósito da questão em exame, que “nem a sanção do projeto de lei pelo Governador tem o condão de convalidar o defeito radical de iniciativa proveniente do descumprimento da Carta Magna” (grifei).
Impende enfatizar, ainda, quanto ao tema ora em análise, que essa orientação – que adverte que o vício de iniciativa não pode ser suprido, validamente, pela sanção do Chefe do Executivo – tem o beneplácito de expressivo magistério doutrinário (ALEXANDRE DE MORAES, “Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional”, p. 1.126, item n. 61.2, 7ª ed., 2007, Atlas; CAIO TÁCITO, “Parecer”, “in” Revista de Direito Administrativo, vol. 68/351; FRANCISCO CAMPOS, “Parecer”, “in” Revista de Direito Administrativo, vol. 73/390).
Igual percepção do tema é revelada por MARCELLO CAETANO (“Direito Constitucional”, item n. 116, vol. II/332, 1978, Forense), cuja lição enfatiza que a sanção governamental – tratando-se de hipótese de usurpação do poder de iniciativa – não faz desaparecer a inconstitucionalidade originária:

“Um projeto resultante de iniciativa inconstitucional sofre de pecado original, que a sanção não tem a virtude de apagar, até porque, a par das razões jurídicas, militam os fortes motivos políticos que determinaram a exclusividade da iniciativa presidencial, cujo afastamento poderia conduzir a situações de intolerável pressão sobre o Executivo.” (grifei)

Registre-se, por oportuno, que o entendimento ora exposto na presente decisão vem de ser reafirmado em recentíssimo julgamento plenário desta Corte, realizado em 16/09/2009 (ADI 3.930/RO, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI).
Cabe observar, finalmente, tratando-se da hipótese prevista no art. 125, § 2º, da Constituição da República, que o provimento e o improvimento de recursos extraordinários interpostos contra acórdãos proferidos por Tribunais de Justiça em sede de fiscalização normativa abstrata têm sido veiculados em decisões monocráticas emanadas dos Ministros Relatores da causa no Supremo Tribunal Federal, desde que, tal como sucede na espécie, o litígio constitucional já tenha sido definido pela jurisprudência prevalecente no âmbito deste Tribunal (RE 243.975/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 334.868-AgR/RJ, Rel. Min. CARLOS BRITTO - RE 336.267/SP, Rel. Min. CARLOS BRITTO - RE 353.350-AgR/ES, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RE 369.425/RS, Rel. Min. MOREIRA ALVES - RE 371.887/SP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA - RE 396.541/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RE 415.517/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 421.271-AgR/RJ, Rel. Min. GILMAR MENDES - RE 444.565/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES - RE 461.217/SC, Rel. Min. EROS GRAU - RE 501.913/MG, Rel. Min. MENEZES DIREITO - RE 592.477/SP, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI - RE 601.206/SP, Rel. Min. EROS GRAU - AI 258.067/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Sendo assim, pelas razões expostas, e considerando os precedentes referidos, nego provimento ao presente agravo de instrumento, por revelar-se inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.

Publique-se.

Brasília, 05 de outubro de 2009.

(21º Aniversário da promulgação da Constituição democrática de 1988)

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 20.10.2009

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
3 a 6 de novembro de 2009

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ)

Adoção - Poder Familiar - Guarda de Menor - Destituição - Prazo Processual
Instrução Normativa/CNJ nº 2, de 3 de novembro de 2009 - Disciplina a adoção de medidas destinadas à observância de tramitação de processos da Lei 8069/90; da garantia de cumprimento de prazos previstos na mencionada Lei; dos demais direitos da criança e do adolescente estabelecidos na “teoria da proteção integral” e dá outras providências. Publicada no DOU de 4/11/2009, Seção 1, p. 94. Publicada também no DJE/CNJ de 4/11/2009, n. 187, p. 7.

Poder Familiar - Destituição - Informação - Registro - Guia Nacional de Acolhimento - Guia Nacional de Desligamento de Crianças e Adolescentes Acolhidos
Instrução Normativa/CNJ nº 3, de 3 de novembro de 2009 - Institui a guia única de acolhimento familiar ou institucional, de crianças e adolescentes, e a de desligamento, fixa regras para o armazenamento permanente dos dados disponíveis em procedimentos de destituição ou suspensão do poder familiar. Publicada no DJE/CNJ de 4/11/2009, n. 187, p. 7. Publicada também no DOU de 6/11/2009, Seção 1, p. 155.

Sistema Prisional - Preso - Convívio Social - Trabalho - Capacitação
Resolução/CNJ nº 96, de 27 de outubro de 2009 - Dispõe sobre o Projeto Começar de Novo no âmbito do Poder Judiciário, institui o Portal de Oportunidades e dá outras providencias. Publicada no DOU de 4/11/2009, Seção 1, p. 94. Publicada também no DJE/CNJ de 4/11/2009, n. 187, p. 2.

Justiça Comum - Paraná - Inspeção
Portaria/CNJ nº 237, de 23 de outubro de 2009 - Instaura inspeção junto às unidades judiciárias e administrativas da Justiça Comum Estadual de Primeiro e de Segundo Grau do Estado do Paraná com início no dia 09/11/2009. Publicada no DJE/CNJ de 3/11/2009, n. 186, p. 23. Publicada também no DJ de 30/10/2009, n. 208, p. 1.

CONVENÇÃO INTERNACIONAL - Menor - Secretaria Especial de Direitos Humanos
Decreto nº 6995, de 30 de outubro de 2009 - Acresce dispositivo ao parágrafo único do art. 1o do Anexo I do Decreto no 5.174, de 9 de agosto de 2004, para designar a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República como Autoridade Central da Convenção Interamericana sobre Restituição Internacional de Menores. Publicado no DOU de 30/10/2009, Seção 1, p. 1. Edição Extra.

PODER JUDICIÁRIO - Dia Nacional - Integração - América Latina
Lei nº 12.075, de 29 de outubro de 2009 - Institui o Dia da Integração Jurídica Latino-Americana. Publicada no DOU de 30/10/2009, Seção 1, p. 2.

TRABALHO ESCRAVO - Combate - Dia Nacional - Semana Nacional - Criação
Lei nº 12.064, de 29 de outubro de 2009 - Dispõe sobre a criação do Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, bem como da Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Publicada no DOU de 30/10/2009, Seção 1, p. 1.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) - Estágio - Estudante - Estrangeiro
Resolução/STF nº 418, de 4 de novembro de 2009 - Altera os artigos 12 e 16 e acresce o art. 14-A à Resolução nº 400, de 29 de maio de 2009. Publicada no DJE de 6/11/2009, n. 208, p. 1.


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
informativo@stf.jus.br

 
Praça dos Três Poderes - Brasília - DF - CEP 70175-900 Telefone: 61.3217.3000

Informativo STF - 566 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário