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quarta-feira, 21 de outubro de 2009

JURID - Pedido de Suzane é negado. [21/10/09] - Jurisprudência


Justiça de SP nega regime semiaberto para Suzane.
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PODER JUDICIÁRIO
1ª VARA DAS EXECUÇÕES CRIMINAIS E ANEXO DA CORREGEDORIA DOS PRESÍDIOS DA COMARCA DE TAUBATÉ


Execução nº 677.533

VISTOS.

Trata-se de pedido de progressão ao regime semi-aberto formulado pela sentenciada SUZANE LOUISE VON RICHTHOFEN, com parecer contrário do Ministério Público, tendo a Defesa insistido na postulação. Foi determinada a realização de exame criminológico, sobrevindo laudo técnico às fls. 219/245.

É o relatório.

Fundamento e DECIDO.

A postulante foi condenada à pena de 39 anos de reclusão pela prática de homicídio triplamente qualificado, perpetrado contra seus genitores, Manfred Albert Von Richthofen e Marisia Von Richthofen, na data de 31.10.12002. Iniciou o cumprimento de sua reprimenda em 08.11.2002 e se encontra até o presente momento em regime prisional fechado.

Embora já tenha preenchido o probatório no atual regime (1/6 do total da pena imposta), é sabido que a Lei de Execuções Penais não estabelece como lapso absoluto esse patamar, que por ela é tratado simplesmente como sendo mínimo necessário para a progressão.

Logo, o cumprimento desse mínimo legal não autoriza, por si só, a concessão da pretendida benesse, já que para tanto se faz também necessária a comprovação de aptidão e mérito de quem a postula, o que não se verifica 'in casu'.

À toda evidência, o simples atestado de boa conduta expedido pela Administração Penitenciária não se mostra suficiente para aferir o mérito daquela que, pela violência do crime cometido, é pessoa presumivelmente perigosa.

Ademais, o bom comportamento pode ser intencional, por conveniências próprias, visando justamente a obtenção de benefícios em sede de execução penal. Imprescindível, pois, que se faça uma análise global e aprofundada, sopesando-se elementos objetivos e subjetivos relevantes, até porque o retorno de um condenado para o seio da sociedade não pode ser encarado como mera experiência ou aposta, visto que o insucesso da medida, a cargo do Poder Judiciário, fatalmente produzira consequências desastrosas e irreparáveis.

Em outras palavras, o mérito não consiste unicamente na boa ou ótima conduta carcerária do postulante para um determinado período. O sentenciado deverá comprovar e convencer o Juízo que reúne condições hábeis para usufruir de um regime mais favorável.

É sabido que o regime intermediário, se por um lado prepara o apenado para o retorno ao convívio social, por outro pode exacerbar frustrações e levar à fuga pela menor vigilância própria.do sistema, máxime-se a permanência nele é muito prolongada.

Sobre o tema, leciona JÚLIO MIRABETE:

"Não basta o bom comportamento carcerário para preencher o requisito subjetivo indispensável a progressão. Bom comportamento não se confunde com aptidão ou adaptação do condenado e muito menos serve como índice fiel de sua readaptação social. Ensina Hans Göbbeis: "O comportamento de um preso não pode ser determinação imediata para estabelecer-lhe um prognóstico biológico-social favorável, principalmente porque tal, 'comprovante' de melhoria se baseia fundamentalmente em informes de funcionários de prisões, fornecidos pouco antes da liberação, e que se atém ao bom comportamento externo, a fim de facilitar a readaptação sem inconvenientes ao termo da condenação. Mas este comportamento externo só de forma incompleta permite tirar conclusões sobre o caráter e a conduta futura do preso. Na verdade, adaptação do sentenciado à organização do estabelecimento se deve a vários e múltiplos fatores simultâneos e justapostos, e somente a verificação dos motivos predominantes permitirá uma conclusão motivada sobre o caráter". É necessário, pois, que se conheça a capacidade provável do condenado de adaptar-se ao regime menos rigoroso, não bastando o seu bom comportamento" (IN EXECUÇÃO PENAL ATHAS, SÃO PAULO, 2007. p. 424).

Não constituindo direito absoluto do condenado, a concessão do regime semiaberto está condicionada, dentre outros fatores, à segurança da vida em sociedade. No caso concreto, a própria natureza do crime que deu ensejo a condenação, traça o exato perfil de Suzane Louise Von Richthofen, além do que o término de sua pena está previsto apenas para o ano de 2040, tudo isto, evidentemente, a aconselhar maior cautela para colocá-la de novo no meio social.

Não se pode olvidar que a sentenciada cometeu duplo parricídio triplamente qualificado, arquitetando, viabilizando e atuando eficazmente no assassinato de seus genitores, que foram friamente atacados enquanto dormiam e executados a pauladas pelo então namorado daquela e o irmão dele, ambos trazidos por ela para o interior da residência durante o repouso noturno das vítimas.

Parece claro que antes de se colocar em semi-liberdade pessoa que tenha agido com tamanha frieza e crueldade - portanto presumivelmente perigosa - e ainda com longa pena a cumprir, o que se espera da Justiça é que bem pondere sobre a pertinência da medida. É o mínimo por exigir na preservação da autuância e dever funcional nessa parcela que lhe cabe, dirigida à segurança e tranquilidade social, aí compreendida a necessidade de se fazer valer o caráter preventivo/retributivo da sanção penal imposta na condenação.

Inquestionável a hediondez do delito que ensejou a condenação da postulante, cujo status libertatis não pode ferir o interesse público, em nome do que se impõe maior rigidez na execução da respectiva pena. Portanto, deve o Estado valer-se de instrumentos jurídicos a permitir maior proteção da sociedade contra os infratores desta natureza, traduzida, inclusive, no reconhecimento constitucional da categoria, consoante se depreende do inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal..

Submetida a exame criminológico constatou-se, notadamente na avaliação psicológica, que Suzane é bem articulada, possui capacidade intelectual elevada e raciocínio lógico acima da média. Mas embora se esforce para aparentar espontaneidade, denota elaboração, planejamento e controle em suas narrativas. Note-se que tais aspectos só puderam ser evidenciados por intermédio de estímulos por ela não conhecidos, diante dos quais apresentou dificuldade em articular adequadamente seus conteúdos psicológicos, colocando-se então em postura defensiva, com utilização de procedimentos primitivos e pouco elaborados.

Também restou anotado na Súmula Psicológica que Suzane tende a desvalorizar o outro, estabelecendo relações de forma a atender exclusivamente às suas demandas pessoais e atribuindo pouca importância ao ser humano. Some-se, à isso forte característica narcisista e facilidade em perder o controle emocional diante de situações que geram desconforto pessoal.

Prognoses tão negativas, aferidas por profissional técnico presumivelmente capacitado, só vêm reforçar a convicção de ser assaz prematura e perigosa a reinserção da detenta no convívio social neste momento, ainda que a conclusão pericial lhe tenha sido favorável em alguns aspectos, valendo lembrar que o exame criminológico é tripartido, ou seja, constituído de avaliações distintas - psiquiátrica, psicológica e social - cada uma em sua órbita de atuação.

Por relevante, atente-se que às fls. 227/229 consta que a sentenciada chegou para a avaliação social demonstrando postura de fragilidade, mas com discurso pronto; se ateve a uma linha de raciocínio e não se perdeu em nenhum momento da entrevista, sempre com objetividade, apesar de em alguns momentos haver expressado emoção, chegando ao choro, mas sem profusão.

Evidente que se preparou para impressionar e nesse propósito conseguiu até se emocionar e chorar em momentos oportunos.

Não há como deixar de notar, ainda, que em quase todo seu discurso buscou ela transferir inteiramente ao então namorado e companheiro de empreitada a responsabilidade pelo delito que praticaram, insistindo na idéia de "garota frágil", por aquele totalmente influenciada e a ele completamente submissa.

Tal perfil, todavia, não se coaduna com a .realidade que salta aos olhos nos autos principais, onde se depara com os elementos de prova que ocasionaram sua condenação (depoimentos, laudos periciais, fotografias etc) e que bem demonstram o grau e a forma que participou da empreitada, em momento algum se comportando de modo passivo ou subjugada. Ao contrário, atuando com determinação e coragem no desempenho da parte que lhe coube na divisão de tarefas previamente engendrada pelo grupo para à consecução do objetivo comum. Nesse contexto, conclui-se que a aparente fragilidade constitui flagrante dissimulação.

Tanto isso é verdade que seu próprio irmão - e que obviamente a conhece em profundidade - se refere a ela como mentirosa e manipuladora, segundo informado à fls. 229.

Pois bem, durante a avaliação psiquiátrica Suzane também fez uma série de relatos e colocações, muitas das quais foram transcritas no laudo técnico (fls. 232/234), revelando que chegou a comparar a vida que levava antes da prática do delito com a de uma "princesinha" que acreditava em príncipe encantado, numa alusão ao então namorado e cúmplice, a quem - segundo insistiu em afirmar- não conseguia dizer não.

Ora, vivendo como se num "conto de fadas", Suzane Von Richthofen, enfeitiçada pelo "príncipe encantado", afirma que não pôde recusar - entre um afeto e outro - as súplicas pela morte de seus pais, os mesmos que asseverou que amava profundamente, reconhecendo que sempre foram provedores, presentes, preocupados e carinhosos. Mas isso tudo não foi o bastante para conseguir dizer 'não' ao namorado...

Tamanha banalização do valor da vida, sobretudo em se tratando da vida de seus pais, toca as raias da anormalidade e fala por si só, dispensando maiores comentários.

Enfim, em que pesem os esforços da combativa Defesa, o certo é que a conduta irrepreensível apresentada pela sentenciada durante o período de encarceramento não pode ter o peso que se lhe buscou atribuir, mesmo porque outra coisa. não se poderia esperar dela, sobretudo diante do perfil que demonstrou ao ser psicologicamente avaliada.

Com efeito, com todo seu tirocínio bem sabia que obter benefícios em sede de execução penal, além do tempo de pena cumprida, necessitaria unicamente do bom comportamento carcerário. E sendo esta sua principal meta nesta fase da vida, parece bastante claro que tenha reunido todos os esforços para atingí-la.

Por óbvio, sempre teve consciência da hediondez do delito que praticou e do repúdio generalizado que o mesmo gerou no meio social. Sendo assim, a única chance que teria de ser novamente aceita em sociedade era convencer a todos começando pelos responsáveis por sua custódia, frise-se - que por trás da criminosa "ocasional, posto que induzida", há uma garota frágil, dócil e prestativa, de fácil convívio e incapaz de fazer mal a quem quer que seja.

Ademais, com toda sua cultura, classe social e educação, não haveria mesmo qualquer razão para apresentar comportamento indisciplinado ou desrespeitoso no cárcere.

O certo é que se está diante de uma jovem de rara inteligência, com firmeza de foco e determinação na obtenção de seus propósitos, dentre eles o de matar os próprios pais. Feito isso, e passado algum tempo de inevitável encarceramento, conseguiu obter, conceito favorável na esfera da Administração Penitenciária e com isso busca agora retornar ao convívio social, ainda que gradativamente, o que lhe permitirá dar seguimento a projetos que certamente a motivaram à prática criminosa no passado e a conduziram, desde lá, até aqui.

Por pertinente, confira-se trecho extraído do voto.n 10.785, proferido pela Col. 11ª Câmara do 6º Grupo da Seção Criminal do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no Agravo em Execução Penal n. 893420.3/6-0000-000, oriundo deste Juízo (Ex. n. 496.056 - Executado: André Luis Apolinário) e relatado pelo Eminente Desembargador ANTONIO MANSSUR:

"...Nos dias atuais, quando campeia solta a criminalidade violenta e perversa, como público e notório, e se instala, no seio da comunidade ordeira, o sentimento de séria e profunda impunidade dos autores de delitos, como o referido no caso sub examine, sem esquecer que não se pode perder de vista que os graves problemas que afetam o sistema penitenciário, acabaram por levar à falência o regime semi-aberto de cumprimento de pena, verdadeiro incentivo às fugas de perigosos delinqüentes e, à prática de novos delitos, em virtude das enormes facilidades que propicia e da total ausência insuficiência do órgão fiscalizador, tornando imperioso, assim, reconhecer que é preciso maior rigor na concessão de benefícios e na escolha dos beneficiados."

Em face do exposto e pelo que mais dos autos consta INDEFIRO o pedido formulado pela sentenciada SUZANE LOUISE VON RICHTHOFEN.

Publique-se, registre-se, intimem-se comunique-se.

Taubaté, 16 de Outubro de 2009.

SUELI ZERAIK DE OLIVEIRA ARMANI
Juíza de Direito



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