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sexta-feira, 9 de outubro de 2009

JURID - Negligência gera indenização. [09/10/09] - Jurisprudência


Negligência em hospitais públicos gera indenização.
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE NATAL

Processo nº 001.05.028180-2

Ação: Ação de Responsabilidade Civil

Autor: Edmar Laurentino Alves Ramos

Réu: Estado do Rio Grande do Norte

SENTENÇA

I - RELATÓRIO

Edmar Laurentino Alves Ramos
aforou ação de indenização contra o Estado do Rio Grande do Norte, objetivando condenação do demandado a reparar os danos morais e materiais sofridos pelo autor em razão de falhas no atendimento médico dos hospitais Walfredo Gurgel e Santa Catarina.

Inicialmente, aduz que sofreu acidente automobilístico em que teve um corte no pé direito e fratura na mão direita tendo sido encaminhado ao Hospital Santa Catarina onde realizou uma "limpeza" nos ferimentos.

Noticia que as dores persistiram então dirigiu-se ao Hospital Walfredo Gurgel onde repetiu-se o atendimento. Posteriormente, já em sua casa as dores intensas persistiram, tanto no pé com um corte profundo quanto na mão direito, que era desconhecida a fratura, e passou a sentir um mau cheiro intenso que advinha do apodrecimento do seu pé.

Informa que ficou desesperado com a possibilidade de necrose e perda do pé decorrente de provável amputação e dirigiu-se novamente ao Hospital Walfredo Gurgel, onde não foi atendido devidamente.

Diante deste quadro, não lhe restou outra alternativa senão buscar por atendimento em hospitais da rede privada no PAPI e na CLÍNICA ENDO PLÁSTICA, onde realizou 14 cirurgias reparadoras que custeou do próprio bolso.

Alega que os Hospitais Walfredo Gurgel e Santa Catarina diagnosticaram um quadro clínico sem gravidade e apenas faziam curativos. Todavia, depois de examinado pelos hospitais particulares foi descoberto seu real estado clínico com a mão direita fraturada e processo de necrose no pé direito.

No hospital PAPI, suas despesas atingiram R$9.301,01 e na CLÍNICA ENDO PLÁSTICA gastou R$3.500,00.

Neste cenário, além do prejuízo material no valor de R$13.000,00, teve sua moral abalada. Esclarece que nas internações pós-cirúrgicas eram injetadas doses diárias de morfina - substância química com grande probabilidade de causar dependência - que somente é recomendada para situações de paciente com muitas dores e em estados terminais.

Argumenta que houve mau atendimento de saúde prestado pelo Estado do RN que causou demora no processo de recuperação, o que trouxe irremediáveis seqüelas ao autor visto que houve perda do movimento do pé direito, sendo que tornou-se comum as dores e inchaços. Quanto a mão direita, seus movimentos são feitos com dificuldades, além do cansaço prematuro e insegurança psicológica e deformidade permanente.

Assevera que tanto o autor com seus familiares sofreram com o ocorrido posto a gravidade das lesões e as 14 cirurgias reparadoras e as muitas visitas ao médico e fisioterapeutas. Afirma que sua revolta consiste na evitabilidade do dano sofrido se o atendimento médico tivesse sido a contendo nos hospitais públicos do Estado.

Fundamentaram sua pretensão na doutrina, jurisprudência e na Constituição Federal. Requereram a condenação do demandado por danos morais a serem arbitrados pelo Juiz e materiais na ordem de R$13.000,00.

Acostou documentos de fls. 15/70, consistindo de vários boletins médicos, fotos da lesão, e recibos dos gastos com procedimentos médicos..

Devidamente citado, o demandado, preliminarmente, aduziu prescrição de fundo de direito, e no mérito aduziu que a responsabilidade civil do Estado por omissão é subjetiva e depende da configuração de culpa, sendo que há carência de provas. Pediu a improcedência dos pedidos iniciais. Não juntou documentos.

Intimados a se manifestar sobre a contestação, o autor refutou os argumentos de defesa e reiterou os pedidos iniciais.

O representante do Ministério Público declinou de intervir no feito.

É o que importa relatar. Segue a decisão.

II - FUNDAMENTOS

Tratam os autos de ação indenizatória cuja pretensão do autor é de condenação do Estado do Rio Grande do Norte a reparar danos morais, a serem fixados por este Juiz e danos materiais no patamar de R$13.000,00, sofridos pelo autor em razão de falhas no atendimento médico dos hospitais Walfredo Gurgel e Santa Catarina.

Analiso, primeiramente, a preliminar de prescrição do fundo de direito. O Estado do RN aduz que, transcorrido mais de cinco anos, a pretensão autoral estaria prescrição, por quatorze dias, em razão da ação ter sido ajuizada em 28.11.2005 e o evento danoso, segundo afirma o Estado, ter ocorrido, em 14.11.2000, conforme boletim do Hospital Walfredo Gurgel, a fl.20 dos autos.

Ocorre que o termo inicial da contagem para a prescrição é, nos casos como o dos autos de indenização por responsabilidade civil do Estado, da data do conhecimento de que houve falha na prestação do serviço público ou da data que o ato foi conhecido como lesivo de seu direito, aplicando-se a teoria da "actio nata", amplamente utilizada na jurisprudência do STJ.

ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO CONTRA A FAZENDA NACIONAL - ERRO MÉDICO - DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS - PROCEDIMENTO CIRÚRGICO - PRESCRIÇÃO - QÜINQÜÍDIO DO ART. 1º DO DECRETO N. 20.910/32 - TERMO INICIAL - DATA DA CONSOLIDAÇÃO DO CONHECIMENTO EFETIVO DA VÍTIMA DAS LESÕES E SUA EXTENSÃO - PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. 1. O termo a quo para aferir o lapso prescricional para ajuizamento de ação de indenização contra o Estado não é a data do acidente, mas aquela em que a vítima teve ciência inequívoca de sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometida. Precedentes da

Primeira Seção. 2. É vedado o reexame de matéria fático-probatória em sede de recurso especial, a teor do que prescreve a Súmula 07 desta Corte. Agravo regimental improvido. ( STJ - AgRg no REsp 931896 / ES- AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 2007/0046821-6, DJ 20/09/2007)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA CONSOLIDAÇÃO DO CONHECIMENTO EFETIVO, PELA VÍTIMA, DAS LESÕES E SUA EXTENSÃO. IMPOSSIBILIDADE DE VERIFICAÇÃO. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA. 1. O termo a quo para contagem da prescrição de ação indenizatória em face da Fazenda Pública não é a data do acidente, mas aquela em que a vítima teve ciência inequívoca de sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometida. 2. In casu, há nos autos pedido da recorrente (fl. 176) no sentido da necessidade de realização de prova pericial com elaboração de laudo técnico minucioso para o fim de determinar a exata extensão da lesão por ela sofrida, o que não lhe foi oportunizado pelas instâncias ordinárias. 3. Não tendo sido garantido à parte o direito à produção de prova pericial, para o fim de comprovação dos alegados danos sofridos, não é possível a fixação do termo inicial do prazo prescricional. 4. Agravo regimental provido para prover o recurso especial e determinar o retorno dos autos à primeira instância para o fim de que sejam produzidas provas periciais, sob o crivo do contraditório e ampla defesa, e assim se estabeleça o termo a quo para contagem do prazo prescricional. (AGRESP 200400579217 -AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 655759, DJ 06/08/2009)

PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. AÇÃO POLICIAL. PERSEGUIÇÃO EM VIA PÚBLICA. VÍTIMA ATINGIDA POR PROJÉTIL DE ARMA DE FOGO. "BALA PERDIDA". INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONFIGURAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. SÚMULA 07. PRESCRIÇÃO. DECRETO LEGISLATIVO 20.910/32. APLICAÇÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS ATOS LESIVOS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TEORIA DA CAUSA MADURA. CAUSA PETENDI. PRINCÍPIO NARRA MIHI FACTUM, DABO TIBI JUS. OFENSA À LEI REVOGADA. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. REVISÃO DO QUANTUM ARBITRADO PELA INSTÂNCIA A QUO. SÚMULA 07. IMPOSSIBILIDADE IN CASU. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, CPC. INOCORRÊNCIA. 1. Ação de indenização em face do Estado, ajuizada por vítima de disparo de arma de fogo, efetuada por policial militar, em razão de perseguição policial, objetivando indenização por danos físicos, psicológicos e estéticos. 2. O termo a quo do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. É que a prescrição da ação indenizatória, in casu, teve como lastro inicial o momento da constatação das lesões sofridas e de suas consequências. Precedentes: (Resp. n.º 700/716/MS, DJ. 17.04.2006, REsp 742.500/RS, DJ 10.04.2006, Resp n.º 673/576/RJ, DJ. 21.03.2005, REsp 735.377/RJ, DJ 27.06.2005). 3. A pendência da incerteza acerca do reconhecimento do ato lesivo praticado pela Administração Pública impede aduzir-se à prescrição, posto instituto vinculado à inação. 4. É assente em doutrina que: "Não é toda causa de impossibilidade de agir que impede a prescrição, como faz presumir essa máxima, mas somente aquelas causas que se fundam em motivo de ordem jurídica, porque o direito não pode contrapor-se ao direito, dando e tirando ao mesmo tempo." (Câmara Leal in "Da Prescrição e da Decadência", 1978, Forense, Rio de Janeiro, p. 155) 5. In casu, tendo a recorrida ajuizado a ação de indenização em 13.01.2004, objetivando a indenização por lesões decorrentes do disparo de arma de fogo, em perseguição policial, revela-se inocorrente a prescrição, porquanto o completo delineamento das lesões sofridas e suas consequências se deu no ano de 2002.(fls. 161). 6. O art. 515, § 1º do CPC permite que o Tribunal avance no julgamento de mérito, sem que isso importe em supressão de instância. Precedentes: RESP 274.736/DF, Corte Especial, DJ 01.09.2003; REsp 722410 / SP, DJ de 15/08/2005; REsp 719462 / SP, DJ de 07/11/2005). 7. A causa petendi não é integrada pela qualificação jurídica do fato, por isso que resta indiferente se a parte alude à responsabilidade estatal em face da omissão do Estado e o Tribunal entende pela conduta comissiva do Estado e a conseqüente responsabilidade objetiva estatal, por força da máxima implícita ao ordenamento jurídico de que: "narra mihi factum, dabo tibi jus." O Tribunal a quo analisou os fatos narrados: A perseguição policial e a troca de tiros relatada pela Autora, em sua petição inicial, e corroborada pelos documentos juntados aos autos, não foram negadas pelo Réu, tratando-se, pois, de fato incontroverso nos autos. Entendo, ademais, que, na hipótese em berlinda, houve importante falha no planejamento da ação policial, com severo comprometimento da integridade física de terceiro inocente. (fls. 163) E considerou a responsabilidade objetiva, em face da conduta comissiva: O ponto central de controvérsia nos autos se concentra na existência ou não de responsabilidade civil do Estado quando agentes públicos (policiais militares), empreendendo perseguição a bandidos, com estes trocam tiros em via pública de alto tráfego de veículos e pedestres, resultando, desse tiroteio, lesões de natureza grave em terceiro, vítima inocente.(...) A responsabilidade civil do Estado, pelos danos causados a terceiros, decorrentes da atuação dos agentes públicos, nessa qualidade, é objetiva. (fls. 163). 8. Neste sentido já me posicionei: Forçoso repisar quanto à causa de pedir, que norma jurídica aplicável à espécie e a categorização jurídica dos fatos que compõem a razão do pedido não a integram. Assim, eventual modificação do dispositivo legal aplicável ou a mudança de categorização jurídica do fato base pedido não incidem sobre o veto do art. 264 do CPC. (Luiz Fux in "Curso de Direito Processual Civil - Processo de Conhecimento", 2008, Forense, Rio de Janeiro, p. 399). 9. A adoção do princípio tempus regit actum, pelo art. 1.211 do CPC, impõe obediência à lei em vigor regula os recursos cabíveis quando da prolação do ato decisório. 10. In casu, o acórdão recorrido que examinou a controvérsia foi proferido em 24.08.2006, portanto, posteriormente, à revogação dos artigos 603 e 611, ambos do Código de Processo Civil, indicados como violados. 11. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice contido na Súmula 07/STJ. 12. A análise da existência de ofensa ao art. 333, inc. I, do Código de Processo Civil implica o revolvimento de matéria fática-probatória, o que é interditado a esta Corte Superior. 13. In casu, consoante assentado pelo acórdão recorrido: "A tese de que o projétil de arma de fogo que causou as lesões referidas pela Autora não teria sido disparado por policiais militares não está comprovada nos autos, ônus esse que competiria ao Estado. Há notícias, porém não a certeza, de que a vítima teria sido atingida por um disparo de AR-15. Segundo matéria publicada nos jornais da época, anexadas aos autos pela Autora, a única certeza de que tinham os peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli é que o projétil que perfurou a lataria do veículo em que se encontrava a vítima não era proveniente de um revólver, calibre 38 - única arma apreendida com os bandidos(...) (fls. 164). 14.A responsabilidade estatal restou comprovada pelo Tribunal a quo, com base nas provas dos autos, bem como escorreita a imputação da indenização fixada a título de danos materiais e morais. A análise da existência do fato danoso, e o necessário nexo causal entre a suposta conduta e os prejuízos decorrentes da mesma implica em análise fático-probatória, razão pela qual descabe a esta Corte Superior referida apreciação em sede de recurso especial, porquanto é-lhe vedado atuar como Tribunal de Apelação reiterada ou Terceira Instância revisora, ante a ratio essendi da Súmula n.º 07/STJ. Precedentes: (AgRg no REsp 723893/RS DJ 28.11.2005; AgRg no Ag 556897/RS DJ 09.05.2005; REsp 351764/RJ DJ 28.10.2002.) 15. Isto porque o Tribunal asseverou que: "Na hipótese destes autos, o conjunto probatório aponta - por exclusão e diante da ausência de elementos de convicção em sentido contrário - para a falta cometida, justamente pelos agentes públicos - policiais militares - incumbidos de zelar pela segurança da população. Com os bandidos foi apreendido um único revólver, calibre 38 - arma que não produziria o furo encontrado na lataria do veículo em que se encontrava a vítima, segundo afirmação dos peritos do ICCE.(...)Os elementos de convicção já existentes nos autos permitem configurar o fato administrativo ( a perseguição policial e o tiroteio em via pública), o dano (lesões sofridas pela vítima) e o nexo causal (que tais lesões decorreram de errôneo planejamento de ação policial, com veementes indícios de que o projétil de arma de fogo que atingiu a Autora teria sido disparado de armamento utilizado pelos policiais militares). (fls. 165/166) 16. Descabe ao STJ examinar questão de natureza constitucional, qual seja a alegação de ofensa ao art. 37, par. 6º, da Constituição Federal, postulando a redução da fixação do quantum fixado à título de danos morais, porquanto enfrentá-la significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao colendo STF. A competência traçada para este Tribunal, em sede de recurso especial, restringe-se tão-somente à uniformização da legislação infraconstitucional. 17. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC, tanto mais que, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 18. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.( STJ - RESP 200801028764 - RESP - RECURSO ESPECIAL - 1056605, DJ 25/03/2009)

Logo, tendo o autor somente, em 06.12.2000, tomado conhecimento de que houve falha na prestação do serviço público de saúde, consoante documento de fl.19 dos autos, a pretensão autoral não está prescrita. Portanto, preliminar rejeitada.

Sendo assim, repousando a causa unicamente sobre prova documental, entendo os autos instruídos para julgamento, na conformidade do art. 330, I, do CPC.

O cerne da questão diz respeito à possibilidade de responsabilizar o Estado do Rio Grande do Norte por condutas ativas que consistiram em falhas ou má prestação do serviço de saúde pública, decorrentes de ações médicas equivocadas ou negligentes que culminaram por agravar a situação de saúde do autor que, num primeiro momento, não era grave, mas que, por procedimentos médicos descuidados, mau atendimento ao caso específico do autor, terminou por tornar grave sua situação de saúde, deixando seqüelas evitáveis se o atendimento tivesse sido de forma correta e devida.

Tal circunstância tem sido uma constantes nos hospitais de nosso Estado. A super lotação dos hospitais públicos estaduais, a falta de médicos, de enfermeiros e de anestesiologistas, de medicamentos, de instrumentos e equipamentos para exames e tratamento adequado dos enfermos, bem como a insuficiência de leitos, além dos profissionais da saúde serem mal remunerados e sem uma boa condição de trabalho, diante da péssima estrutura hospitalar dos hospitais públicos do Estado, tudo isto, colabora para o atendimento às pressas e sem cuidados com os pacientes, e por muitas vezes com negligência, sem a devida atenção que o problema de saúde necessitaria.

Neste quadro, diante dos argumentos e da documentação acostada pelo autor nos autos, verifico que pretensão autoral merece procedência. Os documentos trazidos pelo autor, constantes de fotos de seu pé com deformidade física decorrente de traumatismo grave e necrose, conforme laudo médico de fls.29, que inclusive comprova a fratura em sua mão direita, além dos recibos dos procedimentos cirúrgicos e listagem de medicamentos e materiais hospitalares utilizados no tratamento do autor, nos hospitais particulares, comprovam que o atendimento ao problema de saúde do autor não foi o adequado, pois nos dois hospitais do Estado apenas fizeram a limpeza e curativos no seu pé sendo que as lesões requeriam maiores cuidados que não forma dispensados ao autor. Não fizeram um raio-x na mão do autor, que somente, posteriormente, na rede privada, descobriu que estava fraturada.

Com isto, o autor teve que passar por diversos procedimentos médicos e quatorze cirurgias plásticas reparadoras das lesões sofridas decorrentes da necrose de seu pé devido ao atendimento falho nos hospitais do Estado, tendo inclusive que fazer enxertos de peles no pé com anestesia geral.

O Estado do Rio Grande do Norte argumenta que o caso dos autos seria de responsabilidade civil do Estado por omissão e nesta hipótese seria subjetiva a responsabilidade dependendo da configuração de culpa, aduzindo ainda que haveria carência de provas para tanto. Estes alegações não tem o menor fundamento. Primeiro, não se trata, propriamente de conduta omissiva no atendimento e sim conduta ativa, comissiva, consistente no mau atendimento clínico e médico, maculados por falhas e negligências, falta de cuidados devidos ao problema de saúde pelo qual passou o autor e neste caso a responsabilidade civil do Estado é objetiva.

Ainda que se persista e se sustente a tese de que se trata de conduta omissiva e de responsabilidade civil subjetiva do Estado a depender da comprovação da culpa, esta culpa está mais que comprovada nos autos através de toda documentação e instrução realizada nos autos. Logo, é ineficaz e inútil a defesa da tese de responsabilidade civil subjetiva por omissão, posto que tanto sendo objetiva ou subjetiva a responsabilidade civil a responder o Estado do RN, em qualquer dos casos foi devida e suficientemente demonstrada a culpa do Estado na falha da prestação do serviço de saúde no atendimento a enfermidade sofrida pelo autor.

Com efeito, entendo ser o caso de responsabilidade civil objetiva do Estado por uma conduta macula por falhas no mau atendimento médico-hospitalar ao autor. Porém, caso se entendesse diferente, no sentido de ser responsabilidade subjetiva por omissão do Estado, como dito antes, mesmo assim está perfeitamente comprovada a culpa do demandado em seu comportamento falho e lesivo a saúde física e psicológica do autor a ensejar a reparação devida.

Desta maneira, a responsabilidade civil objetiva caracteriza-se com a demonstração destes três requisitos: conduta ilícita, dano e nexo de causalidade, não sendo exigido, portanto, a demonstração da culpa do agente.

Isto posto, constato assistir razão ao autor. Verifico estarem presentes todos os elementos ensejadores da responsabilidade civil objetiva, a saber, o dano, o comportamento ilícito ou conduta danosa e o nexo de causalidade.

O dano físico estético e o dano a saúde do autor já foram mencionados antes e estão comprovados nos autos através dos documentos. O comportamento ilícito, da mesma forma, foi demonstrado, debatido e comprovado nos autos e o nexo causalidade é mera consequência do mau atendimento médico ao autor que culminou nos danos materiais, de sua saúde e de sua moral.

Logo, no caso dos autos, restou comprovado, além da culpa, o nexo causal entre os danos alegados e a conduta danosa do Estado do Rio Grande do Norte. Diante disto, presentes todos requisitos marcantes da responsabilidade civil objetiva a recair sobre o Estado do Rio Grande do Norte, a pretensão do autor merece acolhimento.

Resta, por fim, mensurar o valor dos danos morais, tendo em vista que os danos materiais são certos, determinados e concretos, estando comprovados plenamente através dos documentos juntados aos autos, no valor de R$13.000,00, conforme os recibos acostados.

Neste caso, o autor passou por quatorze cirurgias reparadoras decorrentes da falha no atendimento dos hospitais do Estado, Walfredo Gurgel e Santa Catarina. Teve, ainda, o autor necrose no seu pé que poderia ter levado a amputação, mas que, felizmente, isto não ocorreu. Porém, ficou com deformidade (dano estético) no pé e seqüelas consistentes de inchaços e dores constantes além de dificuldades de movimentos tanto no pé quanto na mão fraturada.

Todos estes fatos estão na órbita do plano físico, some-se a isto o plano psicológico, a frustração, sofrimento e dor tendo inclusive que tomar diverso analgésicos, com destaque para a morfina que dimensiona o problema pelo qual passou o autor, e tudo isto por muitos dias, visto que a recuperação foi demorada em decorrência do tardio atendimento adequado que somente foi feito na rede privada de saúde. Agrava ainda o dano psicológico e moral o fato de que é pobre e teve que pagar procedimentos médicos da rede privada que são caríssimos, o que causa ainda mais preocupação, tormento, falta de paz ao autor e prejuízos porque o dinheiro não dá pra tudo.

Neste cenário, arbitro o valor a título de dano moral no valor de R$85.000,00 (oitenta e cinco mil reais).

III - DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo procedentes os pedidos contidos na inicial para condenar o Estado Rio Grande do Norte a pagar ao autor R$13.000,00 (treze mil reais), à título de danos materiais que devem ser corrigidos monetariamente desde o evento danoso nos moldes da súmula nº43 do STJ.

Condeno ainda o demandado a pagar ao autor à título de dano moral o valor de R$85.000,00 (oitenta e cinco mil reais), a incidir correção monetária nos termos da súmula nº362 do STJ.

A correção monetária deve ser elaborada conforme tabela 01 da Justiça Federal e sobre todos os valores deverão incidir juros moratórios a fluir desde o evento danoso conforme súmula nº54 do STJ.

O demandado arcará com os ônus sucumbenciais cujos honorários advocatícios arbitro em 10% sobre o valor da execução.

Sentença sujeita ao reexame necessário. Transcorrido o prazo para recurso voluntário, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Natal/RN, 02 de outubro de 2009.

Cícero Martins de Macedo Filho
Juiz de Direito



JURID - Negligência gera indenização. [09/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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