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terça-feira, 22 de setembro de 2009

JURID - Policial militar. Missão de paz no exterior. Voluntariado. [22/09/09] - Jurisprudência


Policial militar. Missão de paz no exterior. Voluntariado. Irrelevância.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.040.534 - RJ (2008/0059361-0)

RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA

RECORRENTE: ROBERTO BANDEIRA DE MELO E OUTROS

ADVOGADO: VICENTE MENEZES SILVA E OUTRO(S)

RECORRIDO: UNIÃO

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. POLICIAL MILITAR. MISSÃO DE PAZ NO EXTERIOR. VOLUNTARIADO. IRRELEVÂNCIA. LEI 5.809/72. INAPLICABILIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. É irrelevante, para efeito de aplicação da Lei 5.809/72, se a nomeação ou indicação do servidor, ou de pessoa sem vínculo com o serviço público, decorreu de ato voluntário.

2. As disposições da Lei 5.809/72, na redação anterior ao advento da Lei 10.937/04, não se aplicam aos militares estaduais que integraram missão de paz das Organizações das Nações Unidas, pessoa jurídica de direito internacional público, porquanto estavam a serviço desta última e não da União.

3. Recurso especial conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso, mas lhe negar provimento. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília (DF), 18 de agosto de 2009(Data do Julgamento).

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA
Relator

RELATÓRIO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:

Trata-se de recurso especial manifestado por ROBERTO BANDEIRA DE MELO e OUTROS com base no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal.

Narram os autos que os recorrentes, Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro, ajuizaram ação ordinária de cobrança em desfavor da UNIÃO objetivando a condenação desta ao pagamento das vantagens pecuniárias denominadas "retribuição básica", "gratificação por tempo de serviço", "indenização por representação no exterior" e "ajuda de custo", nos termos da Lei 5.809/72, regulamentada pelo Decreto 71.733/73, em razão de terem integrado o componente policial da Autoridade Transitória das Nações Unidas no Timor-Leste (UNTAET - United Nations Transitional Administration in East Timor), na condição de observadores policiais.

Após regular processamento do feito, sobreveio sentença de mérito que julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar a UNIÃO a pagar aos autores as quantias equivalentes às diferenças entre o que lhes seria devido a título de "retribuição básica", "gratificação por tempo de serviço", "indenização por representação no exterior" e "ajuda de custo" e o que lhes foi eventualmente pago pelo Estado do Rio de Janeiro, no período em que estiveram em serviço no exterior, acrescidas de correção monetária e juros de mora (fls. 205/209).

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em sede de apelação e remessa necessária, reformou a sentença para julgar improcedente o pedido formulado na inicial, ao entendimento de que os autores, por terem integrado a missão da ONU de forma voluntária, não faria jus às vantagens pecuniárias pleiteadas, que somente seriam devidas aos servidores nomeados ou designados para tais missões.

A respectiva ementa foi assim concebida (fl. 238):

ADMINISTRATIVO. MILITAR. MISSÃO DE PAZ NO EXTERIOR. VOLUNTARIADO. VANTAGENS ESTABELECIDAS PELA LEI Nº 5.809/72. INAPLICABILIDADE.

I. As disposições da Lei nº 5.809/72 não se aplicam aos servidores militares estaduais que integraram missão de paz das Organizações das Nações Unidas, como voluntários, porquanto não foram obrigados aceitar o encargo.

II. E isto porque o integrante de missão de paz da ONU, que é pessoa jurídica de direito internacional público, está a serviço desta e não do seu país de origem, o qual não o compeliu, na presente hipótese, a participar de tal empreitada.

III. Remessa necessária e apelação da União Federal providas.

Sustentam os recorrentes, em preliminar, afronta ao art. 535, II, do CPC, tendo em vista que o Tribunal de origem não teria sanado as omissões suscitadas nos embargos declaratórios.

No mérito, além de dissídio jurisprudencial, alegam violação aos arts. 1º, § 2º, "c", 3º, I, "b", e 5º, V, da Lei 5.809/72, uma vez que seria irrelevante o fato de terem participado da missão da ONU de forma voluntária, haja vista que esta era a condição de todos os demais integrantes brasileiros, inclusive aqueles pertencentes às Forças Armadas.

Contrarrazões às fls. 335/337. Recurso admitido na origem (fls. 345/346).

É o relatório.

VOTO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA (Relator):

Consoante reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não há falar em afronta ao art. 535, II, do CPC, quando o Tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos, assentando-se em fundamentos suficientes para embasar a decisão, não se devendo confundir "fundamentação sucinta com ausência de fundamentação" (REsp 763.983/RJ, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, DJ 28/11/05).

Quanto ao mérito, os arts. 1º e 3º da Lei 5.809/72 (que "Dispõe sobre a retribuição e direitos do pessoal civil e militar em serviço da União no exterior, e dá outras providências"), têm a seguinte redação:

Art 1º Esta lei regula a retribuição no exterior e dispõe sobre outros direitos dos funcionários públicos e dos militares, em serviço da União no exterior.

.....................................................................................................

§ 2º O disposto nesta lei se aplica:

.....................................................................................................

c) no que couber, aos servidores do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, bem como às pessoas sem vínculo com o serviço público, designados pelo Presidente da República.

Art 3º O servidor em serviço no exterior - assim considerado aquele que se encontra em missão fora do País por ter sido nomeado ou designado para o desempenho ou exercício de cargo, função ou atividade no exterior - pode ser enquadrado em uma das seguintes missões ou atividades: (Grifos nossos)

Como se infere da leitura do precitado diploma legal, visa ele disciplinar a situação dos servidores civis e militares - inclusive dos demais entes da Federação -, ou mesmo sem vínculo com o serviço público, nomeados ou designados para o desempenho ou exercício de cargo, função ou atividade no exterior, a serviço da UNIÃO.

Vale ressaltar, de início, ser irrelevante para o deslinde da controvérsia o fato de os recorrentes terem integrado a missão da ONU de forma voluntária, uma vez que os termos "nomeado" ou "designado" utilizados na Lei 5.809/72 não têm a conotação de serviço compulsório.

Com efeito, segundo o Dicionário Eletrônico HOUAISS de Língua Portuguesa, a palavra "nomeação" significa "ato ou efeito de nomear ou ser nomeado", "ato formal de atribuir um cargo público a alguém, efetuado por autoridade competente", ou, ainda, "designação de alguém para cargo ou função privada". Por sua vez, "designação" seria a "indicação de (alguém ou algo) entre os demais; distinção".

No plano doutrinário, o Professor HELY LOPES MEIRELLES (In DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO, 30ª., Malheiros Editores, São Paulo: 2005, pp. 408-409) bem abordou a matéria, consignando:

2.5. Provimento de cargos.

Provimento é o ato pelo qual se efetua o preenchimento do cargo público, com a designação de seu titular. O provimento pode ser originário ou inicial e derivado. Provimento inicial é o que se faz através de nomeação, que pressupõe a inexistência de vinculação entre a situação de serviço anterior do nomeado e o preenchimento do cargo. Assim, tanto é provimento inicial a nomeação de pessoa estranha aos quadros do serviço público quanto a de outra que já exercia função pública como ocupante de cargo não vinculado àquele para o qual foi nomeada. Já, o provimento derivado, que se faz por transferência, promoção, remoção, acesso, reintegração, readmissão, enquadramento, aproveitamento ou reversão, é sempre uma alteração na situação de serviço do provido.

Verifica-se, assim, que em nenhum momento a Lei 5.809/72 impôs que as vantagens nela previstas seriam devidas apenas aos servidores que participassem de missões no exterior de forma compulsória, razão pela qual, consoante sempre válida regra de hermenêutica, não cabe ao intérprete restringir onde o legislador não o fez.

Desta forma, tem-se que a questão a ser examinada refere-se a saber se os recorrentes, Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro, ao integrarem a missão de paz internacional realizada pela ONU no Timor-Leste, estariam, em última análise, a serviço da UNIÃO, conforme exigido pela Lei 5.809/72.

Conforme reconhecido pelos próprios recorrentes, a UNIÃO, em resposta ao pedido formulada pela ONU, "solicitou aos Governos Estaduais (...) a realização de processo de seleção interna nas Polícias Militares de cada Estado, e, dentro dessa avaliação, que fossem selecionados os melhores militares para participar da missão" (fl. 257).

Observa-se, desta maneira, que em nenhum momento a UNIÃO requisitou ou determinou ao Estado do Rio de Janeiro a cessão dos recorrentes, na medida em que, por meio de um de seus órgãos - Ministério das Relações Exteriores - somente atuou como intermediário entre o referido organismo internacional, que ficou encarregado pela remuneração dos militares, e aquele Estado-Membro.

Nesta linha de raciocínio, conclui-se que a Lei 5.809/72, na redação vigente ao tempo em que os recorrentes realizaram sua missão no exterior (janeiro de 2000 a março de 2002), não lhes garantia o direito pleiteado na inicial, tendo em vista que não poderiam ser considerados como estando a serviço da UNIÃO no exterior.

Isso porque, embora inegavelmente representasse o Brasil do exterior - que, aliás, nos termos do art. 1º, caput, da Constituição Federal, é formado "pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal" - , estavam a prestar serviços à ONU, pessoa jurídica de direito internacional, cuja personalidade jurídica não se confunde com a de seus membros. Tal entendimento é corroborado pelo advento da Lei 10.937, de 12/8/04, cuja ementa tem a seguinte redação:

Dispõe sobre a remuneração dos militares, a serviço da União, integrantes de contingente armado de força multinacional empregada em operações de paz, em cumprimento de obrigações assumidas pelo Brasil em entendimentos diplomáticos ou militares, autorizados pelo Congresso Nacional e sobre envio de militares das Forças Armadas para o exercício de cargos de natureza militar junto a organismo internacional.

Esse novo diploma legal veio justamente socorrer aos servidores que, como os ora recorrentes, integram contingente armado de força multinacional empregada em operações de paz, não-albergados pela Lei 5.809/92.

A Lei 10.937/04, todavia, não tem o condão de favorecer os recorrentes, na medida em que expressamente veda sua aplicação retroativa. Verbis:

Art. 14. Esta Lei não se aplica aos militares integrantes de tropa brasileira que se encontre no exterior em missão de paz na data de sua publicação.

Por tudo até aqui exposto, conclui-se que o acórdão recorrido não violou os arts. 1º, § 2º, "c", 3º, I, "b", e 5º, V, da Lei 5.809/72.

No que tange à alínea "c" do permissivo constitucional, melhor sorte não socorre aos recorrentes.

De fato, a "A indicação de decisão unipessoal como paradigma com fito de demonstrar a existência de divergência jurisprudencial a embasar o recurso especial pela alínea c é inviável, uma vez que, nos moldes previstos na lei processual e no Regimento desta Corte, somente a decisão colegiada se presta para tal mister" (REsp 1.017.273/SC, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJe 17/11/08).

Por sua vez, nos termos da Súmula 13/STJ, "A divergência entre julgados do mesmo tribunal não enseja recurso especial".

Também o acórdão relatado nos autos do REsp 380.213/PR, em que foi relator o Min. JORGE SCARTEZZINI, Quinta Turma, também não se presta à comprovação da divergência, uma vez que sequer foi conhecido, em face da incidência da Súmula 284/STF.

Por fim, embora presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso especial no que se refere ao paradigma proveniente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que, adotando entendimento contrário ao do acórdão recorrido, estendeu aos Policiais Militares do Estado do Paraná, que participaram de missão no exterior o direito previsto na Lei 5.809/72, tal solução não é o que melhor se coaduna com a legislação de regência, devendo, nos termos da fundamentação acima, ser afastada.

Ante o exposto, conheço do recurso especial e nego-lhe provimento.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2008/0059361-0 REsp 1040534 / RJ

Números Origem: 200351010119151 372187

PAUTA: 04/08/2009 JULGADO: 18/08/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO XAVIER PINHEIRO FILHO

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: ROBERTO BANDEIRA DE MELO E OUTROS

ADVOGADO: VICENTE MENEZES SILVA E OUTRO(S)

RECORRIDO: UNIÃO

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Militar - Sistema Remuneratório e Benefícios - Gratificações e Adicionais

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso, mas lhe negou provimento."

Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 18 de agosto de 2009

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 902837

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 14/09/2009




JURID - Policial militar. Missão de paz no exterior. Voluntariado. [22/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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