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quarta-feira, 2 de setembro de 2009

JURID - Pensão por morte de parceiro homossexual. Possibilidade. [02/09/09] - Jurisprudência


Previdenciário. Pensão por morte de parceiro homossexual. Possibilidade. Comprovação união estável para fins previdenciários. Casal separado. Pagamento de pensão alimentícia. Dependência econômica presumida. Correção monetária. Juros de mora. Honorários advocatícios.
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Tribunal Regional Federal - TRF 4ª Região.

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2002.71.00.053659-4/RS

RELATOR: Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

ADVOGADO: Procuradoria-Regional do INSS

APELADO: MARIA DO HORTO LARANJA MARTINS espólio

ADVOGADO: Nadia Lucy Caetano Teixeira

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 02A VF PREVIDENCIÁRIA DE PORTO ALEGRE

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE PARCEIRO HOMOSSEXUAL. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO UNIÃO ESTÁVEL PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. CASAL SEPARADO. PAGAMENTO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1. É possível a comprovação de união estável entre pessoas do mesmo sexo para fins de percepção do benefício de pensão por morte, consoante precedentes dessa Corte.

2. Se o cônjuge divorciado ou separado recebia pensão alimentícia do de cujus, a dependência econômica é presumida, fulcro no artigo 76, § 2º, da Lei n.º 8.213/91.

3. Preenchidos os requisitos contidos no art. 74 da Lei 8.213/91, é de ser concedido o benefício de pensão por morte, a partir da DER.

4. Atualização monetária, a partir de maio de 1996, deve-se dar pelo IGP-DI, de acordo com o art. 10 da Lei nº 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei nº 8.880/94.

5. Os juros de mora devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei nº 2.322/87.

6. Os honorários devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, corrigir, de ofício erro material da sentença, negar provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de agosto de 2009.

Desembargador Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle
Relator

RELATÓRIO

Maria do Horto Laranja Martins ajuizou a presente ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão do benefício de pensão por morte, em decorrência do óbito de sua companheira, Eunice Maria Baltasar Jacques, ocorrido em 13-03-1997 (fl. 22), desde a data do óbito.

À fls. 627/630, foi noticiado o falecimento da autora, razão pela qual a autora foi substituída por seu Espólio.

Ainda, foi informada que a mãe da de cujus já percebia o benefício de pensão por morte, razão pela qual foi determinada a sua citação. No entanto, informou a parte autora que a mãe da de cujus havia falecido razão pela qual foi considerado como dispensável a citação da mesma.

Sentenciando, o MM. Juízo monocrático julgou procedente o pedido da parte autora, condenando o INSS a conceder à autora o benefício de pensão por morte, com termo inicial em 13-06-2002 (DER). O réu deverá pagar os valores devidos de 13-06-2002 até 18-01-2005, data do falecimento da dependente. As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente pelo IGP-DI, desde o período em que seriam devidas, acrescidas de juros de mora de 1% ao ano, a contar da citação. Condenou, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da condenação. Sentença sujeita ao reexame necessário.

Irresignado, apelou o INSS, requerendo a reforma da decisão. Alegou que a parte não juntou os documentos indispensáveis para a comprovação da união estável, bem como não há prova de que a autora percebia alimentos em decorrência de uma separação.

Sem contrarrazões, vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

À revisão.

Desembargador Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle
Relator

VOTO

Remessa Oficial

Inicialmente, cabe anotar que o art. 475, § 2° do CPC não tem aplicação na espécie, porquanto nesta fase do processo não é possível determinar se o valor da controvérsia é inferior a sessenta salários mínimos.

Sendo assim, correto o juiz a quo em submeter o feito ao reexame necessário.

Pensão por morte

Pretende a autora que seja concedido o benefício de pensão por morte de sua companheira e no caso, tendo o óbito ocorrido em 13-03-1997 (fl. 22), são aplicáveis as disposições da Lei 8.213/91, com redação original, que estatuía:

Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data do óbito ou da decisão judicial, no caso de morte presumida.

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente,

(...)

III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do artigo 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei;

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

...

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

De tais dispositivos, extrai-se que dois são os requisitos para a concessão do amparo em tela: (a) qualidade de segurado do instituidor da pensão; (b) dependência do beneficiário.

Quanto à qualidade de segurada da extinta, a mesma restou incontroversa. Logo, a lide versa sobre a comprovação da qualidade de companheira da parte autora, considerando que a dependência econômica entre companheiros é presumida por força de lei (art. 16, § 4º, da Lei n. 8.213/91) e sobre a possibilidade de ser reconhecido a condição de união estável entre casais homossexuais, para que então sejam considerados como dependentes para fins previdenciários.

Em recentes decisões, este Tribunal tem entendido entendido pela possibilidade de equiparar os paceiros homossexuais aos companheiros em união estável, quando de sexos diversos. Sendo assim, tornou-se possível o deferimento do benefício de pensão por morte a companheiros de mesmo sexo, consoante precedentes:

"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CASAL HOMOSSEXUAL. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam, a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento.

2. Faz jus à percepção de pensão por morte o companheiro homossexual quando demonstrada a existência de união estável com o ex-segurado até a data do óbito.

3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

(AC n. 2008.71.00.004210-1/RS, 6ª Turma, Rel. Des. João Batista Pinto Silveira, j. à unanimidade em 15-04-2009, publicado in DJU 23-04-2009)

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO HOMOSSEXUAL. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

"1. Comprovada a caracterização como companheiro homossexual e presumida legalmente a dependência econômica entre companheiros, é devida a pensão por morte.

"2. Os honorários advocatícios são devidos em 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício pleiteado nesta ação previdenciária, excluídas as vincendas (Súmula 111 do STJ)."

(AC n. 2001.70.00.027992-0/PR, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Néfi Cordeiro, j. à unanimidade em 15-12-2004, publicado in DJU 09-03-2005)

CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. COMPANHEIRO. UNIÃO HOMOSSEXUAL. REALIDADE FÁTICA. TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS. EVOLUÇÃO DO DIREITO. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE IGUALDADE. ARTIGOS 3º, IV E 5º. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

"1. A realidade social atual revela a existência de pessoas do mesmo sexo convivendo na condição de companheiros, como se casados fossem.

"2. O vácuo normativo não pode ser considerado obstáculo intransponível para o reconhecimento de uma relação jurídica emergente de fato público e notório .

"3. O princípio da igualdade consagrado na Constituição Federal de 1988, inscrito nos artigos 3º, IV, e 5º, aboliram definitivamente qualquer forma de discriminação.

"4. A evolução do direito deve acompanhar as transformações sociais, a partir de casos concretos que configurem novas realidades nas relações interpessoais.

"5. A dependência econômica do companheiro é presumida, nos termos do § 4º do art. 16 da Lei n. 8.213/91.

"6. Estando comprovada a qualidade de segurado do de cujus na data do óbito, bem como a condição de dependente do autor, tem este o direito ao benefício de pensão por morte, o qual é devido desde a data do ajuizamento da ação, uma vez que o óbito ocorreu na vigência da Lei n. 9.528/97. (...)

"10. Apelações providas."

(Ac n. 2000.04.01.0736438/RS, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu, unânime, publicado in DJU 10-01-2001)."

Informa-se ainda que, por ocasião da Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, proposta pelo Ministério Público Federal, pelo Grupo pela Livre Orientação Sexual - NUANCES e pelo Grupo Gay da Bahia - GGB, a matéria restou consolidada, mediante determinação à Autaqruia Previdenciária que aceitasse pedidos administrativos requeridos por parceiros homossexuais, desde que lograssem êxito em comprovar os mesmo requisitos exigidos na Lei nº 8.213/91 aos parceiros heterossexuais. O acórdão restou assim ementado:

"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CABIMENTO. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. ABRANGÊNCIA NACIONAL DA DECISÃO. HOMOSSEXUAIS. INSCRIÇÃO DE COMPANHEIROS COMO DEPENDENTES NO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL.

"1. Possui legitimidade ativa o Ministério Público Federal em se tratando de ação civil pública que objetiva a proteção de interesses difusos e a defesa de direitos individuais homogêneos.

"2. Às ações coletivas não se nega a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum, de lei ou ato normativo federal ou local.

"3. A regra do art. 16 da Lei n.º 7.347/85 deve ser interpretada em sintonia com os preceitos contidos na Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), entendendo-se que os limites da competência territorial do órgão prolator, de que fala o referido dispositivo, não são aqueles fixados na regra de organização judiciária, mas sim, aqueles previstos no art. 93 do CDC.

"4. Tratando-se de dano de âmbito nacional, a competência será do foro de qualquer das capitais ou do Distrito Federal, e a sentença produzirá os seus efeitos sobre toda a área prejudicada.

"5. O princípio da dignidade humana veicula parâmetros essenciais que devem ser necessariamente observados por todos os órgãos estatais em suas respectivas esferas de atuação, atuando como elemento estrutural dos próprios direitos fundamentais assegurados na Constituição.

"6. A exclusão dos benefícios previdenciários, em razão da orientação sexual, além de discriminatória, retira da proteção estatal pessoas que, por imperativo constitucional, deveriam encontrar-se por ela abrangidas.

"7. Ventilar-se a possibilidade de desrespeito ou prejuízo a alguém, em função de sua orientação sexual, seria dispensar tratamento indigno ao ser humano. Não se pode, simplesmente, ignorar a condição pessoal do indivíduo, legitimamente constitutiva de sua identidade pessoal (na qual, sem sombra de dúvida, se inclui a orientação sexual), como se tal aspecto não tivesse relação com a dignidade humana.

"8. As noções de casamento e amor vêm mudando ao longo da história ocidental, assumindo contornos e formas de manifestação e institucionalização plurívocos e multifacetados, que num movimento de transformação permanente colocam homens e mulheres em face de distintas possibilidades de materialização das trocas afetivas e sexuais.

"9. A aceitação das uniões homossexuais é um fenômeno mundial - em alguns países de forma mais implícita - com o alargamento da compreensão do conceito de família dentro das regras já existentes; em outros de maneira explícita, com a modificação do ordenamento jurídico feita de modo a abarcar legalmente a união afetiva entre pessoas do mesmo sexo.

"10. O Poder Judiciário não pode se fechar às transformações sociais, que, pela sua própria dinâmica, muitas vezes se antecipam às modificações legislativas.

"11. Uma vez reconhecida, numa interpretação dos princípios norteadores da constituição pátria, a união entre homossexuais como possível de ser abarcada dentro do conceito de entidade familiar e afastados quaisquer impedimentos de natureza atuarial, deve a relação da Previdência para com os casais de mesmo sexo dar-se nos mesmos moldes das uniões estáveis entre heterossexuais, devendo ser exigido dos primeiros o mesmo que se exige dos segundos para fins de comprovação do vínculo afetivo e dependência econômica presumida entre os casais (art. 16, I, da Lei n.º 8.213/91), quando do processamento dos pedidos de pensão por morte e auxílio-reclusão."

(6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, j. à unanimidade em 27-07-2005, publicado in DJU 10-08-2005)

Frisa-se, por oportuno, que, segundo artigo 16 da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) c/c com o artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor, foi reconhecido o efeito erga omnes da referida decisão, razão pela qual ela deverá ser aplicada no presente caso.

Ressalta-se, ainda, que o referido entendimento já tem sido aceito e aplicado pelo INSS na esfera administrativa, consoante Instrução Normativa INSS/DC nº 118 de 14-04-2005, a saber:

"Art. 30. O companheiro ou a companheira homossexual de segurado inscrito no RGPS passa a integrar o rol dos dependentes e, desde que comprovada a vida em comum e a dependência econômica, concorrem, para fins de pensão por morte e de auxílio-reclusão, com os dependentes preferenciais de que trata o inciso I do art. 16 da Lei n. 8.213, de 1991, para óbitos ocorridos a partir de 5 de abril de 1991, ou seja, mesmo tendo ocorrido anteriormente à data da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública n. 2000.71.00.009347-0."

"Art. 271. Por força de decisão judicial (Ação Civil Pública n. 2000.71.00.009347-0), fica garantido o direito à pensão por morte ao companheiro ou companheira homossexual, para óbitos ocorridos a partir de 5 de abril de 1991, desde que atendidas todas as condições exigidas para o reconhecimento do direito a esse benefício, observando-se o disposto no art. 105 do RPS."

Por derradeiro, o Superior Tribunal de Justiça também já manifestou acerca do assunto, tendo sido favorável ao reconhecimento do direito de parceiros homossexuais ao benefício previdenciário de pensão por morte, a saber:

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RELACIONAMENTO HOMOAFETIVO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. MINISTÉRIO PÚBLICO. PARTE LEGÍTIMA. (...)

3 - A pensão por morte é: "o benefício previdenciário devido ao conjunto dos dependentes do segurado falecido - a chamada família previdenciária - no exercício de sua atividade ou não ( neste caso, desde que mantida a qualidade de segurado), ou, ainda, quando ele já se encontrava em percepção de aposentadoria. O benefício é uma prestação previdenciária continuada, de caráter substitutivo, destinado a suprir, ou pelo menos, a minimizar a falta daqueles que proviam as necessidades econômicas dos dependentes." (Rocha, Daniel Machado da, Comentários à lei de benefícios da previdência social/Daniel Machado da Rocha, José Paulo Baltazar Júnior. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: Esmafe, 2004. p.251).

4 - Em que pesem as alegações do recorrente quanto à violação do art. 226, §3º, da Constituição Federal, convém mencionar que a ofensa a artigo da Constituição Federal não pode ser analisada por este Sodalício, na medida em que tal mister é atribuição exclusiva do Pretório Excelso. Somente por amor ao debate, porém, de tal preceito não depende, obrigatoriamente, o desate da lide, eis que não diz respeito ao âmbito previdenciário, inserindo-se no capítulo 'Da Família'. Face a essa visualização, a aplicação do direito à espécie se fará à luz de diversos preceitos constitucionais, não apenas do art. 226, §3º da Constituição Federal, levando a que, em seguida, se possa aplicar o direito ao caso em análise.

5 - Diante do § 3º do art. 16 da Lei n. 8.213/91, verifica-se que o que o legislador pretendeu foi, em verdade, ali gizar o conceito de entidade familiar, a partir do modelo da união estável, com vista ao direito previdenciário, sem exclusão, porém, da relação homoafetiva.

6- Por ser a pensão por morte um benefício previdenciário, que visa suprir as necessidades básicas dos dependentes do segurado, no sentido de lhes assegurar a subsistência, há que interpretar os respectivos preceitos partindo da própria Carta Política de 1988 que, assim estabeleceu, em comando específico: "Art. 201- Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a: [...] V - pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no § 2 º."

7 - Não houve, pois, de parte do constituinte, exclusão dos relacionamentos homoafetivos, com vista à produção de efeitos no campo do direito previdenciário, configurando-se mera lacuna, que deverá ser preenchida a partir de outras fontes do direito.

8 - Outrossim, o próprio INSS, tratando da matéria, regulou, através da Instrução Normativa n. 25 de 07/06/2000, os procedimentos com vista à concessão de benefício ao companheiro ou companheira homossexual, para atender a determinação judicial expedida pela juíza Simone Barbasin Fortes, da Terceira Vara Previdenciária de Porto Alegre, ao deferir medida liminar na Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, com eficácia erga omnes. Mais do que razoável, pois, estender-se tal orientação, para alcançar situações idênticas, merecedoras do mesmo tratamento.

9 - Recurso Especial não provido.

(REsp 395904/RS, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, Sexta Turma, j. em 13-12-2005, publicado in 06-02-2006, p. 365)"

Dessa forma, frente toda a argumentação trazida aos autos, entende-se que poderá ser deferido o benefício de pensão por morte ao dependente de pareceiro do mesmo sexo, desde que o requerente obtenha sucesso em comprovar a efetiva convivência em união estável, sendo que, comprovada a união estável, a dependência econômica se torna presumida, por força do §4º, artigo 16 da Lei 8.2313/91, devendo o INSS comprovar o contrário.

No que respeita à qualidade de companheiro(a), a Constituição de 1988 estendeu a proteção dada pelo Estado à família para as entidades familiares constituídas a partir da união estável entre homem e mulher, aqui equiparado a relação homoafetiva, nos seguintes termos:

"Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(...)

§ 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento."

O legislador ordinário, por sua vez, regulamentou esse dispositivo constitucional na Lei n. 9.278/96:

"Art. 1º. É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família."

A Lei n. 8.213/91, em sua redação original, assim definiu companheiro:

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(...)

§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal."

Já o Decreto n. 3.048/99 conceituou a união estável deste modo:

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(...)

§ 6º Considera-se união estável aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem."

A título de comprovação da sua união estável com a extinta, a autora acostou aos autos os seguintes documentos:

a) Peça inicial da ação ordinária de reconhecimento e dissolução de união estável, cumulada com pedido de direito sucessórios e patrimoniais, em que a autora busca o reconhecimento da união estável com a extinta (fl. 09/18);

b) Declaração da extinta, em que a mesma contrai obrigações frente a autora, principalmente a de pagar equivalente a 30% de seus rendimentos, datada em 19-11-1991, visto que a extinta havia deixado de morar com a autora (fl. 23);

c) Cédula Hipotecária Integral, em que a autora e a extinta foram devedoras, referente ao imóvel localizado na Avenida Jacuí, nº 1.095 (fl. 28), imóvel que a autora morava e que, por ocasião do acordo na ação ordinária de reconhecimento e dissolução de união estável, cumulada com pedido de direitos sucessórios e patrimoniais, ficou para a parte autora (fl. 126);

d) Recibo de pagamento de Indenização, referente ao seguro de vida deixado pela extinta em favor da parte autora (fl. 29);

Tais documentos foram corroborados pela prova testemunhal (fls. 91/95), colhidas em audiência realizada em 30-06-2003, sendo estas uníssonas em afirmar que a de cujus e a autora viviam maritalmente até 1991.

Em qualquer caso, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja aparência de casamento, não sendo a coabitação, entretanto, requisito indispensável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:

DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL . REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.

I - Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável . Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável .

II - Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.

III - O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (...) (STJ, RESP n. 474962, Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ de 01-03-2004)

Ademais, comprovada a relação afetiva com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, presume-se a dependência econômica, como referido alhures, impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO.

1. A prova material demonstra a convivência 'more uxório', sendo presumida a dependência econômica, entre companheiros. (...) (TRF - 4ª Região, AC n. 1999.71.00.016053-2/RS, Rel. Des. Federal Néfi Cordeiro, Sexta Turma, DJU de 23-07-2003)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE . CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. COMPROVAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. (...)

2. A dependência econômica da companheira é presumida (art. 16, I e § 4º e art. 74 da Lei nº 8.213/91). (...) (TRF - 4ª Região, AC n. 2001.70.07.002419-0/PR, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu, DJU de 23-06-2004)

No entanto, tenho que o conjunto probatório não foi suficiente para comprovar a relação marital após o ano de 1991, quando a extinta elaborou a declaração de fl. 23, mesmo momento em que autora afirma que a extinta se mudou da residência comum, indo morar sozinha, visto que precisava "arejar a relação".

Assim, tendo em vista que eram separadas de fato, a parte autora passa a ter a obrigação de comprovar a dependência econômica.

Nesse sentido, o artigo 76, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, assim dispõe:

Art. 76. (...)

§ 2º. O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes referidos no inc. I do art. 16 desta Lei.

Isso quer dizer que, se o cônjuge divorciado ou separado recebia pensão alimentícia do de cujus, a dependência econômica é presumida. Em caso contrário, a dependência econômica terá de ser comprovada.

À fl. 23, a parte autora acostou declaração feita em vida pela extinta de que se comprometia a pagar a autora, todo dia 4, o correspondente a 30% dos seus rendimentos.

Assim, pelo fato de que as relações homoafetivas ainda lutam por um melhor regramento dentro do ordenamento jurídico brasileiro, tenho que este documento, apesar de precário, poderá ser considerado como prova de que a extinta pagava pensão alimentícia a autora todos os meses. Assim, concluo como comprovada a dependência econômica entre a parte autora e a extinta.

Sendo assim, tendo a requerente preenchido os requisitos legais para a concessão do benefício de pensão, este deve ser concedido a contar da data do requerimento administrativo, uma vez que esta foi a posição adotada pelo juiz de primeiro grau e que não foi impugnada pela parte autora.

Consectários

Correção Monetária

A atualização monetária das parcelas vencidas deverá ser feita pelo IGP-DI (MP n.º 1.415/96 e Lei n.º 9.711/98), desde a data dos vencimentos de cada uma, inclusive daquelas anteriores ao ajuizamento da ação, em consonância com os Enunciados n.º 43 e 148 da Súmula do STJ.

Juros de Mora

"Os juros moratórios, nas ações previdenciárias, devem ser fixados em 12% ao ano, a contar da citação" (Súmula 75 do TRF4). Há muito, a propósito, o STJ vinha entendendo, por aplicação analógica art. 3º do Decreto-Lei 2.322/87, que os juros em matéria previdenciária são devidos à taxa de 1% ao mês, entendimento este que restou corroborado pelo advento do 406 do novo CC, o qual remete à aplicação do § 1º do artigo 161 do CTN.

Observa-se que o julgado de primeiro grau ocorreu em erro material, quanto da fixação dos juros de mora, uma vez que os fixou em 1% ao ano. Logo, corrijo, de ofício, os juros de mora fixados, para que conste em 12% ao ano, consoante fundamentação retro.

Honorários Advocatícios

Os honorários devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".

Dispositivo

Ante o exposto, voto por corrigir, de ofício erro material da sentença, negar provimento à remessa oficial e à apelação.

Desembargador Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle
Relator

Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:

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Nº de Série do Certificado: 44353F9B

Data e Hora: 20/08/2009 08:42:33

D.E. Publicado em 01/09/2009




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