Anúncios


quinta-feira, 10 de setembro de 2009

JURID - Multa administrativa. Responsabilidade pelo ambiente. [10/09/09] - Jurisprudência


Multa administrativa. Responsabilidade pelo ambiente do trabalho. Fornecimento de EPI's.
Obras jurídicas digitalizadas, por um preço menor que as obras impressas. Acesse e conheça as vantagens de ter uma Biblioteca Digital!


Tribunal Regional do Trabalho - TRT 15ª Região

1ª TURMA - 2ª CÂMARA

PROCESSO TRT/15ª REGIÃO - Nº 00788-2007-028-15-00-2

RECURSO ORDINÁRIO DA 1ª VARA DO TRABALHO DE CATANDUVA

RECORRENTE: CITROVITA AGRO INDUSTRIAL LTDA.

RECORRIDO: UNIÃO

JUIZ SENTENCIANTE: WAGNER RAMOS DE QUADROS

MULTA ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE PELO AMBIENTE DO TRABALHO. FORNECIMENTO DE EPI´S. No âmbito da responsabilidade trabalhista, não apenas o empregador é responsável pelo cumprimento das normas trabalhistas de saúde e segurança laborais (de ordem pública), mas também o é o beneficiário final da força de trabalho, que ao fim e ao cabo, se apropria da energia produtiva do trabalhador. A recorrente, a toda evidência, não é mera compradora de matéria prima, sendo fato notório, de repercussão nacional, que as empresas de suco na região do cultivo da laranja, historicamente, não pouparam esforços em tentar eximir-se das responsabilidades trabalhistas decorrentes da sua atividade econômica. Exemplo disso foram as inúmeras cooperativas fraudulentas que atolaram o Judiciário Trabalhista com ações trabalhistas de trabalhadores rurais (verdadeiros empregados) buscando o pagamento de verbas trabalhistas mínimas, como as rescisórias. Antes de as empresas se arvorarem com tais estratagemas, eram as próprias indústrias de suco que se responsabilizavam diretamente pela colheita da laranja, sendo que, após algum tempo, passaram a inserir nos contratos firmados com os produtores de laranja a responsabilidade destes últimos pela colheita e transporte da laranja. O fato concreto dessa dinâmica econômico-social é que as grandes empresas de suco como a requerente são as que diretamente se beneficiam da mão-de-obra dos empregados rurais, notadamente dos colhedores de laranja, o que torna sua responsabilidade pela saúde do trabalhador moralmente incontestável e juridicamente inafastável, de acordo com o princípio da boa-fé objetiva. Recurso a que se nega provimento.

Da r. decisão de fls. 386/390, recorre a CITROVITA AGRO INDUSTRIAL LTDA, pugnando pela reforma da r. sentença, a fim de que seja julgada procedente a ação anulatória de débito fiscal (auto de infração nº 303890036), bem como seja declarada a inexistência de vínculo de emprego entre a autora e os colhedores de laranja (fls. 394/408).

Fls. 411/412 - comprovação do recolhimento do depósito recursal e das custas.

Fls. 415/417 - apresentadas as contra-razões pela primeira reclamada.

Autos relatados.

V O T O

Observados os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

A ação intentada pela recorrente visa a afastar sua responsabilidade pelo fornecimento de equipamentos de proteção individual a trabalhadores que se ativaram na Fazenda São Domingos, de propriedade do Sr. José Gil Martins, ao argumento de que não manteve relação de emprego com os trabalhadores que ali se ativavam.

Pois bem.

Na data de 31/07/96, a recorrente foi autuada pelo Ministério do Trabalho por não fornecer aos trabalhadores rurais, que trabalhavam na Fazenda São Domingos - de propriedade de José Gil Martins - os equipamentos de proteção individual consistentes em luvas para colheita e botinas, consoante se extrai do auto de infração de fls. 37.

Antes de tudo, esclareça-se, a ação anulatória não é sede adequada para a discussão de vínculo de emprego entre a autora e "trabalhadores rurais colhedores de laranja", lato sensu. Referido objeto processual merece ação individual própria com a especificação de cada trabalhador, inexistindo no ordenamento jurídico a figura da declaração ou negativa de vínculo de emprego "erga omnes".

No mérito, a r. sentença de origem deve ser mantida.

Com efeito, no âmbito da responsabilidade trabalhista, não apenas o empregador é responsável pelo cumprimento das normas trabalhistas de saúde e segurança laborais (de ordem pública), mas também o é o beneficiário final da força de trabalho, que ao fim e ao cabo, se apropria da energia produtiva do trabalhador.

Como bem asseverado na r. sentença, quando nos deparamos com a cultura da laranja, notamos que "a empresa produtora de sucos não apenas é a destinatária final das frutas, matéria prima de seus produtos, mas também atua de forma importante na definição de métodos e condições da atividade do produtor rural, até para fixar o momento propício para a colheita" (fls. 386/390).

A recorrente, a toda evidência, não é mera compradora de matéria prima, sendo fato notório, de repercussão nacional, que as empresas de suco na região do cultivo da laranja, historicamente, não pouparam esforços em tentar eximir-se das responsabilidades trabalhistas decorrentes da sua atividade econômica. Exemplo disso foram as inúmeras cooperativas fraudulentas que atolaram o Judiciário Trabalhista com ações trabalhistas de trabalhadores rurais (verdadeiros empregados) buscando o pagamento de verbas trabalhistas mínimas, como as rescisórias. Antes de as empresas se arvorarem com tais estratagemas, eram as próprias indústrias de suco que se responsabilizavam diretamente pela colheita da laranja, sendo que, após algum tempo, passaram a inserir nos contratos firmados com os produtores de laranja a responsabilidade destes últimos pela colheita e transporte da laranja, como se nota da cláusula segunda do contrato acostado a fls. 39.

O fato concreto dessa dinâmica econômico-social é que as grandes empresas de suco como a requerente são as que diretamente se beneficiam da mão-de-obra dos empregados rurais, notadamente dos colhedores de laranja, o que torna sua responsabilidade pela saúde do trabalhador moralmente incontestável e juridicamente inafastável, de acordo com o princípio da boa-fé objetiva.

Note-se, a propósito, que era a própria autora quem fornecia "ferramentas e materiais" aos trabalhadores (fls. 63 e 70). Além disso, a autora tinha ingerência direta sobre o processo produtivo, determinando a quantidade de frutas que deveria ser colhida, a hora e o local da colheita, o modus faciendi do trabalho, justamente porque todas essas circunstâncias têm reflexo direto na produção do suco de laranja, sendo mesmo despicienda a presença formalizada do vínculo de emprego entre a autora e os colhedores de laranja para que se exija a responsabilidade daquela pelas vidas dos trabalhadores que ali prestam seus serviços. Afinal, a colheita da laranja está inserida entre as atividades principais da autora, como um elo mais do que necessário ao seu sucesso empresarial.

A propósito, vale reproduzir o esclarecedor v. Acórdão proferido pelo Exmo. Desembargador Federal do Trabalho, Dr. José Pedro de Camargo Rodrigues, citado pelo d. Ministério Público em seu parecer, proferido nos autos da ação civil pública 00075-1996-070-15-00-1, em que são rés as empresas Coinbra Frutesp S.A, Cargill Citrus Ltda, Citrovita Agro Industrial Ltda, Fazenda Santa Hermínia e Cooperativa dos Trabalhadores Rurais de Tabapuã Ltda:

"Sustentam as empresas, de forma veemente, que a colheita da laranja não se insere na atividade-fim das indústrias de suco e, ainda, que não teria ocorrido simulação fraudulenta (fls. 371/373). A Cooperativa de trabalho, por seu turno, defende essa tese das empresas, afasta a suposição de fraude e se diz idônea (fls. 391/393).

Os depoimentos de fls. 292/302 demonstram, porém, que a indústria necessitava controlar a colheita e os serviços a ela ligados.

O depoimento do Sr. Osório de Almeida Nascimento Costa (fls. 293/296), proprietário da Fazenda Santa Hermínia e Presidente da Associação Brasileira de Citricultores (dos produtores) é muito elucidativo. Noticiou que, apesar de as indústrias terem exigido dos produtores, em 1.995, modificação contratual (aditamento às fls. 145/146) para que os encargos da colheita ficassem por conta do vendedor, o modo de realizar a colheita continuou o mesmo, ou seja, a indústria é que determina a hora, o talhão e a quantidade de colhedores de laranja e ela repassa ao produtor o dinheiro para pagar-lhes (fl. 293); esse controle é feito pelos funcionários das indústrias denominados fiscais de campo, que dirigem a prestação de serviços dos colhedores de laranja e determinam em qual talhão devem ser apanhadas as frutas (v. fl. 294). O produtor de laranja não pode fazer a colheita à revelia da indústria vez que esta é quem diz a fruta que deve ser colhida para a fabricação do suco, pelas razões técnicas que indica, em continuação ao seu depoimento, envolvendo o ponto de maturação e o teor de açúcar diferenciados em função das exigências de cada importador (v. fl. 293).

Esta última afirmação foi reproduzida pelos prepostos da primeira e da segunda requeridas (v. fls. 299/300), que minudenciaram os detalhes técnicos supra aludidos, sempre em consonância com os depoimentos anteriores.

Esses depoimentos de fls. 292/302, também demonstraram que a contratação de trabalhadores era feita diretamente pela indústria. Com efeito, o produtor de laranjas (Fazenda Santa Hermínia), Sr. Osório, informou que a indústria fornece trabalhadores e todo o material necessário à colheita, como escadas e sacolas (fl. 293), assertiva esta corroborada pelo presidente da COOTAB, que além das escadas e sacolas acrescentou ao rol as alças dos sacos e caixas (fl. 296). O Sr. Osório declarou ainda: foi a indústria citricultora quem colocou a Cooperativa dos Trabalhadores Rurais no município de Tabapuã, pois o depoente não contratou nenhum associado da Cooperativa e esses apareceram por lá para colher laranja (fl. 294).

Já o presidente da Cooperativa, Sr. Adriano, por sua vez, em resposta às reperguntas elaboradas pelo advogado das próprias indústrias (v. fl. 298), informou que os fiscais das três primeiras recdas. ligavam na Cooperativa e diziam o local onde existia empreiteiro querendo serviço e a Cooperativa ia no local e se oferecia para intermediar a prestação de serviço com as recdas.; que o depoente não se lembra do nome dos fiscais das recdas. mas apenas de Donizete, Eder, José Carlos, todos da Cargill e apenas João da Coimbra Frutesp.

Finalmente, a fiscalização dos trabalhadores era feita pela indústria e seus prepostos.

O já referido Sr. Osório (produtor) insistiu em que indústria citricultora tem empregados denominados fiscais de campo que dirigem a prestação de serviços dos colhedores de laranja, os quais indicam qual a laranja e em que talhão deve ser colhida (fl. 294).

O Sr. Adriano, presidente da Cooperativa, esclareceu à fl. 298 que eram os fiscais das empresas citricultoras que fiscalizavam os serviços dos colhedores de laranja; que essa fiscalização era direcionada em todos os sentidos, inclusive quanto a correção da forma de execução.

Em síntese, trabalho subordinado, oneroso, pessoal e continuado, com contratação, fiscalização e supervisão técnica por parte das empresas de suco inexoravelmente existiu, mas ninguém assumiu vínculo empregatício, o que é pior do que a terceirização, pois nesta o contrato de trabalho jamais deixará de ser configurado com alguém.

Pelo acima exposto, conclui-se ser a colheita de laranjas tarefa inseparável da produção de sucos, demandando fiscalização contínua e técnica da parte das indústrias, mormente para atender às especificações dos clientes internacionais quanto ao teor de açúcar e grau de maturidade do fruto (v. fls. 293, 299 e 300)"( grifos nossos).

Na referida ação civil pública restou exaustivamente comprovado que a contratação de trabalhadores era feita diretamente pela indústria do suco. É bem verdade que nessa ação civil pública não há a indicação certa da propriedade em que houve a aplicação da multa nos presentes autos, contudo, não menos certo é que aquela ação torna clara a dinâmica da ora recorrente junto às fazendas em que promoveu a colheita de laranjas, no ano 1996.

Nota-se, ademais, que a mencionada decisão (fls. 313), condenou entre outras a ora autora a se abster da prática de promover à intermediação ilícita de mão-de-obra, bem como a executar o serviço de colheita através de seus próprios empregados.

Sobre a responsabilidade, no âmbito da saúde do trabalhador, daquele que se apropria da mão-de-obra do trabalhador, reproduzo trecho do artigo "Meio ambiente do trabalho e responsabilidade civil por danos causados ao trabalhador: dupla face ontológica", de autoria do MM. Juiz do Trabalho e jurista Guilherme Guimarães Feliciano, que assim se manifesta:

"É princípio informador do Direito Ambiental que "os custos sociais externos que acompanham a produção industrial (como o custo resultante da poluição) devem ser internalizados, isto é, levados à conta dos agentes econômicos em seus custos de produção" princípio do poluidor-pagador. Também os custos difusos do sistema de seguridade social com a legião brasileira de mutilados e desvalidos são, nesse sentido, externalidades a serem internalizadas. E, nesse encalço, a identificação do poluidor no meio ambiente do trabalho não oferece qualquer dificuldade: será, em geral, o próprio empregador, que engendra as condições deletérias da atividade econômica ou se omite no dever de arrostá-las; mas também poderá ser o tomador de serviços, quando a organização dos meios de produção e/ou do ambiente de trabalho deflagrar desequilíbrio sistêmico em prejuízo da saúde, segurança e bem-estar dos trabalhadores. Conseqüentemente, a aplicação do princípio do poluidor-pagador às hipóteses de danos pessoais (físicos ou psíquicos) derivados do desequilíbrio labor-ambiental sistêmico permite entrever que a responsabilidade pela internalização dos custos sociais externos e, "a fortiori", a obrigação de indenizar ("Schuld") com responsabilidade objetiva ("Haftung"), favorecem não apenas o empregado (= trabalhador subordinado), mas todo trabalhador inserido na organização empresarial, na acepção lata do artigo 114, I, da CRFB. Essa compreensão atende melhor ao princípio insculpido no artigo 1º, III, da CRFB, uma vez que, do ponto de vista dos direitos humanos de primeira e terceira geração, não se justifica a distinção entre empregados, avulsos, autônomos e eventuais. E, na mesma ensancha, inviabiliza a tese da natureza contratual da responsabilidade civil do empregador pelos acidentes de trabalho (uma vez que, se tal responsabilidade dimanasse de cláusula implícita de integridade inerente aos contratos de emprego, não poderia ser imputada aos tomadores de serviços em geral).

Dessa forma e por tais fundamentos, entendo que a r. sentença de primeiro grau deve ser mantida, mantendo incólume o auto de infração gerado pela ausência de fornecimento de EPI´s aos colhedores de laranja.

DIANTE DO EXPOSTO, decido conhecer do recurso de CITROVITA AGRO INDUSTRIAL LTDA. e o DESPROVER mantendo, a r. sentença de origem, nos termos da fundamentação supra.

MARIANE KHAYAT
Desembargadora Relatora




JURID - Multa administrativa. Responsabilidade pelo ambiente. [10/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário