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terça-feira, 8 de setembro de 2009

JURID - Motorista indeniza família de vítima [08/09/09] - Jurisprudência


Motorista que matou ciclista vai indenizar família da vítima
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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT Circunscrição :1 - BRASILIA

Processo :2006.01.1.125402-3

Vara : 219 - DECIMA NONA VARA CIVEL

SENTENÇA

Trata-se de ação indenizatória, denominada "responsabilidade civil", movida pelo rito sumário, proposta por GERALDO ALTINO BRAGA e SELMA MARIA DOS SANTOS BRAGA em face de SÉRGIO MIRANDA DA COSTA.

Narra a inicial que Tiago dos Santos Braga filho dos autores faleceu em decorrência de um acidente, atropelamento, ocasionado pelo réu. Informa que o réu, ao realizar uma curva para esquerda, avançou a faixa da direita, na contramão de direção, abalroando a vítima e levando-a a óbito. Em virtude disto os autores requerem indenização por dano moral de trezentos salários mínimos, somada a uma pensão vitalícia no valor dos rendimentos da vítima, bem como despesas funerárias e lucros cessantes no período de luto. Pediram, ainda, constituição de capital a fim de garantir o pagamento da pensão vitalícia. Juntaram documentos, fls. 11-26.

Realizada a audiência de conciliação, restou esta infrutífera. Juntada a contestação, alegou-se culpa exclusiva da vítima e, alternativamente, a diminuição da indenização em razão da culpa concorrente, além da ausência de comprovação, nos autos, de renda da vítima, de despesas e dos lucros cessantes pelo luto. Documentos juntados às fls. 57- 138.

Realizada audiência de instrução e julgamento, foi tomado o depoimento pessoal da autora e do réu. Redesignada continuação, as partes desistiram da oitiva das testemunhas arroladas.

É o relatório.

DECIDO.

Presentes os pressupostos processuais e condições da ação, conforme saneamento em audiência. O feito encontra-se regularmente instruído e a causa está madura a receber julgamento. Passo, pois, ao exame do mérito.

É fato incontroverso que a causa da morte da vítima foi os ferimentos em razão do atropelamento.

A culpa do réu resta configurada pela sua confissão. Veja-se:

"QUE o tempo estava muito chuvoso e que na avenida principal a iluminação estava péssima; QUE a avenida principal a que se refere é entre quadras, achando que a velocidade do local era de aproximadamente 40 km/h; QUE no local a via é de mão dupla; QUE a avenida é muito movimentada inclusive com a presença de ônibus; QUE ligou a seta à esquerda; QUE não sabe em que direção a vítima vinha, mas chegou a ver o exato momento da queda devido ao impacto no seu veículo e viu que o acidentado bateu a cabeça no meio-fio; QUE na esquina que ia dobrar, havia um poste que estava com a lâmpada desligada; QUE na esquina em frente não havia poste; QUE acredita que a vítima vinha em uma velocidade muito alta para ciclistas; QUE apenas freou o veículo através do freio de mão no momento em que observou o impacto, ou seja, após a batida; (...)"

O depoimento do autor em Juízo coincide, quase completamente, com suas declarações prestadas na 33ª Delegacia de Polícia, fls. 75/76, não correspondendo, apenas, quanto à iluminação da via, mesmo porque a perícia, fls. 80, constatou que as vias eram dotadas de iluminação pública.

Diante dos fatos descritos pelo próprio réu em Juízo, houve descumprimento do disposto no art. 39, inc. II e parágrafo único do Código de Trânsito Brasileiro. Observe-se:

"Art. 38. Antes de entrar à direita ou à esquerda, em outra via ou em lotes lindeiros, o condutor deverá:

I - (...)

II - ao sair da via pelo lado esquerdo, aproximar-se o máximo possível de seu eixo ou da linha divisória da pista, quando houver, caso se trate de uma pista com circulação nos dois sentidos, ou do bordo esquerdo, tratando-se de uma pista de um só sentido.

Parágrafo único. Durante a manobra de mudança de direção, o condutor deverá ceder passagem aos pedestres e ciclistas, aos veículos que transitem em sentido contrário pela pista da via da qual vai sair, respeitadas as normas de preferência de passagem."

Deste modo, o réu ao pretender entrar à esquerda na via de mão dupla, deveria, primeiro, observar todas as cautelas exigidas, aproximar-se, parar e, somente depois, verificada a ausência de veículos em sentido contrário, pedestres e ciclistas, efetuar a manobra.

Assim não o fez, tanto que esclareceu não ter visto o ciclista antes do atropelamento. Declarou que somente freou quando percebeu o impacto.

Se a via estava mal iluminada, como relatou o réu, tal circunstância merecia mais atenção e cautela. Se estava chovendo, como dito pelo condutor, este deveria ter um cuidado dobrado, principalmente somando os dois fatores de risco, chuva e má iluminação.

Isto é o que estabelece o art. 44 do CTB:

Art. 44. Ao aproximar-se de qualquer tipo de cruzamento, o condutor do veículo deve demonstrar prudência especial, transitando em velocidade moderada, de forma que possa deter seu veículo com segurança para dar passagem a pedestre e a veículos que tenham o direito de preferência.

Razão assiste ao réu, entretanto, quando alega que a bicicleta não continha os equipamentos obrigatórios exigidos pelo CTB, quais sejam:

"Art. 105. São equipamentos obrigatórios dos veículos, entre outros a serem estabelecidos pelo CONTRAN:

I -V(...)

VI - para as bicicletas, a campainha, sinalização noturna dianteira, traseira, lateral e nos pedais, e espelho retrovisor do lado esquerdo."

Neste caso, a ausência dos equipamentos, principalmente os de sinalização noturna, faz surgir a concorrência de culpas. A não utilização de tais acessórios contribuiu para a ocorrência do acidente.

Desta feita, torna-se imperiosa a aplicação do disposto no art. 945 do Código Civil, consoante requereu a Defensoria Pública.

Observo, contudo, que a redação do referido artigo estabelece que o juiz fixará o dano considerando a proporção da culpa dos envolvidos e a contribuição de cada ação para a ocorrência do resultado. Cito:

"Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronta com a do autor."

A orientação doutrinária também é neste sentido e acentua a reparação proporcional, em razão da contribuição da culpa para o evento danoso, uma espécie de "índice de casualidade". Veja-se a lição de Carlos Roberto Gonçalves:

"Preceitua o artigo 945 que a repartição de responsabilidades se dará de acordo com o grau de culpa. A indenização poderá ser reduzida pela metade, se a culpa de vítima corresponder a uma parcela de 50%, como também poderá ser reduzida de Œ, 2/5, dependendo de cada caso." (Direito Civil Brasileiro, 4ª Ed. Volume IV, Responsabilidade Civil, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 407)

Pondero que a omissão do ciclista, consistente em não utilizar os equipamentos obrigatórios, foi proporcionalmente menor à conduta do autor, de desobediência aos comandos previstos no art. 38, inc. II e parágrafo único do CTB, para fins de ocorrência do resultado.

Desta feita, analisando cada conduta, pondero que a contribuição do réu foi de Ÿ e a da vítima de Œ para a eclosão do evento. Portanto, haverá uma redução de Œ do valor a ser fixado.

Responsabilidade civil configurada. Culpa concorrente reconhecida. Passo à fixação dos danos.

Primeiramente, os danos materiais.

Os danos materiais aqui pedidos dividem-se em: pensão alimentícia, despesas funerais e lucros cessantes.

Iniciando por esse último, realmente é presumível o respeito pelos autores ao período de luto pela morte do filho. Entretanto, os lucros cessantes, neste aspecto não são devidos haja vista que os autores sequer informaram o valor pretendido ou quanto auferiam por dia. Nesta linha, não há se falar em indenização pelas vestes utilizadas no funeral.

Em relação às despesas de sepultamento, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que a prova do desembolso e o do respectivo valor é dispensável, tendo em vista a certeza do sepultamento e que seu valor mínimo é, inclusive, previsto em legislação previdenciária. (Precedentes: REsp n.º 625.161/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJU de 17/12/2007; e REsp n.º 95.367/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJU de 03/02/1997)

Entretanto, compulsando os documentos juntados à inicial, observo que a própria Certidão de Óbito dá certeza do sepultamento e de sua localização, cemitério do Gama/DF. Resta, portanto, provado o dano.

Em relação ao "quantum debeatur", foi pedido o valor correspondente a 10 salários mínimos. Entretanto, não há documento ou outra prova que demonstre tal valor. Pela leitura do art. 459, parágrafo único do CPC, ao juiz é vedado, frente o pedido líquido, proferir sentença ilíquida. Ocorre que, em muitos casos, o autor era prejudicado quando, cumprindo a exigência do art. 286 do CPC, formulava pedido certo e determinado, estipulando o valor dos danos materiais. Isto porque, o juiz, na sentença, mesmo reconhecendo o dano, mas por não estar veementemente provado o "quantum", julgava improcedente o pedido. Diante de tal incongruência, a Jurisprudência passou a orientar-se no seguinte sentido: primeiro, o beneficiário de tal regra é o autor, se este se conformar, o réu não tem interesse recursal para apelar alegando o ferimento a esta regra e pleitear a nulidade da sentença e, segundo, não estando o juiz convencido do "quantum debeatur", mas estando seguro em relação à existência do dano, poderá julgar procedente o pedido e remeter as partes para a fase de liquidação. Nesse sentido, anotem-se os precedentes: REsp. 162.194-SP, 158.201-RJ, 59.209-PR e 100.851-SP, todos, STJ).

Forte nesses argumentos, a condenação ao pagamento de despesas funerárias é medida que se impõe. Ante a ausência de comprovação do "quantum debeatur," os autores deverão apurá-los em fase de liquidação, verificando, sempre, que o valor deve sofrer redução de Œ, ou seja, 25%.

(Foi enviado ofício ao ICS, mas, até então, não há resposta nos autos. Não obstante, caso a referida informação não chegue ao processo até a fase de liquidação, tal não prejudicará o réu, pois cabe aos autores a referida prova.)

Utilizando o mesmo raciocínio acima exposto, passo à fixação apenas do percentual do dano material a ser pago em forma de pensão alimentícia, tendo em vista que não há nos autos comprovação da renda auferida pela vítima à época em que contribuía para o sustento da família.

Conforme os padrões já fixados na doutrina e jurisprudência (Precedentes: REsp 674586/SC, REsp 740059/RJ ; REsp 703.878/SP, DJ 12.09.2005, REsp 970.673/MG e Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, 4ª Ed. Volume IV, Responsabilidade Civil, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 412-415 e 417-419), concluo ser devida pensão mensal, fixada desde o falecimento da vítima, à razão de 2/3 do salário que recebia, a ser apurado em fase de liquidação, até a data em que completaria 25 anos de idade; a partir daí, à razão de 1/3 do da mesma base de calculo, até a data em que a vítima completaria 72,7 anos de idade (expectativa de vida do brasileiro do sexo masculino divulgada pelo IBGE em 2009). Consoante exposto, nos cálculos será descontado 25% do total face à redução proporcional pelo reconhecimento da culpa concorrente.

Finalmente, fixo os danos morais.

O critério que vem sendo utilizado pelo STJ, na fixação do valor da indenização por danos morais, considera as condições pessoais e econômicas das partes, devendo o arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade, atendendo-se à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido, bem como que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito.

Assim, a par disto e levando em consideração o fato de as partes envolvidas litigarem sob o pálio da gratuidade de justiça, o que por si presume hipossuficiência econômica, fixo o dano moral em R$ 28.000,00 (vinte e oito mil reais) para cada autor e aplico a redução de Œ em razão da culpa concorrente o que totaliza a condenação em R$ 21.000,0 (vinte um mil reais) para cada um dos pais.

Deste montante, ainda, deve ser deduzida a verba efetivamente paga em razão do DPVAT. Tal valor está especificado no ofício de fls. 162 da FENASEG. O autor recebeu R$ 3.777,01 administrativamente, a autora o valor de R$ 3.777,00 e ambos receberam judicialmente o valor de R$ 7.723,19, o que deve ser dividido igualmente entre os genitores (R$ 3.861,60).

Desta forma, realizadas estas deduções, a cada um dos pais deverá ser paga a quantia final de R$ 13.361,40 (treze mil, trezentos e sessenta e um reais e quarenta centavos) a título de danos morais.

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para condenar o réu a pagar:

a) aos autores as despesas realizadas com o funeral da vítima, a serem apuradas em fase de liquidação de sentença. Tal montante será acrescido de juros moratórios de 1% ao mês e correção monetária segundo o INPC, a partir do dia 07/02/2004, data do evento;

b) aos autores, mensalmente, pensão alimentícia, desde o falecimento da vítima, à razão de 2/3 do salário que esta recebia, a ser apurado em fase de liquidação, até a data em que completaria 25 anos de idade; a partir daí, à base de 1/3 da mesma verba, até a data em que a vítima completaria 72,7 anos de idade, reduzida de 25% em cada mês. Tal montante será acrescido de juros moratórios de 1% ao mês e correção monetária segundo o INPC, a partir do dia 07/02/2004, data do evento;

c) a cada autor a quantia de R$ 13.361,40 (treze mil, trezentos e sessenta e um reais e quarenta centavos) a título de danos morais, corrigidos desta data.

EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, art. 269, inc. I do CPC.

Custas pelo réu. Fixo os honorários em 15% sobre o total da condenação, art. 20 § 3º c/c § 5º do CPC. Suspendo estas verbas pelo prazo de cinco anos, consoante o art. 12 da lei 1.060/50, em razão da gratuidade de justiça requerida pelo réu que ora defiro.

Advirta-se ao réu que o não pagamento da quantia certa após quinze dias implicará em multa de 10% sobre este valor, art. 475-J do CPC.

Publique-se. Intimem-se.

Sentença registrada no sistema eletrônico do TJDFT.

Brasília - DF, quinta-feira, 27/08/2009 às 19h.



JURID - Motorista indeniza família de vítima [08/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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