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quarta-feira, 30 de setembro de 2009

JURID - Locação. Fiador. Penhora. Bem de família. Possibilidade. [30/09/09] - Jurisprudência


Locação. Fiador. Penhora. Bem de família. Possibilidade.
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Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

QUINTA CÂMARA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 58105/2009 - CLASSE CNJ - 202 - COMARCA CAPITAL

AGRAVANTE: LUCIMAR SIMÕES GARCIA

AGRAVADO: ANTÔNIO NEVES CURVO

Número do Protocolo: 58105/2009

Data de Julgamento: 9-9-2009

EMENTA

LOCAÇÃO - FIADOR - PENHORA - BEM DE FAMÍLIA - POSSIBILIDADE - ARTIGO 3º, VII, LEI n. 8.009/90 - INOCORRÊNCIA DE AFRONTA AO DIREITO À MORADIA - PRINCÍPIO DA LIVRE CONTRATAÇÃO - PENHORA MANTIDA - PRECEDENTES STF E STJ.

Não ocorrendo qualquer vício de consentimento ao tempo da celebração da fiança no contrato de locação de imóvel, conclui-se que pertencia à esfera do conhecimento do fiador que a partir daquele momento estaria compelido a satisfazer a obrigação do devedor principal se este faltasse para com o compromisso assumido, concorrendo para tanto com o seu patrimônio.

Desta forma, é vedado ao indivíduo na condição de fiador invocar para a defesa do seu patrimônio a impenhorabilidade do seu único imóvel se ele, por livre convicção concordou com o encargo.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por Lucimar Simões Garcia contra a decisão proferida pelo MMa Juíza de Direito da 21ª Vara Cível da Comarca de Capital, que entendeu pela impenhorabilidade do único imóvel de propriedade do fiador do contrato locatício executado, por ser bem de família, garantindo-lhe a moradia.

Alega em suma, que a decisão a quo deve ser reformada uma vez que a impenhorabilidade aduzida pelo agravado não é oponível contra obrigação que decorre de contrato de fiança, conforme dispõe o art.3º, VI da Lei n. 8.009/90. Assim, mesmo que seja o único imóvel do fiador, a obrigação há de ser garantida.

Às fls. 105/106-TJ foi concedido parcialmente o efeito suspensivo e deferida a liminar para obstar o trâmite processual até a decisão final do presente recurso.

As informações foram prestadas, mantendo a decisão por seus próprio fundamentos (fl. 113-TJ).

Não houve contra minuta.

É o relatório.

V O T O

EXMO. SR. DES. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Em síntese, cinge-se dos autos a irresignação da agravante sustentando ser possível a penhora do bem intitulado de família de propriedade do fiador, em contrato de locação de imóvel.

Pois bem, a questão posta à baila sem dúvida trata-se de matéria longe de ser pacífica entre a doutrina e a jurisprudência dos Tribunais Pátrios.

Há in casu, conflito aparente de norma de direito público, constitucionalmente garantido no art.6º da CF, qual seja, à moradia, e norma de direito privado, em específico, o art.3º, VII, da Lei n. 8.009/1990 que assim dispõe:

"Art. 3º - A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

(...)

VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação." (incluído pela Lei nº 8.245, de 1991)

Em que pese em muitas circunstâncias o STF já tenha entendido pela incidência da eficácia horizontal dos direitos fundamentais às relações privadas, tenho que não seja este mais um caso.

Após minuciosa análise das normas ora em colisão, tenho que há de ser preterido o "direito civil constitucionalizado" a fim de fazer valer as regras estabelecidas pelo direito privado.

Digo isso, pois, devem ser prestigiados e respeitados os pactos, bem como os efeitos estabelecidos pelas partes dos contratos firmados, isto em atenção ao princípio da livre contratação, da livre iniciativa e o pacta sunt servanda.

Verifica-se dos autos que o fiador, ora agravado, não alegou a ocorrência de vício de consentimento ou qualquer outro vício formal ao tempo da celebração do contrato de fiança em que prestou o compromisso de garantir a obrigação firmada entre o locatário e o locador.

Conclui-se, portanto, que pertencia à esfera do conhecimento do fiador, ora apelado, ao tempo da contratação, que a partir daquele momento estaria compelido a satisfazer a obrigação do devedor principal se este faltasse para com o compromisso assumido, concorrendo para tanto, inclusive com o seu patrimônio.

Desta forma, tenho que é vedado ao indivíduo na condição de fiador empreender para a defesa do seu patrimônio, a impenhorabilidade do seu único imóvel se foi ele mesmo quem o colocou nesta condição de fiador da obrigação no contrato de locação.

Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal em análise a caso análogo, (RE 407688/SP, Tribunal Pleno, j. 8-2-2006), por maioria, entendeu pela possibilidade da penhora de bem família do fiador do contrato de locação sem que isso acarrete afronta ao direito constitucionalmente garantido à moradia.

Sob a Relatoria do Ministro Cezar Peluso, os Ministros Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Ellen Graice, Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence, e Nelson Jobim entenderam que o direito à moradia instituído no art. 6º da CF não abarca a proteção à propriedade, devendo prevalecer os princípios da autonomia privada e da autodeterminação das pessoas, inerentes ao direito da personalidade.

Confira parte do voto proferido pelo Min. Joaquim Barbosa no referido acórdão, verbis:

"Nessa linha de pensamento, entendo que a questão posta neste recurso extraordinário implica inicialmente saber se são impositivas ao cidadão comum, ou melhor, se são aplicáveis às relações privadas, com o mesmo peso e o mesmo rigor, as limitações e obrigações impostas ao Estado em virtude da previsão, na Constituição, de um catalogo de direitos fundamentais. Noutras palavras, a questão é saber se esses direitos se impõem, com a mesma força e o mesmo alcance, às relações travadas ao largo de qualquer manifestação estatal.

Em seguida, cumpre decidir, mediante juízo de ponderação, qual dos direitos deve preponderar.

Sou dos que entendem que, em princípio e em certas circunstâncias, os direitos fundamentais se aplicam igualmente nas relações privadas.

Assim me manifestei ao votar no julgamento do RE 201.819 (Rel. Min. Ellen Graice), quando aderi ao voto vencedor, do ministro Gilmar Mendes.

Naquela oportunidade, afirmei:

"Entendo que, em matéria de direitos fundamentais o nosso direito constitucional de distancia largamente da doutrina da State Action do direito norte-americano, segundo a qual as limitações impostas pelo Bill of Rights aplicam-se prioritariamente ao Estado e a quem lhe faz as vezes jamais aos particulares.

Tomo, contudo, a cautela de dizer que não estou aqui a esposar o entendimento de que essa aplicabilidade deva se verificar em todas as situações. No campo das relações privadas, a incidência das normas de direitos fundamentais há de ser aferida caso a caso, com parcimônia em demasia a esfera de autonomia privada do indivíduo".

É precisamente o que está em jogo no presente caso. A decisão de prestar fiança, como já disse, é expressão da liberdade, do direito à livre contratação. Ao fazer uso dessa franquia constitucional, o cidadão, por livre e espontânea vontade, põe em risco a incolumidade de um direito fundamental social que lhe é assegurado na Constituição. E o faz, repito, por vontade própria.

Por via de conseqüência, entendo que não há incompatibilidade entre o art.3º, VII, da Lei 8.009/1990, inserido pela Lei 8.245/1991, que prevê a possibilidade de penhora do bem de família em caso de fiança em contrato de locação, e a Constituição".

Desta feita, após a manifestação do Tribunal Pleno acerca da matéria, as Turmas isoladas do STF tem assim se posicionado, confira:

"Agravo de instrumento. Inadmissibilidade. Certidão de intimação do acórdão impugnado. Existência. Comprovação. Demonstrada a existência de peça obrigatória ao agravo de instrumento, deve ser apreciado o recurso. 2. FIADOR. Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Responsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel residencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/90, com a redação da Lei nº 8.245/91. Agravo regimental improvido. A penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, objeto do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República." (STF, AI 584436 AgR/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 3-2-2009)

"AGRAVO REGIMENTAL. BEM DE FAMÍLIA DE FIADOR. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PENHORABILIDADE. A decisão agravada encontra-se em perfeita harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário deste Tribunal, no julgamento do RE 407.688, rel. min. Cezar Peluso. Agravo regimental a que se nega provimento." (STF, RE 533128 AgR/SC, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 28-10-2008)

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL. REEXAME DE DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. INEXISTÊNCIA. SÚMULAS NS. 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PENHORA. FIADOR. BEM DE FAMÍLIA. LEGITIMIDADE. 1. A aferição do cabimento do REsp tem natureza processual, não alcançando nível constitucional capaz de ensejar a abertura da via extraordinária. 2. O Tribunal a quo não se manifestou explicitamente sobre os temas constitucionais tidos por violados. Incidência dos óbices das Súmulas ns. 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 407.688, decidiu pela possibilidade de penhora do bem de família de fiador, sem violação do artigo 6º da Constituição do Brasil. Agravo regimental a que se nega provimento." (STF, AI 666879 AgR/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eros Grau, j. 9-10-2007)

O Superior Tribunal de Justiça, em atenção ao julgado exarado pelo STF, vem se posicionando no mesmo sentido, verbis:

"AGRAVO INTERNO. LOCAÇÃO. FIANÇA. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. POSSIBILIDADE (PRECEDENTES). Este Superior Tribunal de Justiça, na linha do entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmou jurisprudência no sentido da possibilidade de se penhorar, em contrato de locação, o bem de família do fiador, ante o que dispõe o art. 3º, VII da Lei 8.009/90. 2. Agravo ao qual se nega provimento". (STJ, AgRg no Ag 923763/RJ, 6ª Turma, Rel. Des/SP Celso Limongi, j. 2-6-2009)

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. FIANÇA. PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que é legítima a penhora sobre bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, de acordo com o disposto no inciso VII do art. 3.º da Lei n.º 8.009/90, acrescentado pelo art. 82 da Lei n.º 8.245/91, inclusive para os pactos anteriores à vigência deste diploma legal. Precedentes. Agravo regimental desprovido". (STJ, AgRg no Ag 982933/RJ, 6ª Turma, Rel. Min. OG Fernandes, j. 19-2-2009)

"LOCAÇÃO. FIANÇA. PRORROGAÇÃO DO CONTRATO. CLÁUSULA QUE PREVÊ A OBRIGAÇÃO ATÉ A ENTREGA DAS CHAVES. EXONERAÇÃO DO FIADOR. IMPOSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO A PARTIR DO JULGAMENTO DO ERESP N.º 566.633/CE. FIADOR. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. POSSIBILIDADE. NOVAÇÃO NÃO CONFIGURADA. 1. O entendimento da Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça encontra-se consolidado no sentido de que, havendo, no contrato locatício, cláusula expressa de responsabilidade do garante até a entrega das chaves, o fiador responde pela prorrogação do contrato, a menos que tenha se exonerado na forma do art. 1.500 do Código Civil de 1916 ou do art. 835 do Código Civil vigente, a depender da época da avença. Precedentes. 2. É válida a penhora do bem destinado à família do fiador em razão da obrigação decorrente de pacto locatício, aplicando-se, também, aos contratos firmados antes da sua vigência. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 3. Conforme já decidiu este Superior Tribunal de Justiça, não constitui novação contratual, a ensejar a exoneração do fiador, o simples parcelamento do débito concedido pelo locador ao inquilino. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido." (STJ, AgRg no REsp 876938/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 14-10-2008)

Assim, como se pode compulsar de todo o arrazoado, bem como dos julgados colacionados, não há que se falar em afronta ao direito à moradia, quando o indivíduo, por sua própria vontade e livre convicção, se coloca na condição de fiador em contrato locatício, sendo-lhe, portanto, vedado invocar a impenhorabilidade do bem de família neste caso.

Portanto, a decisão singular deve ser reformada para seja mantida a constrição do imóvel outrora formalizada.

Desta forma, conheço do recurso e lhe DOU PROVIMENTO.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. LEÔNIDAS DUARTE MONTEIRO, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA (Relator), DES. LEÔNIDAS DUARTE MONTEIRO (1º Vogal) e DES. SEBASTIÃO DE MORAES FILHO (2º Vogal), proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

Cuiabá, 09 de setembro de 2009.

DESEMBARGADOR LEÔNIDAS DUARTE MONTEIRO - PRESIDENTE DA QUINTA CÂMARA CÍVEL

DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA - RELATOR

Publicado em 21/09/09




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