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terça-feira, 22 de setembro de 2009

JURID - Inquérito policial. Agressões físicas contra menores da APAE [22/09/09] - Jurisprudência


Processo penal. Conflito negativo de competência. Inquérito policial. Agressões físicas contra menores internados na APAE.
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Superior Tribunal de Justiça - STJ.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 102.833 - MG (2009/0016929-7)

RELATOR: MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

AUTOR: JUSTIÇA PÚBLICA

RÉU: EM APURAÇÃO

SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI - MG

SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI - MG

EMENTA

PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INQUÉRITO POLICIAL. AGRESSÕES FÍSICAS CONTRA MENORES INTERNADOS NA APAE. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSUNÇÃO DA CONDUTA NO DELITO DE MAUS TRATOS (ART. 136 DO CPB) ANTE A NÃO VERIFICAÇÃO, AO MENOS ATÉ ESTA ALTURA, DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO ESPECÍFICO DESTE DELITO (PARA FIM DE EDUCAÇÃO, ENSINO, TRATAMENTO OU CUSTÓDIA), MAS SIM DO PROPÓSITO DE CAUSAR SOFRIMENTO, PRÓPRIO DO CRIME DE TORTURA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL. PARECER MINISTERIAL PELA COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA 1a. VARA CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI, O SUSCITADO.

1. Para que se configure o delito de maus tratos é necessária a demonstração de que os castigos infligidos tenham por fim a educação, o ensino, o tratamento ou a custódia do sujeito passivo, circunstâncias que não se evidenciam na hipótese. Precedente desta Corte.

2.A conduta verificada nos autos encontra melhor adequação típica na descrição feita pelo art. 1o., II da Lei 9.455/97 - tortura, o que não exclui a possibilidade de outra definição do fato se verificado, depois de realizada mais aprofundada cognição probatória, serem outras as circunstâncias delitivas.

3.Parecer ministerial pela declaração de que competente o suscitado.

4.Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 1a. Vara Criminal de São João Del Rei/MG, o suscitado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de São João Del Rei - MG, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Felix Fischer, Arnaldo Esteves Lima e Maria Thereza de Assis Moura.

Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves.

Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Laurita Vaz.

Brasília/DF, 26 de agosto de 2009 (Data do Julgamento).

NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR

RELATÓRIO

1.Trata-se de Conflito negativo de Competência estabelecido entre o Juízo de Direito do Juizado Especial Criminal de São João Del Rei/MG, suscitante, e o Juízo de Direito da 1a. Vara Criminal de São João Del Rei/MG, suscitado.

2.Discute-se a competência para presidir o Inquérito Policial em que se apura a suposta conduta de submissão de menores com debilidades físico-mentais, internos da APAE em São João Del Rei/MG, a ofensas físicas.

3.O Juízo de Direito da Vara Criminal, primeiro a receber a incumbência de acompanhar o feito, declinou de sua competência ao fundamento de que o delito em questão (intitulado, no inquérito policial, como maus tratos - art. 136 do CPB) é infração penal de menor potencial ofensivo (fls. 65).

4.O Magistrado do Juizado Especial Criminal, por seu turno, defendeu não lhe cumprir a presente persecução penal, pois o fato teria correta tipificação no art. 1o., II da Lei 9.455/97, que prevê a conduta de submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo (fls. 75).

5.O MPF, em parecer subscrito pelo ilustre Subprocurador-Geral da República MARIA ELIANE MENEZES DE FARIAS, manifestou-se pela competência do Juízo suscitado. (fls. 88/93).

6.É o que havia de relevante para relatar.

VOTO

PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INQUÉRITO POLICIAL. AGRESSÕES FÍSICAS CONTRA MENORES INTERNADOS NA APAE. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSUNÇÃO DA CONDUTA NO DELITO DE MAUS TRATOS (ART. 136 DO CPB) ANTE A NÃO VERIFICAÇÃO, AO MENOS ATÉ ESTA ALTURA, DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO ESPECÍFICO DESTE DELITO (PARA FIM DE EDUCAÇÃO, ENSINO, TRATAMENTO OU CUSTÓDIA), MAS SIM DO PROPÓSITO DE CAUSAR SOFRIMENTO, PRÓPRIO DO CRIME DE TORTURA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL. PARECER MINISTERIAL PELA COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA 1a. VARA CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI, O SUSCITADO.

1. Para que se configure o delito de maus tratos é necessária a demonstração de que os castigos infligidos tenham por fim a educação, o ensino, o tratamento ou a custódia do sujeito passivo, circunstâncias que não se evidenciam na hipótese. Precedente desta Corte.

2.A conduta verificada nos autos encontra melhor adequação típica na descrição feita pelo art. 1o., II da Lei 9.455/97 - tortura, o que não exclui a possibilidade de outra definição do fato se verificado, depois de realizada mais aprofundada cognição probatória, serem outras as circunstâncias delitivas.

3.Parecer ministerial pela declaração de que competente o suscitado.

4.Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 1a. Vara Criminal de São João Del Rei/MG, o suscitado.

1.O bem lançado parecer ministerial indicou a convicção de seu subscritor pela competência do Juízo de Direito da Vara Criminal, suscitado. Fê-lo nos seguintes termos:

Tem-se que o conflito merece ser acolhido e reconhecida a competência do MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de São João Del Rei/MG.

Com efeito, razão assiste ao ilustre Suscitante, cujos fundamentos de sua decisão devem ser acatados.

Na hipótese, consta do relatório da Autoridade Policial (fls. 60/61) que crianças deficientes internos na Casa Lar, mantida pela APAE, teriam sofrido agressões físicas praticadas pelas funcionárias Terezinha Celeste de Miranda e Maria Aparecida Lopes Silva, que as tinham sob guarda naquela instituição.

Nesse caso, conforme bem observou o MM. Juízo Suscitante, tem-se que, em tese, as condutas se amoldam ao artigo 1º, inciso II, da Lei 9455/97.

A propósito, cita-se o que dispõe sobre o tema Eduardo Arantes Burihan (in A Tortura Como Crime Próprio, ed. Juarez de Oliveira, 2008, pág. 101/102)

O advento da Lei 9.455/1997 fez emergir um aparente conflito entre os crimes de maus tratos (art. 136 do CP) e o art. 1º, II, da Lei de Tortura.

O sujeito ativo nas duas modalidades delitivas é o mesmo. Ambos requerem que o crime seja praticado por pessoa que exerce guarda ou autoridade sobre outra.

Parece que a semelhança pára por ai. O delito de maus tratos apresenta um elemento subjetivo totalmente diverso do crime previsto no art. 1º, II, da Lei de Tortura. Enquanto no crime de maus tratos a finalidade estampada é a educação. ensino. tratamento ou custódia do sujeito passivo. no crime de tortura o objetivo colimado é o de causar intenso sofrimento físico ou mental. Ademais. o tipo de maus tratos se perfaz com a privação de alimentação ou cuidados indispensáveis; com a sujeição a trabalho excessivo ou inadequado e. por fim, com o abuso dos meios de correção ou disciplina. O art. 1º, II da Lei de Tortura, utiliza-se do intenso sofrimento físico ou mental como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Sérgio Salomão Schecaira, reportando-se a Lei de Tortura, faz a seguinte indagação: A conduta do pai que, ao exceder-se em seu ius corrigendi, bate em seu filho, sobre quem tem a guarda, mesmo sem lhe causar lesão, como forma de castigo pessoal, praticaria a figura descrita no art. 1º, II? No nosso entender, melhor seria se o legislador arrolasse as condutas assemelhadas de forma a delimitar o alcance do tipo, como se fez no anteprojeto do Código Penal de 1994.

O melhor critério para diferenciar as duas figuras. segundo nos parece, é o da verificação do elemento volitivo de cada um dos crimes em questão. Se o fim colimado era o de educação, ensino, tratamento ou custódia estamos diante do crime de maus tratos. Agora, se o sofrimento físico ou mental causado na vítima tinha por fim o castigo desarrazoado. o exercício de sadismo ou qualquer outro motivo desprezível, o crime é o de tortura. nos moldes do art. 1º, inciso II, da referida Lei.

Ante o exposto, opina o Ministério Público Federal para que seja conhecido o presente e declarado competente o MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de São João Del Rei/MG, ora Suscitado.

2.Tem-se que, de fato, os autos não trazem indicativos de que o caso sob apuração possa subsumir-se no delito de maus tratos (art. 136 do CPB). Para que se configure esse tipo é necessária a demonstração de que os castigos infligidos tenham por fim a educação, o ensino, o tratamento ou a custódia do sujeito passivo, circunstâncias que não se evidenciam na hipótese.

3.Confira-se, a propósito, a orientação desta Corte:

CRIMINAL. RESP. TORTURA QUALIFICADA POR MORTE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME DE MAUS-TRATOS QUALIFICADO PELA MORTE PROMOVIDA PELO TRIBUNAL A QUO. REVISÃO DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07/STJ. RECURSO NÃO-CONHECIDO.

I.A figura do inc. II do art. 1o., da Lei n.º 9.455/97 implica na existência de vontade livre e consciente do detentor da guarda, do poder ou da autoridade sobre a vítima de causar sofrimento de ordem física ou moral, como forma de castigo ou prevenção.

II.O tipo do art. 136, do Código Penal, por sua vez, se aperfeiçoa com a simples exposição a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, em razão de excesso nos meios de correção ou disciplina.

III.Enquanto na hipótese de maus-tratos, a finalidade da conduta é a repreensão de uma indisciplina, na tortura, o propósito é causar o padecimento da vítima.

IV.Para a configuração da segunda figura do crime de tortura é indispensável a prova cabal da intenção deliberada de causar o sofrimento físico ou moral, desvinculada do objetivo de educação.

V.Evidenciado ter o Tribunal a quo desclassificado a conduta de tortura para a de maus tratos por entender pela inexistência provas capazes a conduzir a certeza do propósito de causar sofrimento físico ou moral à vítima, inviável a desconstituição da decisão pela via do recurso especial.

VI.Incidência da Súmula 07/STJ, ante a inarredável necessidade reexame, profundo e amplo, de todo conjunto probatório dos autos.

VII.Recurso não conhecido, nos termos do voto do relator (REsp. 610.395/SC, Rel Min. GILSON DIPP, DJU 02.08.04).

4.Dessa forma, a conduta até então verificada nos autos encontra melhor adequação típica na descrição feita pelo art. 1o., II da Lei 9.455/97, ante o possível propósito de causar sofrimento (fls. 75), o que não exclui a possibilidade de outra definição do fato, se verificado, depois de realizada mais aprofundada cognição probatória, serem outras as circunstâncias delitivas.

5.É competente, portanto, o Juízo de Direito da Vara Criminal, uma vez que o espectro de penas do delito em tese ultrapassa aquele previsto no art. 61 da Lei de Juizados Especiais.

6.Ante o exposto, conheço do conflito, para declarar competente Juízo de Direito da 1a. Vara Criminal de São João Del Rei/MG, o suscitado.

7.É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

TERCEIRA SEÇÃO

Número Registro: 2009/0016929-7 CC 102833 / MG

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 100000599826 10000094898715 60503897 625060503897 625060610833 6542005

EM MESA JULGADO: 26/08/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. WAGNER NATAL BATISTA

Secretária
Bela. VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO

AUTUAÇÃO

AUTOR: JUSTIÇA PÚBLICA

RÉU: EM APURAÇÃO

SUSCITANTE: JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI - MG

SUSCITADO: JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CRIMINAL DE SÃO JOÃO DEL REI - MG

ASSUNTO: DIREITO PROCESSUAL PENAL

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado, Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de São João Del Rei - MG, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Votaram com o Relator os Srs. Ministros Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Felix Fischer, Arnaldo Esteves Lima e Maria Thereza de Assis Moura.

Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves.

Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Laurita Vaz.

Brasília, 26 de agosto de 2009

VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO
Secretária

Documento: 907577

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 10/09/2009




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