Anúncios


quarta-feira, 30 de setembro de 2009

JURID - HC. Paciente denunciado por incurso do art. 213 do CP. [30/09/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Paciente denunciado por incurso nos termos do art. 213, caput, c/c art. 14, inc. II, todos do CP.


Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

HABEAS CORPUS Nº 90591/2009 - CLASSE CNJ - 307 - COMARCA DE ÁGUA BOA

IMPETRANTES: DR. WILSON MASSAIUKI SIO JUNIOR E OUTRO(s)

PACIENTE: SAMUEL RODRIGUES DE OLIVEIRA

Número do Protocolo: 90591/2009

Data de Julgamento: 08-9-2009

EMENTA

HABEAS CORPUS - PACIENTE DENUNCIADO POR INCURSO NOS TERMOS DO ART. 213, CAPUT, C/C ART. 14, INC. II, TODOS DO CP - IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA - PRETENDIDO TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR FALTA DE JUSTA CAUSA E FALTA DE PROVAS A INCRIMINAR O PACIENTE OU DESCLASSIFICAÇÃO DO ESTUPRO TENTADO PARA O DELITO DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO - IMPOSSIBILIDADE - FATOS QUE, EM TESE, PODEM CARACTERIZAR O DELITO IMPUTADO AO PACIENTE - HIPÓTESE QUE DEMANDA À NECESSÁRIA DILAÇÃO PROBATÓRIA - ALEGAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE DO RECONHECIMENTO DO PACIENTE, DESRESPEITANDO OS ARTIGOS 226 A 228 DO CPP - ATO PREJUDICIAL NÃO EVIDENCIADO - WRIT NEGADO.

Só se justifica a concessão de habeas corpus para o trancamento da ação penal quando a ilegalidade resulta demonstrada pela simples exposição dos fatos, quando atípicos, ou pela ausência de qualquer elemento indiciário que dê fundamento à acusação, bem como constituindo meio impróprio para análise do pleito de desclassificação do crime de estupro tentado para violação de domicílio.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA

Egrégia Câmara:

Trata-se de Habeas corpus impetrado em favor de SAMUEL RODRIGUES DE OLIVEIRA, acusado e denunciado pelo Ministério Público Estadual de infringir, em tese, o artigo 213, c/c 14, II, todos do Código Penal, por cinco vezes, tendo como autoridade coatora o Meritíssimo Juiz de Direito da Comarca de Água Boa-MT.

Visa o Paciente, trancamento da ação penal n° 190/2009, por ausência de justa causa, asseverando não haver indícios de autoria quanto ao crime em testilha, pois, as supostas vítimas não ostentam versões capazes de incriminar o Paciente, uma vez que, não há comprovação de contato físico contra as mesmas, carecendo do tipo subjetivo capitulado no artigo 213 do CP, alegando, portanto, atípica sua conduta. Afasta ainda, possível crime de ato obsceno previsto no artigo 233 do CP, e artigo 61 da Lei de Contravenções Penais.

Informa, ainda, que o reconhecimento do Paciente foi feito de forma equivocada, desprezando os procedimentos capitulados nos artigos 226 a 228 do Código de Processo Penal.

Por fim, assevera que, caso tenha a confirmação de que o Paciente tenha adentrado nas residências das vítimas, não praticou o crime capitulado na denuncia - estupro tentado -, mas sim de violação de domicílio (artigo 150 do CP).

Assim, busca o trancamento da ação penal por falta de justa causa, devendo ser expedido alvará de soltura nos termos do artigo 648 do CPP, podendo ter, o Paciente, praticado o crime de violação de domicílio, sem a intenção de prática sexual contra as vítimas, em virtude de transtornos psicológicos, devendo, igualmente, ser concedida sua liberdade para tratamento em clínica, na cidade de Água Boa-MT, onde reside sua família (fls. 02/19-TJ).

A liminar foi indeferida às fls. 171/172-TJ, pelo Des. Rui Ramos Ribeiro, sendo requisitadas as informações à autoridade coatora, as quais aportaram às folhas 177/184-TJ, informando o MM. Juiz que o Paciente teve sua prisão preventiva decretada visando a manutenção da ordem pública, levando em consideração a quantidade de condutas praticadas, a natureza e a gravidade dos delitos, vindo posteriormente indeferir o pedido de liberdade provisória por estarem presentes a materialidade, indícios suficientes de autoria e ordem pública diante da conduta de invadir as residências das vítimas despido e masturbando-se, ameaçando-as quando sozinhas e evadindo-se do local quando alertado da presença de terceiros.

Instada a manifestar-se a Procuradoria Geral de Justiça na lavra da Dra. VALÉRIA PERSSOLI BERTHOLDI, opina pela denegação da ordem, alegando que ao contrário dos argumentos da defesa, há provas da materialidade e indícios suficientes de autoria, não havendo que se falar em trancamento da ação penal por justa causa, sendo que, esta via estreita não comporta valoração aprofundada de provas, devendo os pontos trazidos pelo Impetrante serem esclarecidos durante a instrução criminal, estando, igualmente, fundamentada a decisão a quo, que indeferiu o pleito liberatório do Paciente (fls.188/195-TJ).

É o relatório.

P A R E C E R (ORAL)

O SR. DR. JOÃO BATISTA DE ALMEIDA

Ratifico o parecer escrito.

V O T O

EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Conforme relatado, visa o Impetrante, o trancamento da ação penal nº 190/09, que é movida contra o Paciente, por ter praticado, em tese, crime previsto no artigo 213, c/c artigo 14, II, ambos do CP, com a conseqüente liberdade provisória, alegando falta de justa causa para o processamento da ação penal, aduzindo não haver prova de que o Paciente tenha praticado o crime em testilha.

Aduz que o ato praticado pelo Paciente, de adentrar e permanecer nas residências das supostas vítimas ensejaria o crime de violação de domicílio (artigo 150 do CP) ou perturbação da tranqüilidade (artigo 65 do Decreto Lei nº 3.688/41), devendo, ainda assim, ser concedido a liberdade provisória do Paciente para tratamento em clínica na cidade de Água Boa-MT, por se tratar, o Paciente, de pessoa com problemas psicológicos.

Consta dos autos informativos (fls. 21/26) que o Paciente ingressou no quintal da residência da vítima IVONE OLIVEIRA DOS SANTOS no dia 16-02-09, mostrando suas partes íntimas, sendo visto pela vítima que, assustada, acionou a polícia, e, novamente no dia 07-6-09, o Paciente retornou e foi visto próximo ao muro da casa, deixando rastro - pegadas - no quintal da residência (fotos juntadas às fls. 36/37-TJ).

No dia 16 de fevereiro de 09, o Paciente ingressou na residência da vítima ADELAIDE DE SOUZA, e, batendo na porta pedindo para que fosse aberta, senão derrubaria e estupraria a vítima, tendo, esta informado, que o fato já havia acontecido varias vezes.

No mês de abril, por volta das 04h, o Paciente ingressou na residência de LUCYMEIRE RODRIGUES DE JESUS, que ao acordar verificou ter alguém ligado a luz da cozinha e, permanecendo calada, viu o Paciente aproximando da porta do quarto da vítima e começou a mostrar o pênis e fazer gestos obscenos, tendo a vítima gritado por socorro, onde o Paciente veio a evadir-se do local, posteriormente reconhecido o mesmo na polícia.

No mês de maio de 2009, o Paciente entrou no interior da residência da vítima ELAYNE FERNANDES LEITE, ao passo que a mesma correu para o quarto e o Paciente/acusado correu atrás, e, segurando seu órgão genital falava palavras obscenas - eu só quero gozar -, sendo que o namorado entrou na residência, e ao fazer barulho na porta, o Paciente evadiu-se pelos fundos.

No mês de maio de 2009, o Paciente ingressou na residência da vítima IVANI MARQUES SORAES, e batendo na porta dizia que ainda iria estuprar a vítima, tendo a vítima acionado a polícia.

Já no mês de Junho por quatro vezes o denunciado forçava a janela da residência da vítima LEILA DE MORAES LOURENÇO SOUTO, sendo que sempre acionava a polícia, porém, o Paciente/acusado evadia-se do local, vindo a reconhecê-lo na polícia, posteriormente.

Por fim, ainda no mês de junho do mesmo ano, nos dias 05 e 06, por volta das 22h, o Paciente veio a ingressar na residência da vítima LARISSA FERRARI, batendo em sua porta, que também veio a reconhecer o Paciente na Polícia.

Pois bem, o impetrante alega que não há provas suficientes para o prosseguimento da ação processual contra o Paciente, negando seu envolvimento do no crime de tentativa de estupro, porém, tenho que para o trancamento da ação penal seria necessário estar evidentemente manifesto que o Paciente não seria o autor do delito que ora lhe é imputado.

Sucede, no entanto, conforme supra citado, sobejamente demonstrado que há fortes indícios da participação do Paciente no crime e presentes, portanto, os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, uma vez que contém a exposição do fato criminoso, com suas circunstâncias essenciais, a qualificação do acusado, a classificação do crime e o rol de testemunhas.

Ao contrário do alegado pelo Impetrante, há testemunhas - conforme ressai das fls. 45-TJ, e 51-TJ - que reconheceu o Paciente como sendo a pessoa que entrou em sua residência. Assim, apesar de haver discordância entre o tipo físico do acusado, torna-se necessário o exame aprofundado das versões apresentadas no arcabouço probatório, pois, ao contrário do alegado pelo Impetrante, existem nos autos fortes indícios de que o Paciente venha a ser o autor das práticas libidinosas.

Nesse aspecto, é cediço que o habeas corpus constitui meio impróprio para a análise de alegações controvertidas que exijam o reexame dos elementos de provas, portanto, para se alcançar a real certeza dos acontecimentos, deve-se revolver todo o conjunto probatório, o que é inviável na via estreita do presente mandamus. E, as colocações e os argumentos apresentados pelo Impetrante, de negativa de autoria e falta de justa causa, dizem respeito ao mérito e exigem aprofundada análise de provas, cabendo ao juízo a quo, se for o caso, mudar a tipificação do crime, o que será possível depois de ouvir as testemunhas e o Paciente em juízo.

Havendo razoável aparência de realidade em ser o Paciente autor do ilícito penal, não se pode trancar a ação penal por meio de habeas corpus, a pretexto de não estar provado o que o Órgão Ministerial pretende demonstrar no decorrer da instrução criminal.

Sobre a possibilidade do trancamento da ação penal, a jurisprudência, verbis:

TJMT: "Não há que se cogitar no trancamento da ação penal, por falta de justa causa, quando a conduta imputada ao paciente descreve fato típico e ainda, quando a constatação do fundamento do writ depende de acurada análise de prova, inviável em sede de habeas corpus. Ação mandamental indeferida." (HC nº 3730/2006, Primeira Câmara Criminal, Rel. Shelma Lombardi de Kato, J. 21-02-2006). (Grifei).

TJMT: "Só se justifica a concessão de habeas corpus por falta de justa causa para a ação penal quando a ilegalidade resulta demonstrada pela simples exposição dos fatos, quando atípicos, ou pela ausência de qualquer elemento indiciário que dê fundamento à acusação." (HC Nº 113124/07, Primeira Câmara Criminal, Rel. Shelma Lombardi de Kato, J. 29-01-08).

STF: "Se a denúncia descreve fato criminoso, em todos os seus elementos, de tal maneira que autorize um juízo de suspeita de crime (e não de certeza) merece ela havida como eficaz ou apta e não inepta, donde a configuração de justa causa para a acusação." (RTJ 59/2). (Grifei).

Dessa forma, nada existe a demonstrar a inexistência do delito com a evidência necessária para o trancamento da ação penal, a qual possui indícios suficientes de autoria, mostrando-se precoce o arquivamento da ação penal instaurada contra o paciente, antes do devido processo legal, que comporta o princípio do contraditório.

Quanto à alegação de que não foi realizado o reconhecimento formal do Paciente, nos termos do artigo 226 a 228 do CPP, restando prejudicado, ao argumento de que o Paciente não foi posto na presença da vítima, com outras pessoas de aparência semelhante com a do Paciente, não prospera.

Não se trata de ato obrigatório o proceder do reconhecimento com pessoas parecidas, como pretende o Impetrante, pois, o verbo do artigo 226 do CPP, e seus incisos, é flexível, ao mencionar a expressão "se possível", levando em conta, caso o acusado venha a ser reconhecido individualmente, não invalida o ato.

Nesse sentido vem o ilustre doutrinador Guilherme de Souza Nucci, in Código de Processo Penal, 5ª edição, p. 488, in verbis:

"Aquiescemos, nesse prisma, com a lição de tourinho, quando menciona que a expressão 'se possível' refere-se ' à existência de serem colocadas pessoas que guardem certas semelhanças com a que deve ser reconhecida' e não com a obrigatoriedade de colocação de várias pessoas lado a lado... não se reconhece ilegalidade no posicionamento do réu sozinho para o reconhecimento, pois o art. 226, II, do Código de processo Penal, determina que o agente será colocado ao lado de outras pessoas que com ele tiverem semelhança ' se possível', sendo tal determinação, portanto, recomendável mas não essencial..."

Ainda:

RSTJ: "O reconhecimento de pessoa não está vinculado, necessariamente, à regra do art. 226, do Código de Processo Penal. Se o criminoso é reconhecido pela testemunha, de plano, ao chegar à Delegacia de Polícia, onde aquele se encontrava, entre várias pessoas, não se há de anular o reconhecimento, desde que integrado no conjunto das provas que incriminam o acusado" (20/204-5).

Da mesma forma no que concerne ao pleito de desclassificação do delito capitulado na denúncia, certo é que sua análise demanda, igualmente, o revolvimento do conjunto fático probatório, não merecendo guarida. Neste sentido:

STJ: "O pedido de desclassificação da imputação de tráfico para uso de entorpecente, na hipótese, envolve o revolvimento de prova, impróprio em razão dos estreitos lindes do writ. 3. Ordem conhecida em parte e, nesta extensão, denegada". (HC 48233 / S. HABEAS CORPUS 2005/0157892-6. Relator(a): Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA. Órgão Julgador: T6 - SEXTA TURMA. Data do Julgamento: 14-8-2007. Data da Publicação/Fonte: DJ 03-9-2007, p. 226). (Grifei).

Por fim, a autoridade apontada como coatora, nas informações, fls. 177/184-TJ, asseverou que o pedido de liberdade provisória foi indeferido por estarem presentes os requisitos previstos nos artigo 312 do CPP, quais sejam a materialidade e indícios suficientes de autoria, bem como a ordem pública, uma vez que, o Paciente invadia as residências das vítimas por varias vezes, se masturbando e ameaçando-as, não havendo que se falar em constrangimento ilegal. Pontifico, outrossim, que a autoridade coatora atendeu ao pedido da defesa, instaurando o Incidente de Sanidade Mental do Paciente para esclarecimentos quanto á imputabilidade do mesmo, sendo certo que qualquer decisão tomada com referência aos argumentos trazidos pelo Impetrante, seria prematuro.

Logo, não há, por ora, a caracterização de coação ilegal apontado pela defesa do Paciente, em ver a Ação Penal trancada ou a conduta do Paciente capitulada na denúncia desclassificada, por carecer de provas pré constituídas, não sendo matéria desse presente mandamus a análise aprofundada de provas, e, estando presentes os requisitos que autorizam a custódia preventiva, a ordem deve ser denegada.

Diante dessas considerações, em consonância com o pronunciamento da douta Procuradoria-Geral de Justiça, DENEGO A ORDEM.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (Relator), DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (1º Vogal) e DES. RUI RAMOS RIBEIRO (2º Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, DENEGARAM A ORDEM, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Cuiabá, 08 de setembro de 2009.

DESEMBARGADOR PAULO INÁCIO DIAS LESSA - PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

DESEMBARGADOR JUVENAL PEREIRA DA SILVA - RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 15/09/09




JURID - HC. Paciente denunciado por incurso do art. 213 do CP. [30/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário