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segunda-feira, 21 de setembro de 2009

JURID - Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. [21/09/09] - Jurisprudência


Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. Concurso público. Anulação do certame.


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN

Apelação Cível n° 2009.006321-2

Origem: 1ª Vara Cível da Comarca de Ceará Mirim/RN.

Apelante: Município de Rio do Fogo.

Advogado: Thiago Cortez Meira de Medeiros. 4650/RN

Apeladas: Kaliane Alessandra Rodrigues de Paiva e outros.

Advogados: Renato Cirne Leite 6903/RNe outros.

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ANULAÇÃO DO CERTAME. NECESSIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. AUSÊNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRECEDENTES DO STF, STJ E TJRN. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 9ª Procuradoria de Justiça, conhecer da Apelação Cível e, sucessivamente, negar-lhe provimento, nos termos do voto do relator, parte integrante deste acórdão.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE RIO DO FOGO contra sentença proferida às fls. 240/246, pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Ceará Mirim/RN, que nos autos do Mandado de Segurança nº 102.09.000376-5, concedeu a ordem requerida e, por conseguinte, declarou "a nulidade do Decreto nº 003/2009, devendo o Prefeito Municipal de Rio do Fogo/RN, reintegrar os impetrantes nos seus respectivos cargos e funções aos quais foram nomeados".

2. Em razões de fls. 249/259, o Município, inicialmente, sustentou a necessidade de se atribuir a este recurso o efeito suspensivo, uma vez que caso tenha que reintegrar imediatamente os concursados, ocorrerá uma lesão as finanças públicas.

3. Salientou que a competência para a criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas é de iniciativa do Prefeito Municipal e sua tramitação deverá ocorrer na Câmara Municipal, conforme determinação dos arts. 30, IV e art. 57, IX da Lei Orgânica do Município de Rio do Fogo.

4. Afirmou que, no caso posto em apreciação, não tramitou perante a Câmara Municipal de Rio do Fogo nenhum projeto de lei que regulamentasse ou autorizasse a realização do concurso, bem como a criação dos cargos listados no Edital nº 001.08.

5. Asseverou que a nomeação de aprovados no período final do mandato em número excedente de vagas existentes gera nulidade, vez que cria despesas ao erário sem a correspondente dotação orçamentária, violando o disposto no art. 21, parágrafo único e art 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

6. Ressaltou que foi aberta no dia 03/01/2009 uma sindicância com o fim exclusivo de apurar as irregularidades.

7. Por fim, pugnou pelo conhecimento e improvimento do recurso.

8. Às fls. 294/305, os apelados apresentaram contrarrazões ao recurso, pelejando pelo seu conhecimento e improvimento.

9. Instada a se manifestar (fls. 70/74), a Nona Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e improvimento do recurso, mantendo-se inalterada a decisão de primeiro grau.

10. É o relatório. Segue o voto.

VOTO

11. Preenchidos os requisitos de admissibilidade conheço da presente Apelação Cível.

12. A discussão trazida à baila nos presentes autos cinge-se na possibilidade ou impossibilidade dos autores/apelados terem sido exonerados devido a ilegalidade apresentada no concurso público, sem a observância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

13. Entendo que não assiste razão ao Município Apelante pelas razões a seguir delineadas.

14. Dentre os inúmeros direitos fundamentais elencados no art. 5º da Constituição Federal, encontra-se expressamente previstos o direito ao devido processo legal, consubstanciado em um processo cuja observância do contraditório e da ampla defesa se torna imprescindível.

15. Tais direitos fundamentais, de cunho eminentemente processual, visam proteger os cidadãos do arbítrio cometido pelos Poderes Públicos na gerência de suas funções.

16. No que tange especificamente ao caso em análise, resta patente a ilegalidade perpetrada pela Municipalidade.

17. Ora, conforme se depreende da análise do contexto fático-probatório carreado aos autos, a exoneração dos apelados foi realizada sem a observância dos princípios constitucionais anteriormente citados.

18. De fato, o Município Apelante apenas comprovou a realização de uma sindicância para apurar a ilegalidade do concurso, sem contudo realizar um devido processo legal administrativo, oportunizando aos aprovados a mais ampla possibilidade de participação e influência nas decisões tomadas.

19. Outro não foi o entendimento do julgador singular:

"A bem verdade foi apenas instaurada uma sindicância que mesmo assim, não permitiu aos impetrantes o direito de se manifestarem a respeito de todo os fatos a eles imputados e de todas as provas contra eles produzidas. Não devemos olvidar que vivemos num estado democrático de direito, que os princípios do contraditório e da ampla defesa deve ser aplicado não só no ambito dos processos judiciais, mas também no processo administrativo, pois entender o contrário é restabelecermos o arbítrio estatal tão combatido e refutado nos dias atuais".

20. Interessante observar a lição de Alexandre de Morais:

"O devido processo legal tem como corolários a ampla defesa e o contraditório, que deverão ser assegurados aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, conforme o texto constitucional expresso (art. 5º, LV). Assim, embora no campo administrativo, não exista a necessidade de tipificação estrita que subsuma rigorosamente a conduta à norma, a capitulação do ilícito administrativo não pode ser tão aberta a ponto de impossibilitar o direito de defesa, pois nenhuma penalidade poderá ser imposta, tanto no campo judicial, quanto nos campos administrativos ou disciplinares, sem a necessária amplitude de defesa".(1) (grifei)

21. Este Egrégio Tribunal de Justiça já se pronunciou diversas vezes acerca do tema, vejamos:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. DECISÃO QUE DEFERIU PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA QUE RESULTOU NA EXONERAÇÃO DE SERVIDORES DO QUADRO FUNCIONAL DA MUNICIPALIDADE. PRELIMINARES DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO SUSCITADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO E PELA PARTE AGRAVADA. REJEIÇÃO. MÉRITO. NULIDADE DE NOMEAÇÕES PARA CARGO PÚBLICO. EXONERAÇÃO SUMÁRIA. APROVAÇÃO EM CONCURSO DEVIDAMENTE COMPROVADA. NOMEAÇÕES ADVINDAS DE CERTAME HOMOLOGADO EM PERÍODO ANTERIOR AOS 03 (TRÊS) MESES QUE ANTECEDERAM O PLEITO ELEITORAL. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 73, INCISO V, ALÍNEA C, DA LEI 9.504/97. INTERPRETAÇÃO PAUTADA NO EXAME SISTEMÁTICO DO ART. 37, INCISO II, E ART. 169, §1º, INCISO I, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 21, INCISO I, DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E LEI DAS ELEIÇÕES (LEI Nº 9.504/97). PRECEDENTES DESTA CORTE. DESCONSTITUIÇÃO DO VÍNCULO ADMINISTRATIVO DE FORMA UNILATERAL. FLAGRANTE DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. REFORMA DA DECISÃO DE QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (grifei) (TJRN - AI nº 2009.000954-8. 1ª Câmara Cível. Rel. Des. Expedito Ferreira, j. 07/07/2009)

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO PARA RECORRER. REJEITADA. PRELIMINAR DE DEFEITO DE REPRESENTAÇÃO DO APELANTE. REJEITADA. CONCURSO, APROVAÇÃO, NOMEAÇÃO E POSSE. EXONERAÇÃO. ATO UNILATERAL. AUSÊNCIA DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. ILEGALIDADE. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA E DA APELAÇÃO.

- Servidores concursados, nomeados e empossados não podem ser afastados sem a instauração do contraditório e da ampla defesa. (grifei) (TJRN - AC nº 2002.000580-6. 3ª Câmara Cível. Rel. Des, Osvaldo Cruz, j 22/09/2005).

22. Corroborando com este entendimento, colaciono jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF:

EMENTA: Embargos de declaração em recurso extraordinário. 2. Anulação de concurso. Inobservância dos princípios da ampla defesa e do contraditório. Necessidade de instauração de procedimento administrativo para apurar irregularidades e promover a defesa. 3. Embargos de declaração acolhidos para prestar esclarecimentos. (grifei) (STF - RE 351489 ED / PR - PARANÁ. Segunda Turma. Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 25.04.2006)

23.Esta matéria inclusive foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO CONVERTIDO EM RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO.ANULAÇÃO. EXONERAÇÃO. SERVIDORES NOMEADOS E EMPOSSADOS.CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. INOBSERVÂNCIA. ART. 21, § 2º, I, DA

LEI N.º 8.666/93. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SÚMULA Nº 7/STJ.

I - É vedada a exoneração de servidor em razão de anulação de concurso público sem que lhe seja oportunizado o contraditório e a ampla defesa. Precedentes.

II - (...)

III - (...).

IV - Inviável o exame da alegada ausência de direito líquido e certo, porquanto verificar a existência nos autos de prova pré-constituída das situações e dos fatos que embasam o direito da impetrante demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, o que encontra óbice no Enunciado nº 07 da Súmula desta Corte.

Agravo regimental desprovido. (grifei) (STJ - AgRg no Ag 824703 / PI. QUINTA TURMA. Rel. Min. Feliz Fischer, j. 24/04/2007)

24. O tema, inclusive, foi objeto de enunciado de Súmula do Colendo Supremo Tribunal Federal, notadamente a de nº 20, que ressalta a ilegitimidade da exoneração de servidor público admitido por concurso, quando o respectivo ato não é antecedido de procedimento em que se possibilite a defesa do interessado, vejamos:

"Súmula 20 - É necessário processo administrativo com ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso".

25. Ademais, em que pese as alegações do Município Apelante de que houve violação de diversos dispositivos infraconstitucionais, as leis constitucionais por encontrarem em um grau hierarquicamente superior, devem prevalecer.

26. À luz do exposto, conheço da apelação e, sucessivamente, nego-lhe provimento, mantendo incólume os termos da decisão hostilizada.

É como voto.

Natal, 01 de setembro de 2009.

Des. Cristóvam Praxedes
Presidente

Des. Vivaldo Pinheiro
Relator

Dr. Paulo Roberto Dantas de Souza Leão
13º Procurador de Justiça




Notas:

1 - MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2004. [Voltar]




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