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terça-feira, 1 de setembro de 2009

JURID - Cominatória para cumprimento de obrigação de fazer. [01/09/09] - Jurisprudência


Cominatória para cumprimento de obrigação de fazer. Fornecimento de tratamento médico/cirúrgico à paciente portador de moléstia grave.


Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT

QUARTA CÂMARA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 45092/2009 - CLASSE CNJ - 202 - COMARCA DE VÁRZEA GRANDE

Número do Protocolo: 45092/2009 Data de Julgamento: 20-7-2009

AGRAVANTE: ESTADO DE MATO GROSSO

AGRAVADO: JONATHAN DE ALMEIDA E SILVA

EMENTA

COMINATÓRIA PARA CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - I) FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO/CIRÚRGICO À PACIENTE PORTADOR DE MOLÉSTIA GRAVE - IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL -

DESNECESSIDADE DE FORMALIDADE BUROCRÁTICA - PROTEÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS - DIREITO À VIDA E À SAÚDE - II) MULTA COMINATÓRIA - CABIMENTO - RECURSO DESPROVIDO.

I) Cumpre ao Estado e/ou ao Município, assegurar a todos cidadãos o direito à saúde, conforme previsão constitucional, sem demorada formalidade burocrática, sobretudo no fornecimento de tratamento médico/cirúrgico, quando se tratar de moléstia grave e com atendimento de urgência.

II) A aplicação de multa cominatória é indubitavelmente o meio mais eficaz de conferir efetividade em condenações de obrigação de fazer, servindo de coação legal para que o agente público cumpra a ordem judicial.

RELATÓRIO

EXMO. SR. DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES

Egrégia Câmara:

Cuida-se de Recurso de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Estado de Mato Grosso, contra a decisão interlocutória proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande, que nos autos da "Ação Cominatória para Cumprimento de Obrigação de Fazer", concedeu parcialmente liminar para que o agravante "no prazo de CINCO dias marque data para realização de procedimento de adaptação de prótese PROREX no olho direito da parte autora, JONATHAN ALMEIDA E SILVA, em prazo não superior a SESSENTA dias", sob pena de incorrer em multa diária no valor de R$100,00 (cem reais). (fls.16/18- TJ).

Em suas razões recursais, postula o agravante pela suspensão da liminar deferida mediante a concessão do efeito suspensivo e, no mérito a revogação da decisão proferida, ao argumento de que a concessão da presente medida passa a priori pela análise administrativa além de pesquisas e atestados dos profissionais (médicos) servidores ou credenciados ao Estado de Mato Grosso, em razão de estarem dentro das esferas de competência, regulamentação, controle e fiscalização, conforme estabelece o artigo 197 da Constituição Federal.

Por esta razão, prossegue sustentando o agravante, a vertente violação ao artigo 2º e 60, § 4°, inciso III, da CF face da desconsideração da decisão combatida porquanto a atribuição e competência da SES/MT na organização do complexo sistema de concessão de medicamentos excepcionais. Ademais, aduz que não pode a Administração dispor de despesas que excedam o orçamento.

Por fim, quanto à imposição de multa cominatória, insurge-se ainda o agravante sob a alegação de exorbitância e afronta direta ao disposto no artigo 412 do Código Civil.

Em contraminuta, pugna o agravado pela conversão do recurso à forma retida e no mérito, pelo desprovimento do presente recurso e, via de conseqüência, a manutenção da decisão recorrida. (fls.45/53).

As folhas 36/37-TJ fora indeferido o postulado efeito suspensivo.

As informações foram devidamente prestadas às folhas 55-TJ.

A douta Procuradoria Geral de Justiça, em judicioso parecer, manifestou-se pelo DESPROVIMENTO do presente recurso (fls.60/64 - TJ).

É o relatório.

P A R E C E R (ORAL)

O SR. DR. ASTÚRIO FERREIRA DA SILVA FILHO

Ratifico integralmente o parecer escrito.

VOTO (DA PRELIMINAR DE INADMISSIBILIDADE DO AGRAVO SOB A FORMA DE INSTRUMENTO)

EXMO. SR. DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Argui o agravado às fls. 46/47-TJ a preliminar de não cabimento do recurso de agravo na forma de instrumento, uma vez que não houve a necessária demonstração de que a decisão de primeiro grau causará danos irreparáveis e de difícil reparação ao agravante.

A preliminar ora levantada não merece ser acolhida

Isso porque, tratando-se de agravo interposto contra decisão que concedeu parcialmente pedido liminar para o fornecimento de tratamento médico/cirúrgico, resta evidenciada a possibilidade de dano irreparável e de difícil reparação, e, portanto, totalmente cabível a forma de instrumento, nos termos do artigo 522 do CPC, uma vez que se trata o agravado de paciente portador de doença grave.

Assim, rejeita-se a preliminar.

É como voto.

VOTO (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Conforme visto no relatório, cuida-se de recurso de agravo de instrumento, contra a decisão que, em "ação cominatória para cumprimento de obrigação de fazer", deferiu parcialmente pedido liminar, determinando ao Estado de Mato Grosso o fornecimento de procedimento de adaptação de prótese PROREX no olho direito de Jonathan de Almeida e Silva. (fls.16/18 - TJ).

A decisão agravada está assim fundamentada:

"(...)

O requisito da relevância do fundamento da demanda (fumus boni iuris) se consubstancia nos princípios constitucionais elencados nos artigos 6° e 196 da Constituição Federal, que impõe ao Poder Público (Executivo) a obrigação de garantir o acesso universal e igualitário das necessidades imprescindíveis para a saúde dos cidadãos, assegurando assim, às pessoas carentes, a distribuição gratuita de medicamentos e realização de exames e procedimentos cirúrgicos destinados ao adequado tratamento médico.

De outro lado, o receio de ineficácia do provimento se concedido somente ao final (periculum in mora) é igualmente verificado, mormente diante do risco de agravamento da doença, uma vez que, conforme Formulário de Solicitação de Exame e Atestado Médico juntado às fls. 22/23, verifica-se que anteriormente o paciente foi tratado com tumor, quando então teve a perda do olho direito.

Assim, restando preenchidos os requisitos legais, a concessão da medida liminar pleiteada é medida que se impõe." (fls. 16/18-TJ).

De ver que, no vertente recurso a objeção é no sentido de que deve o paciente, ora agravado, se submeter a procedimento administrativo próprio, a saber, avaliações, pesquisas, e análises devidamente executadas e prescritas pelos seus profissionais (os credenciados/conveniados do Estado), para então receber efetivamente o medicamento.

Ademais, o agravante alega que a prestação de assistência à saúde tem que ser feita de forma ordenada, dentro da política traçada pelo Ministério da Saúde, por meio de suas Portarias e Protocolos Clínicos.

Incontestável no meu sentir que, em havendo a possibilidade de se colocar o efetivo tratamento médico ao alcance do agravado e sendo o seu estado de saúde bastante crítico, como restou demonstrado, entendo que deve o Estado e/ou o Município, fornecer o tratamento pertinente, até porque, no tocante à saúde e, em casos como este, qual seja, de extrema urgência, toda a burocracia deve ser quesito secundário.

Deste modo, o fornecimento de medicação/tratamento médico não está restrito ao Protocolo Clínico do Ministério da Saúde, não podendo a ausência de indicação do medicamento postulado prejudicar a saúde do autor, mormente porque restou comprovado nos autos a necessidade do tratamento médico/cirúrgico, bem como a urgência e impossibilidade financeira do agravado em realizá-lo.

Assim, em obediência ao comando Constitucional fora editada a Lei n° 8.080/90 que impõe a assistência terapêutica integral, inclusive, farmacêutica, devendo o Estado e/ou Município, assegurar a todo e qualquer cidadão o direito à saúde, não se atendo à demorada burocracia do cumprimento das vias administrativas e tributárias.

Nessa esteira de raciocínio, trago à colação julgados do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e do STJ:

"DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO A PACIENTE PORTADOR DE HEPATITE B. ATENDIMENTO AO PROTOCOLO CLÍNICO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. DESNECESSIDADE. Existindo documentação idônea, firmada por médico credenciado, consistente em laudo médico, onde descrita a moléstia das quais padece o enfermo, e apontando os medicamentos necessários, não está o fornecimento da medicação restrito ao Protocolo Clínico do Ministério da Saúde, não podendo a ausência de indicação do medicamento postulado prejudicar o autor, mormente porque a medicação foi prescrita pelo médico do demandante, sendo indevida a atribuição de outros medicamentos ao paciente, porque o médico que lhe assiste possui melhores condições de prescrever o tratamento correto. O direito à saúde é assegurado a todos, devendo os necessitados receber do ente público os medicamentos necessários. Aplicação do artigo 196 da Constituição Federal. Posição do 11º Grupo Cível. Precedentes do TJRGS e STJ.(...) Apelação a que se nega seguimento." (Apelação Cível Nº 70028530079, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 26-02-009).(Grifo Nosso).

"CONSTITUCIONAL - RECURSO ORDINÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA OBJETIVANDO O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (RILUZOL/RILUTEK) POR ENTE PÚBLICO Á PESSOA PORTADORA DE DOENÇA GRAVE : ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA - ELA- PROTEÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS - DIREITO À VIDA -(ART.5º, CAPUT, CF/88) E DIREITO À SAÚDE (ARTS. 6º E 196, CF/88) - ILEGALIDADE DA AUTORIDADE COATORA NA EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE FORMALIDADE BUROCRÁTICA.

1- A existência, a validade, a eficácia e a efetividade da Democracia está na prática dos atos administrativos do Estado voltados para o homem. A eventual ausência de cumprimento de uma formalidade burocrática exigida não pode ser óbice suficiente para impedir a concessão da medida porque não retira, de forma alguma, a gravidade e a urgência da situação da recorrente: a busca para garantia do maior de todos os bens, que é a própria vida. 2- É dever do Estado assegurar a todos os cidadãos, indistintamente, o direito à saúde, que é fundamental e está consagrado na Constituição da República nos artigos 6º e 193.3 - Diante da negativa/omissão do Estado em prestar atendimento à população carente, que não possui meios para a compra de medicamentos necessários à sua sobrevivência, a jurisprudência, vem se fortalecendo no sentido de emitir preceitos pelos quais os necessitados podem alcançar o benefício almejado (STJ, AG nº 238.328/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 11/05/99, Resp nº 249.026/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 26/06/2000). 4- Despicienda de quaisquer comentários a discussão a respeito de ser ou não a regra dos arts. 6º e 196, da CF/88, normas programáticas ou de eficácia imediata. Nenhuma regra hermenêutica pode sobrepor-se ao princípio maior estabelecido, em 1988, na Constituição Brasileira, de que "a saúde é direito de todos e dever do Estado" (art.196). 5 - Tendo em vista as particularidades do caso concreto, faz-se imprescritível interpretar a lei de forma mais humana. Teleológica, em princípios de ordem ético-jurídica conduzam ao único desfecho justo: decidir pela preservação da vida. 6- Não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da Lei, e sim, considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador, mormente perante preceitos maiores insculpidos na Carta Magna garantidores do direito à saúde, à vida e à dignidade humana, devendo-se ressaltar o atendimento das necessidades básicas dos cidadãos. 7- Recurso ordinário provido para o fim de compelir o ente público (Estado do Paraná) a fornecer o medicamento Riluzol (Rilutek) indicado para o tratamento da enfermidade da recorrente." (STJ-ROMS 11183 - PR - 1ª T. Rel. Min. José Delgado - DJU 04-9-2000- p. 00121).(fls.176/178).

Como se vê, a jurisprudência pátria, em reiterados julgados, vem decidindo no sentido de que o Estado/Município deve ser compelido a atender àqueles que necessitam de tratamento médico/hospitalar e medicamento para suprir casos graves e de urgência visando a garantir a sobrevivência deles, independente de formalidade burocrática.

Diante disto, não há que se falar em inexistência de previsão orçamentária, uma vez que caracterizada a urgência do atendimento devido à parte demandante, primando-se pelo direito à vida acima de tudo.

Quanto à irresignação do agravante acerca da aplicação de multa cominatória, esta também não merece guarida. É que, já se firmou o entendimento de que é cabível a cominação das astreintes contra o agente público, em questões como a dos autos, com o fito de assegurar o resultado prático equivalente ao adimplemento da obrigação.

Para corroborar este entendimento faz-se oportuna a transcrição de jurisprudência extraída do E. Tribunal de Justiça do RS:

"DIREITO PÚBLICO. DIREITOS À VIDA E À SAÚDE. MEDICAMENTOS. MULTA. Cabível a fixação de multa de natureza inibitória, visando ao cumprimento de obrigação específica pelo devedor, no caso, o fornecimento de medicamentos ao agravado. Exegese do art. 461, § 5º, do CPC. RECURSO DESPROVIDO." (Agravo de Instrumento Nº 70011620077, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roque Joaquim Volkweiss, Julgado em 06-7-2005).(Grifo Nosso).

Com estas considerações, NEGA-SE provimento ao recurso. É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES (Relator), DR. JOSÉ M. BIANCHINI FERNANDES (1º Vogal convocado) e DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (2ª Vogal), proferiu a seguinte decisão: AFASTADA A PRELIMINAR, NO MÉRITO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. DECISÃO UNÂNIME. A PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA RATIFICOU O PARECER.

Cuiabá, 20 de julho de 2009.

DESEMBARGADOR JOSÉ SILVÉRIO GOMES
PRESIDENTE DA QUARTA CÂMARA CÍVEL E RELATOR
PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 24/07/09




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