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terça-feira, 1 de setembro de 2009

JURID - Apelação crime. Receptação (art. 180, caput, do CP). [01/09/09] - Jurisprudência


Apelação crime. Receptação (art. 180, caput, do CP). Alegado desconhecimento da origem ilícita da 'res'. Improcedência. Agente costumeiro em crimes contra o patrimônio.
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Tribunal de Justiça do Paraná - TJPR.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 568.749-2, DA COMARCA DE LONDRINA - 2ª VARA CRIMINAL

APELANTE: ELENYLSON PASSOS CARDOSO

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

RELATOR: DES. EDUARDO FAGUNDES

APELAÇÃO CRIME - RECEPTAÇÃO (ART. 180, CAPUT, DO CP) - ALEGADO DESCONHECIMENTO DA ORIGEM ILÍCITA DA 'RES' - IMPROCEDÊNCIA - AGENTE COSTUMEIRO EM CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO - CONHECIMENTO INEQUÍVOCO DA ORIGEM ESPÚRIA DO BEM - DOSIMETRIA - CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO INERENTES AO TIPO PENAL VALORADAS NEGATIVAMENTE - CORREÇÃO DE OFÍCIO - RECURSO NÃO PROVIDO.

"Em crime de receptação, o fato dos agentes terem personalidade voltada à prática delitiva é circunstância que induz na certeza de que conheciam a origem ilícita dos objetos adquiridos, bem como de que agiram conscientes e imbuídos de evidente dolo ao adquirirem a res" (RJDACRIM 15/154)

O fato de o apelante ter sido 'apreendido na posse de veículo produto de furto' não pode, no crime de receptação, justificar aumento além do mínimo legal.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 568.749-2, da Comarca de Londrina - 2ª Vara Criminal, em que é Apelante ELENYLSON PASSOS CARDOSO e Apelado MINISTÉRIO PÚBLICO.

RELATÓRIO

O ilustre Promotor de Justiça com exercício na Comarca de Londrina denunciou Elenylson Passos Cardoso como incurso nas sanções do artigo 180, caput, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos delituosos (aditamento às fls. 110/111):

"No dia 21 de junho de 2006, por volta das 21h55min, tendo por local a Avenida Siriema, na cidade e Comarca de Arapongas/PR, o denunciado ELENYLSON PASSOS CARDOSO, com animus delinquendi, dolosamente, ciente da reprovabilidade de sua conduta, recepcionou uma motocicleta marca Honda CG 150 Titan, chassi n. 9C2KC08504R025384, sabendo este que sobredito bem era produto de crime. Consta dos autos que, de posse do bem adquirido de forma criminosa, ao ser abordado pela milícia empreendeu no sentido da Rua Pavão do Pará, daquela cidade e Comarca. Consta ainda que, ato contínuo à evasão este, ao fazer uma curva, desequilibrou-se e caiu, sendo dado voz de prisão e encaminhado a socorro médico, onde novamente tentou fuga, lesionando-se gravemente. Consta, por fim,que a milícia, ao verificar a procedência da motocicleta, constatou que esta seria produto de roubo no dia 17/06/2006 na Comarca de Londrina/PR, tendo como vítima Tatiane Chofard Ribeiro, razão pela qual, encaminharam-no perante a Autoridade Policial, o qual lavrou o imprescindível auto de prisão em flagrante, sem contudo interrogá-lo já que encontrava-se internado sem condições de prestar depoimento."

Recebida a denúncia em 08 de agosto de 2006 (fls. 42) e seu aditamento em 16 de abril de 2007 (fl. 112), o réu foi citado (fl. 136/v.) e devidamente interrogado (fls. 137/139 e CD em anexo).

Durante a fase de instrução foram inquiridas 02 (duas) testemunhas arroladas na denúncia (fls. 82/83 e 147/148). A defesa não arrolou testemunhas.

Alegações finais do Ministério Público às fls. 157/166 e da defesa às fls. 169/172.

Prosseguindo os trâmites legais, sobreveio a sentença de fls. 174/178, na qual entendeu por bem o MM. Juiz em julgar procedente a denúncia, para condenar o réu Elenylson Passos Cardoso como incurso nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal, fixando-lhe as penas de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime semi-aberto, e 10 (dez) dias-multa.

Inconformado, o sentenciado interpôs Recurso de Apelação (fl. 181). Em suas razões (fls. 184/187), alegou que desconhecia a origem ilícita da motocicleta, razão porque deve ser absolvido.

Contra-razões pelo Ministério Público às fls. 191/195.

Nesta instância, a douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou (fls. 211/221) pelo conhecimento e não provimento do apelo, mas pela reforma, de ofício, na dosimetria da pena para diminuí-la para 2 (dois) anos, em razão de as circunstâncias do delito, consideradas negativas pelo magistrado a quo, serem normais ao tipo penal.

É o relatório.

VOTO E SEUS FUNDAMENTOS

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

No mérito, é de se negar provimento ao apelo, entretanto, ex officio, alterar a dosimetria da pena imposta, porque, nos termos do parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, as circunstâncias do delito, valoradas negativamente na sentença, são inerentes ao tipo penal.

A materialidade configurou-se no Auto de Prisão em Flagrante (fls.06/10); no Auto de Exibição e Apreensão (fl. 11), Boletins de Ocorrência (fls. 12/15); no Auto de Avaliação (fl. 20); Auto de Entrega (fl. 21) e no Termo de Declaração da Vítima (fl. 18).

A autoria é certa e recai sobre o apelante.

O apelante foi surpreendido por policiais militares quando de posse da motocicleta roubada. Ao perceber a aproximação dos milicianos o réu empreendeu fuga, acidentando-se em seguida e sendo levado para atendimento médico.

Não há dúvidas, portanto, de que era o apelante (autoria) quem estava de posse da motocicleta roubada (materialidade).

A defesa alegou ausência de dolo, aduzindo que o apelante desconhecia a origem ilícita da motocicleta.

Apesar da argumentação expendida pela defesa, as circunstâncias que envolveram o delito conduzem à conclusão segura de que o apelante tinha plena consciência da origem espúria da motocicleta.

A primeira evidência é que a moto estava sem a placa (cf. Auto de Exibição e Apreensão de fl. 11), que certamente foi retirada para dificultar sua identificação.

Outra circunstância que labora contra o apelante é seu passado criminoso. Conforme se depreende das certidões de fls. 120/130, o apelante é costumeiro em crimes contra o patrimônio.

Além disso, ao ser questionado sobre a origem do bem, restringiu-se a dizer que "emprestou" a moto de um "moleque", cujo nome não sabia. Quando questionado por que um sujeito que mal conhecia lhe emprestaria uma motocicleta, assim afirmou: "(...) a moto era roubada! O moleque não vai emprestar pra mim? Era roubada mesmo (...)". Logo em seguida, porém, disse que aquelas eram as palavras da denúncia, que ele apenas repetira.

Ora, o conjunto de indícios leva à certeza de que o apelante tinha conhecimento da procedência espúria do bem, pois é inconcebível que um sujeito costumeiro em crimes contra o patrimônio não conheça a origem ilícita de um veículo desprovido de placas de identificação, sobretudo porque emprestado por alguém que mal conhecia.

Demais, a versão apresentada pelo réu é inconsistente. Com efeito, ninguém toma emprestada uma motocicleta, "em um bar", de um desconhecido, sem ter plena consciência de que tal veículo procede do ilícito.

Esta é a jurisprudência:

"Impossível cogitar-se da absolvição ou desclassificação da receptação para a modalidade culposa quando as circunstâncias que envolveram o fato, como tentativa de fuga, ocultação da placa do veículo roubado, não-apresentação do recibo de compra, ausência de pesquisa a respeito da origem do veículo junto à repartição de trânsito competente, etc., deixam evidenciado a anterior ciência pelo réu da procedência ilícita do bem. Para o reconhecimento do dolo no delito de receptação, não pode o Julgador ficar adstrito à confissão do réu, uma vez que, em regra, é ele demonstrado pelas circunstâncias que envolver os fatos" (RJTACRIM 38/288, in MIRABETE(1))

E mais:

"Em crime de receptação, o fato dos agentes terem personalidade voltada à prática delitiva é circunstância que induz na certeza de que conheciam a origem ilícita dos objetos adquiridos, bem como de que agiram conscientes e imbuídos de evidente dolo ao adquirirem a res" (RJDACRIM 15/154, in MIRABETE, sem destaque no original.)

E ainda:

"Na receptação, a apreensão de coisa subtraída em poder do agente gera a presunção de sua responsabilidade, invertendo-se o ônus da prova, impondo-se justificativa inequívoca, assim, se esta for dúbia e inverossímil, transmuda-se a presunção em certeza, autorizando, assim, a condenação" (RT 746/629, in MIRABETE.).

Do exposto, ficou comprovado nos autos que o réu Elenylson Passos Cardoso, agindo dolosamente, ou seja, ciente da origem ilícita do bem, tinha a posse da motocicleta comprovadamente roubada. Plenamente configurado, pois, o delito tipificado no art. 180, caput, do Código Penal, razão porque o apelo não comporta provimento.

Por fim, verifica-se que o magistrado a quo fixou a pena-base em 2 (dois) anos, valorando negativamente as seguintes circunstâncias judiciais: culpabilidade, personalidade e circunstâncias do crime.

Como bem observado pela douta PGJ, porém, as circunstâncias do delito, da forma como avaliadas na sentença, são inerentes ao tipo penal. O fato de o apelante ter sido "apreendido na posse de veículo produto de furto" não pode, no crime de receptação, justificar aumento além do mínimo legal. Assim, como as circunstâncias do delito que poderiam justificar o aumento (tentativa de fuga, após abordagem policial) não foram consideradas pelo magistrado a quo, deve ser extirpado o aumento referente às circunstâncias do delito.

O Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça recomenda, em seu art. 6.12.6.4(2), que, em sendo fixada a pena acima do mínimo, o magistrado esclareça quais as circunstâncias que determinaram o aumento e qual o quantum referente a cada uma delas. Como não há essa especificação na sentença, presume-se que o aumento para cada circunstâncias judicial desfavorável foi igual.

Deste modo, tem-se que para cada uma das 3 (três) circunstâncias valoradas negativamente o magistrado aumentou a pena em 4 (quatro) meses, fixando-a provisoriamente em 2 (dois) anos.

Excluindo o aumento relativo às circunstâncias do delito, a pena-base resta fixada em 1 (um) ano e 8 (oito) meses.

Na segunda fase da dosimetria, aplicando-se o aumento de 1/3 (um terço) relativo à reincidência, a pena resta fixada em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Mantenho o regime fixado, inicialmente semi-aberto, e a inviabilidade da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e sursis, uma vez que o sentenciado não preenche os requisitos do art. 44 e 77 do Código Penal, por ser reincidente.

Ex positis:

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso, e de ofício, proceder a adequação da pena, nos termos do voto.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores LAURO AUGUSTO FABRÍCIO DE MELO (Presidente, sem voto), MARCUS VINICIUS DE LACERDA COSTA e MARIA JOSÉ TEIXEIRA.

Curitiba, 13 de agosto de 2.009.

DES. EDUARDO FAGUNDES
Relator

Publicado em 28/08/09



Notas:

1 - MIRABETE, Julio Fabrini. Código Penal Interpretado. 5ª ed. - São Paulo: Atlas, 2005. p. 1671/1672. [Voltar]

2 - 6.12.6.4 - Recomenda-se que, sendo fixada a pena base acima do mínimo legal, o magistrado esclareça quais as circunstâncias que determinaram o acréscimo e qual o quantum que acresceu em relação a cada uma delas. [Voltar]




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