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segunda-feira, 21 de setembro de 2009

JURID - Ação ordinária. Multa de trânsito. Defeito no velocímetro. [21/09/09] - Jurisprudência


Ação ordinária. Declaratória de nulidade de penalidade de trânsito. Impossibilidade. Defeito no velocímetro do veículo. Imputação da responsabilidade à fabricante.


Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT

Órgão: 6ª Turma Cível

Apelação Cível 20050111279266APC

Apelante(s: DETRAN/DF - DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO DISTRITO FEDERAL

Apelado(s): LUÍZA MIRANDA IMBROISI

Relator: Desembargador OTÁVIO AUGUSTO

Revisora: Desembargadora DIVA LUCY IBIAPINA

Acórdão nº 373.422

E M E N T A

AÇÃO ORDINÁRIA. DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE PENALIDADE DE TRÂNSITO. DESISTÊNCIA DA AÇÃO APÓS A SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE. DEFEITO NO VELOCÍMETRO DO VEÍCULO. IMPUTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE À FABRICANTE.

- Não se admite a desistência após a prolação da sentença. Ainda que haja acordo entre as partes, a desistência após a sentença constitui verdadeira reversão da decisão de mérito já proferida, o que daria ao autor da ação o poder de dispor sobre a sentença de mérito, ignorando a decisão judicial e, em última análise, esvaziando todo o esforço e dispêndio envidados para a solução do conflito.

- A discrepância entre a velocidade indicada no velocímetro do carro da autora e a aferida pelos medidores eletrônicos de velocidade não pode ser imputada ao Detran, pois a responsabilidade pelo defeito é da fabricante do veículo.

- Recurso provido. Unânime.

R E L A T Ó R I O

Cuida-se de Ação Ordinária com pedido de antecipação de tutela interposta por LUIZA MIRANDA IMBROISI contra DETRAN/DF DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO DISTRITO FEDERAL objetivando a anulação de 05 (cinco) autos de infração de trânsito.

Afirma que é proprietária do automóvel de marca Peugeot/206 Soleil, placa JGC 2433/DF, sendo que até novembro de 2004 jamais havia sido autuada por qualquer infração de trânsito. Diz que a partir dessa data foi surpreendida com várias notificações, todas por trafegar em velocidade superior à máxima permitida para a via.

Assevera que procurou a FINATEC - Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos para saber a razão das discrepâncias entre a velocidade em que trafegava, marcada pelo velocímetro de seu veículo, e a velocidade medida pelos equipamentos eletrônicos do réu, detectando-se defeito no aparelho do automóvel, o qual foi substituído pela concessionária da marca Peugeot.

Sustenta que apresentou defesa junto ao réu para anulação administrativa das multas, indicando a ausência de culpa da autora e salientando que o fato gerador das autuações é de difícil percepção pelo motorista, estando incluso nos eventos de caso fortuito ou de força maior, tendo sido, entretanto, rejeitada.

Em sede de contestação, o réu aduziu, em suma, que os fatos deduzidos na inicial não estão abrangidos pela responsabilidade objetiva, com referência ao defeito dos equipamentos eletrônicos medidores de velocidade, haja vista decorrerem de suposto defeito no velocímetro do veículo da autora. Evidencia que, em hipóteses como a dos autos, deve prevalecer a presunção de legitimidade e legalidade dos atos administrativos, não trazendo a requerente qualquer elemento de convicção de que não era possível evitar ou impedir que a responsabilidade pelo ato de estar trafegando em excesso de velocidade se devia, exclusivamente, ao defeito no velocímetro de seu automóvel. Assinala que a autarquia não é fabricante de seu veículo, o que não lhe remete a responsabilidade pelo defeito do equipamento.

A r. sentença julgou procedente o pedido de desconstituição das multas, condenando o réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios arbitrados moderadamente em R$ 300,00 (trezentos reais).

Em seguida, a autora requereu a desistência da ação, informando que a empresa Peugeot do Brasil diligenciou no sentido do pagamento de todas as infrações cometidas em razão da falha no velocímetro no seu veículo, bem como da retirada da pontuação na sua Carteira de Habilitação.

O réu opôs embargos de declaração requerendo a extinção do processo sem resolução de mérito, em face da desistência da requerente, o que foi rejeitado à fl. 140.

Inconformado, o réu apresentou recurso de apelação, insistindo nos argumentos dantes expendidos, assim como na existência de erro material, pois a apelada, em 11 de maio de 2007, desistiu da ação, tendo sido a sentença publicada em 19 de abril de 2007, nada declarando sobre a referida petição. Busca a reforma do r. julgado singular, seja pela extinção sem resolução de mérito, seja pelo julgamento da improcedência dos pedidos, invertendo-se os ônus da sucumbência.

Contrarrazoados, subiram os autos.

É o relatório.

V O T O S

O Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO - Relator

Presentes os pressupostos de admissibilidade da presente apelação, dela se conhece.

Preliminarmente, insurge-se o apelante quanto à existência de erro material na r. sentença singular, uma vez que a apelada, em 11 de abril de 2007, trouxe ao conhecimento do juízo, por meio dos documentos de fls. 128/132, a informação de que os pedidos por ela deduzidos na presente ação perderam o objeto, pois a Peugeot reconheceu sua culpa em relação à desregulagem existente no velocímetro do veículo, diligenciando, inclusive, o pagamento das infrações de trânsito e a retirada da pontuação correspondente, pedindo, ao final, a desistência da ação.

Afirma que o i. sentenciante a quo nada declarou sobre a petição, nem sanou a omissão por meio de embargos declaratórios, já que a hipótese reclama a extinção do processo sem resolução do mérito.

Ocorre que a declaração de desistência em face da perda superveniente do objeto da demanda ocorreu em 11 de abril de 2007, tendo sido a r. sentença proferida em 09 de março de 2007. O i. sentenciante, por certo, nada poderia ter manifestado na oportunidade da prolação da sentença, inexistindo qualquer erro material a ser sanado, uma vez que a prestação jurisdicional desejada já tinha sido entregue.

Mister consignar que não se admite a desistência após a prolação da sentença. Como se sabe, a desistência da ação inviabiliza a própria análise do mérito da causa, na medida em que gera solução exatamente oposta, qual seja a sentença terminativa, que extingue o processo sem exame do mérito.

Ainda que haja acordo entre as partes, a desistência após a sentença constitui verdadeira reversão da decisão de mérito já proferida, o que daria ao autor da ação o poder de dispor sobre a sentença de mérito, ignorando a decisão judicial e, em última análise, esvaziando todo o esforço e dispêndio envidados para a solução do conflito.

Segundo o professor Fredie Didier Júnior, "pode o autor, se ganhou a causa, renunciar ao direito de executar ou desistir da execução eventualmente já ajuizada; ou, se perdeu, renunciar ao direito de recorrer ou desistir do recurso que já interpôs; mas desistir da causa que já foi julgada, não, pois não há mais do que desistir, uma vez que a prestação jurisdicional almejada já foi entregue. (1)" (in Curso de Direito Processual Civil, volume 1, 7ª edição, Edições JusPodivm: Salvador, 2007, p. 503).

Registre-se que a petição de fl. 128 não pode ser considerada como ato de renúncia da autora, que importaria em julgamento com resolução de mérito, uma vez que a renúncia ao direito sobre o que se funda a demanda é ato abdicativo pelo qual o demandante reconhece não possuir o direito alegado. Não é o caso dos autos, uma vez que a apelada apenas esclarece que a Peugeot reconheceu sua culpa em relação à desregulagem existente no velocímetro do veículo, diligenciando, inclusive, o pagamento das infrações de trânsito e a retirada da pontuação correspondente.

Ademais, para a prática de qualquer ato de disposição de direitos, necessita o advogado de poderes especiais, segundo estabelece o artigo 38, in fine, do Código de Processo Civil, inocorrente na hipótese.

Rejeita-se, portanto, a preliminar aventada.

No mérito, razão assiste ao apelante.

Requer o réu a improcedência do pedido de desconstituição das sanções punitivas aplicadas em decorrência de infrações de trânsito e a inversão dos ônus de sucumbência, em razão da regularidade das multas aplicadas à apelada.

Com efeito, o auto de infração se presta a documentar o fato que, supostamente, infringe uma regra de trânsito, cuja consequência seja a imposição de uma sanção punitiva (art. 280 do CTB). Com suporte em tal auto, a autoridade aplicará ou não a penalidade cabível (art. 281 do CTB), expedindo-se, então, a notificação da aplicação da penalidade ao infrator.

Verifica-se ser incontroverso o cometimento de 05 (cinco) infrações de trânsito por trafegar em excesso de velocidade, bem como que o velocímetro do veículo da autora apresentava defeito à época de tais fatos.

Entretanto, a questão cinge-se a saber se as referidas infrações podem ou não ser imputadas à apelada em razão da existência de um defeito em instrumento de seu automóvel, defeito confirmado, inclusive, pela concessionária Peugeot.

Ao que se percebe dos autos, evidencia-se que a discrepância entre a velocidade indicada no velocímetro do carro da apelada e a aferida pelos medidores eletrônicos de velocidade não pode ser imputada ao Detran porque a responsabilidade pelo defeito é, efetivamente, da fabricante do veículo.

Vale acrescentar que a apelada trouxe ao conhecimento do juízo, por meio dos documentos de fls. 128/132, a informação de que a empresa Peugeot do Brasil reconheceu sua culpa em relação à desregulagem existente no velocímetro do veículo, diligenciando, inclusive, o pagamento das infrações de trânsito e a retirada da pontuação correspondente.

Nessa conformidade, tendo-se em conta que as notificações de penalidade por infração de trânsito da apelada foram legais, DÁ-SE PROVIMENTO ao presente recurso, invertendo-se os ônus sucumbenciais.

A Senhora Desembargadora DIVA LUCY IBIAPINA - Revisora

Conheço do recurso porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

Adoto como relatório a narrativa apresentada pelo Eminente Relator.

Dou início ao exame do presente procedimento recursal apreciando citação feita pelo Apelante de que haveria o Eminente Magistrado a quo, ao sentenciar, incorrido em erro material, eis que não considerou petição em que a Autora/Apelada, por seu bastante procurador, afirma a perda de objeto da demanda anulatória que propusera em desfavor do DETRAN porque a "a empresa Peugeot do Brasil através de seu representante Sr. Nilson Martins, que reconhecendo a ausência de responsabilidade de sua cliente, a aqui Autora, diligenciou no sentido de pagar todas as infrações cometidas em razão da falha no velocímetro do veículo da Autora bem como de providenciar a retirada da pontuação na sua CNH.(documentos anexos)". Assim, com fundamento em tais razões, em face da perda de objeto da medida judicial que propusera, fora apresentada pela Autora "sua desistência da ação" - fl. 128.

Pois bem, elementar pesquisa dos atos havidos no procedimento que teve curso em primeira instância revela a absoluta impropriedade da questão suscitada pelo Recorrente.

Assim o afirmo porque a declaração de desistência por perda de objeto da demanda (fl. 128) veio aos autos em 11 de abril de 2007, quando já proferida sentença afirmativa da procedência dos seguintes pedidos: a) de desconstituição de autos de infração lavrados pela Autoridade de Trânsito, b) de restituição de eventuais valores pagos a título de multa, com as devidas correções e; c) de expedição da documentação do veículo Peugeot/2006 Soleil de propriedade da Autora (fls.123-127).

A mencionada decisão de mérito, prolatada em 09 de março de 2007 (fl. 127), não poderia, por óbvio, ter considerado ato unilateral praticado pela demandante em época posterior à de sua feitura. Certo que publicação só veio a ocorrer em 19 de abril de 1007 (fl. 135), dias após a data em que exarada a sentença de mérito (fls. 123-127) e de juntada aos autos do manifesto de desistência da ação pela Autora (fl. 128); fato que tal, entretanto, não altera a circunstância de que o juiz encerrara seu ofício jurisdicional na fase de conhecimento em primeira instância com exame de mérito da causa proposta ao Poder Judiciário.

Não poderia a Autora desistir do prosseguimento de processo já encerrado na fase de conhecimento. De conseqüência, inexistente o erro material apontado pelo Apelante em suas razões de recurso.

Impossível, contudo, desconsiderar a manifestação expressa em escrito de fl. 128 e assinada por procurador judicial a quem foram conferidos poderes da cláusula ad judicia et extra (fl. 05), afinal, resta exime de dúvidas que por ação de terceiro - a empresa Peugeot do Brasil - está solucionado o conflito de interesses entre as partes que litigam nesse processo. Apesar disso, não se pode considerar como ato de renúncia a manifestação de fl. 128 da Autora que ganhou a causa, isso porque a seu procurador não concedeu poder especial para renunciar ao direito em que se funda a ação(2). Logo, a teor do que dispõe o Artigo 38 da Lei Processual Civil, não está habilitado a oferecer renúncia o advogado subscritor da peça de fl. 128

Em circunstâncias que tais, mister prosseguir no exame de mérito do procedimento recursal aviado pelo Réu/Apelante, eis que necessária a rejeição dos argumentos por meio de que afirma a ocorrência de vício por erro material na decisão de mérito vergastada.

Porém, não se pode olvidar que motivo superveniente à prolação da sentença deu solução à lide. É inquestionável que todas as pretensões da Autora foram satisfeitas por ação de terceiro junto ao Réu com o que, como inequivocamente consignado na petição de fl. 128, nenhuma obrigação resta a ser adimplida pelo ora Apelante.

Verdade é que, de fato, perdeu objeto a presente demanda.

A Autora/Apelada, conquanto titular de direitos constituídos por sentença que lhe deu ganho de causa, por fatos supervenientes ao surgimento de título judicial regularmente composto em seu favor, nada mais pode exigir do Réu/Apelante. Fatos supervenientes à prolação da sentença que a reconheceu titular de direitos levaram à completa satisfação dos interesses antes resistidos. Estão cumpridas todas as obrigações até então inadimplidas. Nada mais tem a Autora/Apelada a exigir do Réu/Apelante.

Nesse contexto, considerando as especiais circunstâncias fáticas relevadas nos autos do presente feito, tenho que, se possível fosse confirmar, em sede de instância revisora, a douta sentença vergastada, mister seria, a exame final, considerar carente de exigibilidade aquele provimento, embora devesse ele se constituir em título executivo judicial.

Entrementes, prosseguindo na análise de mérito da pretensão recursal deduzida pelo Réu/Apelante, identifico razões bastantes a justificar a postulada reforma da decisão recorrida.

Vejamos.

Quanto aos demais argumentos lançados na irresignação apresentada pelo Recorrente, não há como desconsiderar a farta prova documental que, por meio de aparelhos eletrônicos, atestou a prática de infrações às regras de trânsito pelo condutor ou pela proprietária do veículo indicado na peça vestibular, daí porque lavrados diversos Autos de Infração (Artigo 280, caput, e § 2º, CTB). A Autoridade de Trânsito, em consideração a dados assim objetivamente identificados e configuradores de ato infracional, não poderia deixar de atender à legislação que determina o sancionamento de tal conduta (Artigo 281 CTB).

A condução do veículo com excesso de velocidade de fato ocorreu. Inadmissível, portanto, opor ao órgão de trânsito, para o fim de desconstituir os autos de infração lavrados, argumentos relativos a problemas relacionados ao velocímetro do automotor, até porque eventual defeito do medidor, ainda que por culpa imputável exclusivamente ao fabricante, não afasta a infração praticada pelo condutor ou pelo proprietário do veículo.

Permanece o excesso de velocidade pelo qual deve responder quem o praticou. Se há culpa de terceiro, em ação regressiva haver-se-á de apurar a responsabilidade de quem teria levado o condutor ou o proprietário do veículo a incorrer em conduta tipificada como infração de trânsito. Quanto ao mais, apenas com essas breves considerações, adiro integralmente aos fundamentos aduzidos pelo Eminente Relator.

De tal modo, superada a questão preliminar, acompanhando pronunciamento da Douta Relatoria, é meu voto no sentido de conhecer o recurso interposto e a ele dar provimento, com o que inverto os ônus da sucumbência.

É como voto.

O Senhor Desembargador LUCIANO VASCONCELLOS - Vogal

Com a Turma.

D E C I S Ã O

REJEITADA A PRELIMINAR, DEU-SE PROVIMENTO AO RECURSO. DECISÃO UNÂNIME.

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, OTÁVIO AUGUSTO - Relator, DIVA LUCY IBIAPINA - Revisora, LUCIANO VASCONCELLOS - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador OTÁVIO AUGUSTO, em proferir a seguinte decisão: REJEITADA A PRELIMINAR, DEU-SE PROVIMENTO AO RECURSO. DECISÃO UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 26 de agosto de 2009

Desembargador OTÁVIO AUGUSTO
Relator

Publicado em 02/09/09



Notas:

1 - O STF não admitiu a desistência de recurso extraordinário, após a ter sido prolatada decisão, mesmo que ainda não publicada (AgReg no RE 212.671-3, 1ª T., rel. Min. Carlos Brito, j. 02.09.2003, DJU de 17.10.2003, p. 20) [Voltar]

2 - CPC - Art. 38: "A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e firmar compromisso. (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 1994)". [Voltar]




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