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terça-feira, 8 de setembro de 2009

JURID - Ação de indenização por danos morais e estéticos. Apelo. [08/09/09] - Jurisprudência


Ação de indenização por danos morais e estéticos. Apelo do réu. Nulidade da sentença por cerceamento de defesa e julgamento extra petita. Inocorrência.


Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2006.014183-0, de Xanxerê

Relator: Des. Luiz Carlos Freyesleben

PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. APELO DO RÉU. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA E JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. AGRAVO RETIDO. FORMULAÇÃO DE QUESITOS COMPLEMENTARES AO LAUDO PERICIAL. COMPETÊNCIA DO MAGISTRADO, COMO DESTINATÁRIO DA PROVA, PARA AFERIR A NECESSIDADE OU NÃO DA SUA APRECIAÇÃO. DANOS ESTÉTICOS DECORRENTES DE CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. PROVA PERICIAL INDICATIVA DO NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA DO MÉDICO E A EXISTÊNCIA DOS DANOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. FATO OCORRIDO NA VIGÊNCIA DO CC/1916. ENTENDIMENTO DOS ARTS. 159 E 1.545 DO CC/1916 E DO ART. 14, § 4º, DO CDC. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR CARACTERIZADA. CRITÉRIOS PARA O ARBITRAMENTO DA VERBA INDENIZATÓRIA. RAZOABILIDADE. APELO DA AUTORA. CUMULAÇÃO DE DANOS MORAIS PUROS E ESTÉTICOS. POSSIBILIDADE. RECURSOS DESPROVIDOS.

O indeferimento dos quesitos complementares não configura cerceamento de defesa.

"Não ocorre julgamento extra ou ultra petita quando o juiz, decidindo a causa, dá aos fatos, narrados pelo autor na inicial, definição jurídica, simplesmente, qualificando-os, para, em decorrência, arbitrar o valor da indenização (STJ, 3ª T., Resp 10002-SP, rel. Min. Nilson Naves, j. 9.12.1991, v.u., DJ 17.2.1992, p. 1373)" (Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery).

Em se tratando de cirurgia plástica embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado e tem o dever de indenizar quando a intervenção der causa a defeitos físicos anteriormente inexistentes, piorando a aparência da paciente de modo a causar-lhe constrangimento no convívio social.

Os danos morais puros são cumuláveis com os estéticos, pois suas naturezas não se confundem, ainda que possam derivar do mesmo fato.

O juiz deve fixar o valor da indenização por danos morais de modo a representar, a um só tempo, o abrandamento da angústia do lesado, orientação pedagógica e séria reprimenda ao ofensor, com o fito de evitar sua recidiva.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.014183-0, da comarca de Xanxerê (1ª Vara Cível), em que são apelantes e apelados Fábio Portanova Barros e Adriane Franke Spilmann:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer dos recursos e desprovê-los. Custas legais.

RELATÓRIO

Adriane Franke Spilmann aforou ação de indenização por danos morais e estéticos contra Fábio Portanova Barros, alegando haver-se submetido a uma cirurgia de lipoaspiração abdominal, realizada pelo réu, em 27-8-1999. Disse que, depois de uma semana da cirurgia, retornou ao consultório do médico para a retirada dos pontos e, passado o tempo de recuperação, não notou nenhuma melhora quanto ao aspecto corporal anterior ao ato cirúrgico, mormente na região operada. Destarte, insatisfeita, submeteu-se à nova lipoaspiração, em 4-2-2000, e parte da região abdominal permaneceu dormente, "com ondulações que pareciam pequenas bolas". Diante de tal quadro consultou outro especialista que lhe sugeriu que, passados seis meses, realizasse uma terceira cirurgia para a retirada ou o enxerto de gordura.

Tendo em mãos esta sugestão médica, procurou o réu para mostrar-lhe o resultado da intervenção, momento em que ele se prontificou a realizar a terceira cirurgia na mesma semana, fato que lhe fez perder a confiança no profissional. Por isso, propôs-lhe custear nova cirurgia com outro médico da área, mas não obteve sucesso em sua proposta. De outro lado, disse ter extrema preocupação com sua aparência física, pois, antes das cirurgias, desfilava e participava de concursos de beleza. Entretanto, após a malfadada cirurgia, tem vergonha de exibir seu corpo, não mais podendo apresentar-se em eventos onde tivesse de exibir sua plástica. Por isso, requereu a condenação do demandado em danos morais puros, no importe de 300 salários mínimos, e danos estéticos, no valor equivalente ao custo de uma nova cirurgia plástica, além das despesas médicas, anestésicas e hospitalares, até se recuperar completamente.

Requereu a condenação do réu em custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação.

Fábio Portanova Barros contestou (fls. 30-40), confirmando a realização de ambas as cirurgias de lipoaspiração em Adriane Franke Spilmann, a primeira de ordem estética e a segunda reparadora. Disse que a última cirurgia foi a causa do descontentamento da autora. Ademais, entende tratar-se de obrigação de meio e não de resultado, não estando obrigado a pagar à autora as indenizações pleiteadas, mormente por não ter agido culposamente, tampouco, prometido êxito à paciente.

Anotou que a técnica da lipoaspiração é procedimento dependente da cicatrização da gordura subcutânea e também da característica corpórea de cada paciente. Ademais, a recuperação da autora foi boa, permanecendo um mínimo de ondulação derivada do processo empregado, não causando o menor prejuízo ao corpo dela. De outro lado, alegou que a requerente não esperou o tempo necessário para sua completa recuperação, pois, após a retirada dos pontos, consultou outro médico, antes mesmo de a cirurgia completar seis meses. Diante de tais argumentos requereu a improcedência dos pedidos.

Houve réplica (fls. 50-52).

O doutor juiz de direito deferiu a produção de prova testemunhal e pericial e nomeou perito (fl. 72).

As partes apresentaram quesitos (fls. 77-78 e 82-84) e o laudo foi juntado ao processo (fls. 102-106).

Fábio Portanova Barros apresentou quesitos complementares (fls. 112-117) e o doutor juiz de direito indeferiu a pretensão (fl. 119), objeto de agravo retido (fls. 127-130), sobre o qual a autora manifestou-se nas fls. 151-152.

Realizada audiência (fls. 162-169), ouviram-se as partes e três testemunhas da requerente; expediram-se cartas precatórias para ouvida de seis testemunhas do réu (fls. 192, 210-213, 242 e 292).

O médico Fábio Portanova Barros arguiu a suspeição do perito (fls. 246-250), a qual não foi conhecida por intempestividade (fl. 280). Essa decisão desafiou agravo de instrumento (fls. 322-331), ao qual foi negado efeito suspensivo (fls. 341/343).

As partes apresentaram alegações finais (fls. 294-315 e 346-357) e a doutora juíza de direito julgou procedentes os pedidos (fls. 361-372), condenando o réu a indenizar a autora por danos morais e estéticos, no importe de R$ 20.000,00, como também em custas processuais, reembolso dos honorários periciais e advocatícios, estes fixados em 15% do valor da condenação.

Fábio Portanova Barros apelou (fls. 379-405), suscitando preliminar de cerceamento de defesa, pois a magistrada sentenciou quando ainda pendia de julgamento o agravo de instrumento desfechado contra a decisão que não conheceu da exceção de suspeição do perito, aforada pelo réu, por ser intempestiva. De outro lado, tachou de extra petita a sentença de primeiro grau porque fundada na culpa do cirurgião, não invocada pela autora na petição inicial.

No mérito, disse da inexistência de dano moral, por não ser culpado pelo evento danoso, realçando que a causa do descontentamento da autora foi a segunda lipoaspiração, tratando-se de cirurgia reparadora, razão por que sua obrigação era de meio e não de resultado.

Rebelou-se contra os valores da indenizações, por exorbitantes, razão pela qual pediu suas reduções.

Requereu a apreciação do agravo retido, a cassação da sentença ou sua reforma.

Adriane Franke Spilmann também apelou (fls. 412-417), realçando que a magistrada considerou o dano estético uma subespécie do dano moral ao fixar o valor da condenação. Por isso, pugnou pela reforma da sentença para manutenção, a título de dano moral, da quantia arbitrada pela magistrada, sem prejuízo da condenação também em danos estéticos, a ser apurado singularmente, por não se confundir com os danos morais puros. De outro lado, caso não obtenha sucesso neste pedido, requereu a majoração do valor dos danos morais puros.

Houve contrarrazões (fls. 424-430 e 434-442).

Os autos estavam conclusos em gabinete quando sobreveio o julgamento do agravo de instrumento interposto pelo réu (fls. 449-451), tendo sido julgado prejudicado pela superveniência da sentença.

VOTO

Cuida-se de apelações cíveis interpostas contra a sentença da doutora juíza de direito da 1ª Vara Cível da comarca de Xanxerê que, em ação indenizatória, movida por Adriane Franke Spilmann contra Fábio Portanova Barros, julgou os pedidos procedentes, condenado o réu, cumulativamente, em danos morais e estéticos no valor de R$ 20.000,00.

1 - Do apelo do réu

Fábio Portanova Barros suscitou preliminares de cerceamento de defesa e de julgamento extra petita.

No mérito, disse da inexistência de dano moral, pois não ficou caracterizada sua culpa pelo evento danoso, ressaltando que a causa do descontentamento da autora foi a segunda lipoaspiração, feita no sentido reparador. Por isso, sua obrigação era de meio e não de resultado.

Disse da exorbitância do valor da condenação, pleiteando sua redução, ao tempo em requereu a apreciação do agravo retido e a cassação da sentença ou sua reforma.

A preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa não pode vingar.

O réu entende que o agravo de instrumento interposto por ele, visando à revogação da decisão indeferitória do pedido de suspeição do perito e da realização de nova perícia, deveria ter sido julgado antes da sentença judicial. Ademais, pretende o provimento do agravo retido interposto contra a decisão da magistrada que indeferiu a apresentação de quesitos complementares depois da juntada do laudo pericial, vendo nisso evidente cerceamento de defesa (fls. 127-130).

O apelante não tem razão, pois o fato de a juíza haver sentenciado pelo mérito, antes do julgamento do agravo de instrumento, rejeitando a exceção de suspeição por intempestividade, não é motivo suficiente para o reconhecimento do cerceamento do direito à ampla defesa, pois não se atribuiu efeito suspensivo ao agravo de instrumento do réu Fábio Portanova Barros (fls. 341-343), cabendo ao magistrado continuar o processo, em obediência ao princípio da celeridade e da economia processual. Ademais, bem colocou o desembargador Jânio Machado ao apreciar a liminar suscitada:

A exceção de suspeição do perito judicial foi oferecida com base no art. 135, inciso V, do CPC (aplicável por força do contido no art. 138, inciso III, do CPC).

Constata-se, então, que a alegada suspeição teve origem por ocasião da perícia, realizada no dia 11.11.2003 (fl. 31). De acordo com o art. 305 do CPC, a exceção deve ser argüida em 15 dias, contados do fato que a ocasionou. Assim, o prazo começou a fluir em 11.11.2003 e, como a petição de exceção foi protocolizada em 02.08.2005, ocorreu a preclusão temporal.

Não se pode - como pretende o requerente - contar o prazo a partir do depoimento de fl. 58, pois, naquela oportunidade, o perito apenas prestou os esclarecimentos solicitados pelo agravante. O simples fato de a perícia ter sido contrária ao interesse do agravante não tem o condão de tornar suspeito o perito (fls. 341-342).

Destarte, tendo sido negado o efeito suspensivo ao agravo de instrumento, não havia impedimento nenhum à marcha processual, o que torna incensurável, nesse aspecto, a decisão judicial criticada.

Naquilo que diz com o cerceamento de defesa, decorrente do indeferimento dos quesitos complementares, também não tem razão o requerido.

Os autos dão conta de que Fábio Portanova Barros redigiu quesitos (fl. 77-78), os quais foram respondidos pelo perito (fls. 102-103). Entretanto, após a entrega do laudo pericial, o réu refez seus quesitos, apresentando-os como complementares (fls. 112-117), tendo a juíza indeferido o pedido (fl. 119). Destarte, não houve cerceamento de defesa, porque ensanchado foi ao réu oferecer quesitos antes da facção da perícia.

Ressalta-se, outrossim, que o juiz pode indeferir a realização de quesitos complementares caso disponha de elementos para formar seu convencimento. Aliás, o doutor juiz de direito Giancarlo Bremer Nones agiu corretamente ao indeferir os quesitos complementares requeridos pelo réu, estando seu posicionar em perfeita harmonia com incontáveis precedentes desta Câmara. Em face disso é que lhe peço licença para transcrever o excerto de sua sentença para integrá-lo a este voto:

No caso dos autos, verifica-se que os quarenta e nove quesitos suplementares apresentados pelo réu dizem respeito a questões genéricas - que deveriam ter sido formuladas no prazo do art. 421, § 1º, inc. I, do codex instrumental - e não a pontos omissos, obscuros ou contraditórios do laudo.

Nesta mesma direção está a jurisprudência desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL. PERÍCIA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA PELO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE, UMA VEZ QUE APRESENTADOS QUESITOS COMPLEMENTARES, A TEOR DO ART. 435 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, E NÃO OPORTUNIZADA PELO SENTENCIANTE A PRODUÇÃO DA PROVA REQUERIDA. COMPETÊNCIA DO MAGISTRADO, COMO DESTINATÁRIO DA PROVA, DE AFERIR SOBRE A NECESSIDADE OU NÃO DA SUA REALIZAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. APELO DESPROVIDO.

1. É certo que, depois de juntado o laudo pericial aos autos, "a parte que desejar algum esclarecimento do perito e do assistente técnico, deverá requerer ao Juiz que mande intimá-lo a comparecer à audiência" (in, Curso de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro: Forense, 22. ed., 1997, vol. I, p. 482).

2. Contudo, mesmo que o Código de Processo Civil autorize a formulação de quesitos para fins de esclarecimento, isso não significa, necessariamente, que o juiz esteja obrigado a deferir a complementação da perícia. (Ap. Cív. n. 2007.031934-0, de Maravilha, Rel. Des. Vanderlei Romer, j. 15/10/07).

Sendo o Magistrado o destinatário da prova, este possui discricionaridade para analisar se a realização de determinado ato instrutório, ou sua complementação, é necessário e suficiente ao desenrolar do litígio e à formação do seu convencimento (arts. 130 e 131 do Código de Processo Civil).

Na hipótese em exame, o Julgador manifestou a desnecessidade da complementação da prova técnica, pois diante do laudo apresentado e dos demais elementos constantes dos autos, em especial a vasta documentação trazida pelas partes, já havia formado sua convicção de modo a estar apto ao julgamento (Ap. Cív. n. 2003.011184-0, de Tubarão, rel. Des. Alcides Aguiar, j. 16-03-2006).

Inocorre cerceamento de defesa quando foi facultada à parte a formulação de quesitos e indicação de Assistente Técnico, como manda o CPC (Ap. Cív. n. 2001.019969-6, de Turvo, rel. Des. José Volpato de Souza, j. 11-08-2003).

Portanto, arreda-se a preliminar de cerceamento de defesa e desprovê-se o agravo retido.

De outra parte, melhor sorte não se reserva ao réu quanto à preliminar de julgamento extra petita.

Na visão do apelante, a juíza de direito ultrapassou os limites da discussão, que era a de perquirir se a responsabilidade pelos danos causados à autora era de meio ou de resultado. Alega que a magistrada distanciou-se dos temas centrais da ação e se estendeu, de modo a imputar-lhe toda a culpa pelo evento danoso, condenando-o por motivos não elencados no pedido da autora. Aduz que a demandante jamais referiu-se à existência de culpa pelo insucesso da cirurgia e, por isso, foram ofendidos os artigos 128 e 460 do CPC, tornando a sentença increpada insubsistente.

A preliminar invocada, porém, não faz o menor sentido, razão por que é de ser afastada. É que "não há decisão extra petita quando o juiz examina o pedido e aplica o direito com fundamentos diversos dos fornecidos na petição inicial (JTJ 164/176)" (JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 896).

A autora expôs, suficientemente, os fatos basilares para a avaliação judicial e consequente decisão, pouco importando que a sentença não tenha sido do agrado do réu, pois "não ocorre julgamento extra ou ultra petita quando o juiz, decidindo a causa, dá aos fatos, narrados pelo autor na inicial, definição jurídica, simplesmente, qualificando-os, para, em decorrência, arbitrar o valor da indenização (STJ, 3ªT. Resp 10002-SP, rel. Min. Nilson Naves, j. 9.12.1991, v.u., DJ 17.2.1992, p. 1373)" (JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria Andrade. op. cit. p. 896). Assim, resta-nos refutar também a preliminar de julgamento extra petita.

No mérito, há que ser dito que os fatos aconteceram em 27-8-1999 e 4-2-2000, aplicando-se a eles os artigos 159 e 1.545 do Código Civil de 1916. Assim, em analisando a prova coligida, tem-se que, em 27-08-1999, a autora submeteu-se a uma cirurgia de lipoaspiração, realizada pelo réu, para a retirada de gordura localizada nas ancas ou "culotes", como também na região abdominal.

Passados seis meses, a moça retornou ao consultório do cirurgião para manifestar sua insatisfação com o resultado da intervenção médica. Assim, em 04-02-2000, o réu procurou reparar possível erro, realizando na paciente uma segunda cirurgia. Ocorre que, superado o prazo de recuperação, a paciente observou que parte de seu abdômen permanecia dormente, com gordura aparente e ondulações. A respeito disso, autora disse:

Que a depoente fez a primeira cirurgia de lipoaspiração, sendo que seis meses depois esteve no consultório do réu, quando ficou acertada a realização de uma segunda cirurgia, pois o resultado da primeira não havia sido satisfatório, que após a primeira cirurgia ficaram algumas ondulações e permaneceram gorduras em locais que deveriam ser retiradas e não foram, nos culotes e na barriga; que o resultado da segunda cirurgia foi um desastre, pois ficou pior do que estava antes; que a fotografia de fl. 17 foi tirada antes das cirurgias, sendo que as demais foram feitas após a segunda cirurgia, pois a depoente não tem nenhuma fotografia posterior a primeira operação; que após a segunda cirurgia o réu disse que seria necessária a realização de uma terceira operação, ou quantas fossem necessárias, pois ele injetaria gordura até que o organismo da depoente absorvesse; que a depoente respondeu ao réu dizendo que não tinha mais confiança nele e queria apenas que ele pagasse a terceira cirurgia a ser realizada por outro profissional; que a depoente nunca foi modelo profissional, mas participava de concursos de beleza e desfiles de moda até antes da primeira cirurgia; que a depoente esclarece que após a cirurgia teve bastante alterações em seu comportamento; que a depoente não foi alertada pelo réu sobre os riscos da cirurgia, pois do contrário jamais iria fazê-la; que a depoente engravidou um ano e meio após a segunda lipoaspiração; que o médico não possuía nenhum computador simulando como a depoente ficaria após a cirurgia, nem fez nenhuma medição (fls. 163-164). (grifou-se)

Por sua vez, o réu afirmou em seu depoimento:

Que antes de realizar os procedimentos cirúrgicos o depoente advertiu a autora a respeito dos riscos quanto ao resultado, bem como, eventual risco geral à saúde; que mesmo assim a depoente quis realizar o procedimento; que não houve nenhum problema em razão da primeira cirurgia, tendo apenas a autora achado que poderia ter sido retirado mais gordura; que em vista disso a autora solicitou a realização de uma nova lipoaspiração, que foi realizada aproximadamente seis meses após a primeira cirurgia; que não houve nenhuma complicação após a segunda cirurgia; que o depoente atribui as ondulações a prováveis alterações cicatriciais; que a autora não apresentou nenhum problema de cicatrização após a primeira cirurgia; que o depoente tomou conhecimento do problema de cicatrização muito tempo depois, pois a autora não o procurou mais em seu consultório; que estas ondulações podem ser tratadas com o deslocamento da pele, ou com lipoaspiração, ou com lipoenxertia; que o depoente se propôs a realizar a correção na autora, mas esta não aceitou, dizendo que queria que o depoente pagasse o tratamento através de um médico famoso do Rio de Janeiro ou de São Paulo; que o depoente não aceitou a proposta; que o depoente pode caracterizar as ondulações apresentadas na barriga da autora nas fotografias de fl. 29 como ondulações mínimas; que analisando apenas as fotos de fl. 29, não se pode dizer se o abdômen da autora apresenta uma ressecção excessiva; que o depoente esclarece que nunca se negou a realizar o tratamento e que na segunda cirurgia o depoente e o anestesista não cobraram honorários (fl. 165). (grifou-se)

A irmã da autora, Nelsi Franke, disse:

Que a autora sempre foi uma pessoa vaidosa; que a autora foi fazer lipoaspiração porque achava que podia tirar um pouco dos culotes e da "barriguinha" que tinha; que após a primeira cirurgia a autora não ficou satisfeita, pois ficaram alguns buracos, sendo que se tirasse novamente a gordura do lado, o local ficaria certo; que o próprio médico não ficou satisfeito com o resultado da primeira cirurgia; que a segunda cirurgia foi feita depois de seis meses da primeira, pois o médico disse que esse tempo era necessário para se verificar o resultado; que então a autora fez a segunda cirurgia, sendo que "não mudou nada"; que após a segunda cirurgia as ondulações ficaram maiores; que após a segunda cirurgia a autora procurou um médico de Passo Fundo e outro de Chapecó, quando a autora soube que tinha acontecido um erro de procedimento, pois a pele tinha grudado no músculo, o que causou as ondulações; que então a autora procurou o réu, que se propôs a fazer mais uma cirurgia, mas a autora não aceitou, pois queria que ele pagasse outro médico; que a autora foi "Garota Atlântida" e desfilava para algumas lojas; que a autora participava de desfile de roupas, inclusive roupas íntimas e biquínis para lojas; que após os fatos a autora mudou seu comportamento, pois hoje veste o que pode e não o que gostaria; que a depoente sempre acompanhou a autora nos consultórios do réu e dos outros médicos; que o réu não fez nenhuma advertência quanto aos riscos relativos ao resultado da cirurgia; que o abdômen da autora ficou bastante irregular, pois parece que tem bastante celulite, entradas e buracos (fls. 166-167). (grifou-se)

Ora, não se pode olvidar que cirurgia plástica é a que objetiva restaurar, de forma artificial, anatômica e funcionalmente, partes do organismo arruinadas por deformidades congênitas ou adquiridas, além de corrigir as desarmonias de ordem estética. No caso dos autos, o que a recorrida tinha era uma desarmonia de ordem estética, pois não estava feliz com sua aparência. Embora o requerido alegue que o descontentamento da requerente tenha sido referente ao procedimento da segunda lipoaspiração, ao qual chama de "cirurgia de reparação", não há dúvida de que a autora visava a melhorar a beleza de seu corpo. Na verdade, as cirurgias plásticas realizadas pelo réu na paciente foram exclusivamente de natureza estética. Logo, a tarefa do cirurgião, nesses casos, não caracteriza obrigação de meio; mas de resultado. Nesta última, basta ao lesado demonstrar a existência do contrato e a não obtenção do resultado prometido para caracterizar a obrigação de indenizar, pois há culpa presumida do especialista.

Não se trata de responsabilidade objetiva, pois a responsabilidade do médico continua a ser subjetiva, invertendo-se somente o ônus da prova quanto à culpa. De qualquer sorte, está claro que a obrigação do cirurgião, quanto à lipoaspiração, é de resultado, pois ninguém em sã consciência submete-se aos riscos de uma cirurgia, nem se dispõe a gastar muito, para tornar-se mais feio ou manter a mesma aparência.

Ao que se depreende da leitura dos autos, a intenção de Adriane Franke Spilmann, ao procurar o médico, era embelezar ainda mais seu corpo, especialmente suas ilhargas e seu abdômen. Contudo, esse objetivo não foi alcançado. Pelo contrário, a autora chegou a resultado oposto. Ora, basta confrontar as fotografias tiradas após as cirurgias com a fotografia que as antecedeu para se chegar à conclusão de que o médico não realizou um bom trabalho, deformando o corpo da paciente, em quem deixou cicatrizes indeléveis, de molde a intimidar a autora, e impedi-la de mostrar o corpo com a contumaz desenvoltura. Assim, a situação criada ocasionou mágoa, humilhação e, porque não dizer, profunda dor da alma, quando a autora apenas pretendia fazer-se mais bonita, corrigindo pequenas imperfeições. Não se permite ao cirurgião plástico afear o que estava bonito ou tornar desagradável aquilo que era agradável aos olhos de terceiros. De sorte que, para quem gostava de expor-se em público, mostrando sua plástica bonita, as cicatrizes deixadas são causa de vergonha (fls. 17-21); aí, pois, reside a incompetência médica, passível de ser apenada pecuniariamente.

As testemunhas do réu alegam que ele utilizou a técnica correta.

Isabel de Fátima Figueiró disse:

Que há seis anos trabalho como instrumentadora nas cirurgias realizadas pelo réu; que se lembra da autora, podendo dizer que a mesma foi submetida a duas intervenções, a segunda para "retoques"; que a técnica utilizada naquela lipoaspiração foi a mesma que viu o réu utilizar em todas as outras várias lipoaspirações nas quais atuou como instrumentadora; que em ambas as intervenções não ocorreu qualquer intercorrência, dando-se ambas dentro da normalidade (fl. 214). (grifou-se)

No mesmo sentido foi o depoimento de Vicente Antônio Alves Pons:

Que na qualidade de anestesista participou da cirurgia a qual submeteu a autora indicada na inicial; que várias foram as cirurgias de lipoaspiração feitas pelo réu das quais, naquela qualidade, participou, daí porque pode dizer que a técnica utilizada pelo réu é a única que o depoente conhece para aquele tipo de intervenção, sendo a utilizada não somente pelo réu, como pelos outros cirurgiões plásticos cujas intervenções acompanha; que a cirurgia referida transcorreu dentro da normalidade, sem qualquer incidente; que é comum, pelo que pode constatar, que se façam novas intervenções no mesmo paciente submetido a lipoaspiração para "retoques", inclusive, se o caso, para "enxertia". (fl. 215) (grifou-se)

Entretanto, o senhor perito afirmou que "a técnica utilizada não foi adequada porque há áreas onde foi retirada gordura em excesso e ocasionou depressões no contorno abdominal com aderência da pele à aponeurose subjacente".

Disse, ainda, que "há irregularidades de contorno corporal provocadas pela lipoescultura em questão nas regiões infra umbilical, flanco direito e mesogástrica".

Por fim, ressaltou que as complicações sofridas pela apelada são "parcialmente passíveis de correção cirúrgica" (fl. 103-105).

Nos casos em que a cirurgia plástica é realizada com fins estéticos, cabe ao cirurgião fazer a prova de que agiu, na execução da sua tarefa, com prudência, zelo e perícia, demonstrando atitudes opostas àquelas conceituáveis como imprudentes, negligentes ou imperitas.

Cabe-lhe, ademais, demonstrar a conduta do paciente, tudo em sintonia com as determinações consagradas pela ciência da medicina. No entanto, não se provou que a causa da deformidade e o não alcance do resultado pretendido foi a ausência de cuidado da autora com relação ao pós-operatório ou problemas de cicatrização.

Aqui, evidenciou-se que o resultado estético da cirurgia foi ruim, bastando, para se chegar a tal conclusão, examinar as fotografias de fls. 17 usque 21.

Tudo isso afetou a alma da paciente, implicando ataque aos seus sentimentos mais recônditos a respeito de sua própria aparência física, da qual se orgulhava de expor, envergonhando-se, hoje, de expô-la como tanto gostava de fazer em seus desfiles.

A cirurgia mal-sucedida acabou por infligir na autora defeito que não tinha e vergonha que já foi orgulho.

"Dessa forma" - ensina Rui Stoco - "a responsabilidade contratual do médico pode ser presumida ou não. Não há obrigatoriedade de presumir-se as culpa só por estarmos diante de um contrato. O parâmetro deve ser o tipo de obrigação assumida pelo facultativo com seu cliente. Se este se propôs a alcançar um determinado resultado, como na cirurgia estética, é presumidamente culpado caso não o atinja. Cabe a este profissional demonstrar sua não-culpa ou ocorrência de caso fortuito ou força maior. O cliente (credor) só deve demonstrar o inadimplemento, isto é, que o resultado não foi alcançado (Tratado de responsabilidade civil. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 400).

Caio Mário da Silva Pereira ensina que:

Com a cirurgia estética, o cliente tem em vista corrigir uma imperfeição ou melhorar a aparência. Ele não é um doente, que procura tratamento, e o médico não se engaja na sua cura. O profissional está empenhado em proporcionar-lhe o resultado pretendido, e se não tem condições de consegui-lo não deve efetuar a intervenção. Em conseqüência recrudesce o dever de informação bem como a obrigação de vigilância, cumprindo, mesmo ao médico recusar seu serviço, se os riscos da cirurgia são desproporcionais às vantagens previsíveis (Responsabilidade Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 169.)

Dessa forma, não atingindo o médico o resultado pretendido e prometido à paciente, deve ele ser responsabilizado civilmente pelos danos a ela provocados, mesmo porque agiu com culpa ao não aplicar as técnicas adequadas nas cirurgias, conforme indicado pelo perito (fl. 103), em resposta ao quesito oito, formulado pelo próprio réu (fl. 78).

Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL. CIRURGIA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL E DANO MORAL. CONTRATADA A REALIZAÇÃO DE CIRURGIA ESTÉTICA EMBELEZADORA, O CIRURGIÃO ASSUME OBRIGAÇÃO DE RESULTADO, SENDO OBRIGADO A INDENIZAR PELO NÃO CUMPRIMENTO DA MESMA OBRIGAÇÃO, TANTO PELO DANO MATERIAL QUANTO PELO MORAL, DECORRENTE DE DEFORMIDADE ESTÉTICA, SALVO PROVA DE FORÇA MAIOR OU CASO FORTUITO (Resp. n. 10536/RJ, rel. Min. Dias Trindade, j. 21-06-1991).

Já decidiu esta Corte de Justiça:

Apelação cível. Ação de indenização por erro médico. Alegados prejuízos (morais, estéticos e materiais) provocados pelo demandado em cirurgia plástica. Sentença de procedência. Mérito. Intervenção cirúrgica no nariz. Melhora estética pretendida pelo autor. Obrigação, no caso, de resultado. Apontada deformação confirmada pelas provas existentes nos autos. Responsabilidade civil verificada. Ocorrência de causa excludente não comprovada pelo requerido. Obrigação de indenizar caracterizada. Condenação por danos morais e estéticos devida. Critérios de fixação das verbas reparatórias. Razoabilidade e proporcionalidade. Preservação. Reparação dos danos materiais. Admissibilidade. Sentença mantida. Recurso desprovido (Ap. Cív. n. 2005.003266-2, de Criciúma, rel. Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva, j. 31-10-2008).

I - Em regra, os contratos de prestação de serviços médicos originam obrigações de meio e não de resultado.

Exceção a esta regra são os casos de cirurgia plástica, na exata medida em que ela tem por escopo, entre outros, o embelezamento estético do paciente, razão pela qual é considerada obrigação de resultado.

VI - Havendo provas suficientes acerca dos danos suportados pela autora, e, diante da ausência de exclusão do nexo de causalidade formado entre o ilícito e o serviço prestado ou de excludente de culpabilidade, resta configurada a responsabilidade civil do réu e, conseqüentemente, o dever de indenizar pelos danos materiais suportados pela vítima e de compensar pelos danos morais experimentados (Ap. Cív. n. 2003.009568-3, de Palmitos, rel. Des. Joel Dias Figueira Júnior, j. 14-11-2006).

No mesmo sentido, colhem-se julgados de outros Tribunais:

INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DANO MORAL OCORRÊNCIA ERRO MÉDICO DANO ESTÉTICO DECORRENTE DE CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DANO QUE É VISÍVEL A OLHO NU RESULTADO NEGATIVO DA CIRURGIA QUE JÁ GERA O ABALO PSICOLÓGICO VERBA ARBITRADA, CONTUDO, EXCESSIVA. DETERMINADA A REDUÇÃO A RS 20.000,00 RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (TJSP. Ap. Cív. n. 6267604700, rel. Des. Vito Guglielmi, j. 19-03-2009).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ERRO MÉDICO - CIRURGIA PLÁSTICA - CIRURGIA ESTÉTICA - NARIZ - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - DEFORMIDADE OCASIONADA PELA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA - DANO MATERIAL E MORAL - NEXO DE CAUSALIDADE PRESENTE - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS.

Nas cirurgias plásticas estéticas, de forma geral, se presume a culpa do cirurgião pelo não atingimento do resultado esperado, pois esta intervenção objetiva a mudança de padrão estético da pessoa, ao embelezamento puro e simples, constituindo por tanto obrigação de resultado, devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma irregularidade (TJPR. Ap. Cív. n. 0241611-3, rel. Des. Sérgio Luiz Patitucci, j. 07-12-2007).

Apelação Cível. Ação condenatória. Responsabilidade civil decorrente de cirurgia plástica de lipoaspiração. Apelos. Contratada a realização de cirurgia plástica estética, o cirurgião assume obrigação de resultado, sendo obrigado a indenizar pelo não cumprimento da obrigação, nos termos avençados. No caso concreto, evidenciou-se a extração excessiva de gordura, gerando resultado estético indesejado. Cabível indenização pelo dano moral decorrente do mau resultado do serviço. Pedido de patrocínio de nova cirurgia prejudicado, ante a sua impossibilidade fática (TJRS. Ap. Cív. n. 70012679718, rel. Des. Ney Wiedemann Neto, j. 15-12-2006).

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO - CIRURGIA PLÁSTICA COSMETOLÓGICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - LESÃO ESTÉTICA - PRESENÇA DOS REQUISITOS ENSEJADORES DO DEVER DE REPARAÇÃO - DANO MORAL - FIXAÇÃO.

Em se tratando de cirurgia plástica embelezadora, o cirurgião plástico assume a obrigação de resultado, obrigando-se a indenizar quando a intervenção der causa a defeitos físicos anteriormente inexistentes, piorando a aparência física da paciente de modo a causar-lhe constrangimento no convívio social. Fixada a responsabilidade, pelo reconhecimento da conduta culposa, o dano deve ser amplamente indenizado, desde que cumpridamente comprovados os prejuízos, através de documentos e outras provas hábeis. Para a fixação da verba indenizatória a título de dano moral, necessária uma avaliação por parte do julgador do caso concreto, de quem deverá conceder a indenização, bem como a condição da vítima, graduando-a de acordo com a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima (TJMG. Ap. Cív. n. 2.0000.00.394967-9, rel. Des. José Affonso da Costa Côrtes, j. 18-12-2003).

Por isso, a não obtenção do resultado por parte do réu, por certo, trouxe manifesto prejuízo à autora, que não obteve o efeito esperado, tornando-se visível o dano estético.

Justo, portanto, que lhe sejam reparadas as sensações de desgaste e abalo, além do dano estético suportado em face da falha na prestação do serviço.

O requerido pretende a redução do valor indenizatório, ao argumento de que não condiz com seu padrão de vida. Enquanto a requerente visa à sua majoração.

Tais pedidos serão analisados na apreciação do apelo da autora.

2 - Do apelo da autora

Adriane Franke Spilmann entende que a magistrada considerou o dano estético uma subespécie de dano moral ao fixar o valor da condenação. Por isso, pugna pela reforma da sentença para manutenção, a título de dano moral, da quantia arbitrada pela magistrada, sem prejuízo da incidência do dano estético, devendo este ser apurado separadamente.

Sucessivamente, pleiteia a majoração do valor arbitrado na indenização.

No tocante à cumulação de danos morais e estéticos, nada impede que se os cumulem, como o fez a juíza em sua sentença, desde que as naturezas dos danos não se confundam, ainda que a origem do fato seja a mesma. Assim, os danos morais puros são cumuláveis, numa mesma ação, com os estéticos, como fazem certo os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. CUMULAÇÃO.

Os danos estéticos devem ser indenizados independentemente do ressarcimento dos danos morais, sempre que tiverem causa autônoma. Recurso especial conhecido e provido (Resp. n. 816.568/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 29/11/2007).

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE RODOVIÁRIO. PASSAGEIRO. LESÕES GRAVES E IRREVERSÍVEIS. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. JUROS MORATÓRIOS.

- É admissível a cumulação dos danos morais e danos estéticos quando, apesar de derivados do mesmo evento, suas conseqüências podem ser separadamente identificáveis (Resp. n. 377.148/RJ, rel. Min. Barros Monteiro, j. 20-9-2005).

É que o dano estético é espécie de dano moral. Assim, sempre que o julgador estiver diante de situação em que perceba a presença do dano moral puro e do dano estético, poderá proceder de duas maneiras distintas: arbitrar uma única indenização por danos morais, considerando a lesão estética como agravante da ofensa moral ou fator de majoração da verba indenizatória; ou fixar duas indenizações distintas, levando em consideração, para o arbitramento do dano moral, a dor física da vítima e o abalo ao seu psiquismo, podendo considerar, de outro lado, para fixar o dano estético, o afeamento da região afetada, a lesão visível ou parente e assim por diante.

Na hipótese, a doutora juíza de direito entendeu por bem considerar conjuntamente as consequências danosas do evento e arbitrar uma indenização por danos morais e estéticos, fundamentando-se segundo critérios específicos e enumerados na sentença. Daí não se poder censurar a sentença increpada nesta parte.

Não é demasia repetir o que se assentou na jurisprudência sobre a cumulatividade de danos morais e estéticos:

Os danos morais e estéticos, conquanto derivados do mesmo evento danoso, têm naturezas distintas, sendo, portanto, plenamente cumuláveis (Ap. Cív. n. 2004.034086-5, de Papanduva, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 29-05-2007).

A cumulação dos pedidos de indenização por danos moral e estético é possível, porquanto visam o ressarcimento de lesões distintas, decorrentes do mesmo ato lesivo praticado pelo agente (Ap. Cív. n. 2004.025590-0, de Palhoça, rel. Des. Wilson Augusto do Nascimento, j. 12-11-2004).

Destarte, admite-se a cumulação entre danos morais puros e danos de ordem estética e a magistrada atuou acertadamente ao arbitrar uma única indenização englobando o dano moral puro e o estético.

Por fim, com relação ao valor da indenização, sabe-se que a fixação de um valor em pecúnia, para acalentar a dor da vítima e servir, ao mesmo tempo, de fator preventivo e repressivo, para que o causador da ofensa nela não persista, deve atender a critérios básicos, tais como:

a) a intensidade e duração da dor sofrida; b) a gravidade do fato causador do dano; c) a condição pessoal (idade, sexo etc.) e social do lesado; d) o grau de culpa do lesante; e) a situação econômica do lesante. (Cf. Prof. Fernando Noronha) (Ap. Cív. n. 97.003972-7, de Mafra, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 13-05-1999).

Claro que, à míngua de parâmetros fixos em que se pautar, o juiz depende quase só de seu bom senso para chegar a um valor proporcional à lesão produzida, sem esgotar as finanças do causador do dano, nem enriquecer desmesuradamente a vítima.

Como visto, a fixação de verba indenizatória deve corresponder, tanto quanto possível, à situação socioeconômica de ambas as partes, sem perder de vista a necessidade de avaliação da repercussão do evento danoso no dia-a-dia da vítima.

Ao prestar depoimento, Rosângela Maria Paglia de Mello declarou:

Que a depoente conhece a autora a bastante tempo, pois ela jogava vôlei para a loja da depoente e fazia alguns desfiles; que três meses antes do casamento a depoente procurou a autora para fazer um desfile, mas esta pela primeira vez disse que não poderia, pois ia fazer uma lipoaspiração, que a autora disse que a depoente poderia procurá-la depois do casamento que ela participaria dos desfiles; que a autora sempre gostou de usar blusas curtas nos desfiles pois gostava de mostrar a barriga e tinha corpo para isso; que após a segunda cirurgia da autora, ela esteve na loja da depoente, quando conversaram a respeito de um novo desfile de lingerie; que a autora disse que não participaria, pois a barriga dela tinha ficado feia; que então a autora mostrou a barriga para a depoente, que ficou cheia de buracos; que a depoente ficou apavorada, que a autora era a número um dos desfiles na loja; que a autora também desfilava para a Loja Lorenci e Larabel; que a autora já ganhou vários concursos de beleza; que a depoente acha que a autora ficou com o estado emocional muito abalado após a cirurgia; que antes do casamento a autora sempre foi uma pessoa alegre; que depois a autora nunca mais jogou, desfilou ou foi à piscina. (fl. 168) (grifou-se)

No mesmo sentido, Adriana Abe disse:

Que a depoente foi secretária do Clube 7 por onze anos, até o dia 30/10/2004; que a autora frequentava bastante a piscina do clube, como associada, sendo que também participava de desfiles de moda ou competitivos feitos no clube e em outros locais; que a autora parou de desfilar logo depois da lipoaspiração; que a autora parou de desfilar porque ficou com buracos no abdômen; que em vista disso a autora também não frequentou mais a piscina do clube; que devido à simpatia e beleza física a autora ganhou vários concursos de beleza, como a Garota Atlântida e Garota Cawboy; que após a cirurgia mudou completamente a maneira de se vestir, não era mais uma mulher vaidosa e passou a ser triste. (fl. 169) (grifou-se)

No caso dos autos, é evidente o abalo psíquico sofrido pela paciente, que passou a conviver com as deformações ocasionadas em seu corpo, e deixou de participar de eventos, além de alterar seu comportamento. Além disso, conforme informado pelo perito, à fl. 105, "tais complicações são parcialmente passíveis de correção cirúrgica", ou seja, mesmo submetendo-se a outras cirurgias, a requerente não obterá o sucesso que almejava quando da primeira lipoaspiração.

Cabe ao réu responder pelo dano moral e estético ocasionado à autora, e desnecessária, na espécie, a sua comprovação.

Nesta direção:

O dano moral possui caráter estritamente pessoal de dor, vergonha, humilhação, assentando-se o entendimento nos tribunais pátrios de que não há necessidade de sua comprovação, bastando a configuração da situação de constrangimento que o fato infligiu ao agente (Ap. Cív. n. 2008.022982-4, de Fraiburgo, rel. Des. Fernando Carioni, j. 3-6-2008).

As mencionadas verbas foram arbitradas, cumulativamente, no valor de R$ 20.000,00, mais juros de mora e correção monetária.

É pacífico na jurisprudência o entendimento de que o valor da indenização não pode ser exorbitante, a ponto de enriquecer o lesado, tampouco irrisório, de maneira a incentivar a reincidência do ato, devendo ser arbitrado de acordo com os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Mostra-se razoável, no caso, a manutenção da quantia estabelecida em primeiro grau, à consideração do ilícito praticado, da natureza da lesão, da extensão do dano sofrido, da capacidade financeira do ofensor, como ressaltado na sentença:

Assim, analisando o caso em tela, arbitro o quantum indenizatório no montante de R$ 20.000,00 o qual abrange as intervenções cirúrgicas a serem realizadas, eventualmente, pela autora e a compensação psicológica derivada da violação da sua integridade física, posto que o reflexo do ato ilícito e suas conseqüências danosas atingiram a esfera valorativa da dignidade e personalidade (fl. 371).

Diante do exposto, conheço ambos os apelos, tanto o da autora como o do réu, e os desprovejo.

DECISÃO

Nos termos do voto do Relator, por votação unânime, conheceram dos recursos e negaram-lhes provimento.

O julgamento foi realizado no dia 30 de abril de 2009, e dele participaram, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Mazoni Ferreira (Presidente) e Jaime Luiz Vicari.

Florianópolis, 7 de agosto de 2009.

Luiz Carlos Freyesleben
RELATOR

Publicado em 31/08/09




JURID - Ação de indenização por danos morais e estéticos. Apelo. [08/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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