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quinta-feira, 17 de setembro de 2009

JURID - Ação de indenização. Contrato de transporte. [17/09/09] - Jurisprudência


Apelações cíveis. Ação de indenização. Contrato de transporte. Responsabilidade objetiva. Excludente. Culpa exclusiva da vítima. "carona" em coletivo.


Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

Número do processo: 1.0079.04.141712-6/001(1)

Relator: IRMAR FERREIRA CAMPOS

Relator do Acórdão: IRMAR FERREIRA CAMPOS

Data do Julgamento: 20/08/2009

Data da Publicação: 09/09/2009

Inteiro Teor:

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE TRANSPORTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EXCLUDENTE. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. "CARONA" EM COLETIVO.Em face da responsabilidade objetiva, a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público responderá pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiro, nos termos do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição da República, a menos que se comprove uma das causas excludentes de responsabilidade, como a força maior, caso fortuito ou culpa exclusiva da vítima.Age com culpa exclusiva a vítima que se arrisca demasiadamente, pendurando-se em coletivo, pelo lado de fora, visando conseguir carona.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0079.04.141712-6/001 - COMARCA DE CONTAGEM - 1º APELANTE(S): GENERALI BRASIL CIA NACIONAL SEGUROS - 2º APELANTE(S): TRANSIMÃO TRANSP SIMÃO LTDA - 3º APELANTE(S): IRB BRASIL RESSEGUROS S/A - APELADO(A)(S): WALLACE MOTA DOS ANJOS, TRANSIMÃO TRANSP SIMÃO LTDA, IRB BRASIL RESSEGUROS S/A, CIA SEGUROS ALIANCA BAHIA - RELATOR: EXMO. SR. DES. IRMAR FERREIRA CAMPOS

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO ÀS PRIMEIRA, SEGUNDA E TERCEIRA APELAÇÕES.

Belo Horizonte, 20 de agosto de 2009.

DES. IRMAR FERREIRA CAMPOS - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. IRMAR FERREIRA CAMPOS:

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença de f. 489/502 que, nos autos da ação de indenização intentada por Wallace Mota dos Anjos em face de Transimão Transportadora Simão Ltda., julgou procedente em parte o pedido inicial para condenar a ré a pagar ao autor indenização por danos morais que fixou em 50 salários mínimos, indenização por danos estéticos que também fixou em 50 salários mínimos, mais danos materiais arbitrados em R$126,98, quantia esta desembolsada com o tratamento, medicamentos e transporte, e R$100,00, pela bicicleta danificada, inacolhendo o pedido indenizatório por lucros cessantes e pensão. Condenou a ré, ainda, ao pagamento dos honorários do perito médico, verba esta que arbitrou em R$3.000,00. Sobre tais valores, deve incidir correção monetária a partir da data do acidente e juros moratórios de 1%, contados da citação da ré, sendo que os honorários periciais serão atualizados e acrescidos de juros a partir da entrega do laudo em 11 de agosto de 2005. Além disso, julgou procedente a lide secundária estabelecida entre a ré e as seguradoras denunciadas, condenando estas, solidariamente, a reembolsar a ré os valores que ela despender. Determinou às denunciadas pagamento de honorários aos patronos da ré, no importe de R$2.000,00. Por fim, em relação à lide secundária estabelecida entre a denunciada Generali do Brasil Companhia Nacional de Seguros e o IRB - Brasil Resseguros S.A., julgou procedente a lide secundária para condenar o denunciado a reembolsar à Generali do Brasil o percentual de 81% do que ela despender em razão da presente decisão. Determinou, também, ao IRB - Brasil Resseguros S.A. o pagamento de honorários advocatícios ao patrono da Generali do Brasil, no importe de R$1.620,00.

Insurge-se Generali Brasil Cia Nacional de Seguros às f. 517/531 aduzindo que os fatos não ocorreram conforme consta na sentença, posto que um ônibus, veículo de grande porte, não consegue frear e dar marcha-ré abruptamente.

Alega que o autor, conforme consta do boletim de ocorrência de f. 10/13, estava inadvertidamente "pegando carona" na traseira do ônibus de propriedade da ré, juntamente com outro colega, quando em razão de freada do coletivo nele colidiu.

Sustenta que a vítima estava pegando carona na traseira do ônibus, conduta cuja proibição é de conhecimento notório, e, mesmo após o motorista, tomando as diligências que lhe cabiam, ter parado o ônibus para a vítima descer, esta permaneceu no local inadequado, sendo então atropelada.

Ressalta que está comprovado que o acidente ocorreu por culpa única e exclusiva da vítima, o que afasta o dever de indenizar, devendo ser reformada a sentença para julgar improcedente a ação.

Salienta que o valor da indenização por danos morais fixado em R$12.000,00 mostra-se excessivo para o presente caso, pois em seu arbitramento não foram levadas em consideração as circunstâncias do caso concreto, ou seja, que a vítima estava pegando carona na traseira do coletivo.

Destaca que a perícia médica consignou que o autor não apresenta nenhum tipo de sequela emocional, psicológica, psiquiátrica e moral em razão do acidente, bem como apresenta controle psíquico/emocional adequado aos padrões normais.

Afirma que a indenização por danos morais não pode representar uma fonte de enriquecimento sem causa, devendo ser arbitrada com moderação, atendendo aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Assevera que o valor dos danos estéticos também deve ser reduzido, pois a única sequela do evento foi uma limitação mínima para o movimento de flexão dorsal do pé acometido, classificada pelo perito no percentual de 3%, sem danos de qualquer outra ordem, inclusive no campo moral, estando totalmente preservada a capacidade laborativa do autor, que se encontra de alta médica.

Aduz que o termo inicial para incidência de correção monetária, tratando-se de indenização por danos morais e estéticos, é a data da prolação da decisão que fixou o seu valor.

Alega que não possui cobertura para danos materiais e/ou estéticos e, por se tratar de contrato de seguro de segundo risco, responde somente por danos corporais e/ou morais que excederem ao limite fixado a mesmo título pela apólice contratada a primeiro risco com a Companhia de Seguros Aliança da Bahia.

Ressalta que o valor da responsabilidade da ora apelante deve cingir-se aos estritos termos do seguro avençado, sob pena de enriquecimento ilícito e violação do art. 757 do Código Civil.

Assevera que não pode responder diretamente perante o autor, com o qual nada contratou.

Diz que a decisão merece reforma para, ao invés de condenar a ora apelante solidariamente com a denunciante, condená-la a reembolsar esta última do que ela vier a despender, observando-se os limites da apólice.

Alega que não houve sucumbência no caso em apreço, hábil a justificar sua condenação ao pagamento de honorários ao patrono da denunciante, sendo que em momento algum houve oposição das denunciadas quanto à eventual responsabilização nos limites dos contratos de seguro.

Requer, ao final, o provimento do recurso.

Contrarrazões às f. 577/588 e f. 597/603.

Transimão Transportadora Simão Ltda. interpôs recurso às f. 536/547, aduzindo que a dinâmica dos fatos evidencia e comprova que o acidente teve como causa a conduta imprudente e negligente da vítima que se aventurou com sua bicicleta na traseira na traseira do coletivo, vindo a desequilibrar-se, o que culminou com sua queda sob as rodas do ônibus.

Informa que os danos reclamados não foram provados.

Afirma que o boletim de ocorrência de f. 10/13 registrou o depoimento do motorista do coletivo, tomado na ocasião do acidente, o qual demonstra que o coletivo seguia regularmente seu trajeto, com todas as cautelas costumeiras, quando foi surpreendido por um ciclista informando que havia um rapaz sob as rodas traseiras do ônibus.

Ressalta que o preposto do requerido, após constatar o acidente, tomou todas as medidas necessárias para um eficaz socorro à vítima.

Alega que, não havendo provas da perda total da bicicleta do autor, não há como julgar procedente esse pedido.

Destaca que a prova oral produzida no processo demonstra que o próprio autor assumiu sua imprudência ao se arriscar em uma carona, pendurando-se no para-choque do coletivo, sendo que também confirmou a inexistência de qualquer ação ilícita do preposto da ré.

Sustenta que, aplicando a responsabilidade subjetiva faz-se necessária a prova da culpa do motorista, dos danos e do nexo causal entre aquele e este, sendo que tal ônus é atribuído ao autor, nos termos do art. 333, I do CPC.

Assevera que, se for aplicável a responsabilidade objetiva, ao presente caso, há de se ponderar pela presença de uma excludente dessa responsabilidade, qual seja, a culpa exclusiva da vítima.

Argumenta que a simples dor física não é capaz de ensejar dano moral, sendo que a perícia médica produzida nos autos é contundente ao afirmar que não foi constatada redução da capacidade laborativa do autor.

Diz que o julgador não pode se basear nas meras alegações do autor, já que as agruras psíquicas devem ter comprovação cabal para ensejar indenização por danos morais.

Afirma que não há falar em cumulação entre os danos morais e os estéticos, posto que fundados na mesma causa.

Pugna pela redução dos valores arbitrados a título de indenização por danos morais e estéticos, atendendo aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Requer, ao final, o provimento do recurso.

Contrarrazões às f. 577/588.

IRB Brasil Resseguros S.A. interpôs recurso de apelação às f. 550/573, aduzindo que o único causador do acidente foi o próprio autor que, em sua conduta inadvertida e temerária, pegava carona na traseira do coletivo com sua bicicleta.

Informa que ficou bem transparente a real dinâmica dos acontecimentos, sendo que o coletivo trafegava regularmente e em velocidade compatível com o local quando, ao passar por um quebra molas, foi noticiado por um ciclista que havia um outro menor debaixo do ônibus, que estava pegando carona na traseira do coletivo e veio a entrar para debaixo do veículo.

Alega que a conclusão do magistrado primevo de que o condutor do coletivo teria avistado anteriormente a vítima, imprimindo manobras e marcha ré para atingi-lo, não encontra amparo em uma prova segura e imparcial.

Afirma que a sentença deve ser reformada para ser julgada improcedente a demanda.

Ad argumentandum, pugna pela aplicação de culpa concorrente ao caso em apreço, com a redução da indenização à metade.

Ressalta que a conduta do autor em empreender carona na traseira do coletivo com sua bicicleta caracteriza-se como verdadeiro ilícito civil.

Destaca que eventual condenação a título de danos morais e estéticos deve ser fixada em quantia certa e não em salário mínimo, por ser manifestamente inconstitucional a vinculação promovida na sentença objurgada.

Assevera que a indenização por danos morais e estéticos deve ser reduzida para não mais do que R$7.000,00.

Sustenta que os danos estéticos estão abrangidos pelo dano moral, não cabendo indenização por um e outro como se fossem fenômenos distintos, salvo quando passíveis de apuração em separado e tiverem fundamentos fáticos distintos, o que não é o caso dos autos.

Argumenta que o autor não sofreu vexames e humilhações, devendo ser declarada improcedente sua pretensão.

Aduz que os valores eventualmente recebidos ou a receber, em face do DPVAT, devem ser decotados de eventual condenação em indenização, nos termos da Súmula nº 246 do STJ.

Diz que a incidência dos juros e da correção monetária no caso de indenização por danos morais deve correr a partir da fixação de eventual indenização pelo órgão julgador, isto é, desde a prolação da sentença ou do acórdão.

Ressalta que no caso dos autos foram celebrados dois contratos de seguro de responsabilidade civil distintos, na modalidade 1º risco com a Aliança da Bahia e 2º risco com a Generali, isto é, a obrigação desta última só subsiste quando termina a responsabilidade da primeira seguradora, nos limites e valores previstos de cobertura para cada uma delas.

Afirma que a Generali do Brasil e, por conseguinte, o seu ressegurador somente podem responder por valor que exceder as coberturas contratadas com o outro segurador.

Sustenta que a solidariedade não pode ser presumida, pois é instituto jurídico que só se aplica em decorrência de lei ou de contrato.

Assevera que diante de sua condição de assistente litisconsorcial e da ausência de lide resistida, não há falar em condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais.

Requer, ao final, o provimento do recurso.

Contrarrazões às f. 577/588 e f. 591/595.

Conheço dos recursos, presentes os pressupostos de admissibilidade.

PRIMEIRA APELAÇÃO

A irresignação do primeiro apelante merece prosperar.

A controvérsia recursal consiste, inicialmente, em apurar quem foi responsável pelo acidente noticiado na inicial, do qual foi vítima o autor, ora apelado.

Dúvidas não pairam, quanto à responsabilidade objetiva da ré, pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiro, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição da República.

A princípio, a concessionária deverá responder pelos danos causados através de simples demonstração do nexo causal entre este e o exercício da atividade, independentemente de culpa, a menos que se comprove uma das causas excludentes da responsabilidade, como a força maior, caso fortuito ou culpa exclusiva da vítima.

Conforme ensinamento do i. doutrinador RUI STOCO:

"Embora a lei civil codificada não faça qualquer menção à culpa exclusiva da vítima como causa excludente de responsabilidade civil, a doutrina e o trabalho pretoriano construíram a hipótese (...). Quando se verifica a culpa exclusiva da vítima, tollitur quaestio: inocorre indenização. (...)" (Tratado de Responsabilidade Civil. Revista dos Tribunais: São Paulo, 6ª edição, 2004, p. 177)

E segue divagando:

"O que importa, no caso, como observa Alex Weill e François Terré, é apurar se a atitude da vítima teve o efeito de suprimir a responsabilidade do fato pessoal do agente, afastando a sua culpabilidade (Droit Civil, Lês Obligacions, n. 653, p. 647; Malaurie e Aynés, ob. cit. n. 59, p. 57, apud Caio Mário, op. cit., p. 296)" (Op. Cit. p, 178)

Resta incontroverso nos autos o fato de que o autor pendurou-se no veículo de propriedade da ré, pelo lado de fora, visando conseguir uma "carona", sendo que em um dado momento seu pé direito ficou preso na roda traseira, o que ocasionou, segundo o laudo pericial, debilidade de 3% do membro inferior acometido (f. 302).

Em relato fornecido no boletim de ocorrência (f. 10/13), mais relevante do que os depoimentos judiciais, tendo em vista que estes foram colhidos cerca de dois a três anos após o sinistro, enquanto aquele foi prestado no dia do fatídico, o motorista do veículo coletivo assim atestou:

"Ao Sr. Del. da D.A.V.A, segundo versão do cond. V 01 (ônibus) o mesmo transitava pela Av. Alameda dos Sabiás, sentido centro B.H ao Bairro Nacional, próximo ao nº 677 ao passar pelo quebra molas e em seguida passou pela via em um local plano, transitava à sua esquerda um veículo de auto escola, que sinalizou que tinha a seta ligada para a direita, momento em que o mesmo segurou o seu veículo no freio, quando percebeu que um ciclista não identificado saiu de trás do veículo para a esquerda, mandando parar o ônibus, que tinha um outro ciclista debaixo do ônibus, vindo a descer e percebendo que o pé direito estava debaixo do eixo traseiro direito vindo a efetuar uma marcha-a-ré, para retirar o pé do env 02 (ciclista) e em seguida colocando-o no ônibus junto com a bicicleta, acompanhado do outro ciclista, socorrendo até policlinica do Ressaca. Momento em que socorria o ciclista, veio um veículo não identificado levando as bicicletas e o outro ciclista." (f. 12)

No curso da instrução processual, foram colhidos depoimentos do próprio autor, do motorista do ônibus, do cobrador à época dos fatos e de mais duas testemunhas do autor, sendo que uma delas era o ciclista que estava com o requerente no dia do fatídico e a outra era um passageiro do ônibus, que esclareceu conhecer o autor, por já ter andado de bicicleta com o mesmo.

Pela simples leitura dos depoimentos supramencionados, verifico que os mesmos apresentam várias contradições, de forma que a única certeza que se pode ter no caso dos autos é de que o autor estava "pegando carona" na traseira do ônibus da requerida no momento em que sofreu o acidente narrado na inicial.

Passo a transcrever trechos dos depoimentos supramencionados:

"(...) o depoente trafegava de bicicleta pelo bairro Cabral e num trecho e aclive, acabou por prender o pé no pára-choque traseiro do ônibus da empresa ré, fazendo-o com o propósito de subir o morro rebocado pelo ônibus, evitando, desta forma, bater pedal; que tão logo o ônibus passou por um quebra-molas, o motorista o parou, empreendeu uma marcha-à-ré, atingindo o depoente com a traseira do ônibus, jogando-o no solo, debaixo do diferencial; que a carcaça do diferencial ainda atingiu o depoente na região frontal e o pneu traseiro do lado direito acabou pisando no pé direito do depoente; que o colega do depoente que também pegava carona no ônibus, avisou o motorista que o depoente estava sob o veículo, oportunidade em que ele empreendeu outra marcha-à-ré, passando por cima da bicicleta do depoente; que parado o ônibus o depoente conseguiu sair sob o ônibus" (f. 349; depoimento pessoal do autor).

"(...) que era passageiro do ônibus da empresa ré e quando estava ele trafegando pelo bairro Cabral, depois de transpor um morro e já numa rua plana, seu condutor passou a fazer zigue-zagues, vindo em seguida a pará-lo e, imediatamente, empreender uma marcha-à-ré, de forma brusca, por uns três a cinco metros; que nesse momento, um outro rapaz de nome, ao que parece, Leandro, gritou para o motorista, alertando-o que havia uma pessoa caída sob o veículo; que o motorista desceu do ônibus e voltou imediatamente arrancando-o à frente e parando-o novamente, momento em que debaixo dele saiu o rapaz com o pé machucado; (...) que o depoente chegou a ver quando o motorista freou o ônibus e empreendeu a marcha-à-ré, tendo o depoente a impressão que ele o fez procurando atingir alguém, mesmo porque sua frente estava livre e desimpedida, não havendo necessidade daquela manobra; (...) que o depoente não chegou a notar que o motorista estivesse percebendo alguém na traseira do ônibus (...) que conhecia o autor há cerca de um ano, antes do acidente, porque juntos já haviam andado de bicicleta juntos; que no entanto nunca freqüentou a casa" (f. 351/352; grifo nosso; depoimento de Anderson de Freitas Contão, testemunha do autor).

"(...) que estava junto com o autor, andando de bicicleta e numa rua do bairro Cabral, num morro, acabaram pegando carona num ônibus da empresa ré que por ali passava; que tão logo subiu o morro, o condutor parou o ônibus e deu marcha-à-ré, momento em que acabou pisando no autor, enquanto que o depoente conseguiu desvencilhar, indo para a lateral esquerda do ônibus; que o autor gritava e o depoente também alertava o motorista, mas ele acabou dando outra marcha-à-ré, mais curta, quando então constatou que havia atropelado o autor; que o motorista desceu, olhou debaixo do ônibus e de imediato quis arrancá-lo para a frente, tendo o depoente recomendado que o fizesse para trás, de modo que não pisasse no autor; que em seguida o autor saiu debaixo do ônibus e foi levado à Policlínica; (...) que o depoente e o autor, vez por outra, pegavam carona em traseira de ônibus; que enquanto viajavam de carona no ônibus, ele chegou a transpor um quebra-mola mas o depoente e o autor não tiveram qualquer problema; (...) que enquanto andaram de carona no ônibus, o condutor chegou a fazer alguns zigue-zagues." (f. 353/354; depoimento de Flávio Pereira de Almeida, testemunha do autor ouvido como informante).

"(...) que conduzia o veículo envolvido no sinistro descrito na inicial; que trafegava a cerca de 50 km hora, quando próximo a um quebra-mola foi alertado por um menino que estava de bicicleta pedindo que o motorista parasse de imediato o que foi feito, alegou o menino que havia um menino debaixo do ônibus na parte direita que segundo foi informado pelo menor a vitima estava de bicicleta pegando carona no ônibus e de repente pelo que tudo indica com a frenagem do coletivo aparentemente o menor não conseguiu manter-se na bicicleta ou soltou do coletivo e se feriu no pé e outras lesões; que o informante não havia visto o menor pegando carona na traseira do coletivo, (...); que o informante prestou socorro ao menor; (...) que para reduzir a marcha do veículo usou suavemente o freio próximo ao quebra-mola; que não tem como informar como a vítima foi parar debaixo da roda traseira do ônibus. (...) que em nenhum momento próximo ao quebra-mola chegou a dar marcha ré no veículo." (f. 381 e 394; depoimento de André Luiz da Mata, motorista do ônibus, ouvido como informante)

"(...) que à época dos fatos, janeiro/2004, a testemunha trabalhava na empresa demandada (...) a testemunha se recorda de um acidente ocorrido no bairro Cabral; que se recorda de um acidente envolvendo um menino de bicicleta, que foi noticiado, em primeiro plano por um passageiro, que disse ao motorista que havia esta criança "agarrada no pára-choque"; que o motorista teria parado em uma subida para esse menino descer, contudo, ao arrancar, muitos passageiros viram e avisaram que havia ocorrido um atropelamento; que o motorista não chegou a ver a vítima; que era comum na região do acidente crianças pegarem carona nos ônibus, sendo comum também aos motoristas, quando da presença de policiais dentro do ônibus, pleitear que os mesmos afastassem esses indivíduos; que a arrancada do veículo no momento dos fatos foi normal, não havendo trancos ou recuos (...) que à época dos fatos ninguém do lado externo do veículo informou do atropelamento por ser uma região erma; que no referido veículo não havia visão traseira pelos vidros, em virtude das propagandas na parte de trás dos ônibus; que assim que foi avisado do atropelamento, o motorista do ônibus parou o veículo; que tanto a testemunha, quanto o motorista desceram do veículo após a ocorrência dos fatos (...) que a criança se encontrava debaixo da roda traseira direita do ônibus; que não se lembra de ter sido imprimida marcha ré no veículo a pedido dos passageiros." (f. 437/438; depoimento de Romeu Leite da Silva; cobrador do ônibus à época do acidente)

Verifico que o único ponto comum em todas as declarações produzidas em juízo é o fato de que o autor encontrava-se pendurado na parte exterior do coletivo, em movimento.

Por outro lado, a alegação do autor, em seu depoimento pessoal, de que o motorista da empresa ré foi responsável pelo acidente ao empreender uma marcha à ré no ônibus que atingiu o requerente, jogando-o no solo, não restou demonstrada no caso dos autos, tendo em vista que não se pode considerar como prova cabal desse fato a afirmativa do outro jovem, ouvido como informante, que também estava pegando carona no dia do acidente, e a afirmativa de um passageiro que coincidentemente conhecia o autor e já havia andado de bicicleta com o mesmo.

Na verdade, a única marcha-ré comprovadamente ocorrida no presente caso foi aquela narrada pelo motorista do ônibus no BO, empreendida após o acidente, a fim de retirar o pé direito do autor que estava preso à roda traseira do veículo, conforme também afirmou o colega do requerente que estava pegando carona, senão vejamos:

"quando então constatou que havia atropelado o autor; que o motorista desceu, olhou debaixo do ônibus e de imediato quis arrancá-lo para a frente, tendo o depoente recomendado que o fizesse para trás, de modo que não pisasse no autor; que em seguida o autor saiu debaixo do ônibus e foi levado à Policlínica;" (f. 353)

Dessa forma, analisando com cuidado e atenção todo o conjunto probatório desenvolvido ao longo da instrução processual, resta evidenciada, no caso sub judice, a culpa exclusiva da vítima, razão pela qual não há falar-se em dever de indenizar.

Isso porque o autor, ora apelado, de forma irresponsável, arriscou-se demasiadamente ao se pendurar de bicicleta no coletivo em movimento, pelo lado do fora, estando, infelizmente, a sofrer as conseqüências de seu próprio ato.

Sobre o tema, eis a jurisprudência:

"INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CONTRATO DE TRANSPORTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EXCLUDENTE. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. "CARONA" EM COLETIVO.

Em face da responsabilidade objetiva, a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público responderá pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiro, nos termos do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição da República, a menos que se comprove uma das causas de irresponsabilidade, como a força maior, caso fortuito ou culpa exclusiva da vítima.

Age com culpa exclusiva a vítima que se arrisca demasiadamente, pendurando-se em coletivo, pelo lado de fora, visando conseguir carona." (TJ-MG; 2.0000.00.496605-4/000(1); Relator: IRMAR FERREIRA CAMPOS; Data do Julgamento: 14/04/2005; Data da Publicação: 05/05/2005).

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - ATROPELAMENTO DE MENOR - MORTE - LITISCONSÓRCIO ATIVO NECESSÁRIO DOS PAIS - INEXISTÊNCIA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL - NÃO CABIMENTO - AGRAVO RETIDO E APELAÇÃO NÃO PROVIDOS. - Em ação de indenização por dano decorrente de morte por atropelamento do filho menor, não há litisconsórcio ativo necessário dos pais. - A concessionária de serviço público de transporte responde objetivamente pelos danos causados a terceiros, sejam eles usuários ou não dos serviços, uma vez que o art. 37, § 6º, da CF/88 não faz qualquer ressalva neste sentido. - Ainda que se trate de responsabilidade objetiva, a culpa exclusiva da vítima rompe o nexo de causalidade e, em conseqüência, afasta a responsabilidade e o dever de indenizar. - Recursos não providos." (TJ-MG; 1.0105.06.196658-3/001(1); Relator: MÁRCIA DE PAOLI BALBINO; Data do Julgamento: 13/09/2007; Data da Publicação: 02/10/2007)

"TRANSPORTE URBANO DE PASSAGEIROS - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - CONFIGURAÇÃO - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR AFASTADA. Ao transporte urbano em geral, que, obviamente, inclui os ônibus municipais, aplica-se o § 6º, do art. 37, da CR/88 e o Decreto Legislativo n. 2.681/12, de cujo art. 17 se depreende tratar-se de responsabilidade objetiva, admitindo-se como únicas excusativas o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima. Restando demonstrado nos autos que a conduta do autor, no momento do acidente, foi pautada pelo desequilíbrio emocional, expondo sua integridade física, o que culminou em seu atropelamento, não há se falar em responsabilidade civil da ré em indenizá-lo." (TJ-MG; 1.0024.03.152840-9/001(1); Relator: EDUARDO MARINÉ DA CUNHA; Data do Julgamento: 06/12/2006; Data da Publicação: 11/01/2007).

"AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - APELAÇÃO - TEMPESTIVIDADE - AGRAVO RETIDO - DESPROVIMENTO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - MENOR QUE PEGAVA CARONA NO ESTRIBO DE ÔNIBUS ESCOLAR - AUSÊNCIA DE DEVER INDENIZATÓRIO. (...) Comprovado nos autos que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do menor-vítima, o qual se encontrava dependurado no estribo do ônibus escolar, a pegar carona, e, quando da partida deste, caiu e acabou sendo atropelado, deve ser julgado improcedente o pedido na ação de indenização aforada por seus genitores." (TJ-MG; 1.0024.03.012932-4/001(1); Relator: SELMA MARQUES; Data do Julgamento: 19/12/2005; Data da Publicação: 10/03/2006).

Impende destacar que o motorista do coletivo não poderia prever que o autor estivesse, no momento do acidente, pendurado atrás do veículo com sua bicicleta, em comportamento completamente inadequado e arriscado.

Dessa forma, outro não pode ser o resultado da ação, a não ser o de improcedência, devendo ser reformado o decisum vergastado.

Em virtude da improcedência da ação, resta prejudicada a análise das demais questões suscitadas pela primeira apelante.

Ante o exposto, dou provimento à primeira apelação, para reformar a r. sentença e julgar improcedente a ação.

SEGUNDA APELAÇÃO

A irresignação da segunda apelante merece prosperar.

Antes de mais nada, devo esclarecer que, dentre outras questões suscitadas pela segunda recorrente, ela alega que o acidente em apreço ocorreu por culpa exclusiva do autor.

Assim sendo, tenho por bem me reportar à fundamentação da primeira apelação, na qual consignei a culpa exclusiva do autor pelo acidente e a consequente necessidade de reforma da sentença para julgar improcedente a ação.

Em razão da improcedência da ação, resta prejudicada a análise das demais questões suscitadas pela segunda apelante.

Por tais razões, dou provimento à segunda apelação, para reformar a r. sentença e julgar improcedente a ação.

TERCEIRA APELAÇÃO

A irresignação da terceira apelante merece prosperar.

A terceira apelante, assim como as outras recorrentes, sustenta, dentre outras matérias, que o acidente sofrido pelo autor se deu por sua culpa, quando pegava carona na traseira do coletivo com sua bicicleta.

Conforme já destaquei, quando do julgamento da segunda apelação, tenho por bem me reportar à fundamentação da primeira apelação, na qual consignei a culpa exclusiva do autor pelo acidente e a consequente necessidade de reforma da sentença para julgar improcedente a ação.

Com efeito, em virtude da improcedência da ação, resta prejudicada a análise das demais questões suscitadas pela terceira apelante.

Mediante tais fundamentos, dou provimento à terceira apelação, para reformar a r. sentença e julgar improcedente a ação.

DISPOSITIVO DAS TRÊS APELAÇÕES

Por todo o exposto, dou provimento às apelações, para reformar a r. sentença e julgar improcedente a ação.

Como consectário, inverto os ônus sucumbenciais fixados na sentença e condeno o autor ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios ao patrono da ré que fixo em R$2.000,00, com fulcro no disposto no art. 20, §4º do CPC, suspensa a exigibilidade por estar sob o pálio da justiça gratuita.

Em virtude da improcedência da ação principal, julgo prejudicada a lide secundária.

Além disso, como a denunciação à lide perpetrada nos autos não é obrigatória, pois se refere à hipótese do art. 70, III do CPC, condeno a denunciante Transimão Transportadora Simão Ltda. a pagar honorários advocatícios às denunciadas Generali do Brasil Cia. Nacional de Seguros e Companhia de Seguros Aliança da Bahia, no montante de R$1.200,00, para cada uma.

A seguradora Generali do Brasil Cia. Nacional de Seguros também denunciou à lide a IRB - Brasil Resseguros S.A..

Destarte, condeno a Generali do Brasil Cia. Nacional de Seguros a pagar honorários advocatícios a IRB - Brasil Resseguros S.A., honorários estes que fixo em R$800,00.

Custas recursais, ex lege.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): LUCIANO PINTO e MÁRCIA DE PAOLI BALBINO.

SÚMULA: DERAM PROVIMENTO ÀS PRIMEIRA, SEGUNDA E TERCEIRA APELAÇÕES.




JURID - Ação de indenização. Contrato de transporte. [17/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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