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quarta-feira, 12 de agosto de 2009

JURID - Recurso de revista. Legitimidade ativa do ministério público [12/08/09] - Jurisprudência


Recurso de revista. Legitimidade ativa do ministério público do trabalho. Ação civil pública. Administração pública. Terceirização fraudulenta.
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Tribunal Superior do Trabalho - TST

PROCESSO Nº TST-RR-588/2003-011-10-00.1

A C Ó R D Ã O

6ª Turma

RECURSO DE REVISTA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TERCEIRIZAÇÃO FRAUDULENTA. ATIVIDADE-FIM. CONTRATAÇÃO SEM PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. DISCUSSÃO CIRCUNSCRITA A DIREITOS DIFUSOS. A legitimidade do Ministério Público do Trabalho, na defesa de interesses difusos, em ação civil pública, já está consagrada, na doutrina e na jurisprudência do c. Tribunal Superior do Trabalho e do e. Supremo Tribunal Federal. O Douto Ministério Público tem a legitimidade reconhecida, conforme previsão tanto na Constituição Federal, artigos 127 c/c 129, inciso III, quanto na Lei Complementar nº 75/93, que conferiu tal legitimação para a defesa dos interesses difusos e coletivos na Justiça do Trabalho, sendo os interesses individuais homogêneos espécie de interesses coletivos lato sensu. Constatado ser o bem tutelado a intermediação de mão-de-obra fraudulenta direcionada à atividade-fim da tomadora de serviços para se eximir da obrigação de admissão mediante prévia aprovação em concurso público, é de se verificar que se encontram inseridos naqueles direitos que visam à defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, o que torna legitimado o Douto Ministério Público para a propositura de ação civil pública.

LITISCONSÓRCIO. NÃO-CONHECIMENTO. Não demonstrada violação literal de preceito de lei ou divergência específica, a teor do artigo 896 da CLT e da Súmula nº 296 desta c. Corte. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. LEGALIDADE DOS CONTRATOS. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. NÃO-CONHECIMENTO. Violação literal e inequívoca de preceito de lei ou constitucional não demonstrada, nem divergência jurisprudencial apta ao exame. Artigo 896 e alíneas da CLT.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-588/2003-011-10-00.1, em que é Recorrente COMPANHIA DE URBANIZAÇÃO DA NOVA CAPITAL DO BRASIL - NOVACAP e Recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO.

Inconformada, a reclamada interpõe recurso de revista às fls. 359-378. Reitera a alegação de ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho para propor ação civil pública com vistas à declaração de nulidade da relação jurídica havida com os empregados terceirizados, bem como à abstenção de contratação de pessoal mediante empresa interposta. Indica violação dos artigos 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93. Transcreve arestos para a comprovação de divergência jurisprudencial.

Insurge-se contra o não acolhimento do litisconsórcio necessário passivo, apontando ofensa ao artigo 47 do CPC e trazendo arestos que entende divergentes.

Pugna, por fim, pela reforma da r. decisão proferida pelo eg. Tribunal Regional no tocante à continuidade dos serviços públicos objeto regular dos contratos e à exigência de concurso público para celebração de contratos de prestação de serviços. Para tanto, indica afronta ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal e apresenta um aresto ao cotejo de teses.

O recurso de revista foi admitido diante de possível divergência jurisprudencial, quanto à ilegitimidade do Ministério Público para a defesa de interesses difusos mediante ação civil pública e à formação do litisconsórcio necessário, conforme o r. despacho de fls. 383-385.

Foram apresentadas contra-razões às fls. 389-399.

Sem remessa à d. Procuradoria-Geral do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TERCEIRIZAÇÃO FRAUDULENTA. ATIVIDADE-FIM. CONTRATAÇÃO SEM PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. DISCUSSÃO CIRCUNSCRITA A DIREITOS DIFUSOS.

CONHECIMENTO

A eg. Corte Regional, ao apreciar recurso ordinário interposto pela reclamada, concluiu pela legitimidade ad causam do Ministério Público do Trabalho para o ajuizamento de ação civil pública, que visa à declaração de nulidade da contratação para atividade-fim mediante empresa interposta e à abstenção de proceder a novos contratos, por se tratar de direito difuso, assim consignando seu entendimento:

"No caso em espécie é incontroverso que a Ré contratou sob a capa simulada da "terceirização" empregados sem concursos públicos para laborarem na atividade-fim da Ré.

Investigação percuciente do Ministério Público do Trabalho comprova essa alegação. Vejamos:

"...os depoimentos coletados (doc.04), inclusive de ocupantes de cargos de confiança da Novacap, não deixam qualquer dúvida quanto à pessoalidade e subordinação na relação do ente público com os empregados da empresa privada em referência. As atividades destes são idênticas àquelas desenvolvidas pelos servidores públicos, sua chefia imediata é a mesma, inexiste qualquer controle por parte da Ipanema quanto ao trabalho ou à jornada de seus empregados junto à Novacap. As diferenças residem na esfera salarial, pois a remuneração dos servidores públicos é, em média, cinqüenta por cento superior à dos empregados da Ipanema, bem assim na circunstância de que os trabalhadores dessa empresa, embora desenvolvam as mesmas atividades dos empregados da Novacap, não foram submetidos a concurso público, ocorrendo o mesmo quanto aos empregados do ICS. Aliás, a própria empresa pública, na pessoa do assessor da Diretoria administrativa, senhor Washington Luiz Souza Sales, confessa que trabalhadores vinculados ao contrato 810/98 "exercem atividades inerentes ao dia-a-dia da Novacap" (fl. 04).

Desta forma, violou o art. 37, inc. II, da Constituição Federal, o qual exige aprovação em concurso público para o ingresso em empresa pública e, assim sendo, violou os direitos difusos de todos os trabalhadores candidatos ao concurso público que deveria ter sido realizado pela Ré." (fls. 343-344)

A reclamada, nas razões de recurso, reitera a alegação de ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho para propor ação civil pública com vistas à declaração de nulidade da relação jurídica havida com os empregados terceirizados, bem como à abstenção de contratação de pessoal mediante empresa interposta. Indica violação dos artigos 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93. Transcreve arestos para a comprovação de divergência jurisprudencial.

Como se depreende do v. acórdão impugnado, trata-se de ação civil pública em que se visava a assegurar abstenção de contratação mediante interposta pessoa para o exercício de atividade-fim da tomadora de serviços, assim como a observância da exigência constitucional de aprovação prévia em concurso público.

Tais direitos foram identificados como difusos, como se pode observar da r. decisão regional:

"Dessa forma, restou provado que a relação de trabalho se desenvolveu com os requisitos do art. 3º da CLT, e que o vínculo de emprego só não é declarado em virtude de vedação constitucionais, devendo, portanto, as referidas relações jurídico-trabalhistas serem consideradas nulas de pleno direito, porque desenvolvidas com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos nela contidos.

Diante da vasta documentação colacionada aos autos, fica patente e irrefutável a violação ao artigo 37, caput, da Constituição Federal/88, violação esta praticada pela NOVACAP, que não observou o princípio da moralidade pública, fazendo contratações irregulares, sob a simulação da terceirização, ao arrepio da lei, desprezando o preceito constitucional que prevê o concurso público, com a finalidade de que as pessoas possam concorrer com igualdade, com dignidade, sem precisar de arranjos políticos para se colocar no mercado de trabalho." (fls. 355)

De início, cumpre registrar que aresto sem a indicação de sua origem não se presta ao fim colimado, porque inviabilizada a aferição da observância da exigência contida na alínea "a" do artigo 896 da CLT relacionada à proveniência.

A parte logra demonstrar divergência válida e específica, por meio do aresto de fls. 362, oriundo do eg. TRT da 3ª Região, que registra tese no sentido de não ter legitimidade o Ministério Público para ajuizar ação civil pública para a tutela de interesses difusos.

Conheço, por força da alínea "a" do artigo 896 da CLT.

MÉRITO

Discute-se nos autos a legitimação do Ministério Público do Trabalho para propor ação civil pública para a defesa de interesses difusos.

O artigo 127 dispõe que:

"O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis."

A promoção da ação civil pública pelo Ministério Público, está prevista no inciso III do artigo 129, que trata das funções institucionais do parquet, como se transcreve:

"III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos."

A Carta Magna ao disciplinar o Ministério Público como guardião dos interesses difusos e coletivos, deixou reservado à lei complementar a forma de tal proteção. A Lei Complementar nº 75/93 trouxe em seu artigo 83, inciso III, uma das formas de exercer a referida proteção, qual seja, a ação civil pública. Assim, a Constituição da República estabeleceu a importante proteção e a lei veio trazer os meios necessários para exercitá-la.

É de se verificar que a Lei Complementar nº 75/93, que regulamenta as atribuições do Ministério Público da União, trata especificamente acerca daquelas do Ministério Público do Trabalho, a teor do inciso III do artigo 83 da norma citada, ao determinar sua competência para propor:

"...ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

É de se ressaltar que a iniciativa do parquet, no ajuizamento de ação civil pública, buscando a defesa de interesses difusos, encontra-se calcada na defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, não sendo, portanto, caso de extinção do processo sem julgamento do mérito.

A legitimação extraordinária do Ministério Público está inserida na Constituição Federal, que prevê a promoção da ação civil pública pelo Ministério Público, no inciso III do artigo 129, que trata das funções institucionais do parquet, associado ao disposto no caput do artigo 127, com a determinação específica da atribuição do Ministério Público do Trabalho prevista no inciso III do artigo 83 da Lei Complementar nº 75/93, ambos já transcritos alhures.

A doutrina e a jurisprudência vêm construindo um pensamento cada vez mais firme no sentido da admissibilidade da Ação Civil Pública e consequente legitimidade do Ministério Público do Trabalho para tutelar além dos interesses difusos, aqueles individuais homogêneos.

O parâmetro para se buscar a tutela do interesse individual homogêneo é a visualização dessa tutela como uma forma de se garantir a maior eficácia às decisões judiciais, examinando o interesse individual não apenas em função da possibilidade da reparação individual do bem lesado, mas em função da equação interesse versus utilidade, a que se refere Ada Pellegrini Grinover, de modo a assegurar que o interesse coletivo prevaleça e que a utilidade garanta um proveito coletivo, social, do direito tutelado.

A jurisprudência desta c. Corte, bem como do e. Supremo Tribunal Federal, vem entendendo que o Ministério Público tem legitimidade para o ajuizamento de ação civil pública para a defesa de interesses difusos e individuais homogêneos, conforme se transcreve:

"MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEGITIIDADE ATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. INTERESSE SOCIAL RELEVANTE. 1. Na dicção da jurisprudência corrente do Supremo Tribunal Federal, os direitos individuais homogêneos nada mais são do que direitos coletivos em sentido lato, uma vez que todas as formas de direitos metaindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), passíveis de tutela mediante ação civil pública, são coletivas. 2. Considerando-se interpretação sistêmica e harmônica dos artigos 6º, VII, letras c e d, 83 e 84 Lei Complementar 75/93, não há como negar a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para tutelar direitos e interesses individuais homogêneos, sejam eles indisponíveis ou disponíveis. Os direitos e interesses individuais homogêneos disponíveis, quando coletivamente demandados em juízo, enquadram-se nos interesses sociais referidos no artigo 127 da Constituição Federal. 3. O Ministério Público detém legitimidade para tutelar judicialmente interesses individuais homogêneos, ainda que disponíveis, ante o notório interesse geral da sociedade na proteção do direito e na solução do litígio deduzido em juízo. Verifica-se, ademais, que o interesse social a requerer tutela coletiva decorre também dos seguintes imperativos: facilitar o acesso à Justiça; evitar múltiplas demandas individuais, prevenindo, assim, eventuais decisões contraditórias, e evitar a sobrecarga desnecessária dos órgãos do Poder Judiciário. 4. Solução que homenageia os princípios da celeridade e da economia processuais, concorrendo para a consecução do imperativo constitucional relativo à entrega da prestação jurisdicional em tempo razoável. 5. Recurso de embargos conhecido e provido." (TST-E-RR-411.489/1997.1, Redator Designado Ministro Lelio Bentes Corrêa, DJ - 07/12/2007)

"EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PEDIDO DE VEDAÇÃO DE CONTRATAÇÃO, PELA RÉ, DE EMPREGADOS POR COOPERATIVA DE TRABALHO FRAUDULENTA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. CARACTERIZAÇÃO. Trata-se o presente feito de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho com o objetivo de impedir a empresa ré de contratar trabalhadores de forma fraudulenta por meio de cooperativas de trabalho, limitando-se a controvérsia a saber se há ou não legitimidade do Parquet para tal ação. Com efeito, a pretensão diz respeito a direitos individuais homogêneos, como corretamente salientado pela e. 4ª Turma, sendo, portanto, legítimo o Ministério Público do Trabalho para ajuizar a presente ação civil pública. Recurso de embargos não conhecido. (TST-E-RR-775.008/01.2, HORÁCIO SENNA PIRES, DJ - 16/03/2007)

"MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEGITIMIDADE ATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS COLETIVOS E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS INDISPONÍVEIS. Tem legitimidade o Ministério Público do Trabalho para propor ação civil pública, visando a tutelar direitos coletivos. Tal é a hipótese sob exame, em que o Parquet Trabalhista persegue a imposição de obrigação de não fazer, com efeitos projetados para o futuro, mediante provimento jurisdicional de caráter cominatório, consistente em não repassar para os salários eventuais prejuízos decorrentes da atividade empresarial, inclusive decorrente de operação com bomba de combustível na venda de produto ao público e de cheques de clientes sem provisão de fundos, observada, no entanto, a exceção contida no §1º do art. 462, da CLT. Inteligência dos artigos 83, III da Lei Complementar nº 75/93 e 129 da Constituição Federal. Tal legitimidade alcança, ainda, os direitos individuais homogêneos, que, na dicção da jurisprudência corrente do exc. Supremo Tribunal Federal, nada mais são senão direitos coletivos em sentido lato, uma vez que todas as formas de direitos metaindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), passíveis de tutela mediante ação civil pública, são coletivos. Imperioso observar, apenas, em razão do disposto no artigo 127 da Constituição Federal, que o direito individual homogêneo a ser tutelado deve revestir-se do caráter de indisponibilidade. Recurso de Embargos conhecido e provido." (TST-E-RR-636470/2000, Relator Ministro Lelio Bentes Corrêa, DJ - 20/08/2004)

"MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. LEGITIMIDADE ATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS COLETIVOS E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS INDISPONÍVEIS. Na dicção da jurisprudência corrente do exc. Supremo Tribunal Federal, os direitos individuais homogêneos nada mais são senão direitos coletivos em sentido lato, uma vez que todas as formas de direitos metaindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos) passíveis de tutela mediante ação civil pública, são coletivos. Consagrando interpretação sistêmica e harmônica às leis que tratam da legitimidade do Ministério Público do Trabalho (artigos 6º, VII, letras c e d, 83 e 84 da LC 75/93), não há como negar a sua legitimidade para propor ação civil pública para tutelar direito individual homogêneo. Imperioso observar, apenas, em razão do disposto no artigo 127 da Constituição Federal, que o direito a ser tutelado deve revestir-se do caráter de indisponibilidade. Recurso de Embargos conhecido e provido." (TST-E-RR-379855/1997, Relator Ministro Lelio Bentes Corrêa, DJ - 25/06/2004)

É de se ressaltar que os interesses difusos revestem-se de caráter "essencialmente coletivo" a requerer, por conseguinte, trato processual coletivo, nas palavras de Kazuo Watanabe, na obra Código de Defesa do Consumidor Comentado.

Assim sendo, resta consagrada a legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho na tutela dos interesses difusos, conforme já vinha decidindo o e. Supremo Tribunal Federal, em acórdão da lavra do Ministro Maurício Corrêa:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. 1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. 5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1. Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação. RE 163.231/SP. DJ 29/6/2001.

A tutela de direitos difusos é incontroversa, na medida em que a coletividade de pessoas têm o mesmo direito lesado, visto que a conduta atingia a todos, na contratação irregular por meio de intermediação de mão-de-obra fraudulenta direcionada à atividade-fim da tomadora de serviços para se eximir da obrigação de admissão mediante prévia aprovação em concurso público, sendo de se legitimar o Ministério Público na atuação contra tal conduta, por força da norma constitucional.

Com esses fundamentos, nego provimento ao recurso de revista.

II - LITISCONSÓRCIO

RAZÕES DE NÃO-CONHECIMENTO

O eg. Tribunal Regional concluiu não ser possível o litisconsórcio necessário no Processo do Trabalho, ao seguinte fundamento:

"O Juízo a quo analisou a questão com objetividade e precisão; faço dela minhas razões de decidir: '... a intervenção de terceiro, a qualquer título, deve ser mantida como figura peculiar ao Processo Civil, não sendo recepcionada sequer por via oblíqua (art. 769 da CLT) ao Processo Trabalhista, uma vez que, postulada pelo demandado, compreende a formação de lide entre empregado e empregador e terceiros a quem se procura atribuir responsabilidade, para a qual a justiça do trabalho é incompetente materialmente, uma vez que não se trata de dissídio decorrente da relação de emprego, afrontando o art. 114 da CF/88" (fl. 263)" (fls. 344-345)

Nas razões de recurso de revista, a reclamada insurge-se contra o não acolhimento do litisconsórcio necessário passivo, apontando ofensa ao artigo 47 do CPC e trazendo arestos que entende divergentes.

Convém esclarecer, de plano, que aresto oriundo do c. Superior Tribunal de Justiça não serve para a comprovação de divergência jurisprudencial, nos exatos termos da alínea "a" do artigo 896 da CLT.

Os arestos provenientes da c. SDI-2 são inespecíficos, porque apenas abordam a citação do litisconsorte passivo necessário em mandado de segurança, em situações que não se mostram condizentes com a dos autos, que trata de ação civil pública.

O aresto de fls. 365, oriundo do eg. TRT da 3ª Região, também não demonstra a especificidade necessária, pois se limita a aduzir sobre a necessidade de se postular às prestadoras de serviços em ação civil pública, porque litisconsórcio necessário, sem, contudo, abordar a questão de não ter sido recepcionada a intervenção de terceiro no processo do trabalho. Pertinência da Súmula nº 296 deste c. Tribunal Superior do Trabalho.

Não se percebe afronta à literalidade do artigo 47 do CPC, ante o entendimento de não ser compatível a intervenção de terceiro com o processo do trabalho, na medida em que o referido preceito de lei nada dispõe acerca de sua aplicabilidade ou recepção no processo do trabalho.

Não conheço.

III - CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. LEGALIDADE DOS CONTRATOS. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO.

RAZÕES DE NÃO-CONHECIMENTO

A eg. Corte Regional, após fazer referência ao contrato de prestação de serviços, aos editais de concorrência e aos depoimentos de testemunhas, concluiu pela ilegalidade na intermediação de mão-de-obra pela NOVACAP, porque contratados os empregados para suas atividades essenciais, com defasagem salarial em relação aos empregados permanentes e concursados, a revelar intenção de burlar a exigência constitucional de prévia aprovação em concurso público.

Eis os fundamentos norteadores da r. decisão da eg. Corte Regional, ao negar provimento ao recurso ordinário da reclamada:

"Analisando o 'Quadro de Empregos Permanentes' da NOVACAP (fls. 92/102), extrai-se que as funções ali descritas são as mesmas dos empregados contratados pela empresa interposta, ou seja, para desenvolver as atividades essenciais da NOVACAP.

(...)

O Contrato celebrado entre a NOVACAP e o Instituto Candango de Solidariedade-ICS, tem por objeto as atividades essenciais da Ré: '... a prestação de serviços concernentes a proteção e preservação do meio ambiente, inclusive a preservação do meio ambiente, inclusive conservação de áreas urbanizadas e ajardinadas e o desenvolvimento tecnológico e institucional previstos no 'programa de Trabalho e Edificação e Urbanização do Distrito Federal' (fl. 186).

Constata-se, também, que há uma necessidade premente de pessoal no seu quadro regular, pois conforme estatística apresentada a defasagem é a seguinte: a) nível básico: 1025 vagas; b) nível médio: 84 vagas; c) nível superior: 53 vagas, perfazendo um total de 1.162 vagas que deveriam ser preenchidas por concurso público (fls. 95/102).

Mas a realização do concurso público não é conveniente à NOVACAP, pois de acordo com a tabela de salário dos empregados permanentes em confronto com os empregados terceirizados, há uma diferença salarial em torno de 50% a favor dos empregados permanentes da NOVACAP (fls. 178/184).

(...)

A tese de que a Ré '...desincumbiu-se, de forma legítima, das peias do concurso público para a realização de determinados serviços...' (fl. 293) restou desmascarada ante os depoimentos dos empregados da NOVACAP, Ipanema e ICS, bem como em face da vasta documentação colacionada nos autos.

Ficou patente que os empregados da Ipanema e do Instituto Candango de Solidariedade tinham controles de horários fiscalizados pela Ré e submetiam-se aos superiores imediatos dela, desenvolvendo as mesmas atividades laborais que os empregados concursados.

(...)

Dessa forma, restou provado que a relação de trabalho se desenvolveu com os requisitos do art. 3º da CLT, e que o vínculo de emprego só não é declarado em virtude de vedação constitucional, devendo, portanto, as referidas relações jurídico-trabalhistas serem consideradas nulas de pleno direito, porque desenvolvidas com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos nela contidos.

Diante da vasta documentação colacionada nos autos, fica patente e irrefutável a violação ao artigo 37, caput, da Constituição Federal/88, violação esta praticada pela NOVACAP, que não observou o princípio da moralidade pública, fazendo contratações irregulares, sob a simulação da terceirização, ao arrepio da lei, desprezando o preceito constitucional que prevê o concurso público, com a finalidade de que as pessoas possam concorrer em igualdade, com dignidade, sem precisar de arranjos políticos para se colocar no mercado de trabalho.(fls. 350-356)

A reclamada, nas razões de recurso de revista, pugna pela reforma da r. decisão regional no tocante à continuidade dos serviços públicos objeto regular dos contratos e à exigência de concurso público para celebração de contratos de prestação de serviços. Para tanto, indica afronta aos artigos 37, inciso II, § 8º, da Constituição Federal; 1º, inciso I, alínea "h", 3, inciso VII, 9º da Lei Distrital nº 2.415/99; 1º da Lei nº 9.637/98; 1º, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.790/90; 2º, incisos I, II, III e IV, 3º, 8º da Lei Distrital nº 2.177/98. Apresenta um aresto ao cotejo de teses.

De plano, cumpre observar que a alegação de afronta a dispositivo constante de lei distrital não se encontra entre as hipóteses de admissibilidade do recurso de revista previstas na alínea "c" do artigo 896 da CLT, que as restringe à demonstração de ofensa literal de preceito de lei ou da Constituição Federal.

Releva notar, ainda, que o único aresto trazido à colação não serve à comprovação de divergência jurisprudencial, por ser oriundo do mesmo Tribunal prolator da decisão recorrida, nos exatos termos da alínea "a" do artigo 896 da CLT.

Uma vez caracterizada a intermediação de mão-de-obra fraudulenta, direcionada às atividades essenciais da tomadora de serviços, que, pelo fato de se tratar de órgão integrante da Administração Pública, sujeita-se à exigência constitucional de aprovação prévia em concurso público, nos termos da Súmula nº 331, item II, deste c. Tribunal e do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, não se percebe afronta aos dispositivos de lei e da Constituição da República invocados pela parte como violados.

Não conheço.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista apenas quanto à ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, negar-lhe provimento.

Brasília, 17 de junho de 2009.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA
Ministro Relator

Publicado em 26/06/09




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