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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

JURID - Recurso de revista. Indenização por acidente de trabalho. [05/08/09] - Jurisprudência


Recurso de revista. Indenização por acidente de trabalho. Eletricista que faleceu eletrocutado na execução de atividades da própria empregadora.


Tribunal Superior do Trabalho - TST.

PROC. Nº TST-RR-123/2006-161-18-00.4

C/J PROC. Nº TST-AIRR-123/2006-161-18-40.9

A C Ó R D Ã O

6ª TURMA

GMHSP/APF/sk/smf

RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRABALHO. ELETRICISTA QUE FALECEU ELETROCUTADO NA EXECUÇÃO DE ATIVIDADES DA PRÓPRIA EMPREGADORA. IMPROSPERÁVEL A TESE DE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. O e. TRT fixa premissa fática segundo a qual o infortúnio teve origem na execução do trabalho. Resta incontroverso nos autos a relação existente entre a atividade laboral do de cujus e o dano causado (óbito). Nesse contexto, ao contrário do que alega o reclamado, o e. TRT não afrontou os artigos 186 e 927 do Código Civil de 2.002 (artigo 159 no CC de 1916); tampouco o 7º, XXVIII, da CF, na realidade, conferiu-lhes a correta interpretação. Somente nas hipóteses em que ausente o nexo de causalidade entre o trabalho executado pelo empregado e o evento danoso, in casu, o óbito, é que se pode admitir culpa exclusiva do obreiro. Acrescente-se, ainda, que, do quadro fático registrado no acórdão do TRT, não se vislumbra nenhuma conduta culposa do empregado que pudesse excluir a responsabilidade civil da empresa. Recurso de revista não conhecido.

COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS ÀS HERDEIRAS DO EMPREGADO FALECIDO PELO SEGURO PRIVADO CONTRATADO PELA EMPRESA. O seguro privado a que se refere a Reclamada, diferentemente do entendimento adotado pelo Tribunal Regional do Trabalho, ostenta a mesma natureza jurídica da indenização decorrente do acidente de trabalho.

Tanto assim que algumas empresas que executam atividades de risco, como é o caso da reclamada, por medida financeira-preventiva, adquire apólices junto às Seguradoras, justamente para que, nas hipóteses de acidente, sejam abatidos ou minorados os custos decorrentes do risco que a atividade empresarial impõe. Note-se que a compensação dos valores não retira a responsabilidade civil do empregador, apenas cobre as despesas ou parte delas. Nesse contexto, irrelevante se o pagamento da indenização é oriundo de seu capital ou proveniente de apólice de seguro, contratado com esta finalidade. Com estes fundamentos, dou provimento ao recurso de revista da Reclamada para determinar sejam compensados o valores comprovadamente recebidos pelas herdeiras do empregado falecido. Recurso conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST-RR-123/2006-161-18-00.4, em que é Recorrente HOT LINE CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA. e são Recorridas LIGIA MENDES DA COSTA E OUTRA.

O e. Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, mediante o v. acórdão às fls. 767-801, complementado às fls. 847-856, negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, mantendo a sentença que afastara a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho, e que a condenara a indenizar as reclamantes (representantes do espólio do empregado falecido) por acidente de trabalho.

A Reclamada interpõe recurso de revista às fls. 879-904, suscitando, preliminarmente, a incompetência da Justiça do Trabalho. No mérito, sustenta a culpa exclusiva do empregado, e por consequência, a inexistência de culpa concorrente, requerendo seja julgado improcedente o pedido.

Admitido na origem (fls. 941-944), as recorridas apresentaram contrarrazões (fls. 961-974).

Considerando a existência de interesse de menor, os autos foram encaminhados ao Ministério Público do Trabalho, juntamente com o Processo nº TST-AIRR-123/2006-161-18-00.4. O órgão Ministerial emitiu Parecer pelo não conhecimento do recurso (fls. 1021-1029).

É o relatório.

V O T O

Satisfeitos os pressupostos referentes à tempestividade (fls. 859-879), representação (fl. 84) e preparo (fls. 733-734 e 938), passo à análise dos específicos do recurso.

1 - CONHECIMENTO

1 - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

O e. Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, mediante o v. acórdão às fls. 767-801, complementado às fls. 847-856, negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, mantendo a sentença que a condenara a indenizar as reclamantes (herdeiras do empregado falecido) por acidente de trabalho. Para tanto, reconhecera culpa concorrente de empregado e empregador.

Seus fundamentos:

"Tenho que a nova redação do artigo 114 da Constituição Federal, dada pela Emenda Constitucional n° 45/04, traz uma visão inovadora da matéria, incluindo expressamente o julgamento das "ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho" (inciso VI).

Conforme reconhecido pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, que tem a última palavra na espécie, esta Justiça Especializada tem competência para julgar o pleito de indenização por danos material e moral decorrente de acidente do trabalho (Conflito de Competência n° 7204. Relator Ministro Carlos Britto. Data do julgamento: 29/06/05).

Assim, o pleito de indenização por danos materiais e morais decorre do acidente do trabalho, o qual está ligado à relação empregaticia havida, sendo, portanto, competente esta Justiça Especializada para julgar a lide.

Ademais, a indenização referenciada, quando devida, integra o patrimônio dos herdeiros, tanto no que se refere aos danos materiais quanto morais, pois não vejo/como diferenciar, juridicamente e de fato, a competência pretensões.O C. STJ pronunciou-se a respeito no processo CC-61587, Conflito de Competência 2006/0074 961-9, Relator Ministro Castro Meira, Ia Seção, julgado em 23.08.06, publicado em 11.09.06, pag. 217:

"PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DO TRABALHO. SERVIDOR PÚBLICO. ARTS. 109 E 114 DA CF. 4. Tem natureza trabalhista a reclamatória intentada pelos herdeiros do trabalhador falecido e em nome dele com o fito de ver reconhecida a indenização por danos morais e materiais ocasionados por acidente de trabalho.

Logo, rejeito a preliminar. "fls. 770-771 - sem destaques no original)

Inconformada, a reclamada interpõe recurso de revista, ao argumento de que a reclamatória intentada por herdeiros deve ser apreciada pela Justiça Comum, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Sustenta que "a referência 'empregado contra empregador', de que trata a Súmula Vinculante nº 3 do STF, "não deixa dúvida quanto à exclusão da competência da Justiça do Trabalho para julgar a presente Ação, que foi proposta por terceiros - viúva e filha - que não o empregado, vítima de acidente de trabalho".

Denuncia violação do inciso VI do artigo 114 da CF, bem como do artigo 113 do CPC.

Colaciona inúmeros precedentes do oriundos do c. STJ, e um precedente da lavra do Ministro Gelson Azevedo, do c. Tribunal Superior do Trabalho (fl. 892).

Sem razão.

A decisão recorrida encontra-se em consonância com a jurisprudência pacificada nesta Corte, consubstanciada na Súmula 392/TST, in verbis: "Dano moral. Competência da Justiça do Trabalho. Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho." .

Acrescente-se que o artigo 943 do Código Civil dispõe que "o direito de exigir a reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança".

Quanto aos arestos oriundos do Superior Tribunal de Justiça, são inservíveis, a teor do disposto no artigo 896, "a" da CLT.

Incide, portanto, na hipótese, o óbice da Súmula 333/TST e do artigo 896, 4º, da CLT.

Corroborando a tese de que a competência é da Justiça do Trabalho, cite-se julgado do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS, DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO AJUIZADA OU ASSUMIDA PELOS DEPENDENTES DO TRABALHADOR FALECIDO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESPECIAL. Compete à Justiça do Trabalho apreciar e julgar pedido de indenização por danos morais e patrimoniais, decorrentes de acidente do trabalho, nos termos da redação originária do artigo 114 c/c inciso I do artigo 109 da Lei Maior. Precedente: CC 7.204. Competência que remanesce ainda quando a ação é ajuizada ou assumida pelos dependentes do trabalhador falecido, pois a causa do pedido de indenização continua sendo o acidente sofrido pelo trabalhador. Agravo regimental desprovido. RE 503043 AgR / SP - SÃO PAULO, AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Julgamento: 26/04/2007, Órgão Julgador: Primeira Turma.

Não conheço do recurso de revista.

1.2 - DANOS MORAIS - ACIDENTE DE TRABALHO - CULPA CONCORRENTE

Quanto ao tema em questão, o e. TRT negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, mantendo a sentença que a condenara, ainda que de forma concorrente, a indenizar os herdeiros do empregado falecido em decorrência de acidente de trabalho.

Seus fundamentos:

"No caso dos danos decorrentes de acidente do trabalho provocados pelo empregador ao empregado (responsabilidade civil), é necessária a comprovação da culpa, pois a responsabilidade é subjetiva.

A solução da questão deve levar em conta as disposições contidas no artigo 7°, inciso XXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual a indenização reparatória por danos oriundos de acidente do trabalho requer a presença do elemento culpa ou dolo.

Para a apuração da responsabilidade civil da recorrente pelos danos provocados pelo acidente que vitimou seu empregado impõe-se o preenchimento dos seguintes requisitos: ação ou omissão culposa ou dolosa do agente, um prejuízo para a vitima e o nexo de causalidade entre ambos.

Tais requisitos são extraídos do artigo 186 do novo Código Civil (artigo 159 do CC de 1916), que, seguindo evolução doutrinária e jurisprudencial, possibilitou, além do ressarcimento do prejuízo material, a reparação do dano moral.

No caso, o prejuízo é evidente, em face do falecimento do empregado.

Por outro lado, depreende-se das provas pericial e testemunhai a culpa concorrente do empregado no infortúnio ocorrido.

Nesse contexto, em que pesem as insurgências de ambas as partes, verifica-se que o d. Julgador de primeiro grau analisou com bastante propriedade a questão da responsabilidade da empregadora em relação ao acidente do trabalho, fazendo um exame acurado das provas constantes dos autos e dando ao caso uma solução jurídica justa, razão pela qual peço vênia para adotar seus fundamentos e adotá-los como razões de decidir quanto a esta matéria:

'Examinemos a alegação capital, de responsabilidade objetiva para os prestadores de serviço, contida no invocado preceito constitucional (art. 37, § 6o da Constituição Federal).

De acordo com a decisão da Excelsa Corte, a responsabilidade objetiva prevista no dispositivo em comento é direcionada ao usuário dos serviços públicos e não se estende a qualquer outra figura vitimada.

Aliás, a dicção do art. 37, § 6o da Carta Magina (sic) é bem explicito:

'§ 6o - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.' (destaquei). Agindo o reclamante como preposto da prestadora de serviços públicos, terceiro seria aquele que, por sua ação ou omissão, viesse a ser vitimado. Trata-se da teoria do risco administrativo, conforme assentado em jurisprudência de nossa mais alta Corte:

'A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente aos usuários do serviço, não se estendendo a pessoas outras que não ostentem a condição de usuário. Exegese do art. 37, § 6o, da CF. ' (RE 262.651, Rei. Min. Carlos Velloso, DJ 06/05/05).

Afasto, portanto, a incidência do art. 37, § 6o da Constituição Federal, porque inaplicável na hipótese.

A Carta Magna tem expressa previsão de responsabilidade do empregador, para acidentes de trabalho, como se vê no artigo 7o, XXVIII. Não há que se falar, em responsabilização do empregador sem a demonstração do nexo causal e da ocorrência de dolo e/ou culpa imputado(s).

De acordo com a versão obreira, o falecido teria sido vitimado em acidente com eletrocussão atendendo ordens do supervisor JOSÉ LAISSON JUNQUEIRA. Em cumprimento a tal ordem, o de cujus teria deixado as funções próprias de encarregado e partido para a execução de um trabalho para o qual não estava suficientemente treinado, despido de equipamentos de proteção e em condições totalmente inseguras propiciadas pelas condutas imprudente e negligente da requerida.

A requerida insurgiu-se quanto a estas alegações, negando o desvio de função, negando a existência de qualquer determinação do supervisor, negando que o autor fosse despreparado para a função - vez que era o superior imediato dos eletricistas, assim como negando a existência de qualquer nexo causal entre a conduta da ré e a fatalidade, porquanto o sinistro teria decorrido de exclusiva culpa da vitima.

Refuto a alegação das autoras de que o autor fosse despreparado para a função.

Ocupando o falecido o posto de encarregado, por óbvio sua capacidade de trabalho estava além daquela exigida para os seus subordinados. Se a conclusão óbvia está errada, competia às autoras o fato extraordinário, que seria a conclusão inversa.

Toda a prova técnica e oral coligida ao processo atesta a capacidade técnica do reclamante:

' . . . que a empresa Hot Line é uma das que mais oferece treinamento aos empregados, tanto que eles facilmente conseguem trabalho em outra empresa quando deixam a Hot Line em virtude do treinamento que recebem nessa empresa; que Evandro com certeza participou de cursos oferecidos pela empresa aos eletricistas e de curso de recapacitação para encarregados; (...) que no local do acidente Evandro era a pessoa mais capacitada para o serviço, embora não fosse ele a pessoa destinada a executá-lo.' (depoimento da Ia testemunha da requerida, fls. 355/356);

'(...) que Evandro tinha melhor qualificação que os demais eletricistas da equipe e por isso ele era o encarregado; que constantemente a empresa Hot Line oferece cursos e reciclagens para os eletricistas, sendo que Evandro participava desses cursos; (...)' (depoimento da 2a testemunha da requerida, fls. 357/358).

'(...) que Evandro tinha qualificação e treinamento adequados à realização do serviço; que a própria Hot Line oferece curso aos eletricistas em convênio com o SENAI; que não sabe de quantos cursbí Evandro participou;

(ooo) que como encarregado Evandro tinha mais conhecimento do serviço que os demais membros da equipe.' (fls. 359/360, depoimento da 3a testemunha da requerida).

'Então, no caso especifico do acidente, o Sr. Evandro Antônio da Silva estava executando os serviços em rede de distribuição de energia em linha viva de Alta Tensão na Subestação vez que como Eletricista, como consta em Carteira de Trabalho cópia anexa ao Processo, estava habilitado a executar os mesmos, conforme Certificado do SENAI, cuja cópia nos foi fornecida pelo Assistente Técnico, Sr. Richard Silva de Freitas. Na função de eletricista este profissional tem a tarefa de subir em postes para executar serviços de manutenção e reforma das redes de distribuição e linhas vivas de energia elétrica de transmissão em Alta Tensão com substituições de cabos, isoladores, braçadeiras e componentes elétricos.' (laudo técnico, descrevendo as funções do eletricista e qualificação do autor, fls. 567) .

Não prospera, assim, o argumento de que o autor fosse despreparado para o serviço que o vitimou.

As autoras chamam, também, a atenção para a NR-10, especialmente os itens '10.2.1.1', '10.2.1.3', '10.2.1. 6'y 1 10.2.2.2' , ' 10.3.2.6' e '10.3. aduzindo que a requerida não deu atenção às regras de segurança estabelecidas neste diploma normativo.

Contudo, não assiste razão às autoras.

Importante sublinhar que a NR-10, editada originariamente pela Portaria n°. 3.214/78 foi integralmente revisada pelo Ministério do Trabalho mediante a edição da Portaria n°. 598, de 07/12/2004, publicada no D.O.U. de 08/12/2004 (Seção I).

Como o sinistro ocorreu antes da revisão da portaria, o fato será analisado à luz das regras jurídicas até então vigentes.

O item 10.2.1.1 aborda a necessidade explicita de cautela nas intervenções em sistemas elétricos. O sinistro não significa necessariamente a ausência de planejamento de segurança, mas a violação de regras, algumas até básicas, de proteção.

O item 10.2.1.3 abordava a necessidade de isolamento da corrente elétrica. O item 10.2.1.6 enfatizava proteções especificas à distância, com controles manuais ou automáticos.

O item 10.2.2.2 cuidava de proteções especiais para sobretensões e sobrecorrentes.

O item 10.3.2.6 é importante para o exame deste caso, porque especificamente relatava a necessidade de aperfeiçoamento técnico para os serviços de reparação Em redes elétricas.

Como já vimos, o autor preenchia adequadamente a exigência.

Por fim, o item 10.3.2.7, que trata do acompanhamento do serviço por profissional de supervisão.

Poder-se-ia dizer que a requerida faltou com o procedimento adequado, com o afastamento do supervisor, fazendo eco ao argumento das autoras. No entanto, afasto tal premissa, uma vez que restou comprovado nos autos que o de cujus não estava incumbido da missão de reparo. A ele, sim, cabia o papel de supervisionar o serviço de reparo. As provas orais assim demonstram:

'...que tem conhecimento de que o supervisor havia indicado outra pessoa para executar o serviço, sendo ela o eletricista Sebastião Silva; que não sabe por qual motivo Evandro resolveu executar pessoalmente o serviço." (fls. 356, depoimento da Ia testemunha da requerida). ' . . .que o supervisor José Laisson não estava presente no local no momento do acidente, mas ele havia passado a coordenação do serviço para Evandro; que por ordem do supervisor quem deveria realizar o serviço era o eletricista Sebastião de Tal; que Sebastião estava presente no local; que o supervisor já havia feito a escala de serviço e indicado Sebastião para a tarefa; que não sabedor qual motivo Evandro resolveu exercitar pessoalmente o serviço; que Sebastião chegou a pedir a Evandro para executar o serviço; que o depoente também pediu para executar o serviço, mas Evandro não deixou, dizendo que depois que ele fizesse aquele serviço o depoente e Sebastião dariam prosseguimento; que Evandro tinha melhor qualificação que os demais eletricistas da equipe e por isso ele era o encarregado;...' (depoimento da 2a testemunha da requerida, fls. 357/358); ...que o supervisor desse trabalho de manutenção era o Sr. José Laisson, tendo ele comentado com o depoente que ele precisaria sair do local onde ocorreu o fato e deixou Evandro no comando do serviço; que José Laisson contou que já havia orientado Evandro de quem realizaria o serviço seria Sebastião de tal; que não sabe por qual motivo Evandro resolveu realizar pessoalmente o serviço; que tem conhecimento de que Sebastião se encontrava no local onde seria realizado o serviço; M. que Evandro tinha qualificação e treinamento adequados a realização do serviço;...' (fls. 359, depoimento da 3a testemunha da requerida).

Eis aí o grande mistério da vida: o que, então, causou a morte de Evandro Antônio da Silva, um pai e esposo, com 2 7 anos de idade, trabalhador competente responsável para ocupar a função /de encarregado, bem treinado, bem equipado num ambiente de provável segurança ?

Enfatizo que essas qualidades profissionais são sustentadas pela própria requerida. São as autoras que negam a capacidade profissional do falecido, argumento que rejeito ante a inequívoca prova (em seu conjunto) coligida nestes autos.

A descrição técnica do sinistro pode ser colhida, primeiro, no laudo interno, providenciado pela requerida:

'E) Acidente:

- Concluído um By Pass provisório para abrir um Fly Tap, a vitima subiu ao local no SKY, ao contato vestido de roupa condutiva, tratou logo de desconectar o Fly Tap, quando então aconteceu o acidente vez que o by Pass provisório estava aberto, provocando um arco elétrico e conseqüente queimaduras em seu tórax, Braços e Cabeça.

F) CAUSA DO ACIDENTE:

Em que pese estarem todos os componentes em perfeita ordem, tais como ferramentas, equipamentos, métodos de trabalho, planejamento; Houve o imprevisto, pois esqueceram e não notaram que o By Pass estava aberto, causando o acidente.

G) CONCLUSÃO:

Ante estas informações prestadas pelo supervisor José Laisson Junqueira, esclarecendo mais, que instantes antes acidente havia acertado com a vitima eletricista Sr. Sebastião da Silva Dias seria o executor da tarefa, salvo m interpretação e outras informações, concluimos que: a falta de revisão no passo a passo da tarefa contribuiu decisivamente para o ocorrido, vez que na revisão constataria que o By Pass estava aberto.' (vide fls. 85/86 - os destaques são meus).

O laudo pericial encomendado pelo juizo, não destoa da narrativa fática, até porque o perito formulou seu laudo após oitiva do Sr. Arnilson:

'As informações colhidas junto ao Sr. Arnilson Pereira, eletricista à época na CONTERRA, hoje na COSERN, e que estava executando serviços próximos em manutenção da rede de distribuição esteve presente no local quando do acontecimento do acidente, são de que é norma da COSERN não permitir a execução de serviços em rede e linha via de distribuição de energia elétrica de Alta Tensão, frente à sua natureza complexa, de eletricistas que não tenham treinamento teórico e prático, e qualificação técnica especifica para essa atividade.

(...) Segundo Sr. Arnilson, o Sr. Evandro ao tentar efetuar a substituição de isoladores fazendo o uso de cestas de caminhão tipo SKY, com aterramento, eusando o EPI, não fez o desligamento da conexão entre cabos de niveis inferior superior, operação esta que consiste em fechar o Jumper (ou By Pass) de isolac provocando desta forma, o acidente'.

Para nós outros, do mundo do Direito, o relato técnico não permite visualizar, com a clareza necessária, o que de fato teria ocorrido.

Mas não se trata de tarefa impossível.

Antes, é preciso compreender dois instrumentos essenciais adotados pelo falecido e que foram participes de sua lamentável morte: o by pass e o fly tap.

By pass quer dizer, em pobre tradução, desvio, atalho, ou seja, um caminho alternativo. É adotado para denominar a intervenção na rede com a criação de um caminho alternativo para a corrente elétrica, isolando a área em que serão executadas as tarefas pelo eletricista.

Também é expressão comum na medicina, especialmente na área cardiologica, quando são criados caminhos alternativos de irrigação para cirurgias cardíacas.

Já o equipamento chamado Fly Tap consiste em espécie de espaçadores para cruzamento de linhas aéreas. Um exemplo de especificações de modelo de Fly Tap pode ser encontrado também na internet, como no documento elaborado pela COPEL10. Imagem, para identificação de um Fly Tap, pode ser encontrada também no projeto publicado na internet pelo Grupo EBD - Bandeirante.

Portanto, se na dinâmica dos fatos, adotou-se o procedimento de instalação/de by pass, foi para evitar a circulação corrente elétrica no ponto que seria manuseado pelo trabalhador. E foi justamente neste momento que ocorreu a chamada falha, cuja responsabilidade a requerida quer imputar exclusivamente ao falecido Evandro.

Ora, como poderia um trabalhador competente e qualificado ter se descuidado de fechar o by pass ou jumper? Se é inequívoco que o desvio da corrente é essencial para se trabalhar em rede viva, seria plausível admitir que o trabalhador ousasse interferir numa rede não isolada, sem que, para tal ousadia, houvesse risco total à sua vida?

Basta atentar que não estamos diante de uma rede de baixa tensão. A área onde ocorreu o sinistro era de Alta Tensão, em uma sub-estação de energia elétrica, com correntes acima de 1000 V - segundo definição do IEE.

É sabido que é dever da empresa guardar um. ambiente seguro, livre de acidentes de trabalho que possam lesionar, parcial ou definitivamente, seus trabalhadores. A regra, edificada há eras, está inserida no art. 157 da CLT. Também é dever do empregado observar as regras de segurança para preservação própria e de seus pares (art. 158, CLT), devendo sempre observar as diretrizes de seu empregador.

Veja que é da empresa a direção trabalhos, dos contratos, do comando, cujo traço maior é a subordinação de seus trabalhadores. Numa relação assim, não é de se admitir que o trabalhador perca a vida no local onde foi buscar o pão de cada dia.

Tudo e mais vim pouco deve ser adotado para fazer frente à imprudências, negligências, impericias. Se nem os elementos de culpa podem ser tolerados num ambiente de trabalho, muito menos o será a figura dolosa de irresponsabilidade, que joga com a vida das pessoas.

No caso, certamente, não estamos diante do dolo, mas de aferir se, no quadro apresentado, agiu ou não o trabalhador com culpa exclusiva no sinistro que lhe subtraiu a vida.

E a resposta, concluo, é negativa.

Não posso assomar as qualidades ostentadas pela requerida para concluir que, num momento de distração, teria o autor faltado com a premissa básica: promover o isolamento da corrente por meio do jvmper ou by pass antes de tocar em rede de energia viva de alta tensão. Não se trata de mera distração ou excesso de confiança, como opinam os técnicos. Trata-se de erro brutal e grosseiro, para o qual não concorre o perfil do alta qualidade anunciado e comprovado pela própria requerida. Por que não uma falha de equipamento? Por que não considerar que o equipamento isolamento falhou? Onde está o by pass adotado naquele infeliz dia? Foi ele submetido à perícia? Qual o modelo de by pass adotado pela COSERN e utilizado pela requerida?

Tenho que se o evento danoso ocorreu por defeito de peça utilizada, ou porque esta não apresenta características técnicas que sustentem a segurança necessária, a lógica estaria preservada, pois não é crivei que o trabalhador houvesse omitido a premissa básica de fechar o by pass antes de tocar na rede viva de alta tensão.

É de se atentar que o by pass não está pendurado em redes de linha viva. São equipamentos que são transportados pelo eletricista para ser instalado provisoriamente. Ora, como poderia o autor portar o equipamento, levando-o para as alturas justamente com a finalidade de instalá-lo e, nesse iter, acabar se esquecendo de cumprir com a finalidade natural do instrumento que é construir o caminho alternativo da corrente e promover o isolamento do ponto de reparo?

Data máxima venia, não encontro lógica que suporte essa conclusão, por mais auto confiança que possa emprestar ao falecido trabalhador.

Outra dúvida capital assola o quadro: 'a quem caberia acompanhar a execução tarefas de reparo?

Certamente, ao supervisor, que não estava presente no local e que, por necessidade do serviço, afastou-se para outro ponto, ainda que próximo.

E teria o falecido trabalhador violado alguma regra substancial de segurança, ao promover, ele próprio, o reparo?

Não posso crer que a conduta do trabalhador vitimado seja fruto de uma violação de regra substancial de segurança.

O fato de ter recebido a delegação do superviso (sic), não quer dizer que o trabalhador Evandro estivesse terminantemente proibido de auxiliar, com suas próprias mãos, a realização das tarefas. Aliás, de que outro modo teriam os trabalhadores que testemunharam no processo a impressão da alta qualificação do falecido obreiro, se não o tivesse visto atuando?

E fosse uma regra substancial de segurança, o procedimento deveria ter sido adotado por escrito pela requerida, com plena ciência de todos os envolvidos em seguir o prescrito.

Se não há uma comprovação de uma regra absoluta de segurança, que impedisse o supervisor ou quem suas vezes fizesse, de ascender ao topo da rede viva e executar o serviço, é porque as normas coletivas de segurança no ambiente de trabalho devem ser indistintamente cumprida por todos, atribuição de tarefas especificas para A, B ou C.

Então, ainda a pergunta: a quem caberia conferir se houve ou não o completo fechamento do by pass? Apenas ao trabalhador vitimado? Não creio que fosse essa uma tarefa exclusiva, atribuída apenas ao trabalhador vitimado. Não é crivei que em um exercício de alta periculosidade, não seja dever de todos os envolvidos estarem atentos, passo a passo, ao que está sendo executado. E bem por isso, imagino, a conclusão do laudo técnico trazido pela própria requerida faz uso do verbo esquecer na 3a pessoa do singular: 'Houve o imprevisto, pois esqueceram e não notaram que o Bv Pass estava aberto, causando o acidente.' (grifei e sublinhei).

Nesse universo de especulações e conclusões, entendo que se o defeito decorria da peça (by pass), Evandro salvou a vida de Sebastião, mas não evitou o sacrifício de um trabalhador.

Se o erro foi de procedimento, atribuído exclusivamente ao ser humano, certamente há falha de segurança coletiva cuja culpa deve ser atribuída à requerida, porquanto não se pode admitir que a responsabilidade recaia exclusivamente sobre a figura do trabalhador, quando há tantos outros envolvidos e com a obrigação de acompanhar e alertar eventual falha de procedimento. Aliás, a antiga redação da NR-10 preconizava a necessidade de previsão de SISTEMA DE PROTEÇÃO COLETIVA, com medidas de isolamento, aterramento e outras medidas similares necessárias à demonstração de que todo o possível foi arquitetado para zelar da saúde humana. As regras de segurança devem, como já disse, ser capitaneadas pela empresa, consoante prevê a legislação consolidada. A revisão da NR-10 não veio acrescentar novas responsabilidades, mas tornar mais minudentes os procedimentos de segurança, definindo: desligamento, bloqueio, teste, aterramento, sinalização e proteção. Afasto, enfim, a ilógica conclusão de que o trabalhador experiente seja a única pessoa responsável por sua própria morte, eis que não foi vitimado por uma concorrência de erros, mas por uma única falha que, de tão grosseira, colide com a

alta qualificação que ostentava, cujo emblema foi defendido e comprovado pela própria ré.

Entendo como não comprovado pela requerida a existência de procedimentos especificos olvidados pelo falecido trabalhador, eis que todo o sinistro decorreu da exclusiva falha no fechamento do by pass, sendo certo que não comprovação segura de que a falha atribuída exclusivamente ao ser humano, quando é bem possível que o próprio equipamento tenha apresentado problemas de isolamento. Se não, no minimo há falha no procedimento coletivo de segurança, por não haver, no momento, ninguém que o alertasse, ainda que não faltassem testemunhas para concluir que o by pass não fechou completamente o circuito para passagem alternativa da corrente.

Concluo, assim, pela culpa concorrente da empresa e empregador, eis que há falhas possíveis atribuídas a ambos. Como já dito, é dever da empresa capitanear os procedimentos de segurança, mas também é dever funcional do empregador concorrer para que o objetivo de um ambiente ae trabalho seguro seja alcançado.

Não se pode imaginar que o autor trabalhe sem verificações continuas do procedimento, atuando à espera de um grito de alerta de quem esteja ao seu lado. O dever de observância é de todos. Ainda que seja prudente distribuir a mesma tarefa de observação dos procedimentos de modo coletivo, isso não exclui nenhum trabalhador em especial da obrigação de vigiar as regras de segurança.

A atuação expedita do falecido trabalhador, abandonando o posto de supervisão para execução direta da tarefa, aliado ao fato de que não há narrativa que tenha adotado procedimento de no sentido de testar a eficácia do by pass, evidenciam que o autor concorreu para o evento. A soma dessa conduta, pela total inércia da requerida, mormente na ausência do alerta por qualquer dos trabalhadores presentes e envolvidos, por ausência de regras especificas de procedimento, por ausência de comprovação de equipamentos de testes da eficácia do by pass adotado, assim como ausência de comprovação de que agiu na completude de sua obrigação de manter higido o ambiente de trabalho, como lhe exige a legislação consolidada e diplomas complementares, fazem emergir igualmente sua responsabilidade. A propósito, já há jurisprudência assentada nesse sentido (...)

O conectivo é aditivo ('e'), o que recomenda a leitura conjugada desses parâmetros.

Destarte, considerando a perda irreparável do esposo, ainda jovem, e do pai, em idade para a filha ainda tão precoce, bem como atento ao fato de que o sinistro resultou da conduta concorrente do falecido e da ex-empregadora, fixo o dano moral em R$45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), sem prejuízo de atualizações futuras. Atribuo 50% (cinqüenta por cento) de cada valor às autoras, devendo a cotaparte da menor impúbere ser depositada em conta poupança onde permanecerá, salvo urgências excepcionais, até que esta atinja a maioridade.

No que concerne aos danos materiais, aqui configurados como lucros cessantes, pedem as autoras que seja fixado valor único. Apresentam como resultado a cifra correspondente a 38 (trinta e oito) anos de salários perdidos, à unidade de R$876,73 (oitocentos e setenta e seis reais e setenta e três centavos).

Ocorre que os lucros cessantes devem corresponder ao que foi deixado de ganhar e não ao capital acumulado do que se deixou ganhar, como pretendem as autoras. Num raciocínio de matemática simples, veja que bastaria depositar o valor total da condenação pedida para, manter-se o capital pretendido (R$476.189,02), sem prejuízo imediata percepção dos juros (e apenas juros) de 1% correspondentes a R$ 4.761,89 (quatro mil, setecentos e sessenta e um reais e oitenta e nove centavos) . Isto, repito, sem prejuízo da atualização monetária do capital pretendido.

Fixo, portanto, a condenação em danos materiais, para pagamento único, em R$100.000,00 (cem mil reais), valor arbitrado nesta data, sem prejuízo de atualizações futuras e atento para o fato da culpa concorrente.

Desse montante, 50% (cinqüenta por cento) deverá ser reservado à requerente menor, destinando-se a importância a uma conta poupança para saque futuro, assim que atinja a maioridade, a exemplo do que já foi determinado com sua cota-parte dos danos morais.

Rejeito a alegação da requerida de que o seguro privado percebido pelas autoras possa ser admitido como compensação.

De acordo com o documento de fls. 89, a requerida atuou como mera estipulante no contrato de seguro, sendo o segurado principal o próprio trabalhador vitimado.

O papel da estipulante em seguro facultativo contratado é de mera mandatária dos segurados reunidos em grupo (vide art. 21, § 2o, Decreto-lei 73/66). /

Tanto assim que a jurisprudência e uníssona no sentido de vedar a denunciação da lide, muitas vezes perpetrada entre empresa estipulante e seguradora, justamente porque inexiste direito de ação de regresso de uma em face da outra. A relação contratual é exclusivamente entre segurado 'trabalhador) e seguradora, razão pela qual descabe autorizar que a requerida seja compensada em importância que foi objeto de seguro contratado pela vitima.

Afasto, igualmente, o pedido de compensação com as verbas percebidas a titulo de proventos (pensão) previdenciarios. A reparação dos danos materiais e morais deve ser efetuada sem prejuízo do seguro a que tem direito o trabalhador e seus dependentes por força da Previdência Social.

Por fim, afasto o pedido de compensação dos lucros cessantes com verbas tipicas de danos emergentes, eis que correspondem estas últimas a despesas decorrentes do evento danoso e não prejuízo colhido por força do que se deixou de ganhar" (fls. 626/648 - grifos do original).

Em razões de revista, a reclamada argumenta que o acidente ocorrera por culpa exclusive do trabalhador que veio a óbito. Denuncia violação dos artigos 7º, XXVIII, da CF; 159 do CC de 1916; 186 e 927 do CC de 2002.

Sem razão.

Destaco, inicialmente, que no acórdão da 18ª Região foi transcrita, ipsis litteris, a sentença. E nesta última, constam todos os elementos fáticos que autorizam o exame do enquadramento jurídico dado pelas instâncias ordinárias, restando afastado o óbice da Súmula 126/TST.

Nesse contexto, verifico que totalmente impertinente a alegação da reclamada no sentido de que houve culpa exclusiva da vítima.

Com efeito, é incontroverso nos autos a relação existente entre a atividade laboral do de cujus e o dano causado. O e. TRT também fixa premissa fática segundo a qual o infortúnio teve origem na execução do trabalho. Ou seja, o acidente ocorrera pelo exercício do trabalho a serviço da empresa.

Nesse contexto, ao contrário do que alega a reclamada, o e. TRT não afrontou os artigos 186 e 927 do Código Civil de 2.002 (artigo 159 no CC de 1916); tampouco o 7º, XXVIII, da CF, na realidade, conferiu-lhes a correta interpretação.

Somente nas hipóteses em que ausente o nexo de causalidade entre o trabalho executado pelo empregado e o evento danoso, in casu, o óbito, é que se pode admitir culpa exclusiva do obreiro. Uma vez constatado o nexo de causalidade, inafastável a responsabilidade civil do empregador.

Acrescente-se, ainda, que, do quadro fático registrado no acórdão do TRT, não se extrai nenhuma conduta dolosa, ou sequer culposa do empregado excludente da responsabilidade civil da empresa.

Com estes fundamentos, não conheço do recurso de revista.

1.2 - COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS PELO SEGURO CONTRATADO PELA EMPRESA

Vejamos a fundamentação do acórdão do TRT para manter o valor da indenização arbitrado pela 1ª instância:

No que tange à irresignação quanto aos valores das indenizações fixadas pela sentença, há de se considerar que a mensuração do montante da reparação é tarefa árdua ao Julgador, ante a ausência na legislação de critérios objetivos à quantificação do dano moral, devendo ser levados em conta os critérios da condição pessoal da vitima, capacidade financeira do ofensor, extensão do dano e caráter pedagógico para o empregador.

No caso, a vítima era jovem quando faleceu (27 anos de idade), deixou esposa e uma filha menor, e, além disso, perdeu a vida de forma trágica, em decorrência de ter recebido uma descarga elétrica no desempenho de suas atividades laborais.

O valor da ultima remuneração correspondeu a R$876,73.

A dor e o sofrimento causados às autoras são imensuráveis .

Assim, entendo razoável o valor fixado a título de indenização por dano moral, qual seja, R$ 45.000,00, sendo metade para cada autora.

Frise-se que tal valor tem o intuito de coibir condutas semelhantes da empregadora que não adotou as medidas de segurança necessárias para evitar o infortúnio que vitimou seu empregado.

No que se refere à indenização por danos materiais, essa compreende os danos emergentes e lucros cessantes (artigo 420 do CPC).

Entretanto, uma vez reconhecida a culpa concorrente da vítima, deve ser deduzido do prejuízo por ela sofrido sua parcela de responsabilidade.

Deste modo, considero justo o montante deferido pelo MM. Juiz de origem (R$100.000,00).."

Por outro lado, não procede o pleito de compensação do valor recebido pelas autoras a titulo de seguro de vida.

Com efeito, a compensação no Direito do Trabalho está adstrita às verbas de natureza trabalhista pagas sob o mesmo titulo, ou seja, entre parcelas que tenham a mesma natureza jurídica.

Assim sendo, não se pode acolher a pretensão do réu de compensação da indenização paga pela seguradora com as reparações por danos morais e materiais deferidas pela r. sentença, pois essas têm natureza diversa.

Pelos motivos expendidos, nego provimento aos recursos." (sem destaques no original).

"Rejeito a alegação da requerida de que o seguro privado percebido pelas autoras possa ser admitido como compensação.

De acordo com o documento de fls. 89, a requerida atuou como mera estipulante no contrato de seguro, sendo o segurado principal o próprio trabalhador vitimado.

O papel da estipulante em seguro facultativo contratado é de mera mandatária dos segurados reunidos em grupo (vide art. 21, § 2o, Decreto-lei 73/66). /

Tanto assim que a jurisprudência e uníssona no sentido de vedar a denunciação da lide, muitas vezes perpetrada entre empresa estipulante e seguradora, justamente porque inexiste direito de ação de regresso de uma em face da outra. A relação contratual é exclusivamente entre segurado 'trabalhador) e seguradora, razão pela qual descabe autorizar que a requerida seja compensada em importância que foi objeto de seguro contratado pela vitima.

Afasto, igualmente, o pedido de compensação com as verbas percebidas a titulo de proventos (pensão) previdenciários. A reparação dos danos materiais e morais deve ser efetuada sem prejuízo do seguro a que tem direito o trabalhador e seus dependentes por força da Previdência Social."

Em razões de revista, a reclamada afirma que as autoras receberam "indenização securitária, antes da propositura da ação, em quantia superior a R$ 100.000,00 (cem mil reais)". Dessa forma, como o valor atualizado da indenização securitária privada recebida, supera, ou no mínimo, é equivalente às indenizações fixadas, deve o mesmo ser compensado nas mesmas de forma a anulá-las ou reduzí-las, caso sejam mantidas." (fl. 899).

Argumenta que os valores pagos pelo seguro facultativo, contratado pela própria empresa em diligência voluntária, devem ser abatidos do valor total da condenação.

Diz que a iniciativa de contratar um seguro com a empresa privada não se confunde com o seguro contra acidentes de trabalho previsto no artigo 7º, XXVIII, da CF, pois este último é direito dos trabalhadores e pago ao órgão previdenciário, em conformidade com o artigo 22, II, da Lei nº 8.212/91.

Colaciona à fl. 897 um aresto oriundo do TRT da 3ª Região.

Com razão.

O aresto colacionado é específico, pois adota o entendimento de que os valores pagos pelo seguro privado, contratado pela empresa, devem ser abatidos.

Conheço do recurso por divergência jurisprudencial.

1.3 - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CORREÇÃO MONETÁRIA DO VALOR INDENIZATÓRIO FIXADO

Em razões de revista, a reclamada insurge-se contra a decisão que fixou o valor da indenização por danos morais, bem como a aplicação de juros e correção monetária a contar do ajuizamento da ação, uma vez que os valores pretendidos pelas autoras não foram acolhidos.

Quanto a este pedido, não colaciona arestos, limitando-se a indicar violação do artigo 93, IX, da CF.

Não há como conhecer do recurso de revista patronal, uma vez que não foi devidamente aparelhado. Além de não colacionar arestos, a reclamada denuncia violação de dispositivo totalmente impertinente à matéria impugnada, pelo que não há como conhecer do recurso.

Não conheço.

2 - MÉRITO

2.1 - COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS PELO SEGURO CONTRATADO PELA EMPRESA

Com razão a empresa.

Do acórdão do TRT deflui-se que o seguro fora contratado por ato voluntário da reclamada, não havendo nenhuma menção à co-participação do empregado. Nesse sentido, entendo que os valores comprovadamente recebidos nos autos devem ser abatidos, sob pena de enriquecimento ilícito do espólio do de cujus.

O seguro privado a que se refere a Reclamada, diferentemente do entendimento adotado pelo Tribunal Regional do Trabalho, ostenta a mesma natureza jurídica da indenização decorrente do acidente de trabalho.

Tanto assim que algumas empresas que executam atividades de risco, como é o caso da reclamada, por medida financeira-preventiva, adquire apólices junto às Seguradora, justamente para que, nas hipóteses de acidente, sejam abatifos ou monirados os custos decorrentes do risco que a atividade empresarial impõe.

Note-se que a compensação dos valores não retira a responsabilidade civil do empregador, apenas cobre as despesas ou parte delas.

Nesse contexto, irrelevante se o pagamento da indenização é oriundo de seu capital ou proveniente de apólice de seguro, contratado com esta finalidade.

Com estes fundamentos, dou provimento ao recurso de revista da Reclamada para determinar sejam compensados o valores comprovadamente recebidos pelas herdeiras do empregado falecido. cujus.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: a) conhecer do recurso de revista por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar sejam compensados os valores comprovadamente recebidos pelas herdeiras do empregado falecido.

Brasília, 17 de junho de 2009.

HORÁCIO SENNA PIRES
Ministro Relator

Publicado em 26/06/09




JURID - Recurso de revista. Indenização por acidente de trabalho. [05/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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