Anúncios


segunda-feira, 10 de agosto de 2009

JURID - Quitação tácita. Inadmissibilidade. Cobrança de diferença. [10/08/09] - Jurisprudência


Impossibilidade jurídica do pedido. Inocorrência. Quitação tácita. Inadmissibilidade. Cobrança de diferença de correção monetária em caderneta de poupança.


Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP.

ACÓRDÃO

IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - Inocorrência - Quitação tácita - Inadmissibilidade - Cobrança de diferença de correção monetária em caderneta de poupança - Quitação exige manifestação expressa e irretorquível de vontade e o poupador não revela a ocorrência daquele instituto nos créditos continuados que se faz em conta - Preliminar rejeitada.

PRESCRIÇÃO - Correção monetária e juros - Demanda que visa a cobrança de diferença alusiva a índices inflacionários não creditados em cadernetas de poupança - Matéria regulada pelo art. 177 do CC/1916, embora proposta a ação na vigência do CC/2002 - Inteligência do art. 2.028 do CC/2002, ante a redução do prazo prescricional de 20 anos (cf. art. 177 do CC/1916), para 10 anos (cf. art. 205 do CC/2002).

CORREÇÃO MONETÁRIA - Caderneta de poupança -Cobrança da diferença não creditada, com base na variação do IPC - Admissibilidade - Ofensa ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido da depositante - Plano Bresser (junho/87) - Índice de 26,06% - Admissibilidade.

JUROS MORATÓRIOS - Incidência a partir da citação, afastado o critério previsto na sentença.

JUROS REMUNERATÓRIOS - Incidência, com capitalização, desde a data em que foi creditado o índice menor na conta poupança.

HONORÁRIOS DE ADVOGADO - Arbitramento - 20% sobre o valor da causa - Arbitramento mantido.

Recurso provido em parte.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO Nº 7.312.038-8, da Comarca de Jundiaí, sendo apelante Banco Bradesco S/A e apelada Paula Yasue Hayashi.

ACORDAM, em Vigésima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, por votação unânime, dar parcial provimento ao recurso.

1. Sentença que condenou o réu a pagar a diferença de remuneração não creditada em cadernetas de poupança da autora, relativas ao período de julho de 1987.

Apela o vencido, sustentando a impossibilidade jurídica do pedido, em razão da quitação. Insiste na ocorrência de prescrição e inexistência de direito adquirido da poupadora à diferença pretendida. Entende que são indevidos os juros remuneratórios, incidindo os juros moratórios a partir da citação. Postula ainda a diminuição dos honorários advocatícios.

Recurso tempestivo, bem processado e contrariado.

2.1. Sem consistência a preliminar de carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido, pois a alegada quitação exige manifestação expressa e irretorquível de vontade e o poupador, como é de trivial sabença, não revela a ocorrência daquele instituto nos créditos continuados que se faz em conta. Assim, aliás, decidiu o extinto 1º TACivSP na ap. 633.882-5, da 5ª Câmara, rel. juiz Sílvio Venosa e na ap. 720.744-7, da 2ª Câmara Extraordinária "A" (acórdão deste relator).

O Código Civil é bastante rigoroso ao definir as formalidades exigíveis do instrumento de comprovação do pagamento de dívida, não se compadecendo com a formalidade legal a existência de uma quitação tácita, de modo a dispensar, na linha de argumentação desenvolvida pelo banco, até mesmo a materialização em documento escrito.

Diferente não é a jurisprudência do STJ:

"Não se há de falar em quitação tácita do débito relativo à inadequada correção dos depósitos em caderneta de poupança pelo simples fato de que o poupador deixou de manifestar, em momento imediato, sua ressalva, vindo a movimentar posteriormente a conta de poupança" (REsp. 146.545/SP, rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU 15-5-2000).

2.2. Não se discute que, em ações deste jaez, "em que são impugnados os critérios de remuneração da caderneta de poupança e são postuladas as respectivas diferenças, a prescrição é vintenária, já que se discute o valor do principal composto por correção monetária e juros capitalizados" (cf. Ag.Resp 532.421 - rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).

A ação foi proposta em 31-5-2007, na vigência do CC/2002, cujo art. 205 reduziu o prazo de prescrição, que era de 20 anos (cf. art. 177 do CC/1916) para 10 anos.

Entre junho de 1987 e a entrada em vigor do novo Código Civil decorreu período superior à metade do prazo vintenário previsto no CC/1916 e, sendo assim, no que tange à prescrição, aplica-se a regra da lei antiga (a do art. 177 do CC/1916), conforme dispõe o art. 2.028 do CC/2002: "Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".

Ante a incidência do CC/1916, afasta-se a prescrição prevista no art. 178, § 10º, III, por ser aplicável à espécie o art. 177, como vem decidindo o STJ:

"Não incide o disposto no art. 178, § 10, III, do Código Civil, pois a correção monetária visa manter íntegro o capital, não se confundindo com prestação acessória. Acolhida, em primeiro grau, a alegação de prescrição, a decisão é de mérito. Superado o óbice, em segundo, devem os juizes do recurso prosseguir no exame da causa, se reunidos os elementos para isso necessários" (REsp nº243.749-0 - SP, rel. Min. Eduardo Ribeiro, 3ª T., j. 17-02-00, BSTJ 09/19, de 15-06-2000).

"Tratando-se de discussão do próprio crédito, que deveria ter sido corretamente pago, não é de aplicar-se ao caso a prescrição qüinqüenal prevista no art. 178, § 10, III, CC, haja vista não se referir a juros ou quaisquer prestações acessórias. Cuida-se, na verdade, de ação pessoal, prescritível em vinte anos"(REsp. 192.429-SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 15-3-99).

"Nas ações em que são impugnados os critérios de remuneração da caderneta de poupança e são postuladas as respectivas diferenças, a prescrição é vintenária, já que se discute o próprio crédito e não os seus acessórios" (REsp. 254.891-SP, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 29-3-01).

"Descabida a prescrição qüinqüenal dos juros com base no art. 178, parágrafo 10, inciso III, do Código Civil" (REsp. 299.432-SP, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, j. em 22-3-01).

2.3. A caderneta de poupança é um meio utilizado pelo poupador para preservar valores frente à inflação, tanto que ao valor da inflação é acrescida a taxa de 0,5% de juros ao mês, sem qualquer outra forma de remuneração.

Tem o poupador o direito de receber a correção monetária equivalente à inflação real do período em que subsistiu o depósito.

Afinal, ao ingressar nesse negócio jurídico, aguarda que o contrato sofra uma recondução tácita ao final de cada ciclo, garantido pela instituição financeira e pela propaganda oficial que a devida correção monetária é sempre creditada.

Essa correção não pode ser escamoteada por lei nova, no contrato em curso.

Trata-se de contrato de adesão entre o poupador e o estabelecimento bancário, constituindo-se em ato jurídico perfeito e acabado, inadmissível qualquer alteração unilateral em suas regras.

É incontroverso que o contrato de poupança firmado entre o autor e o réu era remunerado pelo "IPC" e, com a edição do Decreto-lei 2.290/86 (cujo art. 1º deu nova redação ao art. 12 do Decreto-lei 2.284/86), passaram a ser corrigidos pelas LBC (Letras do Banco Central do Brasil), ou pelo IPC, "adotando-se o que maior resultado obtiver" (conforme § 2º do art. 12 introduzido pelo novo diploma).

Depois, com o advento do Decreto-lei 2.311/86 (que também alterou o citado art. 12), a remuneração continuou pela LBC, "ou por outro índice que vier a ser fixado pelo Conselho Monetário Nacional", embora mantida no parágrafo segundo a adoção do maior.

Permitir-se que legislação posterior atinja as avenças anteriores constitui violação ao princípio do ato jurídico perfeito, por dispor sobre a aplicação às cadernetas de poupança de índice menor do que o efetivamente apurado.

Daí por que a legislação casuística perturbou o direito adquirido do poupador (art. 5º, XXXVI, da CF) e o Colendo STF consagrou o respeito a esse princípio, mesmo sendo de ordem pública ou econômica a norma que o afronta (STF - Pleno; ADin 493-0-DF, rel. Min. Moreira Alves, j. 25-6-92; DJU, 04-9-92, p. 14.089, Seção I, ementa - Boletim AASP nº 1.762).

A correção monetária é simples atualização de valores, sendo natural, como enfatizou o juiz Maurício Vidigal, hoje Desembargador deste Tribunal, "que os gestores de políticas econômicas tentem, com o objetivo de combater a inflação, mascarar a perda do valor da moeda, editando índices que não correspondam à realidade. Tais atos atendem à conveniência do momento, não contendo a intenção de distribuir justiça, mas a de solucionar questões econômico-financeiras. O juiz, porém, encarregado de ordenar a atualização justa, não pode deixar de considerar a real perda do valor da moeda, se pretende a justiça. E não há lei que o impeça de assim agir, porque o espírito, tanto da criação pretoriana que autorizou correção monetária de alguns débitos, quanto da lei que generalizou seu uso, contém a intenção de que as relações entre credores e devedores não sejam desequilibradas pela desvalorização da moeda, devendo ser mantidas semelhantes com a atualização real" (A. I. nº 497.923/1, 5ª Câmara do 1º TACivSP, j. 25-3-92).

Esses mesmos fundamentos justificam a adoção dos índices do IPC em vez daqueles previstos no plano econômico denominado "plano verão", sendo tal tese acolhida pelo STF, conforme ementa assim expressa:

"Caderneta de Poupança. Medida Provisória nº 32, de 15.01.89, convertida na Lei nº 7.730, de 31-01-89. Ato jurídico perfeito (artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal). Esta Corte já firmou o entendimento (assim, entre outros precedentes, na ADIN 493-0, de que fui relator) de que o princípio constitucional segundo o qual a lei nova não prejudicará o ato jurídico perfeito (artigo 5º, XXXVI, da Carta Magna) se aplica, também, às leis infraconstitucionais de ordem pública... Portanto, nos casos de caderneta de poupança, cuja contratação ou sua renovação tenha ocorrido antes da entrada em vigor da Medida Provisória nº 32, de 15-01-89, convertida na Lei nº 7.730, de 31-01-89, a elas não se aplicam, em virtude do disposto no artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal, as normas dessa legislação infraconstitucional, ainda que os rendimentos venham a ser creditados em data posterior. Recurso extraordinário não conhecido" (RE nº 200514-2-RS, 1ª T., rel. Min. Moreira Alves, j. 27-8-96).

No mesmo sentido: "Recurso Extraordinário - Caderneta de Poupança - Contrato de depósito validamente celebrado - Ato jurídico perfeito - Intangibilidade constitucional - CF/88, art. 5º, XXXVI - Inaplicabilidade de lei superveniente à data da celebração do contrato de depósito, mesmo quanto aos efeitos futuros decorrentes do ajuste negocial - RE não conhecido" (RE nº 194.079-4-RS, 1ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 10-12-96).

As normas infraconstitucionais que modificaram os rendimentos da caderneta de poupança não podem atingir contratos de adesão, firmados entre poupador e estabelecimento bancário, durante a fluência do prazo estipulado para a correção monetária mensal (RE 212.018-9, rel. Ministro Sydney Sanches; RE 201.017, relator Ministro Carlos Velloso; AGRRE 199.636, relator Ministro Maurício Corrêa; RE 205.249, relator Min. Néri da Silveira; RE 199.321, rel. Min. Sydney Sanches; AGRAR 158.973, rel. Ministro Ilmar Galvão).

Nesse diapasão, a ação é procedente, conforme já decidiu a 5ª Câmara do extinto 1º TACivSP em caso semelhante, conforme acórdão assim ementado:

"Correção monetária - Caderneta de poupança - Plano Bresser e Plano Verão - Cobrança das diferenças não creditadas, com base na variação do IPC - Admissibilidade - Ofensa ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido dos poupadores - Ação procedente" (ap. 1.031.441-5, acórdão da relatoria).

O STJ vem consolidando posição no mesmo sentido:

"Econômico. Caderneta de poupança. Correção monetária. Critério. IPC de junho de 1987 (26,06%). Plano Bresser. IPC de janeiro de 1989 (42,72%). Plano Verão. I- O Superior Tribunal de Justiça já firmou, em definitivo, o entendimento de que no cálculo da correção monetária para efeito de atualização de caderneta de poupança iniciadas e renovadas até 15 de junho de 1987, antes da vigência da Resolução n. 1.338/87-BACEN, aplica-se o IPC relativo àquele mês em 26,06%. Precedentes (...)." (AgRg no REsp. nº 740.791/RS, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJU de 5-9-2005).

"Civil. Contrato. Poupança. Plano Bresser. (junho de 1987) e Plano Verão (janeiro de 1989). Banco depositante. Legitimidade passiva. Prescrição. Vintenária. Correção. Deferimento. (...) 3- Nos termos do entendimento dominante nesta Corte são devidos, na correção de caderneta de poupança, o IPC de junho de 1987 (26,06%) e o IPC de janeiro de 1989 (42,72%)" (REsp. 707.151/SP, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 1-8-2005).

2.4. Os juros moratórios - que são de 1% ao mês, pois a ação foi ajuizada na vigência do CC/02 incidem desde a citação quando o réu foi constituído em mora (cf. art. 219 do CPC), ficando afastado assim o critério previsto na sentença (0,5% ao mês até janeiro de 2003 e a partir daí 1% ao mês).

Sendo assim, os juros moratórios de 1% ao mês, incidem desde a data da citação.

2.6. Faz jus a autora aos juros remuneratórios (que são de 0,5% ao mês), devidamente capitalizados, desde a data em que foi creditado o índice menor em sua conta.

A incidência da referida verba, com capitalização mensal, é tese tranqüila no STJ, conforme se observa do voto que o Min. Ruy Rosado de Aguiar proferiu no REsp. 466.732-SP, assim expresso:

"Os juros remuneratórios de 0,5% ao mês, devem ser incluídos no cálculo da diferença entre os valores de correção das suas contas-poupança e assim calculados desde a data em que era devido o pagamento. Já tive a oportunidade de decidir a questão no julgamento do REsp 411.291/PR, 4ª Turma, DJ 30.09.2002, cuja fundamentação transcrevo a seguir: 'O fato de não ter havido referência expressa aos juros no r. acórdão que apreciou o anterior recurso especial não significa que eles não devam ser considerados quando do cálculo da remuneração devida aos titulares da caderneta de poupança, que promoveram uma ação ordinária para receberem o exato valor que lhes era devido, entre eles os juros do capital. Não há nenhuma razão para que a devolução do capital depositado no banco seja feita sem os juros, uma vez que essa, na verdade, é a única parcela que corresponde à remuneração do depósito, porquanto o índice de atualização serve apenas para manter a equivalência do valor da moeda'".

2.7. Os honorários advocatícios foram fixados em 20% sobre o valor da causa (20% sobre R$ 3.356,67), conformando-se a autora em tal solução.

O arbitramento remunera o profissional de acordo com o grau de zelo demonstrado, a natureza e qualidade da atividade apresentada e o tempo consumido para a realização das tarefas próprias do mister.

3. Deram provimento em parte ao recurso.

Presidiu o julgamento o Desembargador CUNHA GARCIA e dele participaram os Desembargadores CORREIA LIMA e LUIS CARLOS DE BARROS.

São Paulo, 27 de julho de 2009.

ÁLVARO TORRES JÚNIOR
Relator




JURID - Quitação tácita. Inadmissibilidade. Cobrança de diferença. [10/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário