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segunda-feira, 3 de agosto de 2009

JURID - Promotor afastado recebe gratificação. [03/08/09] - Jurisprudência


Juiz decide que promotor de justiça afastado indevidamente de suas funções eleitorais tem direito a receber a gratificação eleitoral.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária do Estado de Sergipe
2ª Vara Federal

PROCESSO N° 2009.85.00.000987-4
CLASSE: 29 - AÇÃO ORDINÁRIA
PARTES: WALTER CESAR NUNES SILVA
UNIÃO FEDERAL

SENTENÇA TIPO "A" (Resolução nº 535/2006 - CJF)

EMENTA:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA QUANTO AO PERÍODO EM QUE A PARTE AUTORA DEIXOU DE PERCEBER A GRATIFICAÇÃO ELEITORAL. PROMOTOR DE JUSTIÇA. ATO QUE O AFASTOU DA ATRIBUIÇÃO ELEITORAL. DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE E DE ABUSIVIDADE EM MANDADO DE SEGURANÇA INTERPOSTO E DECIDIDO NO ÂMBITO DO TRE/SE. COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO NA ESFERA DESTA DEMANDA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIÃO QUE DECORRE DE ATO PRATICADO POR AGENTE PÚBLICO FEDERAL DECLARADO ILEGAL E ABUSIVO, À UNANIMIDADE, PELA CORTE REGIONAL ELEITORAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.


I - A prescrição no tocante às ações intentadas contra a União é qüinqüenal, descabendo qualquer invocação do art. 206, § 2º, do Código Civil, eis que, na forma dos pacíficos julgados dos tribunais pátrios, sem discrepância, a prescrição das ações propostas em face dos entes de direito público interno conta-se na forma do art. 1º do Decreto 20.910/1932, bem como do art. 54 da Lei nº 9.784/1999;

II - Revelando-se que, em decisão proferida na esfera de mandado de segurança, o Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe assentou que o ato fustigado se afigura ilegal e abusivo, descabe rever os fundamentos do aludido decisório, porque assim haveria ofensa evidente à coisa julgada que, no caso, descabe até mesmo a interposição de ação rescisória;

III - Se o ato questionado (afastamento do requerente das funções de promotor eleitoral) foi declarado ilegal e abusivo pela Corte Regional Eleitoral, à unanimidade, transcorrendo prazo recursal, cabível a ação indenizatória para que o autor seja restituído dos valores que deixou de perceber por conta do malsinado ato;

IV - Procedência do pedido.

1. RELATÓRIO.

Trata-se de ação ordinária interposta por Walter César Nunes Silva em face da União, objetivando o ressarcimento de danos materiais advindos de injusto afastamento de suas funções eleitorais, na condição de promotor de justiça de Laranjeiras.

Aduz ter sido surpreendido pela Portaria PRE-SE n. 034/2004, baixada pela Procuradora Regional Eleitoral, procuradora da República Eunice Dantas Carvalho, afastando-o ilegal e arbitrariamente das suas funções eleitorais junto à 13ª Zona Eleitoral, fato que o levou à impetração do Mandado de Segurança n. 46, junto ao Eg. TRE/SE, tendo obtido decisão unânime em seu favor, reconhecendo a ilegalidade do ato e restabelecendo o seu direito de retomar o exercício das funções eleitorais.

Alega ter requerido administrativamente o recebimento das gratificações eleitorais relativas ao período em que ficou afastado ilegalmente de suas funções (de 25.11.2004 a 31.05.2006), pedido este que restou indeferido, sob alegação de ausência de dotação orçamentária.

Requer a procedência do pedido para o fim de que lhe sejam restituídos os valores que, indevidamente, deixou de perceber, por conta do afastamento das suas atribuições eleitorais, no valor que apresenta de R$ 83.651,86 (oitenta e três mil, seiscentos e cinqüenta e um reais e oitenta e seis centavos), renunciando a qualquer pedido de indenização a título de danos morais.

Com a inicial, procuração e documentos de fls. 13/99.

Citada, a União ofereceu contestação, fls. 104/116, suscitando prejudicial de prescrição, para, no mérito, questionar a decisão prolatada no mandado de segurança n. 46 TRE/SE, a alegação de responsabilidade objetiva do Estado, pugnando, ao fim, pela improcedência total da ação, bem como seja homologada por sentença a renúncia do autor a eventuais danos morais.

Despacho de fl. 117, determinando a manifestação do autor acerca da prejudicial levantada na contestação, além do esclarecimento sobre eventual necessidade de produção de prova em audiência, assim como foi determinada vista à União para que esclarecesse a finalidade do depoimento pessoal do autor e de oitiva de testemunhas.

Réplica às fl. 120/124, pugnando pelo indeferimento da questão prejudicial e o julgamento antecipado da lide.

A União manifestou-se às fl. 127/128, requerendo a produção de prova testemunhal.

É o relatório.

2. FUNDAMENTAÇÃO.

2.1. Do julgamento antecipado da lide:

Cumpre-me esclarecer que o cerne da demanda é a reparação do autor, a título de danos materiais, advindos de afastamento ilegal assim declarado por decisão já transitada em julgado, sendo descabida qualquer tentativa de rediscussão da aludida matéria, por óbvio.

Desta feita, a oitiva de testemunhas com a finalidade descrita pela União (fls. 127/128), na presente demanda é totalmente descabida, por não servir aos propósitos da lide na forma delimitada na inicial. Com efeito, como adiante será explicitado nesta sentença, admitir a produção da prova testemunhal corresponderia a rediscutir a decisão transitada em julgado no Mandado de Segurança nº 46, julgado no âmbito do TRE/SE.

Guardando correspondência com a previsão legal do art. 330, I, do CPC, eis que a questão de mérito prescinde de produção de prova em audiência, deve a lide ser julgada antecipadamente.

2.2. Da prejudicial de prescrição:

Ao nos depararmos com pretensões inseridas no contexto próprio do Direito Administrativo, o exegeta não pode olvidar que os institutos e conceitos aí utilizados, ainda que importados de outros ramos jurídicos, como o Direito Civil, serão balizados por um regime próprio. É dizer, o princípio matriz a ser observado em questões atinentes à seara do Direito Administrativo é o da legalidade, devendo-se perquirir, logo na gênese da construção interpretativa, se há normatização específica para a hipótese que se analisa.

Bem por isso, a interpretação de suas disposições será orientada por seus próprios princípios e a integração de suas lacunas deverá efetivar-se por normas que pertençam ao seu domínio, salvo se inexistentes. Na lição sempre lembrada de HELY LOPES MEIRELLES(1):

A analogia admissível no campo do Direito Público é a que permite aplicar o texto da norma administrativa a espécie não prevista, mas compreendida no seu espírito; a interpretação extensiva, que negamos possa ser aplicada ao Direito Administrativo, é a que estende um entendimento do Direito Privado, não expresso no texto administrativo, nem compreendido no seu espírito, criando norma administrativa nova.

Não é diferente com o instituto da prescrição dentro da seara administrativa.

Nessa linha, rejeita-se, de pronto, a tese da União - ainda que formulada como pedido subsidiário - em se aplicar concepções e prazos traçados no vigente Código Civil (Lei nº 10.406/2002).

A prescrição é um direito simétrico, vale dizer, o mesmo prazo assim fixado há de incidir a favor ou em desfavor das partes da relação jurídica, aspecto esse válido para as relações jurídicas estabelecidas entre o Estado-Administração e o administrado.

Exemplo contundente temos na prescrição trintenária no caso do FGTS, previsto no art. 23, §5º, da Lei nº 8.036/1990, a respeito da qual a jurisprudência dos TRF's e do STJ logo pacificou a interpretação de extensão do aludido prazo aos titulares das contas fundiárias para haver do Fundo a recomposição de expurgos inflacionários.

Quanto à generalidade dos casos de prescrição administrativa, pouco importando considerar o prescribente (se o Estado ou administrado), já assinalava HELY LOPES MEIRELLES(2) a observância do mesmo lapso pela administração em face do administrado:

A prescrição administrativa opera a preclusão da oportunidade de atuação do Poder Público sobre a matéria sujeita à sua apreciação. Não se confunde com a prescrição civil, nem estende seus efeitos às ações judiciais (v. adiante, item VI), pois é restrita à atividade interna da Administração, acarretando a perda do direito de anular ato ou contrato administrativo, e se efetiva no prazo que a norma legal estabelecer. Mas, mesmo na falta de lei fixadora do prazo prescricional, não pode o servidor público ou o particular ficar perpetuamente sujeito a sanção administrativa por ato ou fato praticado há muito tempo. A esse propósito, o STF já decidiu que 'a regra é a prescritibilidade'. Entendemos que, quando a lei não fixa o prazo da prescrição administrativa, esta deve ocorrer em cinco anos, à semelhança da prescrição das ações pessoais contra a Fazenda Pública (Dec. 20.910/32), das punições profissionais liberais (Lei 6.838/80) e para cobrança do crédito tributário (CTN, art. 174). Para os servidores federais a prescrição é de cinco anos, dois anos e cento e oitenta dias, conforme a gravidade da pena (Lei 8.112/90, art. 142). [..] O instituto da prescrição administrativa encontra justificativa na necessidade de estabilização das relações entre o administrado e a Administração e entre esta e seus servidores, em obediência ao princípio da segurança jurídica, examinado no cap. II, item II.

Na mesma vereda, a lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO(3):

[...] 12. Não há regra alguma fixando genericamente um prazo prescricional para as ações judiciais do Poder Público em face do administrado. Em matéria de débitos tributários o prazo é de cinco anos, a teor do art. 174 do Código Tributário Nacional, o qual também fixa, no art. 173, igual prazo para decadência do direito de constituir o crédito tributário. No passado (até a 11ª edição deste Curso) sustentávamos que, não havendo especificação legal dos prazos de prescrição para as situações tais ou quais, deveriam ser decididos por analogia aos estabelecidos na lei civil, na conformidade do princípio geral que dela decorre: prazos longos para atos nulos e mais curtos para os anuláveis. Reconsideramos tal posição. Remeditando sobre a matéria, parece-nos que o correto não é a analogia com o Direito Civil, posto que, sendo as razões que o informam tão profundamente distintas das que inspiram as relações de Direito Público, nem mesmo em tema de prescrição caberia buscar inspiração em tal fonte. Antes dever-se-á, pois, indagar do tratamento atribuído ao tema prescricional ou decadencial em regras genéricas de Direito Público.

Nestas, encontram-se duas orientações com tal caráter: a) a relativa à prescrição em casos inversos, isto é, prescrição de ações do administrado contra o Poder Público. Como dantes se viu, o diploma normativo pertinente (Decreto 20.910, de 6.1.32, texto com força de lei, repita-se, pois editado em período no qual o Poder Legislativo estava absorvido pelo Chefe do Executivo) fixa tal prazo em cinco anos. Acresça-se que é este também o prazo de que o administrado dispõe para propor ações populares, consoante o art. 21 da Lei da Ação Popular Constitucional (Lei 4.717, de 29.6.65). Em nenhuma se faz discrímen, para fins de prescrição, entre atos nulos e anuláveis. O mesmo prazo, embora introduzido por normas espúrias (as citadas medidas provisórias expedidas fora dos pressupostos constitucionais), também é o previsto para propositura de ações contra danos causados por pessoa de Direito Público ou de Direito Privado prestadora de serviços públicos, assim como para as ações de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta ou por danos oriundos de restrições estabelecidas por atos do Poder Público; b) o concernente ao prazo de prescrição para o Poder Público cobrar débitos tributários ou decadencial para constituir o crédito tributário. Está fixado em cinco anos, conforme há pouco foi mencionado. Também já foi referido que, a teor da Lei 9.873, de 23.11.99 (resultante da conversão da Medida Provisória 1.859-17, de 22.10.99), foi fixado em cinco anos o prazo para prescrição da ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, a menos que esteja em pauta conduta criminosa, hipótese em que vigorará o previsto para ela. É, outrossim, de cinco anos o prazo para a Administração, por si própria, anular seus atos inválidos dos quais hajam decorrido efeitos favoráveis ao administrado, salvo comprovada má-fé (o que, entretanto, faz presumir prazo maior quando houver comprovada má-fé) consoante dispõe o art. 54 da Lei 9.784, de 29.1.1999, disciplinadora do processo administrativo. Também aí não se distingue entre atos nulos e anuláveis.

Vê-se, pois, que este prazo de cinco anos é uma constante nas disposições gerais estatuídas em regras de Direito Público, quer quando reportadas ao prazo para o administrado agir, quer quando reportadas ao prazo para a Administração fulminar seus próprios atos. Ademais, salvo disposição legal explícita, não haveria razão prestante para distinguir entre Administração e administrados no que concerne ao prazo ao cabo do qual faleceria o direito de reciprocamente se proporem ações. Isto posto, estamos em que, faltando regra especifica que disponha de modo diverso, ressalvada a hipótese de comprovada má-fé em uma, outra ou em ambas as partes de relação jurídica que envolva atos ampliativos de direito dos administrados, o prazo para a Administração proceder judicialmente contra eles é, como regra, de cinco anos, quer se trate de atos nulos, quer se trate de atos anuláveis.

Na demanda posta, que guarda relação jurídica de Direito Administrativo, o prazo prescricional incidente é o qüinqüenal, previsto no Decreto nº 20.910/1932, art. 1º, sendo desimportante a sucessão de leis sobre o tema, pois idêntico prazo foi mantido pela posterior Lei nº 9.784/1999, art. 54, como é da tradição do nosso ordenamento jurídico.

Certo que o conceito de prescrição para fins administrativos - e apenas ele - não difere do usualmente adotado pela civilística tradicional, o seu prazo tem início com a violação do direito vindicado.

Ora, a pretensão deduzida refere-se à reparação de dano material sofrido pelo autor em decorrência de afastamento ilegal, consubstanciado nas gratificações eleitorais não auferidas, prestações de trato sucessivo, cuja prescrição somente atingirá as parcelas vencidas há mais de cinco anos contados da propositura da ação.

Assim, tendo em vista que a ação foi ajuizada em 11/03/2009 e o afastamento ilegal se deu em 25/11/2004, não há que se falar em prescrição.

Prejudicial que se rejeita.

2.3. Mérito:

2.3.1. Da alegada nulidade da ação mandamental:


Segundo a demandada, a decisão proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, no mandado de segurança que declarou a ilegalidade do ato que afastou o demandante das suas funções de promotor eleitoral, é nula em face da incompetência daquela corte para julgar a referida lide.

Inicialmente, é preciso advertir que este magistrado não é órgão revisor de decisões judiciais proferidas em outras esferas da jurisdição. Assim, admitir o argumento da União, neste particular, importaria a "rescisão" do julgado proferido no Mandado de Segurança nº 46, que resultou no Acórdão unânime de nº 033/2006, conforme fls. 40/52 dos autos.

Ora, este juízo não tem competência constitucional para "rescindir" julgados de outros órgãos judiciários, mormente do E. Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe.

Em segundo lugar, ao contrário do que fora afirmado pela requerida, a decisão do TRE/SE, expressamente, deixou consignado que "indo de encontro à ordem jurídica vigente, o comportamento das autoridades impetradas deve ser tido por abusivo e ilegal" (grifos nossos). Sendo assim, é desimportante se o fundamento para a concessão do mandamus se prendeu à análise de matéria de fundo.

O que importa considerar é que o TRE/SE, em acórdão unânime, firmou que o afastamento do requerente das suas funções de promotor eleitoral da 13ª Zona Eleitoral de Sergipe, da forma como ocorreu, revelou-se abusivo e ilegal. Isso basta.

Questionar, nesta seara, se era, ou não, competência daquela justiça especializada processar e julgar o mandado de segurança, revela-se completamente inadequado. É que, como já dito acima, este juízo não é instância rescisória dos acórdãos emanados do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe na sua função jurisdicional. Advirta-se, por oportuno, que a justiça federal de 1ª instância apenas tem a competência para revisar atos administrativos emanados dessa justiça especializada. Nada mais.

Quanto ao argumento deduzido pela União de que, supostamente, não fora intimada para integrar aquele mandamus, duas considerações devem ser feitas.

Primeiramente, a União sequer juntou, nestes autos, cópia integral do Mandado de Segurança nº 46. Em segundo lugar, mesmo se o fizesse e provasse tal fato, não caberia discutir essa questão perante este juízo e sim nas vias adequadas.

Demais disso, é sabido que a autoridade apontada como coatora em mandado de segurança presenta a pessoa de direito público da qual faz parte. Assim sendo, deduz-se que caberia à autoridade impetrada comunicar à União acerca do julgamento, permitindo a esta, se o quisesse, interpor recurso da decisão concessiva da segurança.

De mais a mais, referida discussão, se cabível, deve ser levada pela União aos autos do Mandado de Segurança nº 46, considerando que, ao menos pelo que se deduz da interposição desta ação ordinária, a União já tem plena ciência, após ter sido citada neste feito, quanto ao questionado Acórdão nº 033/2006 proferido naquele mandamus.

Rejeita-se, pois, todos os fundamentos trazidos pela União na peça contestatória quanto à alegada nulidade do referido julgamento.

2.3.2. Do direito à reparação do dano material:

A decisão proferida no julgamento do Mandado de Segurança nº 46, pelo Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, que resultou no Acórdão nº 033/2006, assim deixou assentado:

Com efeito, assiste razão ao impetrante. Mesmo admitindo-se que, por via telefônica, tenha manifestado a intenção de afastar-se de suas funções eleitorais, observo que não restaram formalizados os atos decorrente da conseqüência de tal pedido, com a devida apuração dos motivos ensejadores de tal afastamento e verificação, objetiva e documentada, de eventuais fatos norteadores da sanção imposta ao autor do Mandamus, sempre lhe assegurando o direito de se contrapor às alegações da impetrada, o que não ocorreu no caso, e não é negado pela autoridade apontada coatora.

Assim, as autoridades impetradas não poderiam promover, unilateralmente, a substituição do impetrante, apenas baseadas em suspeitas de práticas político-partidárias, sem a devida apuração nos moldes preconizados na Constituição Federal. Não se trata aqui de afirmar a ocorrência, ou não, de prática irregular do Promotor impetrante, mas sim, de ausência de apuração na forma prevista no ordenamento jurídico, indispensável para a aplicação da sanção vergastada.

Também não se diga que o Mandamus deve ser extinto sem julgamento do mérito sob o argumento de necessidade de dilação probatória, pois o cerne da questão não é a existência ou inexistência do ato ensejador da sanção infligida, mas sim procedimento administrativo, no qual seriam assegurados os lídimos direitos conferidos pela Constituição Federal.

Na verdade, era à primeira impetrada que cabia a dilação probatória, propalada por ela e pelo custos legis, quanto à existência ou não de atos irregulares praticados pelo impetrante, através do devido processo legal, para respaldar a punição aplicada. A certidão de fl. 16 dos autos, que expõe não haver assentamentos do Cadastro de Filiação Partidária do impetrante, continuou respaldado, objetivamente, a ausência de práticas político-partidárias do autor do Mandamus, em face e a primeira impetrada não ter demonstrado, no imprescindível procedimento não instaurado, a ocorrência dos atos apontados.

Nesse ponto, o próprio Procurador Regional Eleitoral, no Parecer lançado nos autos, embora defendendo o ato combatido por entender que não há prova em sentido contrário, mesmo restando patente nos autos (inclusive nas informações da Procuradoria Regional Eleitoral, a exemplo do 3º parágrafo da fl. 117) que a destituição foi levada a cabo sem qualquer apuração formal dos atos atribuídos ao impetrante, acaba por afirmar que "se confirmada a participação do impetrante nas atividades político-partidárias, seria o caso, inclusive, de verificação da prática ou não de infração disciplinar pela Corregedoria (...).

Ora, se o próprio MPE admite que não houve comprovação, qual o respaldo jurídico para o afastamento do impetrante? A resposta é simples: tal respaldo deveria ter sido buscado na adoção do procedimento adequado para o caso, o que não ocorreu. E isto, o autor demonstrou mais do que suficientemente nesta ação, sem nenhuma necessidade de dilação probatória.

As autoridades impetradas tinham o dever de instaurar o respectivo processo, seguindo todos os ditames regentes, sob pena de nulidade.

Fugir de tais regras é menoscabar o próprio Estado de Direito, dentro do qual está contida a segurança e não se ter restrição de direito senão por ordem e dentro dos parâmetros constitucionais e legais.

(...)

À luz desses ensinamentos, e, consubstanciada na prova carreada aos autos, entendo que resta indene de dúvida a existência de irregularidade formal na substituição levada a efeito pelas autoridades impetradas.

Induvidosamente, o ato impugnado se caracteriza como ofensa aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, restando configurado o cerceamento de defesa, consoante preceito constitucional.

(...)

Logo, indo de encontro à ordem jurídica vigente, o comportamento das autoridades impetradas deve ser tido por abusivo e ilegal.

Veja-se, como já dito acima, que a e. Corte Regional Eleitoral de Sergipe disse, com todas as letras e à unanimidade, que o ato que afastou o demandante das suas funções de promotor eleitoral "deve ser tido por abusivo e ilegal". Quem o disse, dessa forma, foi aquele juízo. Não este agora.

A este magistrado compete tão-somente aquilatar os efeitos que decorrem de tal julgamento.

Ora, é sabido que decorrem do julgamento concessivo de um mandado de segurança conseqüências cíveis, administrativas e, até mesmo, criminais. Tanto isso se revela evidente que a Lei nº 1.533/51 determina o reexame necessário, quando a segurança é concedida em primeira instância, e a necessária intervenção do Ministério Publico em todos os feitos dessa espécie.

Sobre esse último aspecto - intervenção obrigatória do Ministério Público em todo mandado de segurança - há de ser feita uma consideração. É desimportante, para essa intervenção, a natureza do direito discutido no mandamus. Não importa se a questão de fundo diz respeito à matéria tributária, administrativa ou de qualquer outra seara do direito.

O Ministério Público intervém, obrigatoriamente, porque o que se analisa em um mandado de segurança, concomitante a essa matéria de fundo, é se a autoridade apontada como coatora praticou ato ilegal ou abusivo. Se o praticou, cabe ao Ministério Público propor as medidas necessárias à salvaguarda da ordem jurídica, conforme tarefa que emana da Constituição Federal.

No caso dos presentes autos, à fl. 41, vê-se que o douto procurador regional eleitoral esteve presente à sessão de julgamento do MS nº 46, firmando ciência quanto ao inteiro conteúdo do voto condutor e do acórdão respectivos.

No caso em exame, este juízo apenas tem por escopo analisar as conseqüências cíveis daquela decisão.

Ora, se o ato praticado foi ilegal e abusivo, é óbvio que o requerente desta demanda, impetrante daquele mandamus, faz jus à restituição de todos os valores que deixou de perceber como retribuição ao exercício das suas funções de promotor eleitoral, com correção monetária e juros de mora, a partir da citação.

Não é outro o entendimento dos tribunais pátrios:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 181 - CLASSE 26 -ALAGOAS (7º Zona - Coruripe)

Relator: Min. Fernando Neves.

Recorrente: Carlos Henrique Pita Duarte.

Advogado: Dr. Anthony de Souza Soares e outros.

Recurso em mandado de segurança. Juiz eleitoral. Denúncias - afastamento - Gratificação eleitoral. Direito a recebimento.

1. O afastamento de juiz de sua função eleitoral, que depois se comprovou ser sem fundamento, não impede o pagamento da respectiva gratificação.

2. Hipótese que constitui exceção à regra de que a percepção da gratificação eleitoral está condicionada ao efetivo exercício do cargo.

Recurso improvido.

É o caso dos autos, adaptando-se dito aresto à situação específica deste feito.

3. Da renúncia da parte autora a pleitear reparação a títulos de danos morais:

A parte autora, expressamente, renuncia a qualquer reparação, a título de danos morais, conforme exposto na petição inicial, fl. 10.

Sendo assim, e se tratando de direito patrimonial disponível, nada impede que assim proceda o autor.

3. DISPOSITIVO.

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial para o fim de condenar a demandada ao pagamento dos danos materiais sofridos pelo autor e que correspondem aos valores não percebidos durante o período de 25/11/2004 a 31/05/2006, pertinentes à gratificação eleitoral a que fazia jus, com correção monetária, parcela por parcela, na forma do Manual de Cálculos desta Justiça Federal e ainda juros de mora, à base de 0,5% (meio por cento) ao mês, contados a partir da citação válida.

Registra-se, por oportuno, a menção expressa da parte autora, na petição inicial, quanto à renúncia a direito de pedir qualquer reparação, a título de danos morais, quanto aos fatos narrados no feito, cingindo-se a demanda, exclusivamente, ao pleito de reparação a título de danos materiais, conforme acima definido, homologando-se dita renúncia, neste ato.

Condeno, ainda, a União na restituição das custas, devidamente atualizadas, conforme critérios acima, fl. 99, bem como em honorários advocatícios que arbitro no percentual de 10% (dez por cento) incidente sobre o valor a pagar ao autor, com base nos parâmetros contidos no art. 20, § 4º do CPC.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

P.R.I.

Aracaju, 31 de julho de 2009.

RONIVON DE ARAGÃO,
Juiz Federal da 2ª Vara



Notas:

1 - MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28. ed. - São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 40. [Voltar]

2 - Ob. cit., p. 654. [Voltar]

3 - MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. - 19. ed. - São Paulo: Malheiros Editores, 2005, pp. 979-980. [Voltar]



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