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segunda-feira, 10 de agosto de 2009

JURID - indenização por danos morais. Discriminação. Gravidez. [10/08/09] - Jurisprudência


Indenização por danos morais. Discriminação. Gravidez.


Tribunal Regional do Trabalho - 3ª Região

Processo : 01072-2008-140-03-00-0 RO

Órgão Julgador : Primeira Turma

Juiz Relator : Des. Maria Laura Franco Lima de Faria

Juiz Revisor : Des. Manuel Candido Rodrigues

RECORRENTES: 1) ERICA TOLEDO CORREA

2) SOCIEDADE RÁDIO E TELEVISÃO ALTEROSA LTDA.

RECORRIDOS: OS MESMOS

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISCRIMINAÇÃO. GRAVIDEZ. O contexto probatório demonstra que a reclamada praticou ato discriminatório ao não contratar a reclamante após conhecimento de seu estado gravídico. A conduta da reclamada violou o direito à cidadania, à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho, à igualdade, à não-discriminação, à proteção ao emprego, dentre outros direitos constitucionalmente assegurados.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recursos ordinários, interpostos contra decisão proferida pelo MM. Juízo da 40ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, em que figuram, como recorrentes, ERICA TOLEDO CORREA e SOCIEDADE RÁDIO E TELEVISÃO ALTEROSA LTDA; como recorridos, OS MESMOS.

RELATÓRIO

O MM. Juízo da 40ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, pela r. sentença de f. 250/267, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados para: a) determinar a anotação da CTPS, com data de admissão em 28 de julho de 2008; b) pagar, em forma de indenização, todos os salários do período de estabilidade provisória, férias + 1/3, 13ºs salários e FGTS + 40% ou, alternativamente, a reintegração ao emprego; c) indenização por danos morais no valor de R$71.700,00.

Embargos de declaração opostos pela reclamada (f. 268/270) e pela reclamante (f. 271/273), que foram providos parcialmente, nos termos da decisão de f. 275/277.

Inconformada, a reclamante interpôs recurso ordinário, às f. 278/284, requerendo: a) o pagamento da importância de R$ 80.000,00 pelos serviços prestados na elaboração e confecção do programa "Feminina", realizada no período de janeiro a agosto de 2007; b) vínculo empregatício a partir de setembro de 2007, quando teve início o programa "Feminina" ou, por cautela, a partir de novembro de 2007, quando da aprovada retirada da produção da empresa Cisup, postulando, ainda, a manutenção salarial no valor de R$ 10.936,00, unilateralmente reduzido a partir de março de 2008. Pede, por fim, a indenização por danos morais e materiais decorrentes do fim abrupto do programa.

A reclamada também recorreu ordinariamente, às f. 285/294 requerendo a aplicação da multa por litigância de má-fé. Alega que inexistiu o vínculo de emprego entre as partes, somente iniciaram-se as tratativas para a sua admissão. Afirma que cabia à reclamante o ônus de comprovar a remuneração percebida e que inexistiu prova o suposto dano moral, sustentando que a gravidez não interferiu na sua contratação.

Comprovantes de recolhimento das custas processuais à f. 295 e de depósito recursal à f. 296.

Contra-razões apresentadas pela reclamante (f. 299/307) e pela reclamada à f. 310/319, pugnando pelo desprovimento do recurso.

Tudo visto e examinado.

V O T O

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Conheço dos recursos, uma vez satisfeitos os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade.

Conheço também das contra-razões, tempestivas e subscritas por procuradores regularmente constituídos.

MÉRITO

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE (F. 278/284)

1. Relação de Trabalho (janeiro a agosto/2007).

Vínculo de Emprego (setembro/2007 a junho/2008)

Sustenta a reclamante que o seu trabalho em prol da reclamada iniciou em janeiro de 2007, com a confecção do programa voltado para o público feminino, com término em agosto de 2007. Afirma que nada recebeu pelos serviços prestados nesse período, sendo certo que a reclamada reconheceu ter contratado a autora para elaboração do projeto através do depoimento de f. 77. Pugna, nesse período, pelo pagamento da prestação de serviço decorrente de uma relação de trabalho.

Diz que "em momento algum afirma que estava trabalhando exclusivamente para a emissora, TV ALTEROSA, e, sim, aduz que realizou um trabalho de grande porte e nada recebeu por ele. A reclamante conciliou seus trabalhos como repórter do SBT e a elaboração de um projeto, destinado ao público feminino, contratado pela Reclamada. Ademais, seu vínculo com a emissora "SBT" terminou no dia 14 de agosto de 2007, conforme se vê às fls. 165, em sua cláusula sexta;" (f. 270).

Aduz, ainda, que a proposta inicial era, de fato, de uma co-produção envolvendo as três empresas, Doze Comunicação (Reclamante), TV Alterosa (Reclamada) e Cesup, mas o que o conjunto probatório evidenciou foi uma típica relação de emprego no período de setembro de 2007 a junho de 2008.

Analisa-se.

Inicialmente, ao contrário do alegado pela reclamante em suas razões recursais, a reclamada não contratou a reclamante para elaboração de um projeto para o programa "Feminina". Tudo ocorreu por iniciativa da reclamante, quem procurou a reclamada para ofertar o serviço e esta indicou a empresa Cisup para fazerem uma parceria.

"Que quando a depoente procurou a reclamada com o seu projeto para o programa Feminina, o sr. Rodrigo Scoralick, gerente de programação, fazendo espécie de aprovação prévia da proposta, indicou à depoente que procurasse esta empresa .....; (depoimento da reclamante, f. 239)

O depoimento pessoal da reclamante vai ao encontro do declarado pela reclamada à f. 77:

"Que contratou a reclamante, tendo em vista a proposta do programa por ela apresentada e pela Cisup, que passou a se chamar "Feminina"."

Logo, de plano, já se evidencia que no período de janeiro a agosto de 2007, na fase de confecção do programa, não se firmou qualquer relação jurídica entre reclamante ou sua empresa (Doze Comunicação) e a reclamada. E, como bem evidenciou o MM. Juízo de origem, nesse período a reclamante não trabalhou no projeto sozinha, contou com a participação da empresa Cisup para elaboração do piloto do programa. Tal fato é demonstrado pelo documento de f. 123, datado de 25/04/2007, onde a reclamante e o Sr. Marcos Ribas começam a mensagem dizendo o seguinte: "Hoje se completam cinco meses da conclusão do projeto "Feminina" e quase dois meses da apresentação do piloto."

Tem-se que a confecção do programa foi desenvolvida pelas empresas Doze e Cisup, ainda que a idéia inicial tenha sido da reclamante, na condição de sócia da empresa Doze. A relação foi puramente comercial entre as três pessoas jurídicas, quais sejam: Doze Comunicação, Cisup e TV Alterosa.

Desse modo, inexistindo qualquer relação de trabalho entre reclamante (pessoa física) e reclamada, não há falar em pagamento pela prestação de serviços no período de janeiro a agosto de 2007.

Em prosseguimento, quanto à análise do vínculo empregatício a partir de setembro de 2007, observa-se que a reclamante reconhece que proposta inicial foi sempre de uma co-produção envolvendo as empresas Doze, Cisup e TV Alterosa e isso também é revelado pela vasta documentação juntada aos autos (por exemplo, o documento de f. 123/124), sendo certo que a relação jurídica comercial firmada entre as três empresas manteve-se até o fim do programa "Feminina".

O fato de não ter sido formalizado o contrato escrito, não desnatura o vínculo havido entre as empresas, tampouco tem o condão de converter em relação de emprego entre reclamante e reclamada. O problema é que o programa iniciou sem uma definição do rateio do faturamento e a responsabilidade de cada empresa no empreendimento e veja-se que toda a documentação refere-se à empresa da reclamante e não a ela própria, na condição de pessoa física. É o que se percebe através das mensagens enviadas através de correio eletrônico no dia 17/10/07 (f. 125/130).

A discussão em torno da parceria continuou no dia 24 de outubro de 2007 (f. 131):

"A proposta mais recente enviada pela Cisup não atende às condições básicas que deram origem a toda essa discussão, porque mantém a cargo do Ribas a direção da apresentação ao vivo e dos quadros feitos por mim. Como já ficou claro, a idéia é exatamente separar nossas tarefas e rotinas.

Já a proposta feita pela Alterosa pode ser negociada. Aceito as funções de apresentadora e editora chefe. Mas, não tenho estrutura empresarial para assumir a responsabilidade pela administração e remuneração da equipe... e acho que nem me sobraria tempo. Fica a cargo de vocês decidir se essa obrigação seria da Cisup ou da Alterosa."

O e-mail de primeiro de novembro revela que a responsabilidade pela remuneração dos empregados ficou a cargo da Cisup, mas a reclamante também intercedia nas negociações salariais. É de se destacar o conteúdo de parte da mensagem eletrônica:

"A Cisup está no seu limite, até correndo o risco de ter que ficar com o prejuízo. Pois aumentaram a despesa do salário do diretor dentre outros gastos. A TV não assumirá mais gastos por se dizer no prejuízo e tb terem aumentando seus gastos" (f. 134).

Em depoimento pessoal declarou a reclamante:

"Que com relação ao programa Feminina, para o qual não se estabeleceu qualquer pactuação escrita, inicialmente houve uma proposta, por parte da reclamada, de que reproduzisse o modelo do programa Viação Cipó, onde havia a repartição dos lucros; que, no primeiro, ou também no segundo mês do programa, houve um encontro de contas da seguinte forma: 50% do faturamento para a TV, 50% divididos entre a CIS UP e a empresa da depoente, sendo que, a partir daí,não mais se chegou a um acordo quanto a esta divisão de valores, como atestam as diversas comunicações recíprocas juntadas nos autos; que, a partir daí o valor ficou fixado em R$ 10.000,00; que, lá na negociação anterior, ficou estabelecido que a CIS UP era quem assumiria, como produtora, custos de realização do programa, tais como contratação de pessoal, até porque era ela que estava estruturada para tanto, e não a empresa da depoente, que, na verdade, era ela só;" (f. 240).

O que se vê nos autos é que as empresas nunca chegaram a um acordo quanto à repartição dos lucros e atribuições, iniciando a apresentação do programa com esse impasse. Lado outro, o que sem tem ao certo é que não esteve presente o requisito da subordinação jurídica capaz de ensejar o reconhecimento do vínculo entre reclamante e reclamada. Não era a reclamante subordinada ao gerente de programação da reclamada, Sr. Rodrigo Scoralick, ou até mesmo, o Sr. Geraldo Teixeira. Os documentos revelam que a interferência deles restringiam, basicamente, na área comercial, acerca do contrato a ser firmado, mudança do horário da programação, audiência, faturamento. Não havia interferência em questões editoriais, mas apenas sugestões ou indicações.

Veja-se a parte final do conteúdo da mensagem seguinte, através da qual a reclamante pretendia comprovar a subordinação com o superintendente da emissora (f. 47): "Estamos tentando encontrar outra pessoa. Você tem alguém para indicar?"

O fato da reclamante, após dois meses de apresentação do programa, passar a receber uma importância fixa não induz a conclusão de que existiu uma relação de emprego. Ao meu ver, foi a solução criada para, pelo menos um período, solucionar o problema relativo à repartição dos dividendos.

A reclamante sempre exerceu seu mister sem a ingerência da reclamada, tanto é assim que se desentendeu com o Sr. Marcos Ribas, sócio da Cisup e produtor do programa e foi firme ao dizer que a parceria deveria ser rompida:

"É uma decisão da Alterosa firmar ou não parceria com a Cisup e as informações da ficha técnica são determinadas pela emissora e não por mim. Porém, a minha condição para ficar no Feminina foi o rompimento de todos os vínculos com a Cisup. Foi prometida inclusive a troca do nome e da marca do programa se fosse necessário para que não houvesse nenhuma ligação com a antiga direção do programa;" (f. 46).

E esse desentendimento culminou na saída do Sr. Marcos Ribas da produção do programa, mas a parceria com a Cisup continuou existindo. Veja que a TV Alterosa não abriu mão de que na ficha técnica do programa contivesse o seguinte: "Formato licenciado pela CISUP"; (f.46). Além disso, consta nos autos que a Cisup entrou com pedido de registro da marca "Feminina" (f. 170).

É de se registrar que o Sr. Marcos Ribas, ouvido como informante, prestou depoimento coerente com os demais elementos probatórios, notadamente com a vasta documentação colacionadas nos autos pelas partes, pelo que se convence que, mesmo deixando a direção do programa e entrando em seu lugar o Sr. Elias Santos, não se rompeu a parceria com a Cisup.

Não resta dúvida de que a saída do Sr. Marcos Ribas criou um problema comercial e um jogo de empurra empurra, pois ninguém queria assumir a produção do programa e arcar com despesas com os funcionários. A reclamante, desde o início das negociações, deixou claro que não tinha condições e nem tempo para arcar com mais esse compromisso, ou seja, suas atribuições restringiam-se à edição e apresentação do programa, basicamente. Por outro lado, a TV Alterosa também deixou claro que não iria assumir as responsabilidades com a produção do programa, incluindo-se aí assuntos relativos às contratações e remunerações de empregados. A empresa de televisão, desde o início, pretendeu uma parceria, que o programa fosse uma produção independente, ainda que se responsabilizasse pela área técnica.

E com todo esse embaraço, como disse o MM. Juízo de origem, o fato da depoente Marina Guadalupe buscar notas fiscais para receber seus pagamentos após a saída do Sr. Marcos Ribas, "são meros detalhes de contabilidade" (f. 257).

Não se retira da reclamante a idéia inicial da produção de um programa feminino, que foi acrescentada com a parceria com a Cisup, mas infelizmente não deu certo. E esta parceria padeceu de má formação congênita, desde o início foi marcada por discussões, desacertos, nada foi conclusivo, tanto é assim que não chegaram a um consenso para formalização do contrato. A situação ainda se agravou com a queda de audiência e de faturamento (gráficos de f. 120/122), culminando no encerramento do programa.

E o que se vê, ainda, é que a reclamante se desentendeu com o Sr. Ribas e não achava justo que propriedade intelectual ficasse em nome da Cisup, mas, frisa-se, esse é um problema nitidamente comercial, e não trabalhista.

E o depoimento da testemunha Marina Guadalupe Victal não se mostrou convincente quanto à presença da subordinação jurídica, ao argumentar que não sabia se a reclamante poderia contratar pessoal, mas é certo que não poderia dispensar sem ouvir o Sr. Roberto Scoralick. Ora, os próprios documentos revelam que a responsabilidade com pessoal era da empresa Cisup e era ela quem a reclamante recorria quando da necessidade de contratação, cite-se, por exemplo, a mensagem de f. 134.

Demais, a referida depoente era empregada da TV Alterosa e, em suas férias, trabalhou no programa "Feminina" e, quando de seu retorno, optou por pedir demissão da emissora para integrar a equipe do programa, o que revela que a reclamada não tinha qualquer ingerência na contratação. Registra-se que foi a reclamante quem pediu a testemunha que lhe indicasse alguém para trabalhar no programa e a própria depoente se ofereceu para tanto.

Ao contrário do alegado pela reclamante, a constituição das empresas não serviu para burlar os preceitos trabalhistas, nos moldes do art. 9º da CLT. Pelo contrário, a reclamante já tinha sua empresa constituída há dois anos e a Cisup era uma empresa bem estruturada no mercado, sendo parceira da reclamada em outros empreendimentos, como a produção do programa "Viação Cipó".

Em nada afeta, para reconhecimento da relação de emprego, o fato da empresa da reclamante não aparecer nas vinhetas do programa, tal fato não considera a inexistência de co-produção, mas sim outro problema de ordem comercial. Realmente, a reclamante ficava indignada com essa situação, pois fazia parte da criação, mas a propriedade intelectual ficava em nome somente da Cisup (f. 46).

Ante o exposto, em face da total ausência de comprovação dos requisitos previstos no art. 3º da CLT, inexiste amparo para que seja reconhecido o liame empregatício entre as partes no período de setembro de 2007 a junho de 2008.

Sucessivamente, pugna a reclamante pelo pagamento da indenização por dano moral com fundamento na competência ampliada pela Emenda Constitucional nº45/2004.

Entretanto, não se evidencia nos autos qualquer relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, pela reclamante (pessoa física) a um tomador de serviço (reclamada). A relação jurídica formada se deu em face de pessoas jurídicas, com nítido caráter comercial, o que refoge da competência desta Justiça a apreciação de eventual dano moral em decorrência do fim abrupto do programa "Feminina", nos termos do art. 114, VI, da Constituição da República.

Nego provimento.

2. Salário Relativo ao Vínculo Reconhecido a partir de julho/2008

Pugna a reclamante pela fixação, no período do vínculo reconhecido pela sentença, do salário em R$10.936,00, valor recebido quando da apresentação do programa "Feminina", além do pagamento do plano de saúde, direito concedido a todos os empregados a todos os profissionais no departamento de jornalismo.

Ainda que o reconhecimento do vínculo de emprego a partir de julho de 2008 seja objeto do recurso da reclamada que será examinado a seguir, nada obsta a análise das questões acima nesse momento.

Não reconhecido o vínculo empregatício no período de setembro de 2007 a junho de 2008, não há qualquer ligação entre a importância recebida pela empresa da reclamante no período de apresentação do programa "Feminina", com eventual salário pela contratação a partir de julho de 2008. Mesmo porque a reclamante, na inicial, informou que recebeu um telefone do superintendente da emissora, Sr. Geraldo Teixeira da Costa Neto, propondo a sua contratação, com salário de R$ 7.170,00.

No que toca ao plano de saúde, não colacionou a reclamante norma convencional ou regulamento de empresa que obrigue a reclamada ao cumprimento dessa obrigação.

Desprovejo.

ISTO POSTO, nego provimento ao recurso da reclamante.

RECURSO DA RECLAMADA (F. 285/294)

1. Inexistência Vínculo Empregatício a partir de julho/2008

Sustenta a reclamada que não houve a alegada contratação da reclamante para apresentação do Jornal Alterosa, apenas tratativas, recebendo convite apenas para comparecer à empresa, acompanhar a gravação do jornal, tomar conhecimento de como era produzido, para então serem discutidas as condições do contrato de trabalho. Diz que a prova produzida pela recorrente demonstra a inexistência de contratação.

Analisa-se.

Do conjunto probatório extrai-se de forma clara e precisa que a reclamante sofreu discriminação em razão da gravidez, ato que, com certeza, deve ser repudiado pelo Judiciário. Não resta dúvida de que a reclamante iria iniciar o seu labor no dia 28 de julho de 2008, mas o efetivo serviço foi obstado ao informar seu estado gravídico.

Não se pode negar que houve discriminação nas tratativas para admissão, como será objeto de análise do tópico seguinte, mas não houve a efetiva contratação e, consequentemente, inexistiu também o vínculo empregatício a partir de 28/07/2008.

Vejamos.

O laudo pericial produzido nos autos, com objetivo de constatar e transcrever mensagens de texto do celular de propriedade de Benny Cohen, demonstrou que as tratativas para admissão ocorreram no início de julho de 2008, tendo como certa a admissão da reclamante:

"Tudo ok, vc comeÇa no 28,mas a gente estréia no dia 11 e não no 4. daí podemos pilotar 1 semana. Vou fazer reunião geral hj e anunciar. Depois te conto.BJ;" (f. 212).

Contudo, isso não significa que houve o efetivo serviço a partir do dia 28 de julho. Todos sabiam das tratativas e que a contratação iria se efetivar, mas não se teve notícia do labor em si.

A testemunha Jaques Mendes Marçal informou (f. 242):

"(...) que, após o término do programa Feminina, o depoente tomou ciência, através de relatos de colegas da redação ou da emissora, de que a reclamante seria a apresentadora do telejornal da tarde (JA1, 1ª edição); que não tem conhecimento de que tenha havido alguma efetiva prestação de serviço da reclamante em relação a esta nova proposta ou convite; (...) que repete ter sabido de uma reunião da reclamante com o sr. Benny e que ela seria a apresentadora do referido telejornal; que estava a par das mudanças no jornalismo da emissora; que, sempre através de colegas, também soube que a reclamante estaria sendo dispensado do jornalismo, porque estaria grávida;" (grifos acrescidos).

E a própria inicial dá-nos conta que a reclamante, realmente, esteve presente na empresa reclamada no dia 28 de julho, mas sua primeira providência foi ligar para o gerente de jornalismo (Sr. Benny) para informar-lhe de seu estado gravídico e, ao conseguir contato, segundo a reclamante, ele respondeu: " É uma boa notícia para a sua vida, mas não sei se é uma boa notícia para o projeto. Não vou decidir isso sozinho. Vou ligar para outras pessoas e depois te falo."

Com efeito, a reclamante se encontrava na empresa, mas com a notícia, em visível discriminação, já deixou claro que a reclamante poderia não ser contratada, dizendo que não iria decidir isso sozinho. O Sr. Benny, nesse momento, não deu aval para a reclamante iniciar a prestação de serviço.

E as mensagens enviadas ao celular da reclamante, no dia seguinte (29/07/2008), demonstram que o Sr. Benny não conseguiu resolver se a reclamante seria contratada ou não, achando melhor ela não prestar serviço.

No dia 30/07/08, nova mensagem foi enviada com o seguinte teor (f. 212):

"Erica, acertei c/ Zeca de resolver so na 2ª-feira, qdo volto a trabalhar. Penso q é melhor vc não ir à TV e aguardar, ok?"

E a efetiva decisão do gerente de jornalismo somente veio no dia seis de agosto, conforme mensagem de texto enviada à reclamante (f. 212).

A mensagem eletrônica de f. 65 atesta que partiu da autora o pedido para que fosse incluída no sistema de informática da autora e, de fato, por já ter trabalhado na emissora anteriormente e já com a notícia de que seria contratada, possivelmente a senha foi liberada, sem a efetiva autorização da chefia. Até porque, como demonstrado acima, após saber do estado gravídico da reclamante, o Sr. Benny não autorizou o início da prestação de serviço.

O teor da mensagem revela tal iniciativa:

"Olá, amigos da informática!

Estou de volta e preciso de ajuda de vocês, como sempre. Por favor, me incluam no grupo Jornalismo e liberem também o meu acesso ao Jornal da Alterosa, no telenews.

Obrigada.

Érica."

Ora, não se pode reconhecer um vínculo de emprego em decorrência de empregados que, sem autorização da chefia e na ausência do Diretor de Jornalismo, liberaram acesso à informática e linha telefônica a empregada, sem a sua efetiva contratação.

Com tal conclusão, também não se pode falar em confissão do preposto, mesmo porque demonstrou tinha conhecimento da matéria fática discutida em Juízo. O que o preposto declarou é que se a reclamante efetivamente recebeu as senhas da reclamada, não foi com a sua autorização, nem com a autorização da TV Alterosa, haja vista que o preposto era o responsável pela determinação de liberação das senhas. Referido depoimento vai ao encontro da mensagem acima, demonstrando que foi da reclamante a iniciativa de pedir o acesso ao sistema, mas não o fez, diretamente, para a pessoa responsável.

Ressalte-se que não se fala aqui em formalização de contrato escrito, mas de efetivo serviço, com a anuência da reclamada. Sabe-se que o Contrato de Trabalho pode ser expresso ou tácito, verbalmente ou por escrito (art. 443/CLT), mas a evidência nos autos é que o contrato não foi firmado, ainda que tacitamente.

Oportuno transcrever o depoimento da testemunha Luciana Oliveira Fonseca (f. 244/245):

"que a depoente recebeu outros e-mail da reclamante, além daquele de f. 63; que o conteúdo do referido documento diz respeito a uma solicitação que a depoente teria feito à reclamante, sabendo que ela era uma das indicadas para a função, para que ela, reclamante, lhe passasse dados ou contatos, e, para sua surpresa, a reclamante, quando lhe atendeu, estava dentro da redação; que, na oportunidade, a reclamante preferiu não conversar ao telefone ou postergar a conversa, até porque lhe dizia que estava grávida e não sabia mais o que iria acontecer dali para frente; que, por e-mail, a própria reclamante lhe dizia que, estando grávida, não mais saberia o que acontecia dali para frente."

Reprisa-se, não está se falando em formalização de contrato escrito, mas de efetivo serviço que não restou comprovado. A própria reclamante temia que isso pudesse não ocorrer em face de seu estado gravídico, como revelou o depoimento acima transcrito.

Observa-se que o documento de f. 66 não foi diretamente enviado à reclamante, mas para chefia de reportagem, produção-BH e demais jornalistas. A reclamante, com o acesso ao sistema de informática, poderia entrar no e-mail da chefia de reportagem e obter tais informações. Contudo, não se pode dizer que já se encontrava envolvida com a rotina do Jornal da Alterosa.

Curioso e importante ressaltar que a referida mensagem foi colhida no dia 28 de julho e, no dia seguinte, a reclamante, já enviou para o seu procurador que subscreveu a peça inicial. Talvez, por orientação dele, a reclamante relutou deixar o local de trabalho nos dias 28 e 29 de julho, só o fazendo no dia 30 do mesmo mês.

E nesse contexto, não se pode dar valor probante ao conteúdo do e-mail de f. 67 no que toca à comprovação de efetivo serviço, mormente quando se vê que o mesmo foi impugnado pela reclamada.

Ante o exposto, impõe-se reconhecer a inexistência de vínculo empregatício a partir do dia 28 de julho de 2008.

Dou provimento ao recurso da reclamada para excluir da condenação a determinação de anotação da CTPS da autora, assim como a indenização pelo período de estabilidade provisória e seus consectários (itens "a", "b" e "c" do dispositivo de f. 266).

2. Indenização Por Dano Moral

Pugna a recorrente pela reforma do julgado, sob argumento de que houve prova de que a gravidez não interferiu na contratação do reclamante, uma vez que a emissora tinha interesse, em primeiro lugar, na contratação da Sra. Laura Lima para a função de apresentadora do Telejornal, o que acabou ocorrendo. Diz que não houve preconceito, tanto é assim que demonstrou a existência de outras apresentadoras que laboraram nas mesmas condições da reclamante.

A reclamada não nega que iniciou as tratativas para admissão da reclamante na condição de editora chefe e apresentadora de Telejornal, tendo, inclusive, noticiado a data de início da prestação de serviços, qual seja, o dia 28 de julho de 2008. Como já fundamentado no tópico acima, através de mensagem de celular, o Sr. Benny, diretor de jornalismo, deixou claro que a admissão estava certa, dizendo, inclusive, que iria fazer uma reunião geral para comunicar o fato.

Ocorre que, no dia em que a reclamante iria iniciar a prestação de serviço, ao comunicar ao Sr. Benny que se encontrava grávida, este já mudou a conversa inicial, pedindo a reclamante que aguardasse a definição do superintendente da reclamada, Sr. Geraldo Teixeira, chamado por todos de "Zeca".

Através da análise das mensagens posteriores à ciência da gravidez da reclamante, é bem possível que o Sr. Benny tenha dito o transcrito na inicial de f.09: "É uma boa notícia para a sua vida, mas não sei se é uma boa notícia para o projeto. Não vou decidir isso sozinho. Vou ligar para outras pessoas e depois te falo."

Transcreve-se algumas das mensagens que se seguiram após a comunicação da gravidez (laudo pericial, f. 208/216):

"Ta, mas fique à vontade, talvez seja melhor vc esperar a decisão. Ta de qtos meses? Ja ta confirmado e garantido ou pode ser alarme falso?" (mensagem enviada pelo Sr. Benny, no dia 29/07/2008, às 10h13min).

"Fiz ultrassonografia. Confirmado. Sete semanas." (mensagem envidada pela reclamante ao Sr. Benny, no dia 29/07/2008, às 10h30min).

"Erica, acertei c/ Zeca de resolver so na 2ª-feira, qdo volto a trabalhar.Penso q é melhor vc não ir à TV e aguardar, ok? Bj." (mensagem enviada pelo Sr. Benny, no dia 30/07/2008, às 08h07min).

"Estou aqui. Helena sugeriu que eu já fizesse a escrever o espelho hoje. O q eu faço? Vou embora e digo o que?" (mensagem envidada pela reclamante ao Sr. Benny, no dia 30/07/2008, às 08h18min).

"Diga q eu vou precisar de + uma semana e q pedi p/ vc esperar. Vc não contou p/ ninguém? Tive de abrir pro Zeca e Lu Gontijo." (mensagem enviada pelo Sr. Benny, no dia 30/07/2008, às 13h51min).

E a testemunha Jaques Mendes Marçal declarou que a reclamante não seria mais a apresentadora porque estaria grávida, enquanto a testemunha Luciana, apesar de alegar que a primeira opção da reclamada seria a apresentadora Laura Lima, disse que enviou solicitação para que a reclamante passasse dados ou contatos e, através de contato telefônico com a reclamante, ficou sabendo de sua gravidez e esta lhe disse que não sabia mais o que iria ocorrer dali para frente (f. 244/245).

É de se registrar que embora tenha a testemunha Luciana declarado que acredita que a reclamante não tenha sido excluída em razão da gravidez, ela presenciou o temor da reclamante quanto a sua situação a partir daquele instante.

O fato de outras empregadas apresentarem o Telejornal grávidas não induz a conclusão de que a reclamada não possa ter agido de forma discriminatória para com a reclamante. Convém registrar que as apresentadoras encontravam-se com o contrato de trabalho em curso e, a reclamante, apenas nas tratativas.

Nessa seara, restaram provados os fatos ensejadores do reconhecimento do dano moral, consistente nas acusações de prática discriminatória contra a mulher em seu estado gravídico. Acresça-se, ainda, que antes da celebração do contrato, as partes devem agir com probidade e boa-fé (art. 422 do Código Civil), deveres estes que foram descumpridos pela parte ré, o que gera dever de indenizar (art. 186 e 927 do Código Civil).

A discriminação fica evidenciada quando somos tratados iguais, em situações diferentes, e diferentes, em situações iguais. A discriminação sofrida pela reclamante foi infundada, já que estava como certa a sua admissão na empresa e esta não ocorreu após a comunicação, ao diretor de jornalismo da emissora, de seu estado gravídico.

A conduta da reclamada violou o direito à cidadania, à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho, à igualdade, à não-discriminação, à proteção ao emprego, dentre outros direitos constitucionalmente assegurados. A empresa também violou disposições infraconstitucionais constantes no art. 373-A,II, da CLT e Lei nº 9.029/95.

No que toca à fixação do dano moral, pretende a reclamada que os valores arbitrados em R$ 71.700,00, sejam reduzidos para R$10.000,00.

Em face da inexistência de lei específica determinadora do quantum devido, o arbitramento da indenização por dano deve ser feito dentro dos limites da razoabilidade, compatível com a extensão e gravidade dos efeitos do dano, o grau de culpa do ofensor e a situação econômica das partes, para que se possa restabelecer o equilíbrio rompido.

O valor estimado tem significado simbólico de reparação satisfativa devida pelo ofensor ao ofendido. Como se sabe, o objetivo da indenização por dano moral é punir o infrator e compensar a vítima ou seus representantes pelo dano sofrido, atendendo desta forma à sua dupla finalidade: a justa indenização do ofendido e o caráter pedagógico em relação ao ofensor.

Com base em tais parâmetros, arbitro em R$15.000,00 o valor da indenização por dano moral.

Desse modo, provejo parcialmente o apelo da reclamada, para fixar em R$15.000,00 o valor da indenização por dano moral.

Fixo o valor da condenação em R$15.000,00 e das custas processuais em R$300,00, pela reclamada, que poderá requerer a devolução das custas recolhidas a maior perante a Receita Federal por meio de procedimento administrativo próprio.

3. Litigação de Má-fé

A recorrente sustenta que restou consignado em sentença que a reclamante sonegou fatos e informações cruciais para a solução da controvérsia, dizendo que a mesma não teve comprometimento com a verdade real, devendo ser a ela imputada a multa por litigação de má-fé.

Sem razão.

O fato de a reclamante ter omitido a existência da Cisup na petição inicial, por si só, não releva a presença de quaisquer das hipóteses do art. 17 do CPC, mormente quando se vê que os documentos juntados à peça de ingresso noticiam a relação havida com a Cisup.

Demais, o que a reclamante pretendia é ver reconhecida a relação de emprego havida entre ela e reclamada, independente da presença de outras pessoas jurídicas, já que, no seu entender, as mesmas atuaram apenas para fraudar a legislação trabalhista.

Diante das razões expendidas, não restaram caracterizadas as condutas previstas nos artigos 17, do CPC.

Nada a prover.

ISTO POSTO, dou provimento parcial ao recurso da reclamada para: a) excluir da condenação a determinação de anotação da CTPS da autora, assim como a indenização pelo período de estabilidade provisória e seus consectários (itens "a", "b" e "c" do dispositivo de f. 266); b) fixar em R$15.000,00 o valor da indenização por dano moral.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Primeira Turma, preliminarmente, à unanimidade, conheceu dos recursos da reclamante e da reclamada; no mérito, sem divergência, deu provimento parcial ao recurso da reclamada para: a) excluir da condenação a determinação de anotação da CTPS da autora, assim como a indenização pelo período de estabilidade provisória e seus consectários (itens "a", "b" e "c" do dispositivo de f. 266); b) fixar em R$15.000,00 (quinze mil reais) o valor da indenização por dano moral; unanimemente, negou provimento ao recurso da reclamante. Fixou o valor da condenação em R$15.000,00 (quinze mil reais) e das custas processuais em R$300,00 (trezentos reais), pela reclamada, que poderá requerer a devolução das custas recolhidas a maior perante a Receita Federal por meio de procedimento administrativo próprio.

Belo Horizonte, 01 de junho de 2009.
MARIA LAURA FRANCO LIMA DE FARIA
Desembargadora Relatora




JURID - indenização por danos morais. Discriminação. Gravidez. [10/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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