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sexta-feira, 14 de agosto de 2009

JURID - Habeas corpus. Atentado violento ao pudor. [14/08/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Atentado violento ao pudor (arts. 214 c/c 224, "a", e art. 71, todos do CP).


Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Habeas Corpus n. 2009.035718-8, de Rio do Sul

Relator: Des. Alexandre d'Ivanenko

HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR (ARTS. 214 C/C 224, "A", E ART. 71, TODOS DO CP).

ARGUIDA NULIDADE DA PRISÃO EM FLAGRANTE. INOCORRÊNCIA. ADEMAIS, COM O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, FICAM SUPERADAS EVENTUAIS IRREGULARIDADES.

ALEGAÇÃO QUE A CONDUTA PERPETRADA PELO PACIENTE NÃO CONFIGURA CRIME. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE APROFUNDADA DE PROVAS NA VIA ESTREITA DO WRIT. CONTUDO, ESTÃO PRESENTES INDÍCIOS SUFICIENTES DA PRÁTICA DELITUOSA PELO ACUSADO.

SUSTENTADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO QUE MANTEVE A PRISÃO DO PACIENTE. SEGREGAÇÃO DEVIDAMENTE FUNDADA NA NECESSIDADE DE GARANTIR A ORDEM PÚBLICA E NA CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. A GRAVIDADE DO DELITO, INSERIDO INCLUSIVE NO ROL DOS CRIMES HEDIONDOS, BEM COMO O MODUS OPERANDI DO AGENTE, QUE INDICA A SUA PERICULOSIDADE E A TENDÊNCIA À PRÁTICA DA PEDOFILIA, JUSTIFICAM A MANUTENÇÃO DA PRISÃO. PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP DEVIDAMENTE ESPECIFICADOS NO DECISUM. ADEMAIS, OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA NO JUIZ DA CAUSA.

PREDICADOS SUBJETIVOS POSITIVOS. FATOS QUE NÃO OBSTAM A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NÃO VIOLADO.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL INOCORRENTE. ORDEM DENEGADA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n. 2009.035718-8, da comarca de Rio do Sul (Vara Criminal e da Infância e Juventude), em que é impetrante Jeremias Felsky, e paciente Angelo Chiarelli:

ACORDAM, em Terceira Câmara Criminal, por votação unânime, denegar a ordem.

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Jeremias Felsky, em favor de Angelo Chiarelli, contra ato proferido pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de Rio do Sul, aduzindo que o paciente sofre constrangimento ilegal com a manutenção da sua prisão em flagrante, que se deu pela prática, em tese, do crime previsto no art. 214 do Código Penal.

Afirma o impetrante, em síntese, que não restou caracterizada qualquer situação de flagrância, conforme dispõe o art. 302 do CPP, até porque o paciente apenas "se encontrava no interior dos seus aposentos, anexo a sede da Igreja onde atuava, na companhia de uma adolescente, ambos distantes um do outro, bem como, completamente vestidos, não apresentando o cenário qualquer visão de ação dita criminosa". Pontua estar presente no "corpo do flagrante, tão e simplesmente as declarações de 3 (tres) [sic] policiais que participaram da malograda operação, que TAXATIVAMENTE relataram que ao arrombarem a porta do quarto residencial do Suplicante, o mesmo se encontrava atrás da porta e a adolescente deitada na cama. ONDE ESTÁ O CRIME??" (fl. 3).

Alega, ainda, que não há justa causa para o prosseguimento do processo crime, ressaltando a ausência da materialidade e que não foi encontrado material pornográfico, apenas imagens de adolescentes em trajes de banho (biquíni). "Na mesma linha, anuncia o Magistrado coator, que após a divulgação do caso, diversas mulheres passaram a ligar para a Delegacia, todavia, com os devidos respeitos, está aqui querendo se negar o instituto da preclusão" (fl. 6 - sic).

Sustenta, outrossim, que a decisão que indeferiu o pedido de relaxamento do flagrante e/ou liberdade provisória carece de fundamentação, além de asseverar que não estão presentes os requisitos do art. 312 do CPP para a manutenção da segregação do acusado.

Por fim, salienta que o paciente é primário, possuidor de residência fixa e atividade lícita, devendo ser aplicado ao caso o princípio da presunção de inocência.

Indeferida a liminar (fls. 243-245), foram solicitadas informações à autoridade dita coatora, que as prestou às fls. 248-253 e esclareceu que o paciente foi preso em flagrante em 19-6-2009; que em 26-6-2009 foi indeferido o pedido de relaxamento do flagrante/concessão de liberdade provisória; que o Auto de Prisão em Flagrante foi homologado em 30-6-2009; que o paciente foi denunciado, em 6-7-2009, como incurso nas sanções do art. 214, caput, c/c art. 224, "a", na forma do art. 71, todos do CP; que a denúncia foi recebida em 7-7-2009; e, por fim, que a prisão do paciente é necessária para a garantia da aplicação penal, para conveniência da instrução, bem como para a garantia da ordem pública.

Remetidos os autos à douta Procuradoria Geral de Justiça, esta, em parecer da lavra do Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, opinou pela denegação da ordem (fls. 255-258).

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, o writ há de ser conhecido.

Argumenta o impetrante, inicialmente, a inexistência de qualquer das modalidades de flagrante descritas no art. 302 do CPP, motivo pelo qual requer o reconhecimento da nulidade do ato e, por conseguinte, a soltura do paciente.

Não assiste razão ao impetrante, pois o auto de prisão em flagrante atendeu aos requisitos legais e constitucionais, até porque, observando as declarações prestadas pelos policiais (fls. 18-20, 21 e 22), pela ofendida (fls. 56-58) e pelo próprio paciente (fls. 23-24), constata-se que a prisão se deu quando estava sendo cometida a infração, restando devidamente caracterizado o flagrante conhecido como próprio (art. 302, I, do CPP).

Improsperável, assim, a nulidade da prisão em flagrante aventada, devendo ser salientado que "o recebimento da denúncia supre qualquer irregularidade ou eventual nulidade do Auto de Prisão em Flagrante, a qual, caso existente, não faz eco na ação penal instaurada" (Habeas corpus n. 02.015463-1, de Joinville. Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 20-8-2002).

Se não bastasse isso, não há como acolher a tese do impetrante no sentido de que não restou demonstrada qualquer prática delituosa, senão vejamos:

A policial civil Sueli Kemper descreve que, ao entrar no quarto, deparou-se "com A. deitada na cama e o Frei atrás da porta; Que A. estava sem a jaqueta que vestia e o Frei com o zípper da calça aberto; Que perguntado a A. o que havia acontecido esta disse que o Frei havia lhe beijado na boca e passado a mão em seus seios; Que o frei também admitiu ter beijado na boca de A. e passado a mão nos seios dela" (fl. 20).

Ruan Marco Cipriano, policial civil, confirma que, ao adentrar no quarto do paciente, encontrou "a adolescente A. deitada na cama do pároco, estando este com a calça aberta" (fl. 22).

Já a vítima A.M., com 13 anos (treze) de idade, revelou que (fls. 56-57):

[...] quando a informante tinha ainda onze anos de idade, em uma certa oportunidade teve um desentendimento com outra adolescente que participava do grupo; que o Frei Ângelo naquele dia chamou a informante para conversar com ele a respeito de tal desentendimento, e começou a passar a mão em seu rosto, a beijou no canto da boca e após lhe beijou no boca; que inicialmente a informante ficou assustada, sendo que o Frei começou a lhe acalmar e perguntou se a informante já havia "ficado" com algum menino, sendo que ao responder a ele que não, o mesmo disse que então sua boca seria só dele; Que como o Frei percebeu que a informante havia ficado muito assustada, durante um certo tempo, não tomou aquele tipo de atitude, voltando a beijá-la apenas quando a informante já estava com 12 anos; Que a informante acabou se envolvendo com o Frei pois ele fazia juras de amor e lhe presenteava com balas, chocolates, pirulitos, além de dois chaveiros e um brinco; Que nos últimos tempos o Frei começou a insistir para que a informante mantivesse relação sexual com ele, mas não aceitava o pedido do Frei pois tinha muito medo de se "entregar" para ele, bem como de que seus pais soubessem; Que o Frei Ângelo pressionava muito a informante dizendo que se o amasse verdadeiramente teria que se entregar por completo a ele, se referindo a relação sexual; Que em algumas oportunidades a informante esteve no quarto do Frei, quando este lhe beijava e passava a mão em seu corpo; Que em várias vezes o Frei colocou a mão dentro de sua blusa e passou a mão em seu seio, por cima do sutian, pois quando ele tentava colocar a mão dentro do sutian, mais precisamente no mamilo a informante tirava a mão dele; Que no domingo passado, quando a informante esteve no quarto do frei, foi a primeira vez que ele passou a mão em sua vagina, acariciando por cima da calça e após começou a passar a mão em seus seios; Que o frei pedia para que a informante ligasse a cobrar para ele, sendo que quase todos os dias falava como ele; que durante as conversas o Frei perguntava muita a cor da calcinha que a informante estava usando, bem como gostava de dizer que estava tocando em seu corpo e lhe dando banho, isto em pensamento; Que o Frei chegou a marcar um dia para que a informante se entregasse por completo a ele, mas acabou despistando ele e não foi ao encontro pois estava com medo; Que o Frei sempre pedia para que a informante não contasse para ninguém o que estava acontecendo, pois senão seria preso; Que na data de hoje o Frei pediu que a informante fosse até o seu quarto; Que disse para ele que não podia, pois estava de castigo, quando o Frei disse que conversaria com sua mãe, para que ela permitisse; Que o Frei realmente telefonou para a sua mãe e convenceu ela a deixar a informante ir até a igreja, sob a alegação de que precisava de sua ajuda; Que por volta das 15h30min a informante foi até a igreja e ao chegar lá a secretária disse que o Frei estava em sua casa, que fica no andar superior; Que quando a informante subiu encontrou com o Frei que estava no quarto, mexendo no computador, ele pediu que entrasse, trancou a porta e apagou a luz; Que o Frei deitou a informante na cama dele e se deitou ao lado; Que o Frei começou a beijá-la e passar a mão em sua barriga e seus seios; Que quando estavam há alguns minutos dentro quarto, o Frei ouviu um barulho e se assustou, sendo que se levantou rapidamente da cama e pediu para que a informante se sentasse, mas antes que conseguisse se levantar a porta foi arrombada por uma policial; Que o Frei dizia que nada havia acontecido e que apenas estava lhe dando alguns conselhos; que em conversa com a policial a informante acabou contando tudo que estava acontecendo; que a informante diz que a maioria dos contatos com o Frei eram através de códigos [...]. (grifado)

Disse o paciente (fls. 23-24):

[...] que o declarante admite que perguntou por várias vezes a cor das calcinhas que A. usava por "bobeira"; que com relação às conversas que o declarante mantinha com A. através de telefone e de mensagens, reconhece que algumas delas possuíam conotação sexual, bem como fantasias sexuais com peças íntimas; que quando o declarante dizia que "queria fazer amor com A.", "dar banho nela", "queria vê-la nua", "queria vê-la sem calcinha e sem sutiã", eram todos momentos de "bobeira"; Que o declarante admite que dava "beijos de amor" em A., só que em forma de "selinho"; Que o declarante reconhece que no dia de hoje "escorregou" suas mãos nos seios de A.; Que quando declarante falou a A. que iria pedir ao Bispo para casar-se com ela, tratava-se também de "bobeira"; que o declarante admite que tem diversas fotografias de adolescentes, inclusive algumas de biquíni; Que o declarante diz ser fotógrafo e tem como hobbie a fotografia e filmagem; Que o declarante afirma que convidou A. para ir até a Igreja, onde pediu autorização para a mãe da menina; Que por volta das 16h30 da tarde A. adentrou em seu quarto repentinamente, onde o declarante encontrava-se fazendo um trabalho; Que então o declarante decidiu trancar a porta do quarto para não ser mais incomodado e terminar o seu trabalho, embora, A. já se encontrasse sentada na sua cama; Que então o declarante sentou-se na cama e fez "uns carinhos", em A.; Que o declarante descreve os carinhos como sendo: passar a mão no rosto, dar um selinho, e "escorregou" as mãos nos seios de A.; Que neste momento a polícia bateu em sua porta e adentrou no quarto; [...]. (grifado)

Tenho que, em análise perfunctória, indícios da prática de atos aviltantes e repugnantes pelo paciente encontram-se, para esta fase, devidamente delineados nos autos, sendo que sua conduta, em princípio, configura o crime de atentado violento ao pudor, com violência presumida, caindo por terra a alegação que não há justa causa para o prosseguimento da demanda.

E, quanto à materialidade, lembrando que se trata de habeas corpus, entendo que se encontra suficientemente demonstrada pelas declarações presentes nos autos, salientando-se que, além de o paciente ter sido preso em flagrante, em crimes dessa natureza, a palavra da vítima tem alto valor probatório.

Frisa-se que a via eleita não se presta para a realização de um exame aprofundado das provas constantes dos autos a fim de se concluir pela inocência do paciente, mas, especificamente com relação ao material fotográfico apreendido, em que há fotos de crianças/adolescentes, algumas em trajes mínimos (uma delas com os seios à mostra) e outras em que o paciente está presente, tenho que elas, no contexto do feito, servem como indícios de uma conduta voltada à prática da pedofilia.

No que se refere à aventada falta de fundamentação da decisão que manteve a prisão do paciente, bem como a ausência dos requisitos ensejadores da segregação cautelar, em que pese o entendimento do impetrante, não prosperam as alegações, uma vez que, apreciando o conteúdo do presente writ, nota-se que o magistrado singular fundamentou adequadamente a necessidade da prisão.

Constou no decisum que negou o pedido de relaxamento da prisão em flagrante/liberdade provisória (fls. 33-35):

A prisão em flagrante atende a todos os requisitos legais e constitucionais pertinentes à espécie.

O caso em comento é por demais complexo e ganhou grande publicidade, não apenas em jornais e canais de televisão locais como também na rede nacional, em horário nobre.

Ao que consta, Ângelo Chiarelli foi preso em flagrante delito quando, segundo ele, "acariciava" uma menor de idade em um quarto reservado.

Meras carícias, contudo, não ocorreram no modesto entender deste magistrado, eis que adolescente estava sem camisa, o frei com o zíper da calça aberto, tendo a menina mencionado que Angelo havia lhe dado um beijo na boca e o frei admitido que já tinha apalpado os seios da menor.

Extrai-se dos esclarecimentos prestados pelo frei:

[...]

Ainda, colhe-se do testemunho da adolescente A.M., hoje com 13 anos de idade:

[...]

Com Ângelo também foram apreendidas diversas fotografias com conteúdo pornográfico envolvendo menores de idade.

Diante da divulgação do caso, diversas mulheres, algumas até mesmo de outros Estados, passaram a entrar em contato com a polícia informando que também foram molestadas por Ângelo quando eram crianças/adolescentes, o tem demonstrado que a sua atitude desvirtuada tem origem bastante remota.

Ângelo, em nota divulgada em jornais locais, procura diminuir a gravidade da sua conduta, sempre salientando que tudo não se passou de meras carícias e que se vê arrependido, afirmando que pretende obter a liberdade para continuar a exercer o seu trabalho na paróquia com crianças e adolescentes.

Tendo tudo isso em conta, a colocação de Ângelo em liberdade, neste momento, comprometeria sensivelmente a investigação que está em curso pela Autoridade Policial, podendo ainda influenciar negativamente no ânimo de outras pessoas da comunidade, em especial crianças e adolescentes que mantinham contato estreito com o frei, que poderão deixar de prestar o seu testemunho sobre eventuais outros fatos dessa natureza.

Não há razão, portanto, para o deferimento do pleito formulado, eis que presentes os requisitos da segregação cautelar elencados no art. 312 do CPP, mais especificamente indícios fortes de autoria e materialidade de crime de natureza grave, tendo a prisão como móvel principal, mas não único, a conveniência da instrução criminal. (grifado)

Cuidando-se de habeas corpus, imperioso restar caracterizado constrangimento ilegal à liberdade do paciente o que, no presente feito, não se identifica, ante a inexistência de irregularidades ou ilicitudes na decisão que manteve a prisão do acusado.

Ressalta-se que "a conveniência da medida deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à prática delituosa. Embora seja certo que a gravidade do delito, por si, não basta para a decretação da custódia, a forma e execução do crime, a conduta do acusado, antes e depois do ilícito, e outras circunstâncias podem provocar imensa repercussão e clamor público, abalando a própria garantia da ordem pública, impondo-se a medida como garantia do próprio prestígio e segurança da atividade jurisdicional" (MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2004. p. 803).

Como bem pontuou o douto Procurador de Justiça (fl. 251), a manutenção da "custódia cautelar é indispensável para a garantia da ordem pública (dado a pluralidade de vítimas ingênuas atingidas e a comoção social gerada, facilmente perceptível após cada apresentação do tema em programas televisivos) e da instrução processual (impedir que, solto, venha a coagir testemunhas)".

Entendo que a manutenção da prisão do paciente está devidamente fundada, em especial, na garantia da ordem pública e na conveniência da instrução criminal, pois as provas carreadas aos autos evidenciaram a materialidade do delito e os indícios de autoria, principalmente em razão da prisão em flagrante e do relato da vítima menor, sem contar ainda a gravidade do fato ao qual o paciente restou denunciado, inclusive, inserido no rol dos delitos hediondos, sendo dever da Justiça acautelar o meio social.

Existem grandes probabilidades de que o paciente seja contumaz em práticas delitivas dessa natureza, destacando-se o seu modus operandi, sempre demonstrando astúcia e, assim, aproveitando-se da fragilidade mental que é peculiar das crianças/adolescentes, fatores que justificam a manutenção da sua segregação.

Nesse contexto, "a prisão cautelar é decretada com a finalidade de impedir que o agente, solto, continue a delinqüir", pois "há evidente perigo social decorrente da demora em se aguardar o provimento definitivo, porque até o trânsito em julgado da decisão condenatória o sujeito já terá cometido inúmeros delitos" (CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal, 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 229).

Deve-se ter em mente ainda que a ordem pública não se presta apenas para prevenir a prática de ações delituosas, mas está ligada, também, ao propósito de acautelar o meio social e dar maior credibilidade à Justiça.

O delito supostamente praticado pelo paciente é de tamanha morbidez e repulsa, e gera tanta repercussão social, que fica por muito tempo na mídia, causando intensa indignação na sociedade, a ponto de ser possível consignar que a liberdade do paciente pode ocasionar perigo à sua integridade física.

Há também a necessidade de se preservar a instrução do processo, tendo em conta a possibilidade de constrangimentos às testemunhas/informantes, como consignado na decisão proferida em primeiro grau, podendo o paciente vir a interferir nos elementos de convicção indispensáveis para o deslinde da demanda.

Aliás, novas ocorrências podem ser reveladas - em nada configurando a descabida alegação de preclusão -, porquanto a prática de crimes sexuais por representantes da igreja, por vezes, em virtude da posição que ocupam na sociedade, desencoraja denúncias.

Dessa feita, em que pesem as considerações efetuadas pelo impetrante, entendo que a concessão da ordem contrapõe-se ao interesse maior da sociedade e da própria Justiça, sendo a segregação necessária, sobretudo para garantia da ordem pública e para conveniência da instrução criminal.

Em caso análogo, recentemente julgou o Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR (6 X) E TENTATIVA DE ESTUPRO, AMBOS COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. TRÊS VÍTIMAS MENORES 14 ANOS. PRISÃO PREVENTIVA EM 17.02.08. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A CUSTÓDIA CAUTELAR. DECRETO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. PADRE CATÓLICO QUE EXERCE RELEVANTE INFLUÊNCIA EM RELAÇÃO ÀS VÍTIMAS E SEUS FAMILIARES. [...] PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA, NO ENTANTO.

1. Sendo induvidosa a ocorrência do crime e presentes suficientes indícios de sua autoria, não há ilegalidade na decisão que determina a custódia cautelar do paciente, se presentes os temores receados pelo art. 312 do CPP.

2. In casu, além de comprovada a materialidade do delito e de indícios suficientes de autoria, a prisão cautelar foi decretada por conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal, uma vez que o ora paciente, que é padre católico, exerce grande influência em relação a uma das menores e sua mãe, que sabia dos fatos e, por conta deles, recebia ajuda financeira. Ademais, o ora paciente possui vários endereços, o que pode dificultar a sua localização durante a instrução processual.

3. [...]

4. Ordem denegada, em que pese o parecer ministerial em sentido contrário.

(Habeas Corpus n. 106.903 - 2008/0110132-8 RS; Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 18-6-2009). (grifado)

E, do corpo do acórdão:

Com efeito, a preservação da ordem pública não se restringe às medidas preventivas da irrupção de conflitos e tumultos, mas abrange também a promoção daquelas providências de resguardo à integridade das instituições, à sua credibilidade social e ao aumento da confiança da população nos mecanismos oficiais de repressão às diversas formas de delinqüência. (grifado)

Portanto, no caso em tela, vê-se que a manutenção da segregação do paciente está escorada nos permissivos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal, devendo-se observar, outrossim, o princípio da confiança no juiz da causa que, por estar mais próximo dos fatos, tem, sem dúvida, maior noção da necessidade da prisão cautelar.

Registre-se, ademais, que a alegação de ser o paciente primário, possuidor de residência e emprego fixos, por si sós, não são argumentos suficientes para amparar a concessão de liberdade provisória, senão vejamos:

HABEAS CORPUS - PRISÃO PREVENTIVA - SUFICIÊNCIA DE INDÍCIOS DA AUTORIA E PROVA DA MATERIALIDADE. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO (ART. 121, §2º, II e IV, CP) - PRISÃO TEMPORÁRIA CONVERTIDA EM PREVENTIVA - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DA FUTURA APLICAÇÃO DA LEI PENAL - LIBERDADE PROVISÓRIA - VALORAÇÃO DA PROVA - IMPOSSIBILIDADE - PROFISSÃO DEFINIDA, RESIDÊNCIA FIXA E CONDUTA ILIBADA - REQUISITOS QUE NÃO IMPEDEM A PRISÃO CAUTELAR DECRETADA - CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM DENEGADA (Habeas Corpus n. 2004.021373-5, de Palhoça, rel. Juiz Jânio de Souza Machado, j. 31-8-2004).

De mais a mais, a manutenção da segregação não significa desrespeito ao princípio constitucional de presunção de inocência, quando presentes seus pressupostos, como ocorre na hipótese em comento.

A propósito:

[...] A pretendida aplicação do princípio da presunção de inocência não é cabida, pois por demais sabido que tal preceito constitucional não impede a medida cautelar uma vez ocorrentes qualquer dos pressupostos do artigo 312 do Código de Processo Penal. Ora, a própria Constituição Federal faz previsão da possibilidade da prisão exceção, seja preventiva, seja nos casos de flagrante, o que não torna soberano o princípio invocado. (Habeas Corpus n. 2005.022101-8, de Campo Erê. Rel. Des. Solon d'Eça Neves, j. 30-8-2005).

Assim, não há como conceder a medida pleiteada ante a legalidade da manutenção da prisão do paciente.

Observa-se que a comarca de origem deverá promover a(s) devida(s) comunicação(ões), conforme dispõe o § 2º do art. 201 do Código de Processo Penal, acrescentado pela Lei n. 11.690/2008.

DECISÃO

Ante o exposto, a Terceira Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do writ e denegar a ordem.

O julgamento, realizado no dia 21 de julho de 2009, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Torres Marques e dele participou o Exmo. Sr. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, ambos com voto. Funcionou, pela douta Procuradoria Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira.

Florianópolis, 22 de julho de 2009.

Alexandre d'Ivanenko
RELATOR

Publicado em 12/08/09




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