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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

JURID - Gravidez. Demissão de sua ocupante no quarto mês de gestação [05/08/09] - Jurisprudência


Administrativo. Exercício de cargo público de livre nomeação e exoneração. Gravidez. Demissão de sua ocupante, no quarto mês de gestação. Estabilidade provisória do art. 10, II, b, do ADCT.


Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2007.032771-8, de Criciúma

Relator: Des. Pedro Manoel Abreu

Administrativo. Exercício de cargo público de livre nomeação e exoneração. Gravidez. Demissão de sua ocupante, no quarto mês de gestação. Estabilidade provisória do art. 10, II, b, do ADCT. Aplicabilidade reconhecida às ocupantes de cargos comissionados naquela situação. Ausência de distinção constitucional, nesse tocante, entre o servidor público efetivo e o comissionado. Exegese dos arts. 5.º, § 2.º, 7.º, XVIII, 39, § 3.º, da Constituição e art. 10, II, b, do ADCT. Honorários advocatícios. Fixação equitativa e razoável. Manutenção da verba fixada. Recurso desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.032771-8, da comarca de Criciúma (Vara da Faz., Acid. de Trab. e Registros Públicos), em que é apelante Município de Criciúma e apelada Rosângela Duarte Rodrigues:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta pelo Município de Criciúma contra sentença exarada em sede de reclamatória trabalhista movida por Rosângela Duarte Rodrigues.

O decisum objurgado julgou procedente o pedido alternativo contido na peça vestibular, para condenar o apelante a pagar à autora o correspondente à remuneração que esta teria percebido no mês de maio/2005 até cinco meses após o parto, devidamente corrigido e acrescido dos juros legais pelos índices da taxa SELIC. Houve, ainda, condenação em honorários de advogado.

Em sua insurgência disse o apelante que a nomeação para provimento de cargo em comissão tem guarida no art. 37, II, da Constituição Republicana, assumindo o caráter estatutário, somente se lhe aplicando o regramento previsto em lei específica.

Verberou que o direito à estabilidade provisória não se aplica aos servidores públicos e que o direito à licença gestante é um direito de caráter previdenciário, que a recorrida faz jus, independente de estar trabalhando ou não para o Município.

Gizou que a servidora comissionada não foi contemplada no rol de agraciados pelo art. 39, § 3.º da Constituição, isto porque o dispositivo constitucional, ao não distinguir entre servidores efetivos e comissionados, não foi estendido a estes últimos.

Alegou ainda a inaplicabilidade do art. 10, I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT, pois este se refere a direito de caráter trabalhista e censurou a fixação dos honorários de advogado, que deveriam estar limitados em 10% do valor da condenação.

Ao final, pugnou pela reforma da sentença, reconhecendo-se a improcedência do pedido inaugural.

Contra-arrazoando, a apelada propugnou pela manutenção do decisum vergastado.

VOTO

Prima facie, diante do caráter meramente indenizatório da presente demanda, registra-se desnecessária a participação do Ministério Público no processo, havendo, inclusive, orientação expressa daquele órgão nesse mesmo sentido.

No mérito, cinge-se a pretensão recursal à reforma da sentença, ao argumento de que seriam inaplicáveis os dispositivos constitucionais lá invocados aos ocupantes de cargos comissionados.

Extrata-se dos autos que a apelada era ocupante de cargo de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração (Decreto n. 118/2004, fl. 38), do qual foi efetivamente exonerada em 3.5.2005 (Decreto n. 644/2005, fl. 37, v.), quando se encontrava aproximadamente com quatro meses de gestação (fl. 09). Pois bem.

Desde o advento da Constituição Republicana, a regra de acesso aos cargos da Administração Pública passou a ser o concurso público, certamente um dos mais destacados braços da democracia. Entretanto, o legislador constituinte, atento às necessidades administrativas, manteve a previsão constitucional dos cargos demissíveis ad nutum, notadamente em art. 37, II:

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

Não paira dúvida de que a apelada estava no seu quarto mês de gestação quando foi, então, exonerada, daí resultando apenas indagar se, por se tratar de cargo comissionado, sujeito ao regime estatutário municipal, estaria a sentença autorizada a invocar a aplicação do art. 39, § 3.º, da CF, que dispõe:

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

De outro turno, o art 7.º, inciso XVIII, da Carta Política, assegura aos trabalhadores urbanos e rurais, o direito a licença à gestante, expressamente estendida aos servidores públicos, in verbis:

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias.

É certo concluir que a Constituição não fez distinção entre servidores públicos e comissionados, limitando-se apenas a afirmar que "aplica-se", aos servidores "ocupantes de cargo público", o disposto no art. 7.º, XVIII.

Não há negar, igualmente, que o art. 10, II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias é aplicável à espécie, ao contrário do que verberou o Município apelante, conclusão que se extrai da natureza da pretensão e do direito em baila. Esse entendimento já encontra sedimentação na Corte, em decisão da relatoria do eminente Desembargador Luiz Cézar Medeiros, oriunda da apelação cível n. 1998.003750-6, que agora adota-se como razão de decidir:

(...) Resta, pois, analisar-se se o fato da autora ocupar cargo comissionado, portanto, demissível ad nutum, se constitui em elemento impeditivo de reconhecer-se em seu favor o benefício da estabilidade provisória decorrente da licença-maternidade.

Sobre o tema, a melhor inteligência é aquela manifestada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se depreende da leitura do elucidativo e judicioso aresto:

"FUNCIONÁRIA PÚBLICA - GESTANTE - CARGO EM COMISSÃO - EXONERAÇÃO - INDENIZAÇÃO

13º. Constitucional e Administrativo. Mandado de Segurança. Cargo em comissão. Gestante. Exoneração. Falta de motivação do ato administrativo no sentido de que a exoneração se deu por razão outra que não a da gravidez. Inexistência de direito a permanecer no cargo, que é de confiança. Direito, contudo, a uma indenização equivalente a cinco meses de remuneração, a contar da gravidez. Invocação de normas protetivas da própria Constituição para o trabalhador in genere (arts. 5º, par. 2º, 7º, inc. XVIII, e 10, inciso II, alínea b, do ADCT). Recurso ordinário conhecido e provido.

I - A impetrante foi nomeada para exercer cargo em comissão. Alega que foi exonerada simplesmente por estar grávida. O impetrado, em suas informações, ao fazer a defesa do ato impugnado, não alegou nenhuma razão para a exoneração. Restou, assim, claro que o motivo foi a gravidez.

II - Ainda que não haja norma expressa para proteger a recorrente, pode-se-lhe aplicar, por força do par. 2º, do art. 5º da Constituição, dispositivos constitucionais relativos ao trabalhador em geral (art. 7º, inc. XVIII, combinado com o art. 10, inc. II, b, do ADCT.

III - Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido para que à recorrente, que não tem direito a permanecer no cargo, seja paga uma indenização equivalente à remuneração que ela teria em 5(cinco) meses a contar da gravidez" (RMS 3.319-9/SC -Rel. Min. Adhemar Maciel).

E isto porque a licença-maternidade é um instituto que se circunscreve no âmbito dos Direitos e Garantias Fundamentais (Título II da Lei Maior), tendo sua eficácia inclusive estendida às funcionárias civis (art. 39, par. 2º, CF; esta, a tese já acobertada pelo Egrégio Tribunal Superior de Justiça: "A licença gestante foi expressamente estendida às servidoras civis e militares pela nova Carta Magna" (STJ, MS n. 616/91/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo).

O estado laborativo, por parte da mulher, será o bastante à consecução do citado instituto jurídico. Pouco importará seja ela servidora efetiva ou comissionada; estabelecer distinções aqui seria malferir frontalmente a Carta Magna (afinal, o § 2º, do art. 39 da CF não chegou a um grau de minudência suficiente a excluir as comissionadas). Não se pode descurar que a exegese, em tal seara, deita arrimo numa perspectiva liberal. Afinal, está-se diante de uma Garantia Fundamental; não poderá, pois, o administrador público querer impor limites a uma prerrogativa posta à disposição da universalidade das servidoras gestantes.

Pautando-se por esse diapasão, vê-se que o titular do Executivo Municipal terá sua margem de atuação discricionária severamente mitigada. O cargo comissionado, demissível ad nutum, sofre radical transmudação. Há um fato biológico - gravidez - que, tal qual ocorre com as trabalhadoras da iniciativa privada, gera uma estabilidade provisória no cargo. A reaquisição da discricionariedade administrativa dar-se-á somente com o encerramento da eficácia da norma constitucional, qual seja, com o completamento do prazo de 5 (cinco) meses após a geração por parte da servidora.

Caracterizada a subsunção da categoria das servidoras comissionadas à prerrogativa inserta no art. 7º, XVIII da CF, pela norma de extensão correlata (art. 39, par. 2º, da CF), depreende-se que o caráter ad nutum de tal cargo encontra-se obstaculizado, até que o prazo normativo retro (cinco meses após a geração) esteja superado. Enquanto perdurar o lapso temporal, encontra-se a servidora acobertada pela estabilidade provisória.

Assim, reprisando consideração outrora expendida, o Administrador Público não poderá exonerar a servidora durante sua gravidez por força de um instituto jurídico da extração constitucional (licença-maternidade), tendo 'sobrestada' uma discricionariedade ínsita a esse tipo de relação estatutária, qual seja, a possibilidade de demissão imotivada.

Neste Tribunal idêntico entendimento já foi sufragado:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - SERVIDORA EXERCENTE DE CARGO COMISSIONADO - GRAVIDEZ - DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA - DIREITO À INDENIZAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO - EXEGESE DOS ARTS. 10, II, b E 7º, I DA MAGNA CARTA - REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDOS - SENTENÇA MANTIDA.

Embora não tenha direito à permanência no cargo, a servidora exercente de cargo em comissão, tendo sido exonerada quando da ciência pela municipalidade de seu estado gravídico, e sem que tenha sido deduzido outro motivo a justificar a quebra da confiança, tem a apelada direito a ser indenizada pelo período desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto" (Apelação Cível n. 96.011997-3 - Des. Orli Rodrigues).

ADMINISTRATIVO - CARGO EM COMISSÃO - GESTANTE - EXONERAÇÃO - DIREITO À REMUNERAÇÃO.

É inquestionável que a gestante, ocupante de cargo em comissão, pode ser exonerada a qualquer tempo. No entanto, faz ela jus à remuneração correspondente ao período de garantia à estabilidade no emprego assegurada a todas as gestantes (CF, ADCT, art. 10, II, b; ROMS nº 3.319-9/SC, Min. Adhemar Maciel)" (Apelação Cível n. 96.008231-0 - Des. Newton Trisotto). Do mesmo relator: Apelação Cível n. 98.009604-9, de Maravilha e Apelação cíveln. 97.012310-8, de Laguna.

E no corpo do acórdão cuja ementa foi transcrita, o eminente relator taxativamente afirma que "a ocupante de cargo público em comissão pode ser exonerado a qualquer tempo, mesmo se gestante. Não há lei que lhe assegure a permanência no cargo.

Porém, tem o direito à remuneração correspondente ao período de estabilidade que a Constituição Federal assegura à empregada gestante (ADCT, art. 10, II, b).

Por oportuno, vale ressaltar que há uma simples estabilidade provisória, a qual não acarretará quaisquer outras vantagens porventura existentes na seara trabalhista. A recorrente terá somente direito à remuneração devida da data da dispensa até o quinto mês posterior ao nascimento do filho, conforme disciplina o dispositivo constitucional.

Esta também, aliás, a inteligência veiculada pelo aresto proveniente do STJ, antes colacionado (RMS 3.313/9).

Em suma, não surgirá, por força da licença-maternidade um tertius gens (ou como diria Bobbio, 'la terza via') de regime laboral, verdadeira alquimia jurídica, na qual coexistem institutos de direito estatutário e celetista.

Considerando então, como indiscutível o direito das gestantes ocupantes de cargos comissionados à estabilidade provisória constitucionalmente garantida e, considerando mais, inexistir prova nos autos de que a autora comunicou seu estado a destempo, se mostra a meu ver irretorquível o atendimento de sua pretensão, tão-somente no tocante ao pagamento das verbas reconhecidas no decisum (TJSC, ap.cív. n. 1998.003750-6, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 22.4.2002).

Quanto à excessividade dos honorários de advogado, fixados em R$ 2.000,00 em desfavor da Fazenda Pública Municipal, também não lhe assiste razão.

É que os honorários advocatícios serão arbitrados, quando vencida a Fazenda Pública, pela regra insculpida no art. 20, § 4.º, do CPC, que dispõe:

§ 4o Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior.

No caso presente, ordena o Estatuto Processual que o juiz atente para a fixação equitativa dos honorários, de forma a não provocar aviltamento da verba e primar pela moderação dela quando vencida for a Fazenda Pública.

Os valores fixados pelo julgador a esse título afiguram-se razoáveis e proporcionais à condenação, daí não se podendo inferir que tenha ele extrapolado ao estipular aquele montante.

Tendo em conta, portanto, o grau de zelo profissional e a natureza e a importância da demanda, que prima pela aplicação de direitos fundamentais, não é de se alterar a sentença, igualmente, nesse tocante.

No mesmo sentido já se decidiu:

PROCESSUAL CIVIL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AVILTAMENTO DO TRABALHO DO CAUSÍDICO - OCORRÊNCIA - APLICAÇÃO DO § 4º, DO ART. 20, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - FIXAÇÃO PELA APRECIAÇÃO EQÜITATIVA

Nas causas previstas no § 4º, do art. 20, do Código de Processo Civil, há de prevalecer um critério de eqüidade, em função do qual o juiz agirá com prudente arbítrio, fora dos limites do § 3º do art. 20, para evitar aviltamento de verba, nas pequenas causas, e adotar mais moderação nas sucumbências da Fazenda Pública (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 43. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v 1, p. 106) (TJSC, Ap. Cív. N. 2007.000238-0, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 13.4.2009).

Não há, pois, como atender ao reclamo.

DECISÃO

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 19 de maio de 2009, foi presidido pelo signatário, com voto, e dele participaram os Desembargadores Luiz Cézar Medeiros e Sônia Maria Schmitz.

Florianópolis, 9 de junho de 2009.

Pedro Manoel Abreu
RELATOR

Publicado em 29/07/09




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