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terça-feira, 25 de agosto de 2009

JURID - Familiares serão indenizados. [25/08/09] - Jurisprudência


Empresas de táxi aéreo são condenadas a indenizar familiares de vítima morta em acidente.
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Circunscrição: 1 - BRASÍLIA
Processo: 2004.01.1.126652-3
Vara: 207 - SÉTIMA VARA CÍVEL

Processo: 2004.01.1.126652-3
Ação: REPARAÇÃO DE DANOS
Requerente: LUIZ ANDRÉ RORIZ SOLANO e outros
Requerido: MORETO TÁXI AÉREO e outros

SENTENÇA

Trata-se de ação ajuizada, sob o rito ordinário, por LUIZ ANDRÉ RORIZ SOLANO, ANDRÉA RORIZ SOLANO CATEB, HUMBERTO LUCENA RORIZ SOLANO E LUIZ RORIZ SOLANO em desfavor de MORETO TÁXI AÉREO e HELIMED AERO TÁXI LTDA, objetivando reparação por danos materiais e morais.

Determinada a emenda à inicial às fls. 57 e 74, foi atendida às fls. 60/69 e 81/94, oportunidade em que houve pedido e exclusão do Distrito Federal do pólo passivo.

Narra a petição inicial, literalmente, que, "no dia 1° de janeiro de 2000 - primeiro dia do ano -, quando festivamente comemoravam tanto a reinauguração da residência oficial do Governo do DF em Águas Claras, quanto ao início do segundo mandato do governador Roriz, com uma missa de ação de graças celebrada pelo Padre José Ribamar Nunes-, foram tragicamente surpreendidos pela dolorosa notícia de que a irmã do Governador - IRIS RORIZ SOLANO -, que embarcara num helicóptero a serviço da 1ª Ré, embora de propriedade da 2ª Ré, a fim de buscar a imagem de Nossa Senhora Aparecida, houvera sido vítima fatal de acidente, por volta das 12h15min, ao sair da aeronave que a transportava, por cuja hélice traseira fora atingida" - fl. 83.

Aduzem os autores que, segundo relatório final do Comando da Aeronáutica (CENIPA), o fato ocorreu tendo em vista a (i) desobediência às normas de segurança; (ii) negligência do piloto ao aterrissar, não anunciando que a passageira deveria sair pela porta direita, bem assim mantendo o motor da aeronave ligado - fl. 84.

Sustentam que a responsabilidade das rés é objetiva, não dependendo de demonstração de culpa. Fundamentam a pretensão basicamente nos arts. 927, inciso III, 933 e 948, do Código Civil, bem assim nos arts. 256 e 348 do Código Brasileiro de Aeronáutica, além do disposto no Código de Defesa do Consumidor.

Pedem: (i) a condenação das rés ao pagamento de: (a) R$20.000,00 (vinte mil reais) pelas despesas com o funeral; (b) pensionamento mensal, durante 18 anos, tendo por base a remuneração de R$ 6.000,00 (seis mil reais) por mês, valor supostamente recebido pela vítima em vida; (c) R$ 2.080.000,00 (dois milhões e oitenta mil reais), correspondente a R$520.000,00 para cada um dos autores, a título de indenização por danos morais.

Instruem a petição inicial com os documentos de fls. 16/55 e 62/68.

Citadas (fls. 99 e 101), as requeridas apresentaram contestação.

A segunda requerida - HELIMED - alega, em apertada síntese, que [fls. 114/142]: (i) é parte ilegítima, já que o helicóptero estava a serviço do Distrito Federal; (ii) não se trata de responsabilidade contratual, mas sim institucional; (iii) não há responsabilidade civil objetiva, até porque o acidente teria ocorrido por culpa exclusiva da vítima; (iv) que, no mínimo, restou configurada a culpa concorrente da vítima. Refuta os danos alegados, bem assim o descumprimento das normas de segurança. Requer a denunciação da lide da Seguradora AGF e, no mérito, a improcedência do pedido.

A primeira requerida, MORETO TÁXI AÉREO, por sua vez, na peça de defesa, sustenta que [fls. 152/194]: (i) foi contratada pelo Distrito Federal para atender interesses do governador, sendo que não estava agendado qualquer compromisso oficial para a citada data, razão pela qual colocou a aeronave em revisão mecânica, com dispensa do piloto. Em virtude de pedido dos familiares do governador, indicou a HELIMED para prestar o transporte aéreo, isso em caráter particular. Não havia qualquer relação entre as requeridas, tampouco com a vítima, tanto que não é proprietária da aeronave nem empregadora do piloto. Por essa razão, é parte ilegítima; (ii) deve ser julgado improcedente o pedido, uma vez que não participou do evento danoso, bem assim porque a culpa do acidente teria sido da vítima, que não observou a indicação de perigo existente na face lateral da aeronave; (iii) na eventualidade da procedência do pedido, sejam os danos materiais de sepultamento fixados no equivalente a cinco salários mínimos, à míngua da comprovação dos gastos; (iv) seja julgado improcedente o pedido de pensionamento, uma vez que os autores não eram dependentes econômicos da vítima, sendo que, à época da propositura da ação, o filho mais novo contava com 28 anos de idade; (v) na hipótese de acolhimento do pedido de indenização por danos morais, sejam fixados em trezentos salários mínimos.

Réplicas às fls. 208/234.

Oportunizado prazo para especificação de provas, houve requerimento de inspeção judicial, que foi indeferido (fl. 255), facultando-se o requerimento de perícia.

Houve interposição de agravo retido às fls. 259/265, tendo a decisão sido mantida (fl. 273).

Houve requerimento de oitiva de testemunhas (fls. 242/244 e 275).

No curso da audiência de instrução, tentada a conciliação, restou infrutífera, razão pela qual houve coleta da prova testemunhal, conforme termos acostados às fls. 308, 326 e 341/349. Na mesma oportunidade, tendo em vista inexistência de anterior apreciação do pedido, foi indeferida a denunciação da lide, decisão que não foi impugnada.

Alegações finais às fls. 357/373 (HELIMED), fls. 381/384 (autores) e fls. 386/407 (MORETO).

É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO. DECIDO.

Trata-se de pretensão de reparação por danos materiais e extrapatrimoniais, em decorrência de acidente aéreo que vitimou a genitora dos três primeiros requerentes e esposa do quarto autor, isso quando aquela contava com 52 anos de idade.

PRELIMINARES

Inicialmente, rejeito todas preliminares de ilegitimidade passiva (ou carência de ação) veiculadas pelas requeridas, uma vez que, de acordo com a teoria da asserção, se da leitura da petição inicial as condições da ação estiverem em tese presentes, eventual reconhecimento da falta […] deve corresponder à análise do mérito da causa, com a improcedência do pedido inicial. (20081010039485APC, Relator NÍDIA CORRÊA LIMA, 3ª Turma Cível, julgado em 24/06/2009, DJ 06/07/2009 p. 124).

Assim, definir se a HELIMED prestava serviço ao Distrito Federal ou aos autores, a partir de subcontratação pela MORETO TÁXI AÉREO ou não, é matéria a ser resolvida quando da apreciação do mérito.

Não é demasiado ressaltar que o contrato administrativo prevê, em tese, a possibilidade de a prestadora de serviço responder diretamente pelos danos causados por seus agentes, nos termos da cláusula décima, item 10.3 - fl. 201. Some-se a isso o disposto no art. 259 do Código Brasileiro de Aeronáutica, o que demonstra o descabimento da alegada ilegitimidade das requeridas.

Inexistindo outras questões preliminares ou prejudicais, passo ao enfrentamento do mérito.

MÉRITO

Nesse aspecto, assiste parcial razão aos autores.

Com efeito, é incontroverso (por ausência de impugnação) que IRIS LUZIA RORIZ SOLANO foi atingida pelo rotor da cauda do helicóptero de propriedade da HELIMED AERO TÁXI LTDA, tendo sido o choque físico causa suficiente da morte - fls. 16/40. Não há dúvida também que a aeronave era operada pelo piloto Wagner Claudio Teixeira, contratado pela mencionada pessoa jurídica.

Inexiste controvérsia, ainda, quanto ao fato de a vítima ter desembarcado do helicóptero com o rotor ligado.

O cerne do debate fático reside em saber se o serviço de transporte foi realizado em "missão oficial", mediante subcontratação da HELIMED realizada pela MORETO, ou em caráter particular, a partir de fretamento contratado por familiares da vítima.

Discute-se, ademais, se o piloto repassou aos passageiros as informações de segurança, bem assim se houve ocorrência de excludente de responsabilidade civil.

NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA

A questão recorrente de se saber se o transporte fora realizado em missão oficial é irrelevante para se definir a existência de responsabilidade civil da segunda requerida, importando apenas para caracterização da solidariedade entre as rés.

Nesse aspecto, ainda que o transporte tivesse sido realizado em "missão oficial", nada impediria que os lesionados, mesmo abrindo mão do disposto no art. 37, parágrafo 6°, da Constituição (caso fosse necessário), ajuizassem ação diretamente contra os supostos causadores imediatos dos danos que elenca.

Na verdade, cabe ao prejudicado escolher contra quem deseja litigar, sabedor, a priori, das eventuais diversidades de regramentos e teses que irá enfrentar.

A responsabilidade objetiva do estado é proteção do lesionado, concebida para dispensar a prova da culpa do causador do dano, não podendo servir, entretanto, para acobertar qualquer dos responsáveis pela reparação.

Assim, totalmente despropositada a pretensão das requeridas de obrigar os autores a litigarem primeiro contra o Distrito Federal, a quem competiria o regresso.

Destaque-se, a propósito, que é plausível que os prejudicados, a despeito da responsabilidade civil objetiva do estado, prefiram litigar contra os causadores do acidente, até porque o regime de execução é diverso do público, não se submetendo ao precatório.

Superada essa questão, importa saber se houve ou não subcontratação, visto que poderá caracterizar solidariedade entre as requeridas, além de se definir o regime jurídico aplicável ao caso.

Nesse aspecto, indubitavelmente, o transporte realizado pela HELIMED destoava, aparentemente, do que se poderia considerar "missão oficial", visto que o transporte de familiares do governador, a pretexto de buscar a imagem de uma santa, para uso em solenidade particular, poderia constituir, ao que se apresenta, desvio de finalidade.

Ocorre que o Sr. Sebastião Aires de Abreu, sócio da MORETO TÁXI AÉREO LTDA - fl. 109, admitiu ser prática considerada comum a possibilidade do uso de aeronaves para missões particulares, a critério do governador, ainda que contratada pelo Distrito Federal.

Confira-se o teor do depoimento (fls. 343/344):

"que a MORETO possuía um contrato com o GDF com fornecimento de uma aeronave, especificamente um helicóptero, sendo que o piloto era indicado e fornecido pelo Distrito Federal; que no dia do acidente a aeronave de propriedade da MORETO passava por manutenção, não sabendo dizer se havia prévia fixação da data de manutenção; que o contrato fazia menção, salvo engano, a determinado número de horas de vôo; que a utilização da aeronave era devida pelo governador e quem ele indicasse; que quem definia o trajeto da aeronave era o governador, independente de se tratar de missão oficial ou não, já que estava a sua disposição; que a aeronave contratada pelo Distrito Federal era do modelo AS 350, possuía apenas uma porta lateral esquerda deslizante; que a aeronave do acidente possuía duas portas laterais; que a abertura da porta é realizada manualmente; que a abertura da porta de uma aeronave por pessoa que não possua conhecimento é difícil, tendo em vista a situação existente durante o vôo dado o barulho da hélice e o próprio vôo em si; 'que não é uma coisa comum'; que desconhece qualquer relatório indicando a participação da vítima em vôos anteriores; que não se recorda o nome do solicitante, mas sabe dizer que alguém o ligou pedindo que indicasse o nome de empresas aéreas idôneas, que pudessem fornecer um helicóptero similar ao fornecido pela MORETO; que esclarece que inexistia qualquer dispensa dos serviços da MORETO no dia do acidente, mas em virtude da necessidade de manutenção, a segunda requerida estava impossibilitada de atender a solicitação; que não tem certeza se o piloto Luiz Fernando que já pilotava a aeronave da MORETO estava à disposição do governador; que quem operou a aeronave foi um terceiro piloto; que ao que sabe o piloto que operou a aeronave no dia do acidente possuía vinculo empregatício com a HELIMED. às perguntas do advogado dos autores, assim respondeu: que não existia uma prévia agenda de manutenção; que não sabe dizer se no contrato constava obrigação de fornecimento pela MORETO de uma segunda aeronave, nas hipóteses de manutenção; que o motivo da MORETO de não estar à disposição do governador diz respeito ao dever e direito de realizar manutenções na aeronave; que no caso do helicóptero da MORETO a abertura da porte dependia apenas de abaixar a maçaneta e impulsionar a porta para a fora de forma que entre no trilho e permita sua abertura; em relação à aeronave da HELIMED não sabe dizer se possui ou não trava de segurança; que é piloto de aeronave; que em razão da existência de programa de prevenção de acidentes, aplicável as empresas de táxi aéreo, o desembarque da aeronave depende alternativamente de duas providências: uma, desligamento da aeronave ou encaminhamento do passageiro para fora do helicóptero mediante acompanhamento de pessoa (agente) devidamente treinada para tanto.

Logo se vê que o fato de a aeronave ter sido utilizada para transporte de familiar do governador, acompanhada de outros dois agentes públicos, não afasta a conclusão de que o helicóptero estava à disposição do Distrito Federal, ainda que em sublocação.

Na mesma linha, o responsável pela assinatura do contrato administrativo, testemunha compromissada, Sr. Benjamin Segismundo de J. Roriz, por sua vez, indagada a respeito da ocorrência de missões "pessoais", assim respondeu: "que não se recorda quem era a empresa de táxi aéreo que prestava serviços para o Distrito Federal; que tem certeza que o Governador poderia usar a aeronave tanto para missões oficiais quanto para fins pessoais; não se recorda, entretanto, se a aeronave poderia ser utilizada por terceiros para fins particulares, pois teria que conferir o contrato; que não sabe dizer se os pilotos que operavam a aeronave eram fornecidos pelas empresas ou pelo Distrito Federal; que no dia do acidente não estava no Distrito Federal; Dada a palavra aos advogados dos autores e da primeira ré, nada requereram".

Nota-se que o uso de aeronaves pelo governador e familiares estava ao talante do chefe do poder executivo, não sendo o trajeto e o caráter da missão o fator decisivo para se saber se estava ou não a "serviço do Distrito Federal".

Embora a testemunha José Clodomiro Machado Garcia, a quem competia apenas confrontar o número de horas cobradas pela MORETO TÁXI AÉREO do Distrito Federal, isso tendo em vista os relatórios fornecidos pela Casa Militar, tenha afirmado que, na eventualidade de problema com aeronaves particulares apresentarem problemas, os helicópteros da Secretaria de Segurança poderiam ser utilizados, nada esclareceu a respeito do caso concreto. Vale dizer: não sabia detalhes dos trajetos realizados pelo governador, informação reservada à Casa Militar, tampouco afirmou que, naquela ocasião, houvesse qualquer helicóptero de propriedade do Distrito Federal à disposição do governador.

Não é só. A referida testemunha sequer sabia dizer se o contrato administrativo autorizava a MORETO a valer-se de aeronave de terceiros. Esclareceu, entretanto, que constitui prática comum a subcontratação.

Frise-se: a testemunha arrolada pela Moreto não sabia se havia ou não proibição de subcontratação. Confira-se, no que interessa: "que nos momentos em que não havia disponibilidade de aeronave particular, mas havia missão oficial a ser realizada com o Governador, o Distrito Federal disponibilizava helicópteros dos bombeiros ou da policia militar, sempre que havia algum problema com a aeronave particular o depoente ou piloto do corpo de bombeiros eram convocados para operar aeronaves do Distrito Federal em missões designadas pela Casa Militar, no cumprimento de ordens do governador; às perguntadas formuladas, na forma da lei, pelo advogado dos autores, respondeu que permaneceu atestando as horas de vôo por cerca de dois ou três meses após o acidente noticiado nos autos; que não se recorda quanto tempo a empresa demorava para enviar a solicitação de pagamento das horas de vôo; que durante o período que atestava o pagamento dos vôos, não certificou qualquer prestação de serviço pela HELIMED, até porque não existia contrato do Distrito Federal com esta empresa; que não sabe dizer se o contrato autorizava a MORETO a valer-se de aeronave de terceiros; que atualmente é comum isso acontecer na aviação; que não sabe se havia sublocação, o que sabe dizer que o contrato era com a MORETO, daí porque o pagamento era feito para a MORETO".

Também não é crível que no início do ano, quando recém-empossado o governador, houvesse dispensa da MORETO da função de realizar o transporte aéreo.

Ora, cabia à primeira requerida comprovar que estava autorizada a realizar a alegada revisão na aeronave, bem assim dispensada de fornecer outro helicóptero durante o mencionado período, o que poderia ser facilmente obtido mediante requerimento de prova, inclusive com solicitação de requisição de relatórios da Casa Militar, entre outros meios.

Certamente, se não fez tal requerimento de prova, não lhe interessava o resultado da diligência.

De toda maneira, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, nos termos do art. 333, inciso II, do CPC.

A razão é simples. A despeito do sócio da MORETO TÁXI AÉREO afirmar que apenas indicou uma prestadora do serviço, a convergência de fatores permite concluir que a HELIMED prestava serviço aos familiares do governador em razão de sublocação realizada pela MORETO, cujo pagamento, por certo, não se daria por repasse direto do Distrito Federal, ante a vedação contratual de sublocação, mas mediante contrato particular das mencionadas pessoas jurídicas privadas. Isso, todavia, não desnatura a subcontratação, ao revés, reforça-se a "parceria" econômica até então existente entre as requeridas.

Nessa perspectiva, verifico que, embora a primeira requerida tenha impugnado o valor probatório da NOTA FISCAL de fl. 146, sob alegação de se tratar de documento emitido quase dois meses após o acidente, bem assim porque seria referente a outros serviços prestados, não se desincumbiu do ônus de probatório que lhe competia: demonstrar quais trajetos e períodos foram objeto da mencionada cobrança, já que a divergência de data não é capaz, por si só, de afastar a força probante, especialmente porque os documentos fiscais são emitidos, ordinariamente, a posteriori.

A propósito, também não existia vedação expressa de subcontratação (art. 78, inciso VI, da Lei n° 8.666/93), o que afastaria o alegado óbice para configuração da responsabilidade solidária das requeridas.

Ademais, seria verdadeiro contra-senso permitir que a violação de regras administrativas (subcontratação) pudesse servir como escudo para eventual responsabilização civil.

Repise-se que, além da vítima, constavam como passageiros dois agentes públicos, a saber: o Sr. Davino Alves Cavalcanti e o policial militar Celso Mota Fernandes - fl. 49 - (cujas oitivas também não foram requeridas), tudo a corroborar o fato de que se tratava de operação realizada a pedido do governador, no "cumprimento" do contrato administrativo.

Verifico, ainda, que o documento de fl. 49 (não impugnado), editado pelo Jornal de Brasília à época do acidente, relata que o piloto que conduzia a aeronave "há 15 dias estava prestando (sic) serviços ao governo do Distrito Federal".

Conclui-se, a partir do conjunto probatório, que havia relação negocial entre as requeridas, o que também é admitido pela HELIMED AERO TÁXI LTDA, inclusive em contestação - fl. 119, itens 20/23, tendo sido o serviço remunerado, indiretamente. Por conseqüência, há solidariedade entre as requeridas, nos termos dos art. 259 do Código Brasileiro de Aeronáutica, a saber:

"Art. 259. Quando o transporte aéreo for contratado com um transportador e executado por outro, o passageiro ou sucessores poderão demandar tanto o transportador contratual como o transportador de fato, respondendo ambos solidariamente".

FALHA DE SEGURANÇA

A responsabilidade civil pressupõe, em regra, a ocorrência de conduta (ação ou omissão), dano, nexo causal e culpa ou dolo.

Apesar de imputarem responsabilidade objetiva às requeridas, os requerentes indicam como "causa de pedir" a negligência do piloto quanto para com as regras de segurança, especialmente no que diz respeito ao repasse de informação. Acusam a segunda requerida de não ter, por seu preposto, desligado a aeronave antes de possibilitar o desembarque da vítima.

Embora dispensável, em virtude do caráter objetivo da responsabilidade civil do transportador aéreo, passo a examinar, em breves considerações, a ocorrência da violação do dever de cuidado (omissão), visto que constitui aspecto umbilicalmente ligado ao debate da excludente da responsabilidade civil - "culpa" da vítima (fato exclusivo da vítima).

Na verdade, quanto a saber se o piloto repassou aos passageiros as informações de segurança, embora as requeridas tenham repisado o fato de constar advertências no corpo da aeronave, bem assim frisado que o relatório do CENIPA (fls. 16/24) não se prestaria para apuração de culpa, mas apenas para "prevenção de acidentes", restou admitido pela HELIMED que o mencionado relatório da Aeronáutica é fruto das "declarações" prestadas pelo piloto - fl. 127, item 55, embora divirja da afirmação de inexistência do "briefing".

Verifico, por outro lado, que as requeridas invocam grande parte do relatório do CENIPA para sustentar "culpa" exclusiva/concorrente da vítima; rejeitando o valor probatório nos pontos que não lhes interessam.

No entanto, para se contraporem às conclusões do referido relatório (documento enunciativo), competia às requeridas arrolarem o piloto para ser ouvido em juízo, o que não foi feito, impondo-se a aceitação do valor probatório do expediente emitido pela Aeronáutica, até por se tratar de documento público que retrata depoimento prestado por empregado da segunda requerida, inclusive, conforme indicado à fl. 127, item 55 [frise-se].

Poder-se-ia pugnar pela realização de perícia, conforme facultado quando do indeferimento da inspeção judicial. Permaneceram as requeridas inertes, chamando o ônus probatório.

O relatório da Aeronáutica [CENIPA] confirma falha na transmissão das informações de segurança, seja pela omissão de repasse das informações relativas aos procedimentos indispensáveis, seja pela inadequação do cartão impresso - fls. 21/22.

De todo modo, o aspecto central para definição da responsabilidade civil reside no fato de o preposto da segunda requerida ter permitido ou não impedido que a vítima descesse da aeronave sem DESLIGAR o motor e interromper a circulação da hélice traseira do helicóptero.

O referido fator foi determinante para a ocorrência da morte da vítima, independente do estado de pressa ou ansiedade da usuária do serviço.

Aliás, é exatamente em virtude do estado psicológico da vítima que deveria o piloto ter desligado o motor imediatamente ao pousar.

Em se tratando de normas de segurança, ademais, não cabe qualquer presunção de que o usuário do serviço conheça o procedimento técnico a ser adotado (aspecto psicológico - fl. 21, item 2).

Dessa forma, irrelevante se a passageira estava ou não acompanhada de um policial militar ou se ela possuía experiência (o que não foi sequer evidenciado). Vale dizer: tinha o piloto o dever de segurança, consistente em impedir o desembarque da passageira sem a interrupção das hélices.

Trata-se de medida de responsabilidade indelegável do piloto, não podendo valer-se de suposto desencargo por outro passageiro, por mais qualificado que seja.

Na verdade, sequer houve prova de que o policial militar estivesse acompanhando a passageira para alertá-la dos cuidados no embarque ou desembarque, até porque não indícios de qualificação e atribuição para tanto.

Repise-se: a omissão determinante para o fatídico acidente decorreu de o piloto não haver desligado o motor da hélice (fato incontroverso).

Não há guarida nos fatos para as invocadas excludentes de responsabilidade, especialmente da culpa exclusiva ou concorrente da vítima (rectius: fatos exclusivos ou concorrentes da vítima), já que, o não desligamento do motor foi "CAUSA" SUFICIENTE do resultado danoso.

É oportuno destacar que a omissão não é causa, ao menos no sentido natural; tem-se, na verdade, a causalidade normativa, decorrente da violação do dever de cuidado.

Ainda que a vítima estivesse com muita pressa para se desembarcar da aeronave, houvesse a interrupção pelo piloto do funcionamento da aeronave, não teria o evento morte ocorrido, mesmo à míngua de informações de segurança.

Ademais, se houve tempo para realizar o "briefing" de segurança aos passageiros, como afirmado no item 57 de fl. 128, porque não haveria tempo para interrupção do funcionamento da hélice?

Em reforço às conclusões do relatório da CENIPA, mostra-se elucidativo o depoimento do sócio da MORETO acerca dos procedimentos que deveriam ter sido observados:

(…) que no caso do helicóptero da MORETO a abertura da porta dependia apenas de abaixar a maçaneta e impulsionar a porta para a fora de forma que entre no trilho e permita sua abertura; em relação a aeronave da HELIMED não sabe dizer se possui ou não trava de segurança; que é piloto de aeronave; que em razão da existência de programa de prevenção de acidentes, aplicável as empresas de táxi aéreo, o desembarque da aeronave depende alternativamente de duas providências: uma, desligamento da aeronave ou encaminhamento do passageiro para fora do helicóptero mediante acompanhamento de pessoa (agente) devidamente treinada para tanto.

Não há dúvidas, ainda, que "devido ao ruído e deslocamento de ar promovido pelo roto superior", que não foi desligado, houve obstáculo, quiçá, "impedimento de visualização do rotor de cauda e a sinalização de perigo" na região da cauda - fls. 34/35, o que afasta, por completo, a culpa (na verdade, a relevância do fato) da vítima.

Some-se à citada falha procedimental a ausência de repasse de informações claras e de forma eficiente, conforme anotado no mencionado relatório do CENIPA, até porque não é crível que uma pessoa, em sã consciência, advertida de forma adequada, coloque em risco a própria vida, quando facilmente poderia ter evitado o evento danoso e sofrível.

Embora as conclusões do laudo pericial realizado pelo IML indiquem "tratar de evento acidental", consignam, logo em seguida, que "acidentes dessa natureza são previsíveis por profissionais da área de aviação" - fls. 34/35, a corroborar a responsabilidade civil das requeridas.

Nota-se que, a despeito de ser dispensável a prova da culpa, no caso concreto, restou plenamente demonstrada pela falha na segurança de se permitir ou não impedir a descida da passageira ainda estando a hélice ligada.

No que se refere ao regramento aplicável ao caso, o Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n° 7.565/86) estabelece a responsabilidade civil objetiva, a saber:

Art. 256. O transportador responde pelo dano decorrente:

I - de morte ou lesão de passageiro, causada por acidente ocorrido durante a execução do contrato de transporte aéreo, a bordo de aeronave ou no curso das operações de embarque e desembarque; [...] § 1° O transportador não será responsável:

a) no caso do item I, se a morte ou lesão resultar, exclusivamente, do estado de saúde do passageiro, ou se o acidente decorrer de sua culpa exclusiva;

Nota-se que o transportador aéreo, havendo morte do usuário, ocorrida durante a execução do contrato, ainda que no curso das operações de desembarque, somente se exonera da obrigação de indenizar os prejuízos causados se provar culpa exclusiva da vítima ou ter o fato decorrido unicamente do estado de saúde do passageiro, o que não é o caso dos autos.

A esse respeito, ensina SÉRGIO CAVALIERI FILHO (Programa de responsabilidade civil, 8ª edição, revista e ampliada, Atlas, 2009, p. 330): "A presunção de responsabilidade estabelecida nesse dispositivo é tão forte que só pode ser elidida 'se a morte ou lesão resultar, exclusivamente, do estado de saúde do passageiro, ou se o acidente decorrer de sua culpa exclusiva' (§1°, 'a'). Não se fala, portanto, aqui, em fortuito interno ou externo, nem em fato exclusivo de terceiro. Outra peculiaridade da responsabilidade do transportador aéreo é que se estende aos passageiros gratuitos, que viajarem por cortesia, e aos tripulantes, diretores e empregados que viajarem na aeronave acidentada, sem prejuízo da eventual indenização por acidente de trabalho, consoante expressa disposição do §2°, 'a' e 'b', do já citado art. 256 do Código Brasileiro de Aeronáutica".

Frise-se que o art. 248 do Código Brasileiro de Aeronáutica afasta a tarifação da indenização quando restar provada a culpa grave do transportador ou de seus prepostos.

Considera-se culpa grave, para esse fim, quando o transportador ou prepostos assumiram o risco de produzir o resultado danoso, que deve ser previsível.

É exatamente a hipótese dos autos, em que foi ignorada regra básica de segurança, o que constitui falha grosseira para um profissional da aviação. Ainda o civilista SÉRGIO CAVALIERI FILHO, sustenta, nesse ponto, que: "Caracteriza-se a culpa grave nos casos de falta de cautela grosseira, injustificável, não comum nessa área de atividade específica".

De toda maneira, ainda que não se aplicasse a referida norma, haveria a indenização de ser integral, tendo em vista que se trata de responsabilidade civil objetiva do concessionário de serviço público, conforme doutrina o supracitado jurista, a saber: "Ora, as empresas aéreas são concessionárias de serviços públicos e, como tais, estão sujeitas às regras do 6º do art. 37 da Constituição Federal, pelos danos que causarem a terceiros. Têm, destarte, responsabilidade delitual ilimitada, tal como o Estado e os demais prestadores de serviços públicos, e não mais se sujeita aos limites do art. 269 do Código Brasileiro de Aeronáutica" - (Op. cit. p. 333).

Ademais, trata-se de vítima de acidente de consumo (que pressupõe apenas um fornecedor de serviços), considerada consumidora por equiparação, nos termos do artigo 17 do CDC, o que invoca a responsabilidade objetiva e o dever de reparação integral. Confira-se: REsp 540.235/TO, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, DJ 06/03/2006 p. 372.

No que pertinente ao código de defesa do consumidor, é oportuno transcrever alguns dispositivos aplicáveis ao caso:

"Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

(...)

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

(…)

"Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito."

"Art. 9° O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto."

(…)

"Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° - O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

(...)

§ 3° - O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro

Art. 17. "Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento".

Portanto, sob todas as perspectivas, a responsabilidade das requeridas é objetiva, não tendo sido afastada por fato exclusivo ou concorrente da vítima, tampouco fortuito ou força maior, razão pela qual imperiosa a reparação integral, solidariamente. Não é outra a linha de entendimento do Supremo Tribunal Federal. Confira-se: RE 172720.

Comprovada a culpa, não obstante dispensável, e o nexo causal com o dano (em sentido amplo, a morte), resta analisar os reflexos patrimoniais e extrapatrimoniais (prejuízos ou danos estritos).

DANOS MATERIAIS

Em relação aos danos, impõe-se a verificação da ocorrência e da extensão dos prejuízos.

Como sabido, a reparação por danos materiais exige prova do fato constitutivo do direito do autor (art. 333, inciso I, do CPC), consistente na diminuição do patrimônio.

Assim, embora os autores tenham afirmado que a vítima exercia duas atividades laborais, com remuneração total de R$6.000,00 (seis mil reais), não produziram prova do alegado, mesmo tendo sido o ponto impugnado especificamente nas contestações.

Além disso, a indenização por danos materiais consiste na prestação de alimentos às pessoas a quem o falecido os devia, levando-se em conta a vida provável da vítima (CC, art. 948, em tudo semelhante ao Código Civil vigente à época do acidente).

Ocorre que, no caso concreto, TODOS os filhos já tinham adquirido a maioridade civil à época do acidente e, ao que consta na petição inicial, possuíam endereços diversos dos genitores. Não se pode presumir a dependência.

O cônjuge da vítima, por sua vez, não possuía dependência econômica, ao menos é o que demonstra o documento de identificação profissional acostado aos autos - fls. 62/66 - afastando-se também a presunção inicial.

Ademais, o fato de o primeiro autor ainda cursar o segundo grau, à época do acidente, o que não restou provado, não o tornava dependente financeiramente da vítima, notadamente porque contava com quase 23 anos, além de se qualificar na inicial como "funcionário público".

Ressalte-se que os autores, a partir das contestações apresentadas, tiveram oportunidade de provar o prejuízo material alegado e quedaram inertes.

Desse modo, não desincumbiram do ônus probatório de demonstrar a dependência financeira em relação à vítima, a justificar a concessão do pensionamento, o que poderia ser facilmente produzido, inclusive a partir das declarações para o imposto de renda, para órgão pagador, entre outras formas.

Finalmente, se não restou provado que a vítima exercia atividade laboral, também não há falar em dependência e contribuição para o sustento dos filhos maiores (e casados, na maioria) ou do cônjuge.

Os precedentes judiciais que autorizavam a estipulação de pensionamento, isso a despeito da inexistência de prova da dependência financeira (dos alimentos), tinham em vista a não fixação dos danos morais, preenchendo uma lacuna jurídica, que poderia ocasionar injustiça material.

O cenário jurídico mudou, não se justificando, com a devida venia de entendimento contrário, a condenação no pensionamento sem que exista prova da dependência.

Nesse aspecto, recorro novamente ao magistério de SÉRGIO CAVELIERI FILHO, a saber: "O dano deve ser provado por quem o alega. Esta é a regra geral, que somente admite exceção nos casos previstos em lei (…). Essa prova deve ser feita no processo de conhecimento, posto que para a liquidação só poderá ser deixada a mensuração do dano, o quantum debeatur, jamais a prova da sua existência. Condenar sem prova do dano colide com todos os princípios que regem a matéria. Aliás, se há uma prática que o juiz deve evitar é a de deixar a apuração do valor do dano para liquidação de sentença. A proibição de proferir sentença ilíquida, sendo o pedido certo, é medida imposta no sentido de abreviar a solução definitiva do litígio, realizando desde logo o direito do autor e afastando os inconvenientes de um longo processo de liquidação" (op. cit. p.120). Continua: "Tratando-se de cônjuge e filhos menores, tem-se entendido que a dependência econômica é presumida. Nos demais casos, ascendentes e filhos maiores, irmãos da vítima, a dependência econômica deve ser provada. Não provada, será devida apenas a indenização por eventual dano moral (p. 121).

A exigência de prova da dependência, aliás, é corroborada pela jurisprudência do STJ (mutatis mutandis), até porque, não havendo diminuição do patrimônio, há que se estabelecer a reparação no campo dos direitos extrapatrimoniais. Confira-se:

(…) 3. Reconhecido que a vítima menor com seis anos de idade não exercia atividade laborativa e que a sua família possui razoáveis recursos financeiros, os autores - pai e irmã - não fazem jus ao pensionamento decorrente de danos materiais, mas tão-somente, nesse ponto, aos danos morais fixados. (…) (REsp 158.051/RJ, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 22/09/1998, DJ 12/04/1999 p. 159)

(…) VII. Tratando-se de família de razoável poder aquisitivo, não é pertinente o pensionamento pelo falecimento do filho menor, de tenra idade, por não se supor que viesse a contribuir para o sustento do grupo até dele se desligar. Precedentes do STJ. VIII. (REsp 41.614/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/1999, DJ 11/12/2000 p. 205)

Não é devida a indenização por danos materiais prevista no art. 1537, inc. II, do CC quando não ficar provada ou presumível for a contribuição da vítima para o sustento econômico do lar de seus genitores. Precedentes. (REsp 348.072/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2001, DJ 18/02/2002 p. 425)

Quanto às despesas com o funeral, embora não tenham os autores apresentado os comprovantes dos gastos, a fim de aferir a extensão das despesas, trata-se de fato de notória ocorrência (sepultamento), cuja reparação é imperiosa. Não é outra a linha da jurisprudência local, a saber: TJDFT - 20050110829982APC.

Tendo em vista que se trata de pedido certo, incabível a remessa para liquidação. Uma vez não demonstrada adequadamente a extensão das despesas, considero necessária a redução da verba postulada inicialmente e pouco acima do defendido em contestação, arbitrando a reparação no equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), visto que compatível com a posição social da vítima e dos familiares, à míngua de maiores provas.

DANO MORAL

Já em relação ao dano moral, não se discute o cabimento, visto que a vítima foi morta em acidente terrível, com notórias repercussões sobre os filhos e o esposo (com legitimidade indiscutível), cujo sofrimento intenso dispensa qualquer digressão, ante o rompimento trágico da convivência familiar.

O dano moral, na verdade, é aferível in re ipsa; por isso, somente é necessário à vítima (ou sucessores, como no caso) comprovar o fato por meio do qual emergiu a agressão aos direitos da personalidade.

Na fixação do quanto devido, deve o julgador se pautar pela razoabilidade, conforme reiterado na jurisprudência e na doutrina pátria, atentando-se para o caráter sancionatório da imposição. Confira-se:

[…] 6. Consoante a doutrina e a jurisprudência, a indenização por danos morais não tem unicamente o caráter sancionatório, devendo o julgador, com prudente arbítrio, estabelecer a exata correspondência entre a ofensa e o valor da condenação a esse título. 7. A indenização por dano moral deve ser fixada observando-se os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de modo a evitar valores irrisórios ou excessivos no tocante a sua fixação, desestimulando a reiteração da conduta sem promover o enriquecimento ilícito da parte, impondo-se, assim, a manutenção do quantum indenizatório fixado pela r. Sentença. (20050710175132APC, Relator HUMBERTO ADJUTO ULHÔA, 3ª Turma Cível, julgado em 29/04/2009, DJ 07/05/2009 p. 88)

Nesse esforço de adequação da reparação extrapatrimonial ao grau de lesão aos direitos da personalidade (morte) e à proporcionalidade da resposta, que deve ter em vista as particularidades do caso concreto (operação aérea realizada de inopino, gerando clima de ansiedade em todos, inclusive no piloto) e da condição financeira dos ofensores (empresas de TÁXI AÉREO), mostra-se suficiente a fixação da indenização no equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos para cada autor, o que corresponde a R$232.500,00 (duzentos e trinta e dois mil e quinhentos reais) "per capita". O valor arbitrado não destoa da reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aplicável aos casos de ocorrência de morte de parente próximo, a saber:

(…) VIII. Dano moral devido como compensação pela dor da perda e ausência suportadas pelos autores, no equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos por cada uma das vítimas, a serem repartidos equitativamente, consideradas as circunstâncias dos autos. IX. Ressarcimento pelos objetos de uso pessoal danificados ou perdidos no acidente, bem assim das despesas de funeral não cobertas pelas instituições previdenciárias, em montante estabelecido na fase de liquidação. X. Recurso conhecido e parcialmente provido. (REsp 41.614/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/1999, DJ 11/12/2000 p. 205)

3 -Admite o STJ a redução do quantum indenizatório, quando se mostrar desarrazoado, o que não sucede na espécie, em que houve morte decorrente de acidente de trânsito, dado que as Quarta e Terceira Turmas desta Corte têm fixado a indenização por danos morais no valor equivalente a quinhentos salários mínimos, conforme vários julgados. (…) 5 - Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. (REsp 713.764-RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 04/03/2008, DJe 10/03/2008)

1. Incontroverso o pressuposto de culpa exclusiva do recorrido no evento que causou a morte do menor, o quantum indenizatório, fixado na origem em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) mostra-se em descompasso com os parâmetros que vem adotando esta Corte Superior, para casos assemelhados, que vão até 500 salários mínimos. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que o quantum definido pela Corte de origem somente pode ser alterado, em sede de recurso especial, quando manifestamente excessivo ou irrisório, o que, se verifica no caso dos autos; na espécie, o valor da indenização pela perda do filho menor dos recorrentes, deve ser elevado ao montante de R$ 190.000,00 (cento e noventa mil reais). 3. Recurso especial conhecido e provido parcialmente. (REsp 936.792/SE, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 04/10/2007, DJ 22/10/2007 p. 311).

(…) 11. Considerando-se as peculiaridades do caso, bem como os padrões adotados por esta Corte na fixação do valor indenizatório a título de danos morais por morte, reduzo a indenização arbitrada pelo Tribunal de origem para o valor de R$ 232.500,00 (duzentos e trinta e dois mil e quinhentos reais), correspondente à 500 salários mínimos atuais. Correção monetária a partir da presente data e juros moratórios a partir do evento danoso. 12. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido. (REsp 686.486/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/04/2009, DJe 27/04/2009)

No mesmo sentido são os seguintes precedentes: REsp 745.710/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, Rel. p/ Acórdão Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA - 500 salários mínimos; REsp 714.869/SP, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA - R$ 175.000,00, equivalente a 500 salários mínimos da época; REsp 703.878/SP, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA - R$ 150.000,00, equivalente a 500 salários mínimos da época.

Ressalto que, no montante global, a indenização por danos morais pela morte da genitora e esposa dos autores atinge a quantia de R$ 930.000,00 (novecentos e trinta reais), o que é resposta adequada à falha ocorrida em atividade de risco para os passageiros e terceiros, não se podendo admitir que falhas primárias sejam tratadas com complacência.

Assim, a quantia fixada tem em vista a projeção comportamental no setor aéreo (efeito inibidor), especialmente sobre as requeridas, que não podem prestar o serviço sobre a presunção de que o usuário já possui a informação necessária a evitar o dano, nada fazendo para impedir.

Com relação ao termo inicial da correção monetária e juros moratórios, entendo que devem incidir a partir da publicação da sentença, visto que o valor estipulado teve em conta o atual poder aquisitivo da moeda.

Nesse aspecto, o Superior Tribunal de Justiça editou recentemente a Súmula 362 que diz: "A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento", com o intuito primordial de evitar a correção do que já está atualizado.

Embora a correção monetária e os juros de mora sejam institutos completamente distintos, contudo, ao analisar o caso concreto, fixo o valor adequado para cumprir os objetivos da condenação a título de compensação por danos morais.

Nesse contexto não se pode deixar de considerar que a retroação dos juros moratórios implicaria os mesmos efeitos que ensejaram a edição da Súmula 362, ou seja, da correção do que já está atualizado.

Assim, a incidência dos juros de mora da indenização por danos morais, por interpretação analógica da Súmula 362, deverá incidir, também, a partir do arbitramento do valor da reparação por danos morais.

Ressalto que os autores pleitearam indenização em valor superior ao arbitrado, mas isso não implica sucumbência parcial, posto que o valor da indenização deve ser fixado pelo juiz e o valor constante da inicial não passa de estimativa. No mais, um dos pedidos de reparação material restou parcialmente concedido, tudo a evidenciar sucumbência mínima dos autores.

Ante o exposto, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar as requeridas, solidariamente, ao pagamento de R$232.500,00 para cada um dos autores, a título de dano moral, acrescido de correção monetária (INPC) e juros de mora de 1% ao mês a partir desta data.

Condeno as requeridas, ainda, ao pagamento das despesas com o funeral, que arbitro em R$5.000,00, com incidência de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (art. 219 do CPC) e correção monetária a partir do evento danoso.

Condeno as requeridas ao pagamento das custas processuais, e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, pro rata.

Com o trânsito em julgado da presente sentença, ou caso não sujeita a recurso com efeito suspensivo, deverão as requeridas promover a quitação do débito, no prazo de 15 (quinze) dias, independentemente de nova intimação, sob pena de acréscimo de multa de 10% (dez por cento), na forma do art. 475-J do CPC.

Após, inexistindo requerimentos, observadas as cautelas de praxe, arquivem-se os autos.

Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se.

Brasília-DF, 18 de agosto de 2009, às 19h01m.

Carlos Alberto Silva
Juiz de Direito Substituto



JURID - Familiares serão indenizados. [25/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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