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quinta-feira, 6 de agosto de 2009

JURID - Execução fiscal. Fraude à execução. Veículo automotor. [06/08/09] - Jurisprudência

Jurisprudência Tributária
Execução fiscal. Fraude à execução. Veículo automotor. Alienação posterior à citação do executado. Inexistência de registro da penhora junto ao Detran.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 810.489 - RS (2006/0008038-0)

RELATORA: MINISTRA ELIANA CALMON

RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PROCURADOR: SANDRO SUBTIL SILVA E OUTRO(S)

RECORRIDO: POTYGUARA ROSA DE MIRANDA

ADVOGADO: WAGNER ANTÔNIO PREVIDELLI

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL - FRAUDE À EXECUÇÃO - VEÍCULO AUTOMOTOR - ALIENAÇÃO POSTERIOR À CITAÇÃO DO EXECUTADO - INEXISTÊNCIA DE REGISTRO DA PENHORA JUNTO AO DETRAN - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO CONSILIUM FRAUDIS - PRECEDENTES.

1. A jurisprudência do STJ, interpretando o art. 185 do CTN, até o advento da LC 118/2005, pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp 40.224/SP), no sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a alienação de bem de devedor já citado em execução fiscal.

2. Ficou superado o entendimento de que a alienação ou oneração patrimonial do devedor da Fazenda Pública após a distribuição da execução fiscal era o bastante para caracterizar fraude, em presunção jure et de jure.

3. Afastada a presunção, cabe ao credor comprovar que houve conluio entre alienante e adquirente para fraudar a ação de cobrança.

4. No caso alienação de veículos automotores, a despeito de, em tese, não ser aplicável a norma do art. 659, § 4º, do CPC, porque a transmissão da propriedade dos automóveis se dá com a tradição e com a assinatura, em cartório, do Documento Único de Transferência - DUT, o Código de Trânsito Brasileiro exige que todos os veículos sejam registrados perante os órgãos estaduais de trânsito.

6. Com base nessa exigência legal, a jurisprudência do STJ passou a adotar, em relação aos veículos automotores, entendimento semelhante ao adotado para os bens imóveis, no sentido de que apenas a inscrição da penhora no DETRAN torna absoluta a assertiva de que a constrição é conhecida por terceiros e invalida a alegação de boa-fé do adquirente da propriedade, para efeito de demonstração de que as partes contratantes agiram em consilium fraudis. Precedentes: REsp 944.250/RS (2ª Turma), AgRg no REsp 924.327/RS (1ª Turma), REsp 835.089/RS (1ª Turma), REsp 623.775/RS (3ª Turma).

7. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília-DF, 23 de junho de 2009(Data do Julgamento)

MINISTRA ELIANA CALMON

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso especial interposto com base nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul assim ementado (fl. 87):

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO E FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. TERCEIRO DE BOA-FÉ. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. PARA QUE FIQUE CONFIGURADA A FRAUDE À EXECUÇÃO É NECESSÁRIA A DEMONSTRAÇÃO DO "CONSILIUM FRAUDIS", CUJO PRESSUPOSTO É O CONHECIMENTO PELO TERCEIRO ADQUIRENTE, DA EXISTÊNCIA DA DEMANDA, OU DA CONSTRIÇÃO AO TEMPO DO NEGÓCIO. FRAUDE À EXECUÇÃO NÃO CONFIGURADA.

Apelo desprovido.

Aponta o recorrente, além de dissídio jurisprudencial, contrariedade aos arts. 185 do CTN e 593, II, do CPC.

Defende, em síntese, que:

a) ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, que ressaltou que deve ser demonstrado o consilium fraudis para que seja configurada a alienação em fraude à execução, os arts 185 do CTN e 593, II, do CPC, estabelecem que "basta existir dívida ativa regularmente inscrita, em demanda executiva capaz de reduzir o devedor à insolvência, aliada à inexistência de outros bens do executado capazes de suportar o débito, para que esteja configurada a fraude à execução";

b) o acórdão reconheceu que a alienação se deu em 29/10/2001, enquanto a citação do alienante ocorreu em 20/06/2001, portanto deve ser modificada a decisão, "uma vez que a venda do veículo em tela se deu após a existência de demanda capaz de reduzi-lo à insolvência"; e

c) não sendo exigência da lei o consilium fraudis ou o registro da indisponibilidade no órgão de trânsito para a caracterização de fraude, o julgador não pode estabelecer tal requisito.

Requer, assim, seja reformada a decisão recorrida a fim de ser mantida a penhora efetuada e julgados improcedentes os embargos de terceiro movido pela recorrida.

Após as contra-razões (fls. 105/110), subiram os autos, admitido o especial na origem.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relatora): No que diz respeito ao dissídio jurisprudencial oriundo do mesmo Tribunal, aplico o enunciado da Súmula 13/STJ.

Superado o óbice, configurado o dissídio e prequestionada a tese trazida no especial, prossigo no exame do mérito recursal.

Entendo que o art. 185 do CTN deve ser interpretado sistematicamente, dentro dos critérios estabelecidos para o entendimento das normas de Direito Tributário, não se confundindo a fraude disciplinada na lei específica, com a normatização constante do CPC, só aplicável em caráter supletivo.

Doutrina e jurisprudência divergem quanto ao momento em que deve ser entendida como fraudulenta a alienação. Vozes autorizadas afirmam que não basta apenas a propositura da execução, sendo necessário já ter ocorrido a citação. Outros autores, diferentemente, entendem como suficiente para impedir a alienação de bens a só propositura da ação.

A divergência doutrinária e a redação mais abrangente dada pelo CPC fizeram desenvolver no STJ posições em divergência, a qual, entretanto, está hoje apaziguada, no sentido de só ser considerada como em fraude à execução a alienação de bens de executado já citado para responder à ação do Fisco. Assim ficou decidido pela 1ª Seção desta Corte no EREsp 40.224/SP, relator Ministro Garcia Vieira (DJ de 28/02/2000, página 31), verbis:

PROCESSUAL CIVIL - FRAUDE À EXECUÇÃO - CARACTERIZAÇÃO - CITAÇÃO DO DEVEDOR - NECESSIDADE.

Presume-se fraudulenta a alienação de bens por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito regularmente inscrito, em fase de execução, sendo necessária a citação do devedor.

Embargos rejeitados.

Dessa forma, ficou superado o entendimento de que a alienação ou oneração patrimonial do devedor da Fazenda Pública após a distribuição da execução fiscal era o bastante para caracterizar fraude, em presunção jure et de jure.

Afastada a presunção, cabe ao credor comprovar, como sugerido no art. 185 do CTN, que houve conluio entre alienante e adquirente para fraudar a ação de cobrança.

No caso dos bens imóveis, na forma da legislação processual civil (art. 659, § 4º, do CPC, desde a redação da Lei 8.953/94), apenas a inscrição da penhora no competente cartório torna absoluta a assertiva de que a constrição é conhecida por terceiros e invalida a alegação de boa-fé do adquirente da propriedade.

Portanto, em relação ao executado, a fraude à execução deve ser considerada presumida tendo como marco inicial a citação no processo de execução fiscal, aplicando-se a interpretação decorrente do art. 185 do CTN.

Já em relação aos terceiros de boa-fé e em se tratando de execução fiscal com penhora sobre imóvel, o marco a ser considerado é o registro da penhora no competente cartório, por força da regra do art. 659, § 4º, do CPC, porque não se pode impor ao terceiro adquirente obrigação quanto à ciência da execução tão-somente pela existência da citação do executado, principalmente em hipóteses como, por exemplo, aquela em que o imóvel se encontra situado em Estado da Federação distinto daquele onde corre a ação.

Assim, ausente o registro da penhora efetuada sobre o imóvel, não se pode supor que as partes contratantes agiram em consilium fraudis. Para tanto, é necessária a demonstração, por parte do credor, de que o comprador tinha conhecimento da existência da execução fiscal contra o alienante ou agiu em conluio com o devedor-vendedor, sendo insuficiente o argumento de que a venda foi realizada após a citação do executado.

Idêntico entendimento teve acolhida nos seguintes precedentes desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL NÃO REGISTRADA. SÚMULA 84/STJ. MOMENTO DA ALIENAÇÃO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ.

1. É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro (Súmula 84/STJ).

2. Entretanto, ainda que sejam cabíveis os embargos de terceiro, também está pacificado nesta Corte que a alienação de bem livre de penhora, ocorrida após a citação do executado alienante, pode configurar fraude à execução.

3. No particular, restou reconhecido pela instância ordinária que a celebração da promessa de compra e venda de imóvel, avençada após a citação do executado promitente, não resultou em fraude à execução.

4. Conforme se infere da recente jurisprudência desta Corte, na falta do registro da penhora sobre bem imóvel, exige-se do exeqüente a prova de que o adquirente tinha conhecimento da existência de execução fiscal contra o alienante para que se configure a fraude à execução.

5. Contudo a pretensão recursal esbarra no óbice da Súmula 7/STJ, pois descabe o reexame, na instância especial, de matéria fático-probatória.

6. Recurso especial improvido.

(REsp 449908/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 28.09.2004, DJ 16.11.2004 p. 230)

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA EM IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO EM CARTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. TRANSAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA Nº 84/STJ. PRECEDENTES.

1. Recurso especial interposto contra acórdão que reconheceu não ter ocorrido fraude à execução, já que à época em que celebrada a venda do imóvel, não havia registro da penhora no cartório imobiliário.

2. O art. 129, § 9º, da Lei nº 6.015/73 dispõe que: "Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros: § 9º Os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de dação em pagamento".

3. Todavia, sobrelevando a questão de fundo sobre a questão da forma, a jurisprudência desta Casa Julgadora, como técnica de realização da justiça, tem imprimido interpretação finalística à Lei de Registros Públicos. Tal característica está assente na Súmula nº 84/STJ: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

4. "O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do 'consilium' 'fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp nº 31321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999)

5. Não há que se falar em fraude contra credores se, quando da alienação do bem, não havia registro de penhora. Para tanto, teria que restar nos autos provado que o terceiro adquirente tinha conhecimento da demanda executória, o que não ocorreu no caso em apreço. Precedentes.

6. Recurso especial não-provido.

(REsp 791104/PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.12.2005, DJ 06.02.2006 p. 222)

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE BEM ALIENADO A TERCEIRO DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO DO TÍTULO NO REGISTRO DE IMÓVEIS.

1. Alienação de bem imóvel pendente execução fiscal. A novel exigência do registro da penhora, muito embora não produza efeitos infirmadores da regra prior in tempore prior in jure, exsurgiu com o escopo de conferir à mesma efeitos erga omnes para o fim de caracterizar a fraude à execução.

2. Deveras, à luz do art. 530 do Código Civil sobressai claro que a lei reclama o registro dos títulos translativos da propriedade imóvel por ato inter vivos, onerosos ou gratuitos, posto que os negócios jurídicos em nosso ordenamento jurídico, não são hábeis a transferir o domínio do bem. Assim, titular do direito é aquele em cujo nome está transcrita a propriedade imobiliária.

3. Todavia, a jurisprudência do STJ, sobrepujando a questão de fundo sobre a questão da forma, como técnica de realização da justiça, vem conferindo interpretação finalística à Lei de Registros Públicos. Assim é que foi editada a Súmula 84, com a seguinte redação: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

4. "O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do 'consilium' 'fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp nº 31321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999)

5. Aquele que não adquire do penhorado não fica sujeito à fraude in re ipsa, senão pelo conhecimento erga omnes produzido pelo registro da penhora. Sobre o tema, sustentamos: "Hodiernamente, a lei exige o registro da penhora, quando imóvel o bem transcrito. A novel exigência visa à proteção do terceiro de boa-fé, e não é ato essencial à formalização da constrição judicial; por isso o registro não cria prioridade na fase de pagamento. Entretanto, a moderna exigência do registro altera a tradicional concepção da fraude de execução; razão pela qual, somente a alienação posterior ao registro é que caracteriza a figura em exame. Trata-se de uma execução criada pela própria lei, sem que se possa argumentar que a execução em si seja uma demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência e, por isso, a hipótese estaria enquadrada no inciso II do art. 593 do CPC. A referida exegese esbarraria na inequívoca ratio legis que exsurgiu com o nítido objetivo de proteger terceiros adquirentes. Assim, não se pode mais afirmar que quem compra do penhorado o faz em fraude de execução. 'É preciso verificar se a aquisição precedeu ou sucedeu o registro da penhora'. Neste passo, a reforma consagrou, no nosso sistema, aquilo que de há muito se preconiza nos nossos matizes europeus." (Curso de Direito Processual Civil, Luiz Fux, 2ª Ed., pp. 1298/1299)

6. Precedentes: Resp 638664/PR, deste Relator, publicado no DJ: 02.05.2005; REsp 791104/PR, Relator Ministro JOSÉ DELGADO, publicado no DJ 06.02.2006;REsp 665451/ CE Relator Ministro CASTRO MEIRA DJ 07.11.2005, Resp 468.718, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 15/04/2003; AGA 448332 / RS, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 21/10/2002; Resp 171.259/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 11/03/2002.

7. In casu, além de não ter sido registrada, a penhora efetivou-se em 05/11/99, ou seja, após a alienação do imóvel pelos executados, realizada em 20/04/99, devidamente registrada no Cartório de Imóveis (fls. 09) data em que não havia qualquer ônus sobre a matrícula do imóvel. Deveras, a citação de um dos executados, ocorreu em 25/03/99, sem contudo, ter ocorrido a convocação do outro executado.

8. Recurso especial provido.

(REsp 739388/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28.03.2006, DJ 10.04.2006 p. 144)

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA EM IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO EM CARTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. TRANSAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA Nº 84/STJ. PRECEDENTES.

1. O art. 129, § 9º, da Lei nº 6.015/73 dispõe que: "Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros: § 9º Os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de dação em pagamento".

2. Todavia, sobrelevando a questão de fundo sobre a questão da forma, a jurisprudência desta Casa Julgadora, como técnica de realização da justiça, tem imprimido interpretação finalística à Lei de Registros Públicos. Tal característica está assente na Súmula nº 84/STJ: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

3. "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados na alegação de posse advinda de cessão do direito de uso de linha telefônica, desprovida de registro, posto evidenciada a ausência de má-fé do embargante. Cessão efetivada antes mesmo da inscrição do débito em dívida ativa" (REsp nº 438544/RN, 1ª Turma, DJ de 11/11/2002, Rel. Min. LUIZ FUX).

4. Não há fraude à execução quando no momento do compromisso particular não existia a constrição, merecendo ser protegido o direito pessoal dos promissários-compradores.

5. "O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do 'consilium' 'fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante." (EREsp nº 31321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999) 6. Precedentes de todas as Turmas desta Corte Superior.

7. Recurso especial não-provido.

(REsp 762521/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16.08.2005, DJ 12.09.2005 p. 256)

No caso alienação de veículos automotores, a despeito de, em tese, não ser aplicável a norma do art. 659, § 4º, do CPC, porque a transmissão da propriedade dos automóveis se dá com a tradição e com a assinatura, em cartório, do Documento Único de Transferência - DUT, o Código de Trânsito Brasileiro exige que todos os veículos sejam registrados perante os órgãos estaduais de trânsito.

Com base nessa exigência legal, a jurisprudência do STJ passou a adotar, em relação aos veículos automotores, entendimento semelhante ao adotado para os bens imóveis, no sentido de que apenas a inscrição da penhora no DETRAN torna absoluta a assertiva de que a constrição é conhecida por terceiros e invalida a alegação de boa-fé do adquirente da propriedade, para efeito de demonstração de que as partes contratantes agiram em consilium fraudis. Precedentes: REsp 944.250/RS (2ª Turma), AgRg no REsp 924.327/RS (1ª Turma), REsp 835.089/RS (1ª Turma), REsp 623.775/RS (3ª Turma).

In casu, como se abstrai da decisão recorrida, tem-se alienação realizada em momento posterior ao da citação do devedor na execução fiscal, mas sem que houvesse sido feita prova quanto ao registro da penhora (fls. 88/89):

A sorte dos Embargos de Terceiro pressupõe ser o Embargante estranho à execução, o que se dá no caso. Efetivamente o Embargante não figura no título executivo de fl. 76, nem tão pouco no pedido de redirecionamento do feito de fls. 34/38, sobre não ser parte na execução, não há como lhe atribuir esta qualidade.

A questão está em saber se despida de vício a aquisição do veículo feita a Devedor já citado para a execução fiscal.

Primeiro, de ver que na época da aquisição por parte do Embargante não havia registro da indisponibilidade do veículo junto ao DETRAN, tendo o registro ocorrido normalmente (fl. 10).

Pois a falta de registro da penhora, que tratando-se de veículos dá-se nos assentamentos da repartição de trânsito, importa elidir a presunção de conhecimento por parte de terceiros não vinculados direta e pessoalmente ao negócio jurídico, tudo em homenagem à boa fé e à garantia das relações jurídicas, com o que transfere-se ao Credor o ônus de provar a ciência prévia do adquirente. É que "a alienação do bem na pendência de execução fiscal, por si só, não caracteriza fraude à execução, mormente quando não registrada a penhora, nos termos do art. 7º, IV, da Lei 6.830/80; eis que para a configuração da fraude é necessária a demonstração do "consilium fraudis", que pressupõe o conhecimento pelo terceiro adquirente, da existência da demanda, ou da constrição ao tempo do negócio" ( RSTJ- RT- 755/220).

Depois, de excluir a hipótese de manobra fraudulenta (consilium fraudis).

Tudo indica que o Devedor sequer era mais o proprietário do veículo à época do negócio, pois o Embargante o adquiriu de JULIAN RICARDO MAYER, conforme Certificado de Registro de Veículo, emitido pelo DETRAN/RS à fl. 09.

Ante ao exposto, nego provimento ao recurso.

Nessas condições, impunha-se ao credor o dever de comprovar a existência de conluio entre o alienante e o adquirente ou de prévio conhecimento deste último acerca do processamento do executivo fiscal. Inexistindo providência nesse sentido, resta não-configurada a hipótese de fraude à execução.

Com essas considerações, nego provimento ao recurso especial.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2006/0008038-0 REsp 810489 / RS

Números Origem: 112366993 70007909443 70012309811

PAUTA: 23/06/2009 JULGADO: 23/06/2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro HUMBERTO MARTINS

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO

Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PROCURADOR: SANDRO SUBTIL SILVA E OUTRO(S)

RECORRIDO: POTYGUARA ROSA DE MIRANDA

ADVOGADO: WAGNER ANTÔNIO PREVIDELLI

ASSUNTO: Execução Fiscal - Fraude - Transferência de Bens a Terceiros

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."

Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 23 de junho de 2009

VALÉRIA ALVIM DUSI
Secretária

Documento: 835044

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 06/08/2009




JURID - Execução fiscal. Fraude à execução. Veículo automotor. [06/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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