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quarta-feira, 26 de agosto de 2009

JURID - Estado fornecerá "Óleo de Lorenzo" [26/08/09] - Jurisprudência


Determinado ao Estado fornecimento do "Óleo de Lorenzo"


COMARCA DE JAGUARÃO
2ª VARA JUDICIAL
Rua Uruguai, esquina Mal. Floriano, s/nº

Nº de Ordem:
Processo nº: 055/1.09.0000156-5
Natureza: Ordinária - Outros
Autor: Lucas Ney Lopes
Réu: Estado do Rio Grande do Sul
Juiz Prolator: Juíza de Direito - Dra. Carolina Granzotto
Data: 19/08/2009

Vistos etc.

LUCAS NEY LOPES ingressou com ação de obrigação de fazer/dar cumulada com tutela antecipada em face de ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ambos já qualificados nos autos, narrando que é portador de adrenoleucodistrofia (CID E713), doença rara, conhecida mundialmente através do filme "O Óleo de Lorenzo". Consignou que o óleo previne o aparecimento dos sintomas neurológicos, pode melhorar a qualidade de vida e prolongar o tempo de sobrevida do paciente. Referiu que já apresenta cegueira e perda da capacidade de falar, necessitando dos medicamentos Óleo de Lorenzo e Depakene, os quais não possui condições financeiras de adquirir. Requereu o deferimento de antecipação de tutela para que lhe sejam fornecidos os medicamentos pleiteados, a procedência do pedido e a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita. Juntou documentos (fls. 8-32).

Intimado para tanto, o autor emendou inicial nas fls. 34-35.

A assistência judiciária gratuita e a antecipação de tutela restaram deferidas na fl. 36.

Em face de o réu não ter comprovado o cumprimento da liminar, foi determinado o bloqueio mensal de valores (fl. 73).

Na contestação (fls. 93-94), o réu alegou que o medicamento Depakene faz parte da lista de medicamentos especiais e excepcionais do Estado, mas que o medicamento Óleo de Lorenzo não faz parte nem da lista do Estado, nem da lista do Município. Requereu a improcedência do pedido e a autorização para fornecimento de medicamento similar.

Houve réplica (fls. 95-97).

O Ministério Público opinou pela procedência do pedido (fls. 99-102).

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório.

DECIDO.

I- Das preliminares

a) Do requerimento administrativo

O réu sustentou a falta de interesse processual por não ter sido aviado pedido administrativo anterior à demanda, entendendo não evidenciada a resistência ao atendimento.

Ora, não se constitui requisito para ajuizamento de pedido como o ora examinado a demonstração de prévia requisição administrativa, o que somente poderia ser estabelecido por lei.

Ademais, é reiterada a jurisprudência no sentido da dispensabilidade de tal pressuposto para o ingresso de ação contra o Estado (lato sensu) para o fornecimento de medicamentos.

Por fim, do próprio teor da peça contestatória se depreende a resistência do Estado ao pedido de fornecimento de um dos medicamentos, o que já justifica o ajuizamento da demanda.

b) Da ilegitimidade passiva

O artigo 196 da Constituição Federal dispõe que:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (grifei)

Também a Lei nº 8.080/90, que dispõe sobre ações e serviços de saúde em todo território nacional, em seu artigo 2º, prevê que: "A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício". (grifei)

Da análise dos dispositivos, compreende-se que a saúde é responsabilidade solidária de todos os entes federativos, pois a palavra "Estado" é empregada em seu sentido amplo, abrangendo a União, os Estados-Membros, o Distrito Federal e os Municípios, de modo que qualquer deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda.

Assim, optando o cidadão por propor a ação contra o Estado do Rio Grande do Sul, Estado onde reside, este é o ente que deverá lhe prestar assistência à saúde, visto que todos os entes da Federação estão legitimados para tanto.

Nesse mesmo viés, a existência de listas determinando quais os medicamentos são de responsabilidade de cada ente não pode configurar obstáculo ao direito do cidadão, primeiramente em virtude do mandamento constitucional, que não fez distinção entre os entes federativos e, depois, por se tratarem de mera norma de organização administrativa, inoponíveis, portanto, ao beneficiário do Sistema Único de Saúde.

II- Do mérito

O artigo 5° da Carta Magna atribui a todo e qualquer cidadão, dentre seus direitos e garantias fundamentais, o direito à vida. Complementando tal dispositivo, o artigo 196, também da Lei Maior, preconiza que a saúde é direito de todos e dever do Estado lato sensu.

Nesse passo, imperioso desde já assentar que, embora se trate de norma de abrangência geral, dirigida à sociedade como um todo, há de ser interpretada, outrossim, na sua face mais específica, abrangendo a cada um dos indivíduos de cujo manto necessitem, sob pena de se tornar meramente programática, sem qualquer eficácia.

Assim, no confronto entre a garantia constitucional do indivíduo de ter sua saúde e, em última instância, sua vida, preservada e eventual déficit orçamentário é óbvia a preponderância da primeira, não havendo o que tergiversar. Recorde-se, aliás, que a obrigação do Estado em prestar saúde é também constitucional e que, para tanto, há de fazer a previsão das verbas.

A necessidade dos medicamentos é suficientemente demonstrada pelos documentos juntados com a inicial, dando conta que o autor é portador de adrenoleucodistrofia.

Igualmente estampada nos autos a insuficiência das condições econômicas do autor e de sua família para custear o pagamento dos medicamentos indicados para a sua patologia - os quais possuem considerável custo -, ante a declaração da fl. 9.

Impõe-se, portanto, a procedência do pedido.

No tocante ao estabelecimento de multa para o caso de descumprimento, revejo meu posicionamento anterior em casos semelhantes, entendendo inadequada fixá-la neste momento processual, em que sequer teve o demandado a oportunidade para cumprir a determinação que ora se lhe impõe. Consigno que poderá vir a ser estipulada caso efetivamente venha a ser descumprida a ordem judicial.

Quanto ao requerimento de substituição dos medicamentos requeridos por outros similares, entendo ser cabível desde que com o mesmo princípio ativo, de modo a não acarretar prejuízo ao tratamento.

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado por LUCAS NEY LOPES em face de ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ao efeito de confirmar a antecipação de tutela deferida, enquanto houver a necessidade da utilização do medicamento pelo autor, podendo o mesmo ser substituído por outro similar, desde que com o mesmo princípio ativo, de modo a não acarretar prejuízo ao tratamento.

Isento o réu do pagamento das custas e despesas processuais, com base no parágrafo único, do artigo 11, da Lei n° 8.121/85, e condeno-o ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$ 700,00.

Não se tratando de condenação com valor certo, não está sujeita a reexame necessário (art. 475, §2°, CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquive-se.

Jaguarão, 19 de agosto de 2009.

Carolina Granzotto,
Juíza de Direito



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